Autores
Borges, D.K.G. (UFAM) ; Souza, K.S. (UFAM) ; Oliveira, S.C. (SEDUC AM)
Resumo
Neste artigo apresentamos o estudo da adulteração da gasolina pelo etanol, realizado com alunos do 1⁰ ano, da Escola Estadual Inspetora Dulcinéia Varela Moura. Este trabalho foi apresentado na II Mostra de Bioexatas da escola. Foram selecionados dois postos do bairro Novo Israel para análises com fins didáticos para o estudo de conceitos químicos e trazer a reflexão sobre direitos e deveres do consumidor. Foram realizados o teste da proveta e cálculo de densidade. Os resultados indicam que as amostras de gasolina estão dentro do padrão regulamentados pela ANP (Agência Nacional de Petróleo). Os alunos envolvidos puderam compreender e compartilhar os conhecimentos adquiridos sobre as vantagens e desvantagens de se adicionar etanol à gasolina brasileira e os conceitos químicos relacionados.
Palavras chaves
GASOLINA COMUM; ENSINO DE QUÍMICA; TEOR DE ÁLCOOL
Introdução
Sabemos que a ciência está presente em nosso cotidiano, seja em tratamentos de doenças ou nas atividades corriqueiras como lavar uma louça com detergente ou no cozimento de alimentos. Podemos dizer que ela nos ajuda a compreender e questionar nossa realidade. A partir de situações cotidianas que são explicadas por conceitos químicos permite o educando ter uma visão mais ampla do mundo que o rodeia. Assim, evita-se que o conteúdo seja visto apenas como um conjunto de fórmulas sem contextualização (PINTO, 2012). O mundo contemporâneo necessita de cidadãos alfabetizados em ciência e tecnologia, e nos dias atuais se torna impossível não relacionar a ciência e a tecnologia com a sociedade. Para isso, torna-se essencial, que os alunos sejam estimulados a pensar, refletir, agir, tomar decisões conscientes e compreender discursos de especialistas (HYGINO et al., 2016). Desse modo, o ensino de ciências deve oferecer meios para que os estudantes possam compreender e questionar o desenvolvimento e aplicação da ciência e tecnologia em sua sociedade, assim como afirmam os PCN+ (Brasil, 2002, p.15) o ensino médio deve permitir aos estudantes: “Reconhecer e avaliar o desenvolvimento tecnológico contemporâneo, suas relações com as ciências, seu papel na vida humana, sua presença no mundo cotidiano e seus impactos na vida social”. A utilização do petróleo como fonte de energia foi essencial para garantir o desenvolvimento industrial verificado durante o século XX e a sociedade brasileira ainda é dependente desta fonte. Através da sua destilação fracionada, pode-se obter vários produtos derivados de grande importância econômica, tais como o gás natural, o querosene, o diesel, os óleos lubrificantes, a parafina e o asfalto. Mas a fração do petróleo que apresenta maior valor comercial é a gasolina, tipicamente uma mistura de hidrocarbonetos saturados que contém de 5 a 8 átomos de carbono por molécula (DAZANNI et al., 2003). A adulteração da gasolina e de outros combustíveis ocorre quando se adiciona a eles algum produto que modifique as suas características originais e que diminua a sua garantia e potencial. Esse tipo de fraude ocorre pelo acréscimo de qualquer substância diferente daquelas que já existam no produto ou que já exista, mas esteja em valores fora das especificações regulamentadas. Além disso, é um ato sem reconhecimento de impostos (HYGINO et al., 2016). Geralmente esse tipo de fraude é realizado em postos de combustíveis que desejam ter um maior lucro, tendo em vista que os produtos adicionados são mais baratos que a gasolina. Esses produtos adicionados são líquidos, miscíveis e também combustíveis, pois eles precisam queimar para não deixar vestígios que possam ser notados imediatamente pelo consumidor. Por isso, o dano normalmente é visto somente depois de certo tempo, em razão da acumulação por vários abastecimentos. Além da grande perda econômica para o consumidor, o meio ambiente também sai perdendo muito, pois esses combustíveis adulterados emitem poluentes gasosos altamente tóxicos (HYGINO et al., 2016). Sempre que ocorre instabilidade no preço do petróleo, com sucessivos aumentos do preço de seus derivados, a gasolina ganha ainda mais evidência na mídia. A qualidade da gasolina comercializada no Brasil tem sido constante objeto de questionamento; assim, a determinação da sua composição é importante, devido a algumas formas de adulteração com solventes orgânicos que prejudicam os motores dos automóveis. Um componente presente exclusivamente na gasolina brasileira que merece destaque especial é o etanol (DAZANNI et al., 2003). Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a legislação brasileira estabeleceu, por meio da publicação da Portaria nº 143 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que todos os tipos de gasolina devem receber adição de etanol anidro com um porcentual de 25 %. A margem de erro é de 1% para mais ou para menos. Recentemente a ANP alterou para 27 % a quantidade de álcool permitida para a gasolina do tipo comum e aditivada. Ademais, nessa porcentagem, a adição de etanol à gasolina ajuda na diminuição de poluentes, como o monóxido de carbono (um dos gases do efeito estufa), e também melhora a limpeza interna do motor. A falta ou excesso de álcool em relação aos limites estabelecidos pela ANP compromete a qualidade do produto que chega aos consumidores brasileiros. Assim, avaliar a composição da gasolina, verificando se o teor de álcool está adequado, é uma atitude muito importante (DAZANNI et al., 2003). Dessa maneira nossa proposta de trabalho é analisar a gasolina brasileira com fins didáticos, pois a gasolina é uma substância muito presente no cotidiano de todos e assim explorar o tema de adulteração de gasolina de modo que possamos refletir sobre as ações do governo, ao mesmo tempo sabermos nos posicionar enquanto cidadão com direitos e deveres.
Material e métodos
Este trabalho foi realizado com quinze alunos do primeiro ano da Escola Estadual Dulcineia Varela Moura e apresentado na feira de ciências realizada na escola no mês de junho de 2017. Primeiramente foram selecionados dois postos de gasolina nas adjacências do bairro Novo Israel, na qual chamamos posto um e posto dois. Na atividade experimental foi medido 50ml de gasolina e posteriormente pesado na balança e assim medirmos sua massa. Após esse procedimento, acrescentou-se 50 mL de água. Posteriormente a turma foi dividida em dois grupos para responder a três perguntas do livro Ser Protagonista – Química (ANTUNES, p.59, 2013).
Resultado e discussão
Com o intuito de medirmos a densidade, pesou-se 50 mL de gasolina. Os testes
foram feitos em duplicatas e calculado a média para cada posto. Isso nos
permitiu realizar o cálculo da densidade da gasolina, apresentados na tabela
1.
Os valores de referências para a densidade da gasolina são apresentados pelo
conselho nacional de petróleo (CNP) e encontra-se entre 0,7154-0,7558 g/mL
(25,5 ⁰C). O que demonstra que os valores obtidos para densidade se
encontram dentro das especificações.
De acordo com Tarcinalli (2009) o padrão de densidade da gasolina esta
situado entre 0,72 g/cm3 e 0,75 g/cm3, sendo a gasolina adulterada esta
densidade será menor por conta da adição de compostos orgânicos menos
densos.
Posteriormente, foi acrescentado 50mL de água na proveta e observado o novo
valor de água mais álcool. A quantidade de álcool na gasolina se calculou da
seguinte maneira: Válcool = Vfinal – Vágua. Tanto para o posto 1 como posto
2, obteve-se 12 mL de álcool. A fórmula aplicada para cálculo do teor de
alccol na gasolina foi: %álcool = (Válcool/Vinicial da gasolina) x 100
Os alunos observaram que ao se adicionar a água na gasolina, a mesma
“arrastou” o álcool presente na gasolina. Isso acontece porque o etanol
possui características apolar semelhante a gasolina e polar como a água,
como mostra sua fórmula molecular: CH3-CH2-OH. As pontes de hidrogênio,
representadas pela hidroxila OH são interações mais fortes, por isso a água
arrastou o álcool. A identificação do etanol na gasolina e o estudo da
interação entre as moléculas de água, etanol e os hidrocarbonetos presentes
na gasolina permitem abordar os conceitos de solubilidade e densidade,
explorando as características das moléculas envolvidas para explicar os
fenômenos observados. A geometria molecular, a polaridade da ligação
covalente e das moléculas e as forças intermoleculares podem ser
apresentadas aos alunos de maneira mais significativa, para justificar os
fenômenos macroscópicos observados.
A quantificação do teor de etanol na gasolina pode ser executada através de
uma análise absoluta, que não exige a comparação com valores de referência.
Pode-se observar que os dois postos apresentam um teor de álcool de 24 %,
demonstrando que os mesmos estão dentro da legislação.
Para completar o entendimento desse estudo e sua importância, a turma foi
dividida em dois grupos para responder aos questionamentos abaixo. As
respostas apresentadas é resultado do compartilhamento de opiniões.
1.Que cuidados os motoristas podem adotar para evitar o abastecimento em
postos que vendem combustível adulterados?
Grupo 1 - O cliente pode exigir o chamado teste de proveta que verifica o
excesso do álcool na gasolina. A população pode denunciar para os órgãos
competentes.
Grupo 2 – Teste da proveta, observar se a bomba tem selo do INMETRO.
2.O percentual obrigatório de adição de álcool anidro a gasolina é de 25%
com variação de 1 %. Quais são as vantagens ambientais e econômicas de se
misturar álcool a gasolina?
Grupo 1 - Aumenta o índice de octanagem da gasolina, diminuiu a emissão de
monoxido de carbono para a atmosfera.
Grupo 2 - A adição de álcool à gasolina foi a solução brasileira encontrada
para substituir o chumbo tetraetila, componente oxigenante que num passado
não muito distante servia para ajustar a octanagem (poder de queima) da
gasolina.
Esse chumbo era um componente venenoso e cancerígeno que foi probido pela
OMS e pela ONU nos anos 80, muito embora em países pobres da África seu uso
se deu até meados dos anos 2000. Além disso, esse chumbo é incompatível com
veículos com catalisador. Então uma das causas seria a octanagem e também
porque ajuda a diminuir poluentes. Mas em contrapartida aumenta a emissão de
gases Nox e aumenta o consumo de combustível.
3.Que ações da ANP e do governo levariam a uma menor incidência desse tipo
muito comum de fraude?
Grupo 1 - A agência reguladora informou que mantém um programa de
monitoramento da qualidade do combustível, que prevê a contratação de
institutos de pesquisa como universidades para a coleta e análise de
amostras de combustíveis em todo brasil. O trabalho dá indicativo da
qualidade dos combustíveis comercializados no país. O órgão lembra que os
consumidores também podem contribuir denunciando postos suspeitos.
Grupo 2 – Fiscalizando. A ANP faz uma campanha em seu site da seguinte
maneira: quando você também fiscaliza, o Brasil anda melhor, para diminuir a
possibilidade dos consumidores serem lesados. A ANP também faz fiscalização
nos postos.
No Brasil a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis
(ANP), tem como uma de suas atribuições a proteção dos interesses dos
consumidores quanto à qualidade dos derivados de petróleo comercializados em
todo o território brasileiro, conforme o Art. 8º da Lei nº. 9.478/1997 (Lei
do Petróleo). Para essa finalidade a ANP mantém um programa para monitorar
constantemente a qualidade da gasolina, álcool e óleos diesel
comercializados nos postos revendedores brasileiros. Este programa é
denominado Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis Líquidos
– PMQC [CAVALCANTE, 2014].
O teste da proveta é um direito de todo consumidor cuja realização pelos
postos de gasolina é obrigatória e deve ser realizada imediatamente quando
solicitada pelo consumidor.
Conclusões
A elaboração desse trabalho apresenta uma maneira contextualizada de envolver aspectos físicos e químicos das propriedades substâncias, como a densidade e solubilidade. Podemos perceber que os conceitos químicos são utilizados para explicar os fenômenos. No nosso caso de adulteração da gasolina, com atividades investigativas por meio de experimento com materiais de baixo custo. Com a atividade final também pode-se perceber que as respostas dos grupos, considerando os aspectos sociais, econômicos e ambientais se complementaram e podemos verificar o que podemos fazer para exigirmos nossos direitos, além de saber que tipo de poluentes o álcool e a gasolina produzem como o monóxido de carbono e gases de nitrogênio. Durante a exposição deste trabalho na feira de ciência da escola, os alunos puderam compartilhar os conhecimentos adquiridos e puderam perceber que muito dos colegas, não sabem dar valor as informações que os ajudariam a viver em sociedade, para que no mínimo não sejam lesados e ter um posicionamento de cidadão, tão necessário em um país que vive uma crise moral e política. Por isso a importância de trabalhar temas sociais nas escolas brasileiras, pois ao mesmo tempo que vemos a interligação dos conteúdos químicos com eventos que podem nos ajudar no cotidiano, promove e capacita aos cidadãos uma formação significativa, fazendo-nos compreender a ciência em nosso cotidiano, nos tornando capazes de tomar atitudes críticas com relação ao tema abordado.
Agradecimentos
SEDUC-AM, Gestor Ivan Rufino, Escola Estadual Inspetora Dulcineia Varela Moura.
Referências
Agência Nacional de Petróleo, Brasil. Resolução ANP nº 09, de 07 de março de 2007. Disponível em: <http://nxt.anp.gov.br/NXT/gateway.dll/leg/resolucoes_anp/2007/mar%C3%A7o/ranp%209%20-%202007.xml> .
ANTUNES, M. T. Ser Protagonista – Química. Ensino Médio. 1º ano. Editora SM. São Paulo, 2013.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais + (PCN+) - Ciências da Natureza e suas tecnologias. Brasília: MEC, 2002
CNP. Conselho Nacional do Petróleo. Tabela de correção para 20° C da densidade e do volume. Resolução n° 6, 1970.
CAVALCANTE, R. A. Caracterização Físico-Química do Etanol Hidratado Combustível Comercializado no Município de Mossoró-RN. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal Rural do Semi-Árido, 2014.
DAZZANI, M.et al, Determinação do teor de álcool na gasolina, Química Nova na Escola, 17, 2003.
HYGINO, C. B.; FERNANDES, T. F.; AMARAL, E. I. Gasolina adulterada: uma proposta didática com enfoque CTS no ensino de física e química. XVIII Encontro Nacional de Ensino de Química (XVIII ENEQ), Florianópolis, 2016.
PINTO, V. D. A. Gasolina: uma proposta temática para estudo do petróleo no ensino de química. Trabalho de conclusão de curso, Brasília, 2012.
TARCINALLI, D. G. Relatório sobre Determinação do Percentual de Álcool na Gasolina. Faculdade Anhanguera de Bauru. Bauru, 2009.