Autores
Barros Guimarães, M. (IFRJ) ; Leal de Castro, D. (IFRJ)
Resumo
O artigo expõe uma pesquisa, de caráter qualitativo, que buscou identificar a percepção de alunos do ensino médio com relação às atividades experimentais na disciplina de química. Um questionário foi aplicado com intuito de apurar as expectativas dos discentes com relação aos experimentos vistos em sala de aula. Os dados coletados foram analisados com base na Análise Textual Discursiva (ATD) e elaboraram-se unidades de categorização, as quais foram interpretadas e discutidas. Os resultados obtidos permitem visualizar que a expectativa dos alunos realizarem atividades mágicas dentro do laboratório ainda é frequente. Desse modo, discute-se na valorização de problematizações em sala, visando desconstruir a visão distorcida dos alunos acerca dos objetivos das práticas laboratoriais.
Palavras chaves
Laboratório; Experimentos ; Problematizações
Introdução
A experimentação assume um relevante papel para a aprendizagem no ensino de Ciências, uma vez que o uso de experimentos desenvolvidos no laboratório para o ensino de Ciências é o início do estímulo ao aluno para estabelecer uma relação com a teoria vista em aula. Por esse motivo, o modo como se utiliza o laboratório de química, por exemplo, é mais relevante comparado a experimentação em si (SCHWAHN; OAIGEN, 2000). Embora seja ressaltado uma atribuição pertinente da experimentação é de suma importância destacar que a função desta no desenvolvimento científico não é sempre bem compreendida pelos alunos. Segundo Maldaner (2000), é habitual que muitos docentes atendam as ideias provenientes dos alunos com relação aos experimentos desenvolvidos nas aulas práticas laboratoriais. A expectativa do senso comum dos discentes é presenciar a química no laboratório como um fenômeno espetacular, sendo caracterizada pelas transformações surpreendentes; formações de bolhas e aparecimento de explosões de variadas cores, ou seja, simbolizam a realização de experimentos semelhante a uma exibição de magias. O autor considera que “estas ideias são reforçadas pela mídia, pelos filmes de ficção, pela divulgação de certas práticas alquimistas, jogadas na imaginação das pessoas fora do contexto em que elas se deram.” (MALDANER, 2000, p. 107). É frequente, no âmbito de professores, prevalecer a ideia que a atividade experimental facilitará a aprendizagem, uma vez que exercerá a função de concretizar para o discente as teorias da ciência. Os alunos quando praticam em aula um experimento e observam os determinados fenômenos, frequentemente solicitam a explicação do professor com base em uma teoria. Vale-se ressaltar que quando se utiliza de uma teoria para esclarecer o fenômeno não quer dizer que está sendo provada a veracidade desta, porém está sendo feito o teste da sua capacidade de generalização (SILVA; MACHADO; TUNES, 2011). Segundo Silva, Machado e Tunes (2011) existem algumas crenças a respeito da experimentação que os alunos carregam consigo e podem se traduzir em obstáculos. A primeira crença a ser destacada é que as aulas experimentais motivam mais a aprendizagem com relação às teóricas. Essa ideia contribui para a disjunção da teoria-prática e vai de encontro com as orientações curriculares para o ensino médio (OCNEM) (BRASIL, 2006, p.32) que afirma que “A aula de laboratório deve estimular a proliferação e sistematização de ideias que conjuguem teoria e prática”. A segunda crença destacada é a realização de experimentos que se limitam à apresentação de fenômenos impactantes, tais como explosões, liberação de gases coloridos ou espumas, resulta em maior interesse no estudante ao aprender. No entanto, o efeito impactante que esses fenômenos atuam sobre os alunos, pode ser uma barreira, pois o aluno se sente motivado justamente por visualizar o “show” da ciência e pode reduzir o seu desejo em estudar outras atividades experimentais que não abrangem esses fenômenos vistosos e bombásticos. Galiazzi e Gonçalves (2004) descrevem em seus resultados de pesquisas que o interesse por atividades experimentais que apresentam um belo visual e são comparados a um show são as mais citadas pelos sujeitos investigados. Os autores sinalizam que é preciso superar a prática experimental laboratorial que vem sendo interpretada como motivação visual, a qual os alunos ainda são bastante consolidados à beleza visual, à mágica e ao show da ciência. Pode-se destacar que a ideia que muitos alunos apresentam acerca do laboratório de química de resumir a realização de experimentos práticos a uma apresentação fantástica semelhante a um show, com a presença de reações explosivas, fumaça e muitas cores pode ser motivada por visualizarem seriados televisivos. Destacam- se as séries CSI, Breaking Bad entre outras que retratam assuntos ao redor de criação de bombas ou drogas e utiliza-se da química como recurso para realização de crimes. Por esse motivo, muitos adolescentes possuem uma visão distorcida acerca da química, como por exemplo, categorizá-la como vilã, ou até mesmo pensar que no ambiente escolar de laboratório devem ser realizadas práticas que entram em consonância com o que eles visualizam nas séries. Deste modo estre trabalho objetiva averiguar a percepção de alunos do ensino médio a respeito de atividades experimentais na disciplina de química e discutir os dados recolhidos.
Material e métodos
A presente pesquisa foi realizada com 39 alunos, matriculados no segundo ano do ensino médio de uma instituição de rede pública federal localizada no estado do Rio de Janeiro. Duas turmas foram selecionadas como sujeitos da pesquisa, pois esses alunos frequentaram, no primeiro ano do ensino médio, as aulas práticas laboratoriais referentes à disciplina de química. A Instituição disponibiliza um documento que se constitui na ementa de formação geral referente ao primeiro ano do ensino médio na disciplina de química. Neste estão listados os conteúdos programáticos de cada bimestre da parte teórica da disciplina, porém com relação às atividades práticas laboratoriais não são disponibilizados um direcionamento das aulas práticas a serem executadas com os alunos. Somente é citado que a proposta de avaliação da parte prática laboratorial seria por meio de aplicação de questionários contendo perguntas pertinentes ao tema desenvolvido na aula, equivalendo a 30% da nota dos alunos. Como instrumento de coleta de dados foi aplicado em duas turmas, um questionário contendo uma questão de caráter discursivo. Optou-se por questão aberta, uma vez que não era de interesse antecipar as respostas, mas desejava-se averiguar as opiniões aprofundadas dos entrevistados. Segundo Marconi e Lakatos (2003) uma das vantagens de aplicar perguntas abertas é possibilitar que o entrevistado responda com mais liberdade, não se restringindo a uma alternativa (MARCONI; LAKATOS, 2003). A questão teve por intuito averiguar as práticas que os alunos esperavam que fossem realizadas no laboratório a fim de sondar se as atividades laboratoriais feitas atenderam as expectativas dos estudantes.
Resultado e discussão
A presente pesquisa insere-se na perspectiva de uma análise qualitativa,
voltada na interpretação de diferentes significados presentes nos resultados.
Segundo Moraes e Galiazzi (2006) a pesquisa qualitativa busca compreender os
fenômenos e investigá-los por intermédio de uma rigorosa análise, que se
resulta na análise textual discursiva (ATD). As opiniões dos alunos coletadas
por meio do questionário foram registradas e interpretadas de acordo com a
identificação de unidades de significado. Adiante, as unidades de temáticas
semelhantes foram organizadas em categorias e a partir da categorização, os
textos descritivos foram elaborados. O metatexto apresentado a seguir
comunicarão os resultados desta análise e será referente a única questão do
questionário.
Dentre os 39 alunos investigados, um grupo de 27 alunos defendeu que esperavam
que fossem realizadas no laboratório as atividades práticas vistosas, atrativas
e até mesmo perigosas. O interesse dos alunos em manusear produtos de grande
risco como os ácidos e bases fortes, que são substâncias corrosivas, ou
realizar reações explosivas, radioativas, usando metais pesados e perigosos,
são presentes em suas escritas, como mostraram os relatos a seguir: “Eu pensava
que seria algo bem diferente, reações explosivas, reações radioativas, usando
metais pesados e substâncias perigosas”. “Eu pensei que faria análises com
ácidos perigosos e produtos de grande risco no manuseio”. Esses dois relatos
resumem bem a concepção que grande parte dos alunos carrega consigo em relação
às atividades práticas laboratoriais no ensino de química.
Como já foi destacado na introdução deste trabalho, o conhecimento dos alunos
ainda é muito arraigado ao show que a química pode proporcionar. Pode-se
ressaltar que existam influências da mídia acerca dessa visão distorcida do
laboratório, observa-se que os alunos descrevem claramente em seus relatos,
usando os termos corretos do ponto de vista químico, mas não se preocupam com a
dimensão de suas concepções. De acordo com as Orientações Curriculares do
ensino médio, é preciso desmitificar e superar a visão dos alunos que o
laboratório funciona como mágica (BRASIL, 2006).
O grupo de 12 alunos direcionou nessa questão a realização de atividades
práticas que comprovassem a teoria vista em sala de aula, como mostraram os
relatos a seguir: “Esperava experiências que comprovassem o que foi visto nas
aulas teóricas”. “Queria experimentos com elementos químicos que mostrassem
transformações ou misturas que provassem o que foi dado na teoria”. Galiazzi e
Moraes (2004) apostam em sentido oposto aos relatos descritos dos alunos. Os
autores afirmam que é preciso superar essa visão que a atividade experimental
exerce o papel exclusivo de comprovar a teoria, uma vez que em todas as
observações são as teorias que possibilitam a interpretação destas e não o
inverso.
Conclusões
A partir da análise dos dados, identifica-se que a expectativa dos alunos de manipularem substâncias químicas classificadas como perigosas e nocivas à saúde, reações químicas que sejam explosivas, ou qualquer atividade que seja vista como mágica dentro do laboratório ainda é frequente. Tendo em vista, toda a discussão, ressalta-se a importância do professor valorizar o uso de problematizações em suas aulas, buscando desconstruir a visão deturpada dos alunos com relação ao laboratório, das práticas experimentais e dos experimentos realizados. Os resultados dessa pesquisa permite que seja ressaltada a importância do docente, que leciona a disciplina de química, pesquisar a respeito das teorias de experimentação a fim de propor discussões em sala com seus alunos e que seja superado a simples ideia de que a experimentação comprova as teorias que são definidas pela ciência. É importante ressaltar que a motivação com relação a despertar o interesse nos estudantes pela química deve ser feita de modo bem criterioso, pois é um risco que o aluno imagine e presume que nas aulas experimentais de laboratório no ensino de química seja o foco a realização de experimentos surpreendentes.
Agradecimentos
Agradecemos ao IFRJ pela possibilidade da pesquisa.
Referências
BRASIL. Orientações curriculares para o ensino médio: Ciências da Natureza, Matemática e suas tecnologias/ Secretaria de Educação Básica, 2, Brasília: MEC/SEMTEC, p.135, 2006.
GALLIAZZI, M. C.; GONÇALVES, F. P. A natureza pedagógica da experimentação: uma pesquisa na licenciatura em química. Química Nova na Escola, 27(2), p. 326-331, 2004.
MALDANER, O. A. A formação inicial e continuada de professores de Química: Professores/Pesquisadores. Ijuí: Ed. Unijuí, 2000.
MARCONI, M.A.; LAKATOS, E.M. Fundamentos de metodologia científica. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2003.
MORAES, R.; GALLIAZZI, M. C. Analise Textual Discursiva: processo reconstrutivo de múltiplas faces. Ciência e Educação, 12(1), p. 117-128, 2006.
SCHWAHN, M. C. A.; OAIGEN, E. R. Objetivos Para o Uso da Experimentação no Ensino de Química: A Visão de Um Grupo de Licenciandos. VII ENPEC, 2009.
SILVA, R. R.; MACHADO, P. F. L.;TUNES, E. Experimentar sem medo de errar. In: W. L. P. SANTOS; O. A. MALDANER (Org.). Ensino de química em foco. Ijuí: Ed. Unijuí. p. 231-261, 2010.