Autores
Cardoso, A.S.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO) ; Guerini, S.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO) ; Cardoso, J.L. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO)
Resumo
O Estado Maranhão, seguindo as orientações nacionais que alteraram o Ensino Médio por meio da lei nº 13.415/2017, implantou o Novo Ensino Médio na rede estadual junto à elaboração do Documento Curricular do Território Maranhense (DCTMA), documento que assegura as condições para o cumprimento das leis nacionais ao mesmo tempo que contempla as especificidades locais do estado. Este trabalho teve como objetivo analisar perspectivas regionais do ensino de química descritas no DCTMA. A pesquisa foi de natureza qualitativa, de caráter documental e exploratória, contando com a técnica de análise de conteúdo para interpretação dos dados. Conforme observado, o documento recomenda práticas educacionais que possibilitem que o ensino de química faça o aluno compreender e refletir a realidade
Palavras chaves
Novo Ensino Médio; Ensino de Química; Regionalismo
Introdução
O Brasil é marcado historicamente por sucessivas reformas educacionais. Com atualizações de leis e de documentos orientadores oficiais, a educação brasileira se reestrutura a cada época. Recentemente, por meio da Lei nº13.415/2017, houve a reforma do ensino médio, ao qual foram estabelecidas significativas mudanças estruturais, destacando-se o aumento da sua carga horária mínima anual, que foi de 800 horas para 1.400 horas e a determinação de uma estrutura curricular que se dividiu da seguinte forma: uma parte obrigatória e outra parte diversificada, chamada de itinerários formativos, para os quais há uma orientação que sejam organizados por meio da oferta de diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de ensino. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em seu artigo 35, estabelece que o ensino médio é a etapa na qual o educando deve se preparar para o trabalho, para a cidadania e, ainda, desenvolver sua autonomia intelectual e seu pensamento crítico. Pela lei da reforma, há agora indicações para que os currículos dessa etapa considerem a formação integral do aluno, de maneira a adotar um trabalho voltado para a construção de seu projeto de vida e para sua formação nos aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais (BRASIL, 2017). No intuito de seguir as novas orientações estabelecidas pela reformulação do ensino médio e de se estabelecer uma educação que considere as realidades locais, o estado do Maranhão organizou um documento educacional específico para nortear suas ações ao mesmo tempo que comtempla as normais nacionais. O Documento Curricular do Território Maranhense (DCTMA) teve seu processo de elaboração iniciado em 2018, mas só em 2019 foi publicado. A partir de então, ele representa um organizador curricular do estado e orientador das ações escolares, afirmando que “se estrutura a partir de uma importante reflexão sobre o ensino médio oferecido no estado do Maranhão, desde os seus desafios aos princípios educacionais que orientam o projeto escolar e as práticas pedagógicas” (DCTMA, 2019, p.12). Ainda há destaque para a “necessidade de enxergar a diversidade sociocultural que norteia a construção histórica do estado e de seu povo, tendo-se a “maranhensidade” como eixo fundamental da construção deste currículo. (MARANHÃO, 2019, p.15).Considerando as alterações estruturais, conceituais e regionais, no âmbito do novo ensino médio, mostra-se oportuno refletir quais seriam as recomendações para o ensino de química mediantes esse novo contexto. Desse modo, este trabalho tem por objetivo fazer uma análise sobre os aspectos locais do ensino de química no Estado do Maranhão com base nas orientações do DCTMA, documento que passou a ser reconhecido como um dos principais norteadores da educação maranhense pós-reforma do ensino médio.
Material e métodos
A presente pesquisa é de natureza qualitativa de cunho documental e exploratória. Documental pela necessidade de se recorrer ao DCTMA para se realizar coleta de dados e é exploratória por ter como finalidade tornar mais explícito aquilo que é pesquisado, proporcionando maior familiaridade a seu respeito (GIL, 2023). Este documento foi escolhido por apresentar orientações para o desenvolvimento do trabalho pedagógico do novo ensino médio dentro da perspectiva regional do Estado do Maranhão e por representar um dos principais norteadores da educação estadual. Além desse documento, foram analisados trabalhos de autores que se debruçaram sobre a temática do ensino de química, para que se pudesse confrontar suas ideias com as recomendações do DCTMA. Como técnicas para análise de dados, foram consideradas as propostas para a abordagem de análise de conteúdo (BARDIN, 2011). Desse modo, algumas etapas foram organizadas, segundo as orientações do autor: a pré-análise, na qual foi feita a escolha e organização do material a ser analisado; a etapa da exploração, referente ao momento das fases de codificação e categorização; por último, seguiu-se com a parte de tratamento e interpretação de resultados, que se trata de compreender o sentido da comunicação. Na organização dos dados para interpretação, foram criadas categorias de análise a priori, isto é, buscou-se explicar o ensino de química a partir de concepções estabelecidas no referencial teórico, conforme Bardin (2011). Desse modo, as duas categorias estabelecidas foram metodologias para o ensino de química e competências para o ensino de química, que passaram a ser exploradas afim de que seus aspectos regionais fossem descritos e discutidos de acordo com o aporte teórico selecionado e o documento curricular investigado. O DCTMA é organizado por áreas de conhecimento que integram conjuntos de componentes curriculares e é considerando esse formato que todas as orientações educacionais do documento são direcionadas. No caso da química, ela integra a área denominada Ciências da Natureza juntamente com as disciplinas de física e biologia. Por esse motivo, neste trabalho, as referências a essa disciplina foram descritas como “ciências/química”, dando destaque ao componente específico que se analisou dentro da grande área.
Resultado e discussão
Para a categoria "competências para o ensino de ciências/química", destacou-se
as competências recomendadas pelo DCTMA que estão baseadas em três que são
descritas pela Base Nacional Comum Curricular: “Competência específica 1:
Analisar fenômenos naturais e processos tecnológicos, com base nas relações
entre matéria e energia, para propor ações individuais e coletivas que
aperfeiçoem processos produtivos, minimizem impactos socioambientais e melhorem
as condições de vida em âmbito local, regional e/ou global. (BRASIL, 2018, p.
539); Competência específica 2: Construir e utilizar interpretações sobre a
dinâmica da Vida, da Terra e do Cosmos para elaborar argumentos, realizar
previsões sobre o funcionamento e a evolução dos seres vivos e do Universo, e
fundamentar decisões éticas e responsáveis. BRASIL, 2018, p. 539); Competência
específica 3: Analisar situações-problema e avaliar aplicações do conhecimento
científico e tecnológico e suas implicações no mundo, utilizando procedimentos e
linguagens próprios das Ciências da Natureza, para propor soluções que
considerem demandas locais, regionais e/ou globais, e comunicar suas descobertas
e conclusões a públicos variados, em diversos contextos e por meio de diferentes
mídias e tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC).” (BRASIL,
2018, p. 539). Evidencia-se, nas descrições de cada competência a importância
que se dá para as atitudes dos estudantes frente a questões sociais, sobretudo
no sentido da busca por soluções de problemas relacionados ao seu cotidiano e
que envolva a ciência e a tecnologia. O ato de se promover a adequação do
indivíduo às demandas da sociedade e torná-lo mais produtivo é um dos objetivos
principais da educação baseada nas competências (SAVIANI, 2013). No intuito de
justificar a inserção das competências aos aspectos mais locais do estado, O
DCTMA ainda ressalta outro trecho da BNCC:[...] cabe aos sistemas e redes de
ensino, assim como às escolas, em suas respectivas esferas de autonomia e
competência, incorporar aos currículos e as propostas pedagógicas a abordagem de
temas contemporâneos que afetam a vida humana em escala local, regional e
global, preferencialmente de forma transversal e integradora[...] (BRASIL, 2018
). Para o alcance das competências objetivadas no ensino de Ciências da
Natureza, levando em conta a realidade local, o documento cita como estratégia o
uso do método dialético, que tem a prática social como fundamento do trabalho
pedagógico (MARANHÃO, 2019). Compreende-se assim que o ensino de química
necessita estar relacionado com a realidade dos educandos para que estes possam
desenvolver as competências da maneira que se propõe. Mas, ao fazer menção à
realidade local do território maranhense, o DCTMA reconhece a diversidade que o
compõe citando que:
[...] os estudantes do ensino médio do Maranhão, concentrado, em sua maioria, na
zona rural, pertencente às mais diversas comunidades, com suas peculiaridades –
quilombolas, campesinos, indígenas, sujeitos de diferentes raças/etnias e
gêneros, com anseios e percursos diferenciados –, frequentando escolas em
realidades distintas[...] (MARANHÃO, 2019, P. 22). No tocante à categoria
"metodologias para o ensino de ciências/química", há destaque para as
recomendações do DCTMA sobre quais os métodos de ensino de química devem ser
empregados pelos professores professores maranhenses. As recomendações são para
uso do método dialético, contextualização na perspectiva sócio-histórica e
metodologias ativas. O documento justifica cada uma. O método dialético é
apresentado no DCTMA como essencial na compreensão da realidade pelo aluno, pois
é uma metodologia que se destaca por ter a prática social como eixo do trabalho
pedagógico. Há, portanto, destaque para o fato de que “o processo de ensino que
tem como finalidade ampliar a compreensão sobre os elementos, nexos, inter-
relações, contradições” e fundamentos que constituem a realidade social”
(MARANHÃO, 2019, p.98). A contextualização é vista como uma estratégia para se
desenvolver o conhecimento e o domínio da linguagem científica (códigos,
símbolos, nomenclaturas e gêneros textuais), pois esta seria uma metodologia que
possibilita o pensamento crítico e a intervenção social dos estudantes. Entre as
ações no uso desta metodologia, indica-se organização de debates que levem os
estudantes a se posicionarem diante de questões sociocientíficas a partir de
seus pontos de vista e levando em conta aspectos científicos, históricos,
éticos, políticos, socioeconômicos, culturais e ambientais (MARANHÃO, 2019,
p.96). Finger e Bedin (2019),destacam que contextualizar no ensino de química é
uma maneira de possibilitar que o estudante faça relações do conhecimento
científico com sua realidade social. Para o uso das metodologias ativas há o
argumento de que elas estimulam a autonomia e o protagonismo estudantil e tem “o
diferencial de colocar o estudante diante de desafios reais, estimulando-o a
buscar soluções a partir da investigação científica, da cooperação com os
colegas e do diálogo com o professor” (MARANHÃO, 2019, p.96). Sasseron (2018),
ressalta a concepção de protagonismo estudantil e a relação entre práticas
cotidianas e praticas de ensino proporcionadas pelas metodologias ativas.
Conclusões
Verificou-se que a química, seguindo orientações da área de Ciências da Natureza no DCTMA, apresenta nesse documento curricular algumas competências específicas a serem desenvolvidas pelo alunos que são baseadas nas ideias da BNCC e dentre elas estão o uso e o conhecimento da linguagem científica e tecnológica, a compreensão de fenômenos naturais e tecnológicos, a autonomia para a resolução de situação-problema com o uso de conhecimentos científicos. Com relação às metodologias de ensino, as recomendadas para o ensino de ciências/química são o método dialético, a contextualização na perspectiva sócio-histórica e metodologias ativas. Para o DCTMA, além da possibilidade de desenvolver a identidade regional do trabalho pedagógico idealizado em suas propostas, essas estratégias de ensino favorecem maior aprendizagem aos estudantes, pois, quando se reconhece e se utiliza suas realidades locais, os conteúdos ensinados passam a ter mais significados para eles.
Agradecimentos
Universidade Federal do Maranhão - UFMA Programa de Pós-graduação em ensino de Química - PPECEM
Referências
(BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Traduzido por Luís Antero Reto, Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011. Tradução de: L’Analyse de Contenu.)(BRASIL. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Altera as Leis nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 fev. 2017. Seção 1, p. 1.) (BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. MEC, 2018. Brasília,
DF, 2018. Disponível em < http://basenacionalcomum.mec.gov.br>. Acesso em : 02 de fev. 2023)(FINGER, I.; BEDIN, E. A contextualização e seus impactos nos processos de ensino e aprendizagem da ciência química. Revista Brasileira de Ensino de Ciências e Matemática, v. 2, n. 1, p. 8-24, 16 ago. 2019.)(GIL, Antonio Carlos, 1946 - Como elaborar projetos de pesquisa/ Antonio Carlos Gil.-6. ed. -[3. Reimpr.].- São Paulo: Atlas, 2019.)(LIBÂNEO, José Carlos. As teorias pedagógicas modernas revisitadas pelo debate contemporâneo na educação. In: LIBÂNEO, José Carlos; SANTOS, Akiko (Orgs.). Educação na era do conhecimento em rede e transdisciplinaridade. 3. ed. Campinas: Atomoealinea, 2010a. p. 19-62.)(MARANHÃO. Documento Curricular do Território Maranhense: ensino médio. Rio De Janeiro: FGV, 2019. Disponível em: https://www.gov.br/mec/pt-br/novo-ensino-medio/pdfs/RCSEEMA.pdf. Acesso em: 15 jun. 2023.)(SASSERON, L. H. Ensino de Ciências por Investigação e o Desenvolvimento de Práticas: Uma Mirada para a Base Nacional Comum Curricular. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, [S. l.], v. 18, n. 3, p. 1061–1085, 2018. DOI: 10.28976/19842686rbpec20181831061. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/rbpec/article/view/4833. Acesso em: 29 dez. 2022.)(SAVIANI, Dermeval. Histórias das ideias pedagógicas no Brasil. 4. ed. Campinas: Autores Associados, 2013. 474 p.)