Autores
Pulgarin, M.G.S. (UFAM) ; Marin, N.G. (UFAM) ; Santos, V.S. (UFAM)
Resumo
Esta pesquisa tem como objetivo analisar a trajetória educacional dos estudantes indígenas do curso de Licenciatura em Ciências: Biologia e Química, do Instituto de Natureza e Cultura - INC/UFAM, localizado no município de Benjamin Constant – AM, pertencentes a várias etnias, objetivando quais disciplinas, da área de Química, tendem a ter um grau de dificuldade, enfatizando também as questões vivenciadas pelos alunos que afetam o seu desenvolvimento acadêmico. A coleta de dados foi através de um questionário. Obtiveram-se resultados que demonstram as problemáticas tanto em relação às disciplinas, como em sua inclusão e vivência dentro da universidade. Apesar destes problemas, é possível que sejam amenizados através de discussões e diálogos na universidade.
Palavras chaves
estudantes indígenas; trajetória educacional; inclusão na universidade
Introdução
A Química é uma ciência de difícil compreensão e com conceitos totalmente abstratos, por ter esses conceitos propriamente químicos torna-se ainda mais complexo o entendimento por parte dos estudantes que serão futuros professores. Essa ciência ainda tem gerado entre alguns discentes uma sensação de desconforto em função das dificuldades que se enfrentam no processo de aprendizagem. Habitualmente, tal ensino segue ainda de maneira tradicional, de forma descontextualizada e não interdisciplinar, desenvolvendo nos alunos grande desinteresse pela matéria, em virtude tal qual as dificuldades de aprender e de relacionar o conteúdo abordado ao cotidiano, mesmo a química estando presente na realidade. No cotidiano sempre é possível nos deparamos com situações em que a química está envolvida e inserida no dia-a-dia, e com base nesta constatação que devemos pensar ̎porque os alunos têm tanta dificuldade em aprender algo que está inserida em suas vidas̎. Uma das possíveis dificuldades é o fato de que, na química muitas palavras não têm tradução literal para os indígenas visando que é necessário imaginar ou idealizar os processos químicos, já que a maior parte do mesmo não podemos ver, e isso acabada interferindo de forma direta no entendimento da disciplina para o aluno, afetando o seu aspecto cognitivo do aluno, não se podendo ignorar essa diversidade linguística no país. Considerando que muitas vezes eles compreendem melhor sua língua materna que o português, o que afeta a comunicação de aluno-aluno e professor-aluno, sabendo que o português é a língua majoritária. O ensino da língua portuguesa para as comunidades indígenas, em escolas das comunidades quanto nos cursos superiores, torna-se um grande desafio tendo em vista, sobretudo, as peculiaridades culturais e linguísticas desse povo. No entanto a educação escolar dos indígenas obteve um grande avanço nos últimos anos. Decretado em 1988, a Constituição Cidadã pode reconhecer os direitos culturais dos povos, assim sustentando a direito à diferença e a manutenção dela, ou seja, de ser índio, poder viver e permanecer como tal. Nesse contexto, o objetivo dessa pesquisa é analisar as principais dificuldades que estudantes indígenas enfrentam ao cursar disciplinas da área de Química enfrentados pelos discentes do curso de Licenciatura Ciências: Biologia e Química do 6°, 8° e 10° período. No que se refere a essa investigação os objetivos específicos são: Identificar as dificuldades enfrentadas pelos alunos indígenas durante a graduação e discutir sobre o grau de dificuldades dos estudantes em relação as disciplinas da área de Química pertencentes a matriz curricular do curso.
Material e métodos
Este estudo propõe investigar mais detalhadamente os fatores que dificultam o processo de ensino-aprendizagem dos indígenas em Química na sua formação como professor, com base em uma metodologia pautada em um estudo descritivo, de base empírica e natureza qualitativa, se considera que os paradigmas desta pesquisa são qualitativos e quantitativos se complementam na análise do fenômeno investigado, como destaca Gamboa (1997, p.106). Na pesquisa em Ciências Sociais, frequentemente são utilizados resultados e dados expressos numéricos. Porém se interpretados e contextualizados à luz da dinâmica social mais ampla, a análise torna-se qualitativa, isto é, na medida em que inserimos os dados na dinâmica da evolução do fenômeno e este dentro de um todo maior compreensivo, é preciso articular as dimensões qualitativas e quantitativas em uma inter-relação dinâmica, como categorias utilizadas pelo sujeito na explicação do objeto (GAMBOA, 1997, p. 106). Desta forma, o estudo foi realizado na Universidade Federal do Amazonas – Instituto de Natureza e Cultura – INC, localizada no Município de Benjamin Constant, tenho como sujeitos 12 alunos do Curso de Licenciatura Ciências: Biologia e Química do 6°, 8° e 10° período. A coleta de dados foi realizada no mês de maio tento início no dia 17 à dia 20 de maio. O levantamento de dados foi realizado, primeiramente, com a entrada via documentação a assistente social para solicitação da quantidade de indígenas do curso. Logo após, houve a aplicação de um questionário composto de perguntas abertas e fechadas relacionadas às dificuldades que os discentes encontram no decorrer do curso em relação as disciplinas de química. A pesquisa aconteceu com a aplicação de um questionário elaborado a partir de uma abordagem inicial com os alunos. O questionário continha 5 questões, sendo que 4 questões eram discursivas e 1 objetiva. Após o levantamento de dados através dos documentos no qual disponibilizava a quantidade de indígenas e, da aplicação do questionário para os alunos dos seguintes períodos: 6°, 8° e 10°, realizou-se a análise dos resultados através da categorização das respostas dos participantes.
Resultado e discussão
Verifica-se a necessidade de identificar quais dificuldades os alunos
indígenas têm em relação a Química e disciplinas da mesma, investigando o
processo de ensino e aprendizagem para, após as análises, sugerir possíveis
alternativas para melhoria deste processo. Diante dessa problemática,
observou-se a necessidade de investigar acerca desses problemas que os
estudantes enfrentam na área de química e, no idioma no qual são ministradas
as aulas, já que alguns tem sua língua materna diferente do português.
Indispensável sugerir novos métodos para minimizar essas dificuldades.
Logo, para o aluno indígena ingressar numa universidade ele tem que falar ao
menos o português, muitos falam, porém, a maioria não tem segurança em
leituras de livros específicos. A adaptação, destes jovens, na universidade,
também passa pela dificuldade de viver no ambiente urbano ou, até mesmo pelo
preconceito entre colegas da turma e, também, por professores que colocam os
alunos em condições menos capazes. Essas dificuldades enfrentadas e
vivenciadas por esses alunos podem ser traduzidas, em uma sequência de
desafios que precisam ser superados onde se destacam o desafio da
aprendizagem.
Com base nos dados coletados, dividiu-se o questionário em categorias para
facilitar a discussão: a) etnia, b) primeiro impacto ao entrar na
universidade, c) sentimentos causados por conta da língua materna, d)
dificuldades relacionadas as disciplinas de química e e) sugestões.
Inicialmente buscou-se investigar as etnias dos estudantes que cursam
Licenciatura em Ciências: Biologia e Química através do questionário, a qual
se obteve os seguintes resultados:
Grafico 01: Etnia dos estudantes indígenas participantes da pesquisa
Quando perguntados quais aspectos positivos tiveram quando adentrou
no curso de Licenciatura em Ciências: Biologia e Química, foram
identificados como aspectos positivos as falas dos estudantes, como, por
exemplo: “Todos os dias aprendemos coisas novas, adquirimos conhecimento”
(E1), “Os pontos positivos são que aprendi muitos assuntos novos encontrado
nas disciplinas. Alguns professores dão uma ótima aula” (E2) assim, como
aspectos negativos foram citados problemas que enfatizam sua escolaridade
antiga como: “Pouca base de conhecimento trazida do ensino médio, processo
de adaptação” (E3), O E4 afirma que os professores não têm didática e
ressalta“..., somente abordam os conteúdos superficiais e não tiram as
dúvidas necessárias, ou seja, vejo que os professores, não todos, estão mais
preocupados em terminar o assunto e não passar o devido fim” (E4).
Diante estas respostas sentiu-se a necessidade de questioná-los
sobre os sentimentos dos discentes indígenas diante as situações que
vivenciam e como se sentem pelo fato de muitos de seus colegas e professores
não falarem sua língua materna. Como resultados, o sentimento de timidez foi
apontado quatro vezes; já os sentimentos de dificuldade e exclusão foram
apontados cinco vezes cada. E, o sentimento de inferioridade foi apontado
seis vezes.
Destaca-se que, dos 12 alunos entrevistados, destes, 3 alunos marcaram todas
as alternativas que estavam no questionário, ou seja, se sentem de forma
inferior aos demais colegas, excluídos tanto por professores como colegas em
sala de aula, também existe a timidez que os alunos indígenas possuem quando
há uma aula expositiva e dialogada, e esses problemas acabam afetando o
aluno e criando uma dificuldade para seu aprendizado ou para se engrenar,
então pode se dizer que esta dificuldade é um tipo de sentimento gerado a
partir dos obstáculos vivenciados pelos mesmos. Já outros 3 alunos não
marcaram nenhuma opção, pois dizem que nenhuma opção se encaixa no que eles
sentem, porém, isso não afirma que eles não sintam nenhuma sensação perante
sua vida acadêmica.
Quando abordados sobre as disciplinas que já haviam cursado e quais tiveram
maior dificuldades, eles relatam as disciplinas, como no Quadro 01 abaixo:
Quadro 01 – Disciplinas que os estudantes apresentam maiores dificuldades.
Nota-se que a maior dificuldade citadas pelos alunos está na Química Geral
I, que é uma das disciplinas iniciais do curso, onde o aluno acaba de sair
do Ensino Médio, portanto tem uma visão totalmente diferente da Química
antes de adentrar em uma universidade, com conceitos mais amplos e mais
científicos. O aluno E4 relata sobre o seu obstáculo na Química Geral I e
II: “¬[...]porque aborda nomes específicos e não entendo em minha língua”,
sabe-se a química tem palavras que não podem ser traduzidas, e que muitos
conhecimentos são abstratos, por essa razão isso acaba dificultando o
aprendizado do aluno.
Ainda houve 2 alunos que destacaram a disciplina de Física aplicada que não
pertence a uma disciplina de Química, porém do mesmo modo, eles sentem que é
uma disciplina dificultosa. Por consequência, outros 2 alunos puseram a
Química como disciplina difícil entendimento, confundindo a área estudada no
ensino médio com as disciplinas de Química da faculdade.
Destaca-se a resposta do aluno E7 sobre a disciplina que tem maior
dificuldade, esclarece: “Nome científico, interpretação, palavra cientifica
e cálculo cientifico”, tendo em vista que estas podem ser características
consideras dificuldades, no entanto nota-se uma barreira impedindo o
entendimento da linguagem em conhecer as palavras em português e na
interpretação da pergunta.
Nesse discurso solicitou-se os alunos sugerissem melhorias para que as
problemáticas sobre suas dificuldades durante a graduação fossem
minimizadas. Dentre elas, é possível destacar a sugestão que visa ter dentro
de sala de aula um professor que lecione na língua ticuna e na língua
portuguesa: “um professor que acompanhe nosso estudo em relação a nosso
cotidiano que fale as duas línguas: tikuna e português” (E5), observa-se o
querer de preservar a identidade da língua, lembrando que é de vitalidade
plena, mas no que se refere as línguas de imigração que se nativizaram e as
línguas originalmente nativas do Brasil encontram-se todas elas, em maior ou
menor grau de ameaça de extinção nesse processo.
Outra sugestão visa o diálogo entre o conhecimento cientifico e o
conhecimento tradicional: “Oficinas com temas da biologia e química voltado
para a cultura dos povos indígenas” (E9). O aluno E8 raciocina de maneira
similar ao estudante E9 “...assim buscar métodos que possam facilitar o
ensino, buscando o cotidiano do aluno”.
Júnior et al (2011) tem refletido, no que se diz respeito a dominância
cultural, assim entendendo a necessidade de troca de saberes, como meio de
valorização e coexistência étnica.
É preciso ser defendido a cultura local, seus saberes, sua organização
social e sua visão do mundo, pois cada etnia tem sua própria identidade e
com isso, antes de qualquer influência de cultura dominante, é preciso
respeitar a diversidade linguística e cultural de cada povo, propiciando
meios de troca de saberes entre índios e não índios (JÚNIOR et al, 2011,
p.03).
Neste sentido outra sugestão do A8 reflete a sua resposta marcada na
pergunta anterior sobre o sentimento que o mesmo sente referente a sua vida
acadêmica: timidez, pois sugere: “Se expor mais, dialogando com as pessoas
na universidade”. Então para esta sugestão o melhor método é dialogar com
estes alunos, procurando envolvê-los mais em eventos, para que possa haver
maior comunicação com eles, anulando a timidez e com que este problema
seja amenizado.
Etnia dos estudantes indígenas participantes da pesquisa
Disciplinas que os estudantes apresentam maiores dificuldades
Conclusões
Com este trabalho, é possível inferir que, se precisa melhorar aspectos diante desta temática, tanto em relação a educação quanto ao respeito pela cultura indígena. Pois, ao apresentar as dificuldades vivenciadas por eles, buscou-se demonstrar a importância da educação nas universidades independente da etnia, todos os alunos têm direito a um ensino de qualidade com a mesma igualdade, para manter sua identidade e preservar a cultura. Faz-se necessário pensar formas de amenizar as desigualdades que se encontraram presentes neste trabalho, além de discussões a serem pensadas e debatidas sobre estas problemáticas. Assim, sugere-se mais diálogo e atenção com estes estudantes, ofertar atividades que deixaram de existir no curso como: Feira de Ciências e a Semana de Química, para a participação e entrosamento dos discentes com os demais alunos, criando oportunidades a outros jovens indígenas, incentivando- os a pesquisa, havendo a comunicação e diálogo entre os mesmos e com a comunidade acadêmica. Por vez, é direito dos povos indígenas de serem inseridos dentro da educação e ter um ensino de qualidade, ganhando mais visibilidade e reforçando sua cultura.
Agradecimentos
Os autores agradecem aos alunos indígenas que concordaram em participar deste trabalho, bem como o setor de assistente social do Instituto de Natureza e Cultura - INC/UFAM.
Referências
GAMBOA, S. S. (Org). Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1997.
JUNIOR,, I. G. D.; SILVA,C. A. B.; DIAS, L. M. B. Lutas e contradições enfrentadas pelos índios xavantes na cidade de Barra dos Garças – MT. X Congresso Nacional de Educação, 2011. P. 03