Autores

Menezes de Oliveira, M. (IFRN) ; de Souza Dantas, F. (IFRN) ; de Oliveira Santos, R.F. (IFRN)

Resumo

O trabalho teve como propósito apresentar o processo de criação de um produto específico em Tecnologia Assistiva, possibilitando a utilização de instrumentos laboratoriais nas aulas prático-experimentais no ensino de Química, junto a uma estudante com paralisia cerebral. Foram criados dois instrumentos, uma haste maleável, que vai presa ao braço, e uma base de sustentação para garantir total estabilidade às vidrarias. Foi realizada, com o uso desses materiais, uma aula experimental envolvendo uma titulação. Observou-se que os produtos deram total segurança a discente, encontrando maior facilidade no manuseio dos materiais, e garantindo seu desenvolvimento cognitivo. Sendo assim, o projeto terá continuidade com a evolução dos recursos e serviços oferecidos aos discentes com deficiência.

Palavras chaves

Tecnologia Assistiva; Ensino de Química; Prático-Experimentais

Introdução

A educação tem um papel preponderante no processo de transformação social dos sujeitos inseridos em seus diversos contextos sociopolíticos, econômicos e culturais de uma nação. Quando ela é acessível para todos, faz com que o desenvolvimento de cidades, estados e do próprio país seja potencializado. Constitucionalmente, a educação se apresenta como direito de todos e dever do Estado e da família, com vistas ao pleno desenvolvimento humano numa perspectiva de prática cidadã e emancipatória. (BRASIL, 1988). Nessa perspectiva, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 9394/96, traz em seu Capítulo V, Art. 58, a Educação Especial como uma modalidade de educação escolar oferecida, preferencialmente, na rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. No contexto atual, a Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015, instituída como Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), assegura e promove, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania (BRASIL, 2015). Dessa forma, a perspectiva da educação inclusiva no âmbito escolar vem trilhando caminhos, desafiando as práticas pedagógicas docentes. Conforme Sassaki (2006), a Inclusão pode ser definida como o processo de adequação da sociedade às necessidades de todos os sujeitos, para que os mesmos, estando nela incluídos, tenham condições de exercer sua cidadania, de forma plena e emancipatória. Por educação inclusiva entende-se o processo de inclusão de pessoas com deficiência, “seja mental, auditiva, visual, motora, física múltipla ou decorrente de distúrbios evasivos do desenvolvimento” (ROGALSKI, 2010, p. 3) que, de alguma forma, são excluídas das atividades regulares. A escola torna-se inclusiva quando adota práticas pedagógicas pertinentes e viáveis às especificidades dos alunos e evidentemente, quando reconhece e aceita as diferenças, dando oportunidade, em níveis de igualdade, para o alcance do sucesso acadêmico. O ensino da Química exige do educando, o desenvolvimento de habilidades relacionadas a capacidade de abstração, do pensamento sistêmico, da criatividade, da curiosidade, da capacidade de pensar múltiplas alternativas para a solução de um problema, de forma a estabelecer conexões/relações entre os conteúdos conceituais e procedimentais (a prática experimental). Sendo assim, as técnicas de ensino através da experimentação devem ser consideradas no desenvolvimento de conteúdos da Química, promovendo aprendizagens significativas, por meio da articulação de saberes teóricos e práticos dinâmicos, processuais e relevantes para a formação dos sujeitos. Nessa perspectiva, a Tecnologia Assistiva (TA) merece destaque, no sentido de promover adequações ou adaptações específicas a cada sujeito, observando sua necessidade. Conforme o Decreto nº 5.296/2004, Art. 8º, inciso V, Tecnologia Assistiva é considerada como uma “ajuda técnica por meio de produtos, instrumentos, equipamentos ou tecnologia adaptados ou especialmente projetados para melhorar a funcionalidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, favorecendo a autonomia pessoal, total ou assistida”. Segundo Bersch & Tonolli (2006), a TA é um termo ainda novo, utilizado para identificar todos os recursos e serviços que contribuem, de forma positiva, na ampliação de habilidades funcionais de pessoas com deficiência, promovendo vida independente, com qualidade de vida e inclusão. Portanto, o desenvolvimento de Tecnologias Assistivas nos laboratórios de Química, mostra ser um caminho essencial na promoção do desenvolvimento cognitivo das pessoas com deficiência, numa perspectiva da educação inclusiva no âmbito escolar e social. Nessa perspectiva e, considerando a inclusão de pessoas com deficiência física (Paralisia Cerebral) no Curso de Licenciatura em Química, no IFRN Campus Currais Novos/RN, surge a necessidade de realizar algumas adaptações metodológicas nas aulas laboratoriais, que possibilitem ao estudante a autonomia e desenvoltura na manipulação de produtos químicos necessários a sua formação docente. Nesse sentido, este trabalho tem como propósito apresentar o processo de criação de um produto específico em Tecnologia Assistiva, o qual possibilitará a utilização de instrumentos laboratoriais nas aulas prático- experimentais no ensino de Química, junto a uma estudante com paralisia cerebral. O trabalho foi desenvolvido de forma processual com a participação da estudante, corroborando, assim, com o lema tão utilizado pelas pessoas com deficiência, em defesa de seus direitos: “Nada para nós, sem nós”. Esse lema traz a ideia de participação plena, quando segundo Sassaki (2007, p. 1), afirma, “que nenhum resultado a respeito das pessoas com deficiência haverá de ser gerado sem a plena participação das próprias pessoas com deficiência".

Material e métodos

O presente trabalho contou com a participação da discente Maria Luiza Fernandes, do primeiro período do curso de Licenciatura Plena em Química, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), campus Currais Novos. A mesma apresenta deficiência física caracterizada por uma paralisia cerebral, não comprometendo a sua capacidade cognitiva. Diante das dificuldades encontradas pela discente em aulas experimentais de química devido as suas limitações físicas, especialmente na mão direita, nas pernas, no entanto não é cadeirante, e não apresentando postura ereta, foram criados instrumentos adaptados para facilitar o manuseio de vidrarias de laboratórios através do desenvolvimento das tecnologias assistivas, além da preocupação com a acessibilidade no ambiente de laboratório. Essas técnicas inovadoras contaram com a colaboração do Núcleo de Atendimento às Pessoas com Necessidades Educacionais Específicas (NAPNE/IFRN–CN) e da sala de recurso multifuncional com as professoras do Atendimento Educacional Especializado (AEE), da Escola Estadual Doutor Silvio Bezerra de Melo (EEDSBM), também localizada na cidade de Currais Novos – RN. Os instrumentos elaborados foram: uma haste flexível, feito com material bastante maleável (tira de chumbo), que fica presa a um braço, tendo a função de agarrar vidrarias e outros materiais, o qual adere facilmente às superfícies; e uma base de sustentação para vidrarias, dando maior estabilidade, evitando que elas caiam e ocorra qualquer acidente durante o seu manuseio. Após a elaboração dos instrumentos foram feitos alguns testes em laboratório com a aluna sem a utilização de reagentes químicos, para não ocorrer nenhum acidente grave. Posteriormente foram feitos ajustes necessários nos instrumentos para garantir total eficiência nos resultados, além de permitir conforto e segurança para a estudante. Em seguida, uma aula experimental foi realizada com a discente em uma mesa adaptada, pois a mesma possui dificuldades em ter postura ereta, não tendo fácil acessibilidade às bancadas.

Resultado e discussão

O presente trabalho alcançou com satisfação os objetivos pré-estabelecidos, visto que os recursos inovadores desenvolvidos passaram por uma evolução até oferecer autonomia a estudante com deficiência, levando em consideração suas necessidades físicas no ambiente de laboratório. Os instrumentos elaborados, apresentados na figura 1, garantiram total segurança a discente Maria Luiza Fernandes na realização do experimento envolvendo uma titulação, onde a mesma relatou ter se sentido bastante à vontade com o equipamento, encontrando mais facilidade no manuseio de materiais e vidrarias na realização da prática. Podemos observar a realização desse experimento com o uso da haste flexível presa ao braço da discente na figura 2. Levando em consideração a enorme importância da união dos conceitos da química com a prática, acredita-se que com a contínua evolução dessas tecnologias, ela se tornará cada vez mais um meio facilitador para a discente no aprendizado desses conceitos vistos em sala de aula, após a realização de cada prática. Este fato foi confirmado pela própria aluna durante a realização do experimento. Foi observado que os instrumentos desenvolvidos neste trabalho não suprem todas as necessidades da discente para a realização de diversas outras aulas experimentais de química, de modo que a mesma realize todas as atividades laboratoriais de forma independente. E é por esse motivo que o projeto terá continuidade com o desenvolvimento de novos recursos, além da adequação do ambiente físico de laboratório, como bancadas mais baixas, favorecendo também outros estudantes com deficiências na instituição.

Figura 1

Instrumentos elaborados em Tecnologias Assistivas para a discente com paralisia cerebral.

Figura 2

Realização do experimento com a discente utilizando os instrumentos adaptados.

Conclusões

Como esperado, a pesquisa alcançou todos os seus objetivos pretendidos, merecendo destaque, ainda dentro desse processo de tecnologias assistivas, à contínua evolução dos recursos e serviços oferecidos aos estudantes com deficiência dentro da instituição, levando em consideração as suas necessidades especiais. Logo, o desenvolvimento dessas tecnologias em laboratórios de química mostra ser uma importante ferramenta no processo de ensino-aprendizagem, para o desenvolvimento cognitivo e redução de certas limitações desses discentes. Dessa forma, faz-se necessário a criação de novos instrumentos adaptados considerando a complexidade existente em aulas experimentais de química no curso de licenciatura, bem como em cursos de nível médio e no ensino fundamental envolvendo as disciplinas na área de Ciências. E dentre as tecnologias futuras, pretende-se, em parcerias com os estudantes e professores do curso de Tecnologias em Sistemas da Informação (TSI) do IFRN/CN, a possibilidade da construção de um instrumento mecânica em robótica.

Agradecimentos

Agradecemos ao IFRN – Campus Currais Novos, ao NAPNE – IFRN / CN e ao grupo AEE da EEDSBM / CN.

Referências

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm . Acesso em: 27 jun. 2018.

______. Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acesso em: 27 jun. 2018.

______. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm. Acesso em: 27 jun. 2018

______. Decreto nº 5.296. 2004. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5296.htm. Acesso em: Acesso em: 27 jun. 2018

BERSCH, R.; TONOLLI, J. C. Tecnologia Assistiva. 2006. Disponível em:
http://www.assistiva.com.br/. Acesso em: 27/06/2018.

ROGALSKI, S. M. Histórico do Surgimento da Educação Especial. Revista Educação Ideau. v.5, n. 12, jul. – dez. 2010.Disponível em: https://www.ideau.com.br/getulio/restrito/upload/revistasartigos/168_1.pdf. Acesso em: 27/06/2018.

SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 7. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997.

SASSAKI, R. K. Nada sobre nós, sem nós: da integração à inclusão – Parte 1. Revista Nacional de Reabilitação, ano 10, n. 57, p. 8-16, jul./ago. 2007.