Autores
Lima, M.H.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Pereira, R.Y.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Monteiro, A.J.P.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Nunes, J.B.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ)
Resumo
Este trabalho de natureza qualitativa tem como objetivo discutir sobre o ensino de química por investigação orientada, a fim de destacar a potencialidade da aprendizagem dos educandos sobre cinética química dialogando com o seu contexto social. O lócus deste estudo foi uma escola pública do município de Belém, em um contexto de estágio do PIBID; foi desenvolvida uma atividade de investigação orientada e, considerou-se como dados os relatos escritos e nos mapas conceituais produzidos por quatro estudantes. As análises originaram três eixos que mostraram que o processo da investigação orientada é importante como precursora de aprendizagem e como promotora de construção de conceitos relacionados ao tema cinética química no diálogo com o dia a dia dos aprendizes.
Palavras chaves
Investigação orientada; Cinética Química; Ensino de Química
Introdução
Neste trabalho, utiliza-se a investigação orientada como estratégia para o ensino de cinética química. Ao fazer uma breve abordagem histórica sobre o ensino por investigação, percebe-se que ele foi bastante influenciado pelas perspectivas da pedagogia progressista de John Dewey no século XIX; essa pedagogia progressista surgiu como antagonista à Pedagogia tradicional (ZÔMPERO; LABURÚ, 2011). Na época, àqueles que se diziam adeptos dessa nova pedagogia defendiam uma atividade de ensino onde houvesse o diálogo entre teoria e prática, contextualização do ensino e a participação ativa dos educandos no desenvolvimento da sua aprendizagem, possibilitando a inserção crítica dos indivíduos na sociedade. Hoje já se sabe que a abordagem do ensino por meio da investigação possibilita aos estudantes o desenvolvimento do raciocínio e de habilidades cognitivas (ZOMPERO; LABURU, 2011); mas é necessário ressaltar que tal abordagem deve levar em consideração a experiência de vida do estudante, ou seja, o conhecimento prévio relacionado a experiências de vida, pois os conhecimentos e discursos dos educandos sobre alguma situação e/ou fenômeno são extremamente importantes para aprendizagens e construção de conhecimentos/conceitos. De acordo com Sasseron (2016), uma investigação é iniciada a partir de um problema, passando por uma análise das concepções prévias dos educandos, levando ao teste de hipóteses, levantamento e controle de variáveis e criação de uma relação entre as informações construídas e a elaboração de uma explicação. Faz-se importante destacar que no ensino investigativo esses fatores são responsáveis pelo desenvolvimento das habilidades e competências nos estudantes, principalmente por permitir uma postura ativa dos educandos no processo, possibilitando a ação e reflexão dos mesmos mediante a problemática e as atividades realizadas. Dessa maneira, a atividade investigativa não deve ser limitada a manipulação ou observação do estudante, mas sim pela valorização do refletir, discutir, explicar, relatar o que está sendo abordado em sala de aula (AZEVEDO, 2006). Com isso, é importante entender que na literatura são enunciadas diferentes propostas de investigação e cada uma tem suas características e fundamentos; propostas como: o ensino por descobrimento dirigido de Gil Perez, a investigação dirigida de Gil Perez e Castro, o ensino por pesquisa de Cachapuz e Praia, o ensino por investigação orientada de Vilches, Solbes, Gil Perez, Marques e Praia, educar pela pesquisa de Moraes e Galiazzi, a investigação escolar de Cañal e Porlan; Parente (2012) em sua pesquisa apresenta as particularidades presentes nesses tipos de investigações ao analisar as perguntas, o planejamento, a realização e as respostas. Neste trabalho foi desenvolvida uma aula com características que se aproximam da abordagem do ensino por investigação orientada e para fundamentar esta estratégia de ensino se faz necessário pontuar as suas características. No ensino por investigação orientada os estudantes são estimulados à participação da investigação como nas atividades de investigação científica, mas que tenha como foco a relação entre ciência, tecnologia e sociedade (PARENTE, 2012). Na abordagem do ensino por investigação orientada as perguntas são tratadas como problemas abertos de interesse pessoal e social do estudante, na qual são motivados por sua curiosidade. O planejamento permite realizar uma aproximação da investigação realizada com a atividade científica, integrando conhecimentos conceituais, procedimentais e de valores. A realização por parte do docente permite que ele assuma a posição de orientador no processo de construção do conhecimento do educando, pois ele orienta a elaboração da situação-problema, das hipóteses dos educandos e dos procedimentos para confirmação ou refutação delas, quanto às respostas, o professor permite a articulação dos conhecimentos (re)construídos, tanto o conceitual quanto o metodológico, assim como, favorece o debate entre os educandos acerca de suas opiniões desenvolvidas no processo (PARENTE, 2012). Dessa forma os estudantes têm a possibilidade de articular os conhecimentos que foram (re)construídos com aqueles já construídos, a estabelecer pontes entre estes no desenvolvimento e na solução de problemas investigados, a possibilitar uma preparação para o exercício da cidadania frente a tomada de decisões (PRAIA; GIL-PEREZ; VILCHES, 2007). Nesses termos, tem-se como objetivo deste trabalho discutir sobre ensino de química por investigação orientada, a fim de destacar a potencialidade para aprendizagem dos educandos sobre conceitos de cinética química principalmente pelo no diálogo com o dia a dia dos aprendizes.
Material e métodos
Esta é uma pesquisa qualitativa que “ocupa um reconhecido lugar entre as várias possibilidades de se estudar os fenômenos que envolvem os seres humanos e suas intrincadas relações sociais, estabelecidas em diversos ambientes” (GODOY, 1995, p. 21), pois investigamos uma realidade que não pode ser quantificada e sim qualificada por meio de significados dos valores, concepções, crenças e atitudes de um fenômeno humano entendida como parte da realidade social investigada (MINAYO, 2009). Esse tipo de pesquisa “ocupa um reconhecido lugar entre as várias possibilidades de se estudar os fenômenos que envolvem os seres humanos e suas intrincadas relações sociais, estabelecidas em diversos ambientes” (GODOY, 1995, p. 21). No sentido de qualificar, foi planejada duas aulas para que fossem ocorridas no laboratório da escola da rede pública em Belém/PA, lócus deste estudo. Entretanto, optou-se em analisar apenas os fenômenos da primeira aula. Esta pesquisa foi desenvolvida no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à docência (PIBID), que visa fomentar vivências antecipada de docência nas escolas públicas. Os sujeitos desta pesquisa foram estudantes de uma turma do segundo ano do ensino médio. Como critério de escolha, optou-se em escolher os estudantes que apresentaram relatos e mapa mais significativos às análises, nesse sentido, quatro foram os sujeitos selecionados. Para manter suas identidades em sigilo, foram chamados pelos nomes fictícios de Talita, Maria, Lis e Larissa. Na aula, partiu-se de um problema aberto referente ao que os estudantes entendiam por velocidade à análise dos conhecimentos prévios e assim abordar o assunto de cinética química. Com isso, direcionou-se a discussão para a temática: “degradação dos alimentos”, com perguntas do tipo: “onde a maçã é melhor conservada: na geladeira ou fora da geladeira?”. Assim, a turma foi dividida em 8 grupos com 5 estudantes em cada, para promover a comunicação entre os pares e a construção de hipóteses para questionamentos levantados durante a aula, como: “O que interfere no 'escurecimento' da maçã? Por quê?”; “O 'escurecimento' ocorre mais rapidamente na maçã inteira ou na maçã cortada?”. Após a discussão e a construção de hipóteses passou-se a investigar o fator temperatura em uma reação química com uma maçã cortada ao meio, sendo em uma metade colocada em um ambiente aberto e a outra dentro de um isopor com gelo. Em seguida investigamos o fator área de contato, onde a metade de uma maçã cortada em cubos e a outra inteira foram expostas ao mesmo ambiente. Depois os estudantes foram à sala de multimídia para assistir um vídeo sobre a produção de alimentos e a utilização de agrotóxicos, possibilitando um debate a destacar os pontos relevantes a serem discutidos. Ao final, foi pedida a construção de relatos referente às atividades tidas, respondendo as perguntas: o que fizemos? Como fizemos? Por que fizemos? Para que fizemos? e que construíssem uma esquematização de suas ideias
Resultado e discussão
Os resultados e discussões foram organizados em três eixos de análises, são eles: A importância do processo da investigação orientada como precursora de aprendizagem; a investigação orientada como promotora de construção de conceitos relacionados ao tema cinética química no diálogo com o dia a dia dos aprendizes, e a importância do ensino investigativo para os aprendizes, bem como foi apresentado.
A importância do processo da investigação orientada como precursora de aprendizagem
De acordo com a abordagem do ensino por investigação orientada, teve-se problemas abertos como, o que é velocidade? até como retardar a degradação dos alimentos? Onde houve incentivo às curiosidades dos aprendizes e sua familiaridade com o assunto abordado; como os educandos ainda não haviam estudado os conceitos de ‘cinética química’ em sala de aula, foi escolhido por meio das hipóteses dadas por eles tratar dos conhecimentos conceituais, procedimentais e de valores abordados com debates e reflexões como afirmam Sasseron e Machado (2017).
O material desenvolvido para a análise das concepções dos estudantes estava direcionado à aula de cinética química e, por meio das respostas escritas dos estudantes, foi dado enfoque na maneira como eles organizaram o relato da atividade experimental, as explicações dadas aos fenômenos, a sistematização dos conhecimentos construídos por meio de um mapa conceitual e suas mudanças atitudinais com relação a questionamentos científicos e sociais.
No decorrer do processo, com mediação docente, observou-se que os educandos ficaram inquietos diante da situação-problema e, a partir disso, eles puderam confirmar ou refutar suas ideias acerca dos testes realizados e, assim, possibilitou a reflexão de suas respostas para uma articulação dos conhecimentos construídos.
Com relação às perguntas: “o que fizemos?” e “como fizemos?”, respectivamente, pode-se destacar que os estudantes responderam e, com isso, foi possível inferir que quanto maior nível de dedicação de alguns estudantes nas atividades, maior o nível de detalhamento dos relatos.
Nas atividades experimentais para se investigar os fatores que influenciam a velocidade de uma reação química teve-se a preocupação em selecionar materiais que estivessem o mais próximo possível do cotidiano dos educandos, pois dessa maneira seria possível promover o interesse de muitos jovens ao tentar solucionar uma situação-problema que é perceptível no seu dia a dia. Assim, as perguntas “por que fizemos?” e “para que fizemos?” teve o intuito de levar em consideração a possibilidade dos estudantes movimentarem os conhecimentos construídos naquele encontro de acordo com a sua realidade.
A resposta do “para que fizemos?” estava relacionada com a questão do consumo de alimentos, assunto este que foi abordado a partir de um vídeo sobre alimentos com agrotóxicos. Durante e após a abordagem do vídeo foi promovido um debate acerca de qual alimento devemos consumir? A discussão girou em torno da importância de entender a utilização de agrotóxicos e suas consequências, já que se tinha uma ideia prévia de que existem apenas malefícios. No entanto, com a discussão entre os próprios estudantes evidenciou-se que em determinadas quantidades aceitáveis por organizações de vigilâncias é possível se conservar alimentos de maneira menos perigosa à saúde. Nessa perspectiva é possível dizer que nesse processo houve a tomada de decisões dos estudantes para melhores condições de utilização desses produtos na sociedade.
A investigação orientada como promotora de construção de conceitos relacionados ao tema cinética química no diálogo com o dia a dia dos aprendizes
Talita em seu relato descreve sua opinião sobre a pergunta “por que fizemos?”, ela ressalva que “fizemos (...) para sabermos o que acontece com as coisas em conservação e fora do conservador”. E para a pergunta “Para que Fizemos?”, a educanda destaca que fizemos “para sabermos melhor os acontecimentos com as frutas em conservação”. Observou-se nas respostas da estudante a ênfase que é dada ao tema da investigação cinética química com relação ao que se presencia no cotidiano. Além disso, a aprendiz nos atribui às palavras conservação e conservador um dos fatores que influenciam na degradação de uma maçã: a temperatura.
É destacado outro trecho dado por Maria, ao qual ela relata que o motivo pelo qual “fizemos no caso das maçãs, para saber se tamanho e temperatura influenciam na sua conservação (...)” e, foi realizado isto“para compreendermos o real sentido e significado de velocidade para a química”. Nesses relatos foram apontados mais um fator determinante para a velocidade de uma reação química: área de contato (tamanho, como foi colocado pela estudante), além disso, ela ainda destaca a importância de se investigar a concepção mais adequada para tal fenômeno.
Em um trecho escrito por Lis é respondida a pergunta “para que fizemos?” dando significado aos experimentos e vídeos discutidos, tendo em vista que ela elenca a relevância dos conhecimentos construídos ao longo das atividades e destaca a relação entre um fato do seu cotidiano com a cinética química, e isso pode ser evidenciado por meio da seguinte fala: “Para percebemos os diversos fenômenos químicos que acontecem no nosso dia a dia e a importância de lavarmos os nossos alimentos antes de consumi-los, devido às substâncias químicas que estão presentes e podem ser nocivos à saúde.” Evidencia-se então a importância de atividades de investigação que apresentam problemas abertos para que os educandos consigam relacionar com a sua realidade e com os conhecimentos científicos, possibilitando uma reflexão crítica sobre ambos (SASSERON; MACHADO, 2017).
Outro trecho a ser destacado é onde Lis dá a sua opinião sobre as atividades desenvolvidas, no qual a educanda salienta que a área de conhecimento que ela considerava complexa, como a Química, passa a ser mais atrativa devido às atividades desenvolvidas em sala, e a possibilidade de realizar essas práticas em casa podendo garantir, segundo ela, um “aprendizado permanente”.
As perguntas “Para que fizemos?” e “porque fizemos?” influenciaram diretamente na construção do mapa conceitual pelos educandos. Nessa construção, os estudantes levaram em consideração o seu entendimento sobre Cinética Química, os principais fatores em que ela é influenciada, consequências desse fator, destacando a relação com o cotidiano. Como por exemplo, a figura 01 que apresenta um mapa conceitual construído pela estudante Lis.
A importância do ensino investigativo para os aprendizes
Nos relatos dos estudantes, pôde-se obter alguns trechos relacionados a importância da abordagem investigativa utilizada em sala de aula. Por exemplo, quando, Larissa destaca a importância daquela investigação ao dizer que foi “uma aula mais interativa, comunicativa, mais harmoniosa, menos brigas, mais estudos e entendimento”.
Outro momento em que se observou isso, foi quando a educanda Larissa disse que o desenvolvimento da atividade ajudou “para o enriquecimento intelectual e de consciência do que consumimos e compramos, além de atividade conjunta em grupo de forma harmoniosa”. Ou seja, esse relato mostrou o quanto importante e significativo pode ser uma investigação orientada para os aprendizes.
Os relatos aqui destacados se fez perceber a importância da orientação docente durante o processo de investigação e construção dos conhecimentos dos estudantes, pois, durante este processo as problematizações que foram feitas a partir de alguma dúvida dos estudantes lhes permitiram refletir para além de uma simples definição e, dessa maneira, conseguiam relacionar o que aprendiam com o que viviam.
Mapa conceitual construído por um dos estudantes abordando conceitos de Cinética Química.
Conclusões
Ensinar Cinética Química, por meio da estratégia de ensino por investigação orientada, permitiu aos estudantes o desenvolvimento de habilidades cognitivas e atitudinais durante o processo de investigação, fazendo-os investigar e construir o próprio conhecimento, assim como desenvolver opiniões e atitudes para problemas do cotidiano. As falas em análise mostraram mudanças atitudinais nos estudantes no decorrer do processo que possibilitou a percepção do desenvolvimento de uma aprendizagem em relação ao tema Cinética Química. Dessa forma, é possível dizer que o ensino com características de investigação orientada pode ser uma estratégia que oportuniza a reflexão dos estudantes e aprendizagens mediante a sua realidade. Quando se trata da participação crítica dos estudantes com relação ao seu contexto social, foi possível observar o engajamento deles quanto ao problema levantado e para a solução deste, onde tentavam relacionar com os fatos do próprio cotidiano e pautavam seus argumentos em tomadas de decisões mais adequadas à situação, seja de maneira escrita e/ou oral. Com isso, a estratégia didática do ensino por investigação orientada com caráter orientado não deve ser tratada como uma receita a ser seguida, mas sim como uma possibilidade de desenvolver a aprendizagem dos estudantes, a estimular o envolvimento, a curiosidade, a construção de conhecimento e de atitudes articulando com o seu contexto social.
Agradecimentos
Agradecemos aos estudantes que participaram desta atividade, pois de certa forma contribuíram para a realização deste estudo. Ao nosso orientador pelo apoio e contribuiçõ
Referências
AZEVEDO, M. C.. P. S. Ensino por investigação: problematizando as atividades em sala de aula. Ensino de Ciências-unindo a pesquisa e a prática, p. 19, 2004.
GODOY, A. S.; PESQUISA QUALITATIVA TIPOS FUNDAMENTAIS. Revista de Administração de Empresas. São Paulo, v. 35, n.3, p, 20-29 Mai./Jun. 1995
MINAYO, M. C. D. S.; O desafio da pesquisa social. In. Pesquisa Social: teoria , métodos e criatividade/Suely Ferreira Deslandes, Romeu Gomes; Maria Cecília de Souza Minayo (Organizadoras), 28ª ed, -Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.
PARENTE, A. G. L. Práticas de investigação no ensino de ciências: percursos de formação de professores. 2012. 234 f. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2012.
PRAIA, J.; GIL-PÉREZ, D.; VILCHES, A. O papel da natureza da ciência na educação para a cidadania. Ciência e educação, vol. 13, n. 2, p. 141-156, 2007.
SASSERON, L. H. Interações discursivas e investigação científica: o papel do professor. In: Ensino de ciências por investigação: condições para implementação em sala de aula. CARVALHO, A. M. P. (org.). São Paulo: Cengage Learning, p. 41-61, 2013.
ZÔMPERO, A. F.; LABURÚ, C. E. Atividades investigativas no ensino de ciências: aspectos históricos e diferente abordagens. Ensaio. Belo Horizonte, vol. 13, n. 03, p. 67-80, set./dez. 2011.