Autores
Guimarães, M.B. (IFRJ- NILÓPOLIS) ; Castro, D.L. (IFRJ- NILÓPOLIS)
Resumo
O trabalho tem por intuito averiguar a associação de duas metodologias ativas de ensino para o estudo de periculosidade química. A pesquisa foi aplicada em uma turma de segurança do trabalho, na disciplina de química e consistiu em três momentos. A aplicação de uma narrativa baseada na metodologia Estudo de Casos; a adaptação da sala cooperativa Jigsaw para o estudo das classes de produtos perigosos e a apresentação de uma cartilha por parte dos alunos para a resolução do caso investigativo. Os resultados revelam a viabilidade em adotar metodologias ativas de ensino. Os alunos foram estimulados a desenvolverem a tomada de decisão, atuarem ativamente durante as atividades e conseguirem adaptar nas cartilhas criadas diversas discussões relevantes, de modo criativo e proveitoso para o leitor.
Palavras chaves
Periculosidade Química; Sala Cooperativa Jigsaw; Estudo de Casos
Introdução
O presente trabalho é um recorte de uma dissertação de Mestrado na área de Ensino de Ciências. O foco desta pesquisa consiste em investigar a viabilidade de associar duas metodologias ativas de ensino para o estudo de um assunto de suma importância para a área de segurança do trabalho que versa com a disciplina de química: a periculosidade química de produtos perigosos. As duas metodologias de ensino adotadas foram: Estudo de Casos e Aprendizagem Cooperativa Jigsaw. O método Estudo de Casos trata-se de uma vertente da aprendizagem baseada em problemas, também conhecida como PBL (Problem Based Learning). Esse método baseia-se no uso de narrativas, que são os casos investigativos. Os casos fictícios narram a respeito de personagens que enfrentam problemas e precisam tomar decisões com a intenção de solucioná-los. Com o uso dessa metodologia ativa em sala, o discente é estimulado a desenvolver uma empatia com os personagens e incentivado a tomada de decisões mediante aos casos propostos. Consequentemente, os objetivos educacionais que são esperados a partir da aplicação de tal proposta podem ser alcançados. Segundo Silva; Oliveira e Queiroz (2011), o aluno tende a aperfeiçoar sua comunicação oral; um pensamento crítico e reflexivo é despertado; o desenvolvimento de trabalho grupal é incentivado e a habilidade em tomar decisões e solucionar problemas é fomentada. Conforme Sá e Queiroz (2009), nesse contexto, o papel do docente é auxiliar o aluno a buscar informações sobre o seu tópico em estudo e motivá-lo a refletir sobre as decisões que podem ser tomadas. Para a construção da narrativa, Herreid (1994) aconselha que sejam seguidos passos essenciais para a elaboração de um bom caso investigativo. A narrativa deve ser curta, abordar um assunto atual, conter diálogos entre os personagens principais, produzir empatia com o leitor, dispor de um enredo que conecte a realidade do aluno e seja relevante, possuir utilidade pedagógica e generalizações, além de provocar um conflito que estimule a tomada de decisão do aluno para solucionar a questão problema. Com a intenção de propiciar um espaço de envolvimento entre os alunos e a realização de trabalhos em grupos, adaptou-se associado à metodologia Estudo de Casos, a sala cooperativa Jigsaw. Esse método baseia-se na aprendizagem cooperativa e foi testada, pela primeira vez, nos EUA por Elliot Aronson na década de setenta dos anos noventa. Trata-se de um método altamente estruturado, a qual os alunos se reúnem em grupos de base e grupos especialistas. O grupo de base é o primeiro a ser formado. Nele, os integrantes realizam o contato com um assunto de modo mais geral. Posteriormente, o grupo de base é desfeito e o grupo de especialista é formado. No grupo dos especialistas, os alunos estudam os subtópicos de modo mais detalhado e cada grupo especialista possui o mesmo subtópico para discussão. Ao final, os alunos retornam ao grupo de base inicial para cada componente expor o que aprendeu com seus colegas, de modo que todo conhecimento seja agregado e haja uma compreensão do tópico integralmente. Segundo Cochito (2004), ao longo do processo, cada aluno deve aprender o conteúdo estudado para si e ser capaz de esclarecer aos componentes do grupo o que foi aprendido.
Material e métodos
Esta pesquisa foi feita em uma turma subsequente do técnico em segurança do trabalho de uma instituição federal de ensino do Norte Fluminense do estado do Rio de Janeiro. O percurso metodológico deste trabalho foi composto de três momentos. O primeiro momento foi marcado pela aplicação de um caso investigativo estruturado em histórias em quadrinhos. A elaboração da narrativa foi orientada pelos passos ditos por Herreid (1994), que descrevem como idealizar um bom caso investigativo. O curto caso narrava o exercício de uma engenheira em segurança do trabalho que organizou a semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho (SIPAT), cujo tema em discussão foi a periculosidade de produtos químicos. Este assunto surgiu em razão de um fato verídico: um incêndio ocorrido por causa de um vazamento em uma unidade de refino de petróleo na cidade de Duque de Caxias, no estado do Rio de Janeiro. Na narrativa, os técnicos em segurança do trabalho foram convocados pela engenheira para planejarem, em conjunto, uma cartilha lúdica com a intenção de conscientizar todos os empregados da empresa a respeito dos riscos envolvidos após o contato com as substâncias perigosas. A cartilha deveria versar sobre as características das substâncias químicas, seus símbolos, casos de acidentes e prevenção das seguintes classes de produtos perigosos: inflamáveis, corrosivas, oxidantes, tóxicas e explosivas. Ainda no primeiro momento, após a leitura da narrativa, os alunos foram estimulados a assumirem o papel do técnico em segurança do trabalho para a elaboração de uma cartilha lúdica que seja interativa com o leitor. Para esse fim, os alunos foram orientados a estudarem sobre a periculosidade das substâncias químicas envolvidas no refino do petróleo com a metodologia ativa de ensino: sala cooperativa Jigsaw. Logo após a leitura do caso e esclarecimento do método, a separação dos grupos de base foi realizada e cada integrante recebeu um material que disponibiliza informações básicas das classes de substâncias perigosas. Os alunos leram para ter uma visão geral dos tópicos. Ao final, foram sorteados os integrantes que iriam compor os grupos especialistas. As numerações corresponderam aos subtópicos: inflamáveis, corrosivas, oxidantes, tóxicas e explosivas. Os alunos especialistas assumiram o compromisso de realizar um estudo aprofundado do material para ter um bom desempenho no segundo encontro. O segundo momento foi marcado pela reunião dos grupos especialistas. Nesse encontro, os integrantes ficaram responsáveis na elaboração de um mapa conceitual do subtópico especialista. Após a construção dos mapas, os alunos retornaram aos seus respectivos grupos de base e cada integrante esclareceu o mapa conceitual referente ao seu grupo especialista e, desse modo, todos compartilharam as informações. Ao final desse encontro, os grupos de base discutiram quais recursos seriam adotados para compor as cartilhas. A apresentação das cartilhas lúdicas constitui-se no terceiro momento.
Resultado e discussão
Relatos das ações dos alunos registrados durante o desenvolvimento das
atividades, nos três momentos, foram descritos em um diário de aula e avaliados.
O diário de aula trata-se de um instrumento utilizado pelo pesquisador, que é
constituído de registros das impressões vivenciadas em sala. Nele, são relatadas
as observações e reflexões, sendo um recurso que apresenta uma riqueza em
informações (ZABALZA, 2004).
No que diz a respeito ao enredo da narrativa, a escolha do cenário para compor o
caso deve-se aos comentários de alunos que sonham e almejam estagiar ou até mesmo
prestarem processo seletivo para assumirem um cargo de técnicos em segurança do
trabalho na empresa da Petrobrás. O assunto de periculosidade química desperta
uma motivação nos alunos, devido ao fato deles terem a possibilidade de
futuramente exercerem atividades técnicas como segurança do trabalho, na empresa
da Petrobrás, em Macaé. Como a função de um técnico dessa área consiste em
inspecionar as condições de trabalho e executar atividades de prevenções de
acidentes e alertar sobre os riscos envolvidos no ambiente de trabalho, destaca-
se a relevância de abordar o tópico de periculosidade química de produtos
perigosos.
No que concerne ao uso e a associação das metodologias de ensino ativas,
identificou-se que adotar a metodologia Estudo de Casos provocou um estímulo nos
alunos para a tomada de decisão frente à situação problema e a confecção e
explicação da cartilha lúdica aflorou a criatividade dos alunos, além de
aprimorar a comunicação oral durante a apresentação das cartilhas. O emprego da
sala cooperativa Jigsaw permitiu que os alunos aprendessem a trabalhar em grupos,
interagir, decidir as melhores propostas e realizar um trabalho dedicado.
Destaca-se que a aplicação da metodologia sala cooperativa Jigsaw possibilitou
que os alunos participem ativamente das atividades. É importante salientar que
toda a dinâmica envolvida durante a aplicação dessa metodologia foi esclarecida
aos alunos, uma vez que este método é altamente estruturado e é de suma
importância que os alunos tenham ciência dos objetivos a serem alcançados em cada
etapa.
Durante a aplicação da sala cooperativa Jigsaw, todos os alunos receberam um
Manual de Fundamentos do Corpo de Bombeiros que disponibiliza informações básicas
das classes de substâncias perigosas como: a coloração do rótulo de risco;
transporte e manuseio; procedimentos básicos para acidentes com produtos
perigosos; exemplos, características e propriedades das classes perigosas. Esse
manual serviu de fundamentação que os alunos precisavam para estudar o conteúdo e
desenvolver as atividades.
Com relação à reunião aos grupos de base e especialistas, na sala cooperativa
Jigsaw, constatou-se que essa dinâmica viabilizou a realização de trabalhos de
modo cooperativo. A reunião dos grupos proporcionou que cada aluno assumisse uma
responsabilidade individual e grupal. Os integrantes atuaram como um
multiplicador de informações específicas dos subtópicos estudados.
A cartilha, estruturada pelos alunos dos grupos de base, continha diversificados
recursos como: jogos, reportagem, curiosidade e mito versus verdade. Os alunos
para construírem a cartilha tiveram acesso a um material de orientação
disponibilizado pela pesquisadora. Esse material continha uma gama de orientações
para a elaboração da cartilha: indicações de dimensões e tipo de fonte para o
corpo do texto; instruções para referenciar segundo as normas da ABNT; alertas
sobre os plágios; dica de software para elaborar a cartilha (Power Point);
exigência para salvar o arquivo em pdf, com intuito de evitar a perda da
formatação da cartilha. Todas as cartilhas eram digitais e foram apresentadas no
terceiro momento. Ao todo, foram cinco cartilhas referentes aos seguintes grupos
de base (A, B, C, D e E). Os subtópicos abordados da periculosidade química dos
produtos perigosos foram: inflamáveis, corrosivas, oxidantes, tóxicas e
explosivas.
Com base nas anotações realizadas no diário de aula, destacar-se-á a apresentação
dos grupos de base (A, B, C, D e E) acompanhados dos recursos escolhidos pelos
grupos para compor a cartilha. É importante destacar que todas as cartilhas
confeccionadas eram digitais e foram apresentadas com auxílio de slides.
O grupo de base A escolheu diversificado artifícios para compor a cartilha. Os
recursos escolhidos foram: caça palavras, palavras cruzadas e uma reportagem que
abordava sobre vazamento de gás amônia em frigorífico. Todos os integrantes
apresentaram a cartilha interagindo com o restante dos alunos da sala e
explicaram com clareza e segurança os cinco subtópicos. Identificou-se domínio do
conteúdo por parte dos alunos.
O grupo de base B conseguiu diversificar os recursos para abordar as cinco
classes de produtos perigosos. Destacaram curiosidade acerca do assunto,
elaboraram caça palavras, palavras cruzadas e mito versus verdade. Durante a
apresentação, todos os componentes do grupo apresentaram os tópicos de modo claro
e objetivo. Também interagiram com os colegas para realização de alguns
passatempos.
O grupo de base C priorizou somente um recurso para a abordagem das cinco classes
dos produtos perigosos. O recurso escolhido foi mito versus verdade. A
apresentação do grupo foi bem objetiva e não tão interativa quanto dos outros
grupos. Como somente um recurso foi explorado, no início a turma se interessou em
responder se era mito ou verdade, as afirmações. Possivelmente, se outros
recursos fossem explorados, o grupo teria um melhor proveito durante a
apresentação.
O grupo de base D mesclou alguns recursos para compor a cartilha. Explorou o uso
do dominox de palavras, um jogo semelhante às palavras cruzadas. O grupo
apresentou brevemente sua cartilha e ao final, buscando melhor interação com a
turma, realizou uma dinâmica conhecida como forca, para abordar diferentes
palavras chaves dos assuntos vistos.
O grupo de base E se preocupou em explorar uma introdução para apresentar a
cartilha ao leitor, adicionou o sumário e detalharam informações relevantes sobre
as cinco classes de produtos perigosos em estudo. A inclusão de muitas
ilustrações facilitou a compreensão da mensagem a ser transmitida no texto. O
texto apresentou linguagem compreensível, legível e esclarecedora. Ao final da
cartilha, elaboraram um tópico de considerações finais resaltando a importância
de pontos relevantes para evitar acidentes no trabalho que estão em contato com
essas substâncias. Também foi exposto um tópico que aborda somente curiosidades
gerais sobre a periculosidade química e um jogo de palavras cruzadas que envolve
todas as classes.
Conclusões
Com base na análise e discussões dos resultados serão levantadas considerações que se referem aos três momentos executados. No que diz a respeito ao primeiro momento, identificou-se que a abordagem do tema, periculosidade química, despertou uma motivação nos alunos, devido ao fato deles terem a possibilidade de futuramente exercerem atividades técnicas como segurança do trabalho, na empresa da Petrobrás, em Macaé. Desse modo, destaca-se que este assunto é relevante e assume grande utilidade pedagógica, uma vez que os alunos terão acesso ao estudo de periculosidade, que é essencial nesse ambiente de trabalho. A respeito da utilização do caso investigativo, observou-se que o uso deste recurso, embasado na metodologia Estudo de Casos, estimulou a turma a exercer a tomada de decisão para solucionar a situação problema. Com relação ao segundo momento, à reunião dos grupos de base e especialistas que estruturam a aplicação do método cooperativo Jigsaw, percebeu-se que a os alunos trabalharam em seus pequenos grupos compartilhando informações e oferecendo o auxílio mútuo. Os alunos respeitavam as opiniões dos colegas e entravam em um acordo em comum com o intuito de obter um melhor desempenho no desenvolvimento das atividades. O terceiro momento, caracterizado pela apresentação da cartilha, observou-se que a comunicação oral dos alunos foi aperfeiçoada, os alunos demonstraram domínio no assunto explicitado, já que esclareceram o conteúdo com segurança e com detalhes e os trabalhos foram expostos com criatividade. Destarte, depreende-se que o emprego de duas metodologias ativas de ensino para o estudo de periculosidade química foi proveitoso e satisfatório. Salienta-se que o docente da disciplina de química pode adotar esse material, não unicamente em um curso técnico de segurança do trabalho, pois o assunto envolvido aborda questões sociais relevantes para a aprendizagem dos alunos.
Agradecimentos
Aos alunos do IFFluminense campus Macaé participantes da pesquisa.
Referências
COCHITO, M. I. G. S. Cooperação e aprendizagem: educação intercultural. Lisboa: ACIME, 2004. Disponível em: <http://cidadaniaemportugal.pt/wpcontent/ uploads/recursos/cooperacao-e-aprendizagem.pdf>. Acesso em: abr.2018.
HERREID, C. F. Case studies in science – A novel method of science education. Journal of College Science Teaching, v. 23, n. 4, p. 221-229, 1994.
SÁ, L. P.; QUEIROZ, S. L. Estudo de casos no Ensino de Química. Campinas: Editora Átomo, 2009. 95p.
SILVA, O. B. da; OLIVEIRA, J. R. S. de; QUEIROZ, S. L. SOS Mogi-Guaçu: Contribuições de um Estudo de Caso para a Educação Química no Nível Médio. Química Nova na Escola, São Paulo, v.33, n.3, p.185-192. 2011.
ZABALZA, Miguel Angél. Diários de aula: um instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional. Porto Alegre: Artmed, 2004.