Autores

Alves, D.F.S. (UFRJ) ; Ferreira, I.J. (UFRJ)

Resumo

O presente trabalho relata algumas experiências adquiridas durante um curso de extensão realizado no Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) campus Nilópolis, ao longo do primeiro semestre letivo de 2017. Durante o curso, os participantes tiveram aulas teóricas sobre estruturas moleculares, geometria molecular e sobre construção e aplicação de modelos moleculares. A maior parte da carga horária foi destinada para construção de modelos moleculares com materiais de baixo custo e acessíveis e, ao final do curso, os participantes responderam a questionários sobre a utilização dos modelos. Além da capacitação dos participantes para construção de modelos moleculares, os resultados obtidos apontaram para maiores motivações na utilização de tais ferramentas em sala de aula.

Palavras chaves

Modelos Moleculares; Ensino e Extensão; Materiais de baixo custo

Introdução

Para se evitar que ocorra a perpetuação de muitos erros relacionados a conceitos químicos, fazem-se necessários estudos que correlacionem as mais diversas metodologias de ensino e aprendizagem com as ferramentas passíveis de serem utilizadas pelos docentes (VASCONCELOS; ARROIO, 2013). A possibilidade de transitar por conhecimentos que envolvam grandezas de ordem microscópica e macroscópica (VASCONCELOS; ARROIO, 2013) e tipos de dimensionalidades e intuições espaciais bidimensionais e tridimensionais (ALVES, 2016) possibilita aos alunos uma melhor compreensão da Química enquanto ciência aplicável para seu cotidiano. Apesar da grande ressignificação dos ambientes educacionais que os docentes conseguiram promover de maneira positiva ao longo da história, ainda é observada uma grande ausência da utilização de ferramentas facilitadoras e desmotivação por parte dos professores em utilizá-las (NASCIMENTO; LINSINGEN, 2006). Quando os docentes compreendem a necessidade da escola ser um ambiente de formação cidadã e não somente profissional, o processo de ensino se dá de maneira mais fácil e eficaz (BARBOSA; MOURA, 2013). É necessário que as práticas docentes se modifiquem no sentido de permitir que alunos raciocinem, reflitam sobre a construção de conhecimento, questionem e obtenham novas habilidades para formação de sua criticidade (FREIRE, 1996). Muitos autores apontam para estudo e utilização de diversas ferramentas facilitadoras de ensino que promovam o que foi dito anteriormente. Dentre elas, estão os modelos representativos, denominados por Alves (2016) de Modelos Concretos. Essa denominação foi adotada de modo a corrigir a conceituação dos modelos representativos, amplamente chamados de Modelos Moleculares. A terminologia “molecular” pode inferir que os modelos estão representando apenas substâncias essencialmente covalentes, o que não é verdade. Os modelos podem ser utilizados para representar estruturas químicas de substâncias iônicas ou moleculares, de maneira pedagogicamente ativa e eficaz nos dois caráteres (ALVES, 2016). Os modelos concretos têm apresentado resultados positivos em muitos estudos que envolvem seus desenvolvimentos e aplicações, pois alunos e professores têm a possibilidade de instigar suas intuições espaciais, estimular seus sentidos, promover um desenvolvimento cognitivo e verificar uma construção de conhecimentos Químicos importantes para o cotidiano. Para Orlando et al. (2009), aponta os modelos concretos como ferramentas importantes na estimulação sensorial, o que pode levar a estudos que visem o Ensino de Química numa Educação Inclusiva para pessoas com deficiência visual, por exemplo. As vantagens da utilização destas ferramentas também estão atreladas a possibilidade de desenvolvimento e construção dos modelos por docentes e discentes, fazendo uso de materiais de baixo custo e fácil acesso. Para Alves (2016), as etapas de construção dos modelos também podem colaborar positivamente para o desenvolvimento de muitas habilidades de alunos e professores, como noções de tridimensionalidade e criatividade, mas também de conceitos mais formais e/ou técnicos dentro do que se tem por conhecimento químico, como noções de raios atômicos ou iônicos, por exemplo. Para Santos (2001), a má utilização de modelos concretos em sala de aula pode gerar construção de conhecimentos equivocados de conceitos químicos e, por vezes, de difícil reversão. Nesse sentido, há uma grande preocupação de muitos autores em desenvolver estudos que promovam ou estimulem a capacitação de docentes para uma boa utilização de modelos concretos e sejam fornecidos os aportes teóricos necessários para que isso ocorra. Alves (2016) salienta a necessidade de estudos sobre modelos moleculares que não estejam focados apenas no estudo das estruturas químicas representadas, mas também nos materiais utilizados para o desenvolvimento dos modelos e de como tais ferramentas podem ser aplicadas nos Ensinos Médio e Superior. Para isso, as instituições de Ensino, principalmente as que ofertam cursos de Licenciatura em Química, devem promover cursos, oficinas e estudos sobre os modelos concretos, de modo que os docentes formados sintam-se capazes e aptos para utilizarem essa ferramenta, mediante as necessidades que seus alunos eventualmente possam apresentar.

Material e métodos

O curso de extensão referido foi realizado no Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) campus Nilópolis, no período de abril a julho de 2017, e gerido pela Coordenação de Extensão (CoEx) da mesma instituição. Durante o período da atividade, foi verificada a participação de 18 alunos dos cursos de Licenciatura em Química e Bacharelado em Química, da mesma instituição, maiores de 18 anos e de ambos os sexos. Durante a apresentação inicial, alguns alunos afirmaram já terem lecionado em salas de aula de cursos pré- vestibulares e outras instituições semelhantes. As aulas tinham duração de 1 hora e 30 minutos e ocorriam em encontros semanais, na instituição anteriormente mencionada. As duas primeiras aulas foram dedicadas para estudo teórico de estruturas químicas de substâncias iônicas e moleculares e sobre tipos, uso, construção de aplicação de modelos concretos. Como afirmado por Alves (2016), a utilização dos temos “Modelo Concreto” melhor se aplicam para este tipo de ferramenta, pois englobam tanto representações de substâncias iônicas quanto moleculares. Dentro do estudo de substâncias iônicas, foram frisados com maior ênfase os estudos de células unitárias e como os modelos podem ser utilizados para auxiliar no estudo delas no Ensino Superior. Para as substâncias moleculares, foram trabalhadas as principais geometrias adotadas pelas moléculas e como a aplicação de modelos poderia interferir no processo de ensino e aprendizagem de tais conteúdos nos Ensinos Médio e Superior. Nas aulas seguintes, os alunos aprenderam a realizar a montagem/confecção de modelos concretos de diversas substâncias fornecidas a eles por meio de fórmula molecular ou unitária. A cada semana um tipo de geometria era trabalhada e os alunos verificavam os prós e contras da utilização de cada tipo de material que poderia ser adotado. De forma geral, os materiais mais utilizados pelos alunos durante o curso foram massas de modelar, jujubas, bolas de isopor, hastes metálicas, palitos de dente, palitos de churras, hastes plásticas e, apenas por uma vez, modelo molecular industrializado comercial. Cada material foi analisado mediante aplicabilidade em sala de aula, também sendo comparados com os modelos comerciais mencionados anteriormente. Na última aula, os alunos realizaram apresentações de construções de modelos de substâncias de maior complexidade, frente às realizadas durante o curso, e responderam a um questionário. Tal questionário foi respondido de forma voluntária, assegurado por um termo de consentimento, previamente lido e assinado pelos participantes. As perguntas realizadas buscaram avaliar as facilidades e dificuldades encontradas pelos alunos na construção de modelos concretos, assim como verificar quais foram os materiais que mais os interessaram em manipular e como eles poderiam aplicar tais ferramentas em sala de aula.

Resultado e discussão

O questionário avaliativo do curso de extensão constou de alguma perguntas pertinentes à realização do curso e da motivação dos participantes em propagar a ideia da utilização dos modelos concretos como ferramentas facilitadoras no Ensino de Química. A primeira pergunta realizada a eles foi: "Você recomendaria a outros alunos de Graduação em Química a utilização de modelos moleculares como parte da formação acadêmica para docente: sim ou não? Justifique.". As respostas foram unânimes em dizer "sim", o que fortalece e corrobora com as ideias de Alves (2016), Ferreira e Justi (2005) e Orlando et al. (2009), que afirmam que estudos sobre a elaboração e utilização de modelos concretos devem fazer parte da formação acadêmica dos licenciandos em Química. Quanto à justificativa, 44% das respostas apontaram os modelos como facilitadores de visão espacial das estruturas das substâncias e 56% afirmaram, entre muitas coisas, que os modelos permitem descontração em aula, são ferramentas de fácil uso, trazem certa ludicidade para a aula e ajudam na formação do docente. Outra pergunta realizada aos alunos foi: "Você acha que o uso de modelos concretos produzidos a partir de materiais de baixo custo devem fazer parte das ementas e grades curriculares de disciplinas das Licenciaturas em Química: sim ou não? Por quê?". Para esta pergunta, 89% das respostas foram favoráveis à inserção de estudos sobre modelos moleculares nas disciplinas de ensino responsáveis por estudos de ferramentas facilitadoras e práticas pedagógicas nos cursos de Licenciatura em Química. As justificativas permearam o fato de tais estudos podem complementar a formação dos docentes e permitirem que os professores tenham mais recursos para poderem utilizar em sala de aula. Ainda nesse sentido, 11% das respostas não foram favoráveis, pois afirmavam que as grades curriculares já possuem muitas matérias (Figura 1). Uma das respostas negativas sugeriu que esse tipo de formação seja ofertado apenas por meio de curso de extensão ou como matéria optativa. Talvez, esse tipo de pensamento seja orientado por uma preocupação que os alunos podem apresentar em obter bom desempenho apenas em disciplinas de cunho mais técnico e acabe perpetuando, em alguns discentes, uma desvalorização das disciplinas de cunho pedagógico, que é observada em cursos de Licenciatura de diversas áreas em muitas instituições. Também foi perguntado aos participantes quais seriam as melhorias que eles poderiam sugerir na elaboração dos modelos concretos que foram construídos ao longo do curso de extensão. Do total de respostas, 50% não apontaram nenhuma mudança ou sugestão. Já 27,6% sugeriu elaboração de modelos com materiais mais exóticos e não usuais, como flores e hastes plásticas de cores e texturas diferentes. Nesse sentido, 22,4% das respostas sugeriram tempos maiores para execução e construção dos modelos para maior detalhamento, o que nos infere uma carga horária maior de curso. Isso pode ir de encontro à afirmação de autores que defendem o estudo dessas ferramentas como parte integrante das grades e ementas dos cursos de formação de professores de Química. Por fim, foi perguntado aos alunos quais foram suas maiores dificuldades na elaboração dos modelos feitos durante o curso de extensão. Para esta pergunta, 50% dos alunos apontaram os ângulos e comprimentos de ligação como parte de maior dificuldade na elaboração dos modelos (Figura 2). Muitos alunos ao longo do curso expressaram verbalmente as dificuldades que tinha com conceitos geométricos advindos da Matemática e que essas barreiras se mantinham ao estudar Química. Mesmo com todo auxílio na construção dos modelos, a verificação dessa dificuldade amplia a discussão da aplicação e estudo dos modelos e ressalta a importância dos suportes interdisciplinares que o aluno deve ter. Em outros quesitos, os alunos apontaram dificuldade com habilidades artísticas, pois, de certa forma, os modelos foram produzidos artesanalmente. Outros pontos destacados foram a dificuldade de transportar os modelos, em caso de modelos de grande tamanho/volume, falta de paciência para confecção dos mesmos e tempo hábil para construir modelos que atraiam de fato a atenção de alunos do Ensino Médio, por exemplo.

Figura 1



Figura 2



Conclusões

Fazer uso de modelos concretos em aulas de Química pode se tornar uma alternativa completamente viável para os docentes, desde que estas ferramentas sejam discutidas e estudadas ao longo da formação pedagógica dos professores. A utilização de tais recursos não extingue nem se opõe a utilização de outras ferramentas, ao contrário, ressalta-se aqui o incentivo à utilização de diversos instrumentos e variadas metodologias que consigam realizar as transposições didáticas necessárias para que ocorra um ensino e aprendizagem efetivos. Fazem-se cada vez mais importantes estudos que forneçam aporte teórico para os docentes quanto a utilização de modelos concretos e como esta ferramenta simples pode proporcionar o rompimento de barreiras que se estabeleceram ao longo de décadas no Ensino de Química, como as dificuldades que alunos, e até mesmo professores, sobre geometrias moleculares e estruturas químicas. Sendo feito isso, outros tipos de conceitos químicos podem ser mais bem compreendidos pelos alunos, promovendo melhoras nos desempenhos escolares dos mesmos nesta e em outras disciplinas. O benefício de cursos de extensão e/ou disciplinas nesse viés promovem a curto prazo uma instrumentalização dos professores para esse tipo de ferramenta e a longo prazo uma possibilidade de melhora no aprendizado de alunos lecionados por esses professores.

Agradecimentos

Agradecemos ao IFRJ – Campus Nilópolis pelo constante incentivo a ensino, pesquisa e extensão.

Referências

ALVES, D. F. S. Os modelos concretos e suas colaborações no estudo de sólidos inorgânicos. 2016. 55 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Licenciatura em Química) – Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Nilópolis, 2016.

BARBOSA, E. F; MOURA, D. G. Metodologias ativas de aprendizagem na Educação Profissional e Tecnológica. Boletim Tecnológico SENAC, Rio de Janeiro, v. 39, n. 2, p. 48-67, mai./ago.

FERREIRA, P. F. M.; JUSTI, R. S. Atividades de construção de modelos e ações envolvidas. In: V Encontro Nacional de Pesquisa em Ensino de Ciências, 5, 2005, Bauru. Atas do V ENPEC. Bauru: ABRAPEC, 2005. p. 1-12.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática docente. São Paulo: Paz e Terra, p. 25, 1996.

NASCIMENTO, T. G.; LINSINGEN, I. V. Articulações entre o enfoque CTS e a pedagogia de Paulo Freire como base para o ensino de ciências. Convergência, v. 13, n. 42, p. 95-116, 2006.

ORLANDO, T. C.; LIMA, A. R.; SILVA, A. M.; FUZISSAKI, C. N.; RAMOS, C. L.; MACHADO, D.; FERNANDES, F. F.; LORENZI, J. C. C.; LIMA, M. A.; GARDIM, S.; BARBOSA, V. C.; TRÉZ, T. A. Planejamento, montagem e aplicação de modelos didáticos para abordagem de biologia celular e molecular no ensino médio por graduandos de ciências biológicas. Revista Brasileira de Ensino de Bioquímica e Biologia Molecular, vol. 1, fev. 2009.

SANTOS, H. F. O conceito da Modelagem Molecular. Química Nova na Escola, São Paulo, n. 4, p. 4-5, mai. 2001.

VASCONCELOS, F. C. G. C.; ARROIO, A. Explorando as percepções de professores em serviço sobre as visualizações no ensino de química. Química Nova, São Paulo, vol. 36, n. 8, p. 1242-1247, 2013.