Autores

Mota, P.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE RORAIMA) ; Teles, V.L.G. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE RORAIMA) ; Rizzatti, I.M. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE RORAIMA) ; Lima, R.C.P. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE RORAIMA) ; Medeiros, I.J.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE RORAIMA) ; Silva, S.M. (ESCOLA ESTADUAL GONÇALVES DIAS-RR)

Resumo

A presente pesquisa tem como objetivo principal desenvolver instrumentos com materiais alternativos para realização de aulas práticas de titulação ácido- base no ensino médio, a fim de promover uma aprendizagem significativa sobre determinação de acidez nos alimentos. Foram construídos e adaptados instrumentos para a prática de determinação de acidez do leite. O procedimento foi realizado em uma escola pública do município de Boa Vista/RR com alunos do 2°ano do Ensino Médio, a fim de avaliar os instrumentos propostos em caráter de experimentação investigativa. A aferição dos instrumentos demonstrou viabilidade técnica e as atividades realizadas na escola promoveram a aprendizagem significativa por meio de uma prática experimental alternativa.

Palavras chaves

Ensino de Química; experimentação; acidez

Introdução

Várias pesquisas ressaltam que o ensino de química não pode se abreviar apenas à transferência do conhecimento, mas sim que, este ensino faça contextualização com o cotidiano do aluno, para que o mesmo possa assimilar com mais facilidade os conteúdos trabalhados em sala de aula, considerando que o processo ensino-aprendizagem acontece mediante reflexões e real compreensão da teoria. Para isso, cabe ao professor se desprender de metodologias tradicionais, podendo inovar suas aulas, não se acomodando com os problemas, porém superá-los a fim de promover um ensino de Química significativo. Na aprendizagem significativa ocorre a construção do conhecimento, onde o professor avalia o que o aluno já sabe e então ensina de acordo com os seus conhecimentos. Isto contribui para uma interação entre os assuntos estudados e as novas informações adquiridas pelo estudante (GUIMARÃES, 2009) Entende-se que para a melhoria no ensino de química o educador deve adotar metodologias de ensino que privilegie a experimentação como uma forma de obtenção de dados da realidade, assim contribuindo com o desenvolvimento cognitivo do aluno, por meio do seu envolvimento direto, criativo e construtivo com relações aos conteúdos estudados em sala de aula (BERNARDELLI, 2004). Neste ponto de vista, o presente trabalho aborda temas já muito discutidos no ensino de Química, apresentando metodologias alternativas para realização de práticas que se apresentam como um mecanismo que desperta a criatividade dos professores e estudantes, possibilitando uma maior compreensão dos assuntos, provocando uma interação teoria-prática, para uma aprendizagem significativa. Além das vantagens acima descritas, a construção e adaptações dos instrumentos de laboratório tentam solucionar o grande problema apontado no ensino de Química, como a falta de reagentes e laboratório nas escolas.

Material e métodos

A presente pesquisa é de caráter experimental, em que foram utilizados instrumentos com materiais alternativos e adaptados, como proposta de abordagem na aprendizagem significativa na análise de acidez do leite por titulação. Foi construída uma bureta alternativa (PRADO, CÔRTES, 2007) a partir de uma seringa de 60,0 mL, sem o êmbolo, com uma torneira de três vias (com a via perpendicular fechada), proveniente de um equipo de soro, adaptada à sua abertura de diâmetro menor. A garra para sustentação da bureta foi feita de madeira com aberturas de 2 cm e 3 cm para adaptação no suporte e para acoplar a bureta alternativa, respectivamente. Para isso, foram utilizados parafusos-borboleta. O suporte universal foi feito de madeira com a base medindo 21,5 cm por 14,5 cm e a altura medindo 34. Como Erlenmeyer, foi utilizado um frasco de azeitona medindo 7,5 cm de base e 4,5 cm de abertura. Como pipeta, pisseta, béquer e balão volumétrico, foram utilizados seringa de 10,0 mL, um frasco de detergente, frasco coletor universal e um frasco de perfume, respectivamente. Além destes, foi utilizada uma balança portátil para a pesagem do hidróxido de sódio. As aferições dos instrumentos alternativos, tais como bureta, pipeta, balão volumétrico e balança foram realizadas no Laboratório de Química da Universidade Estadual de Roraima. Como parte do planejamento da aula experimental, foi elaborado um roteiro experimental para determinação da acidez do leite. As atividades desta pesquisa no ensino de química foram divididas em três momentos pedagógicos e foram realizadas nas turmas do 2º ano do nível médio de uma Escola pública do município de Boa Vista/RR. Participaram do presente trabalho um total de 50 alunos; sendo 19, 15 e 16 alunos das turmas A, B e C, respectivamente. Para o primeiro momento pedagógico foi elaborado um pré- questionário, contendo quatro perguntas. Após a aplicação do questionário foi realizada a problematização inicial: “Como determinar a acidez nos alimentos?” por meio de discussões e reflexões acerca de conhecimentos prévios dos alunos em relação aos ácidos e bases, relação da acidez de alimentos industrializados e a legislação, características ácidas dos alimentos e saúde, incluindo os questionamentos levantados pelos próprios alunos. Para organização do conhecimento, no segundo momento foi realizada uma prática seguindo o roteiro experimental elaborado com o objetivo de determinar a acidez do leite. Para execução da aula prática, foram utilizados hidróxido de sódio, água destilada, extrato de repolho roxo e leite longa vida. O preparo da solução de hidróxido de sódio 0,1 mol/L foi efetuado na Escola pelos próprios alunos e o extrato de repolho roxo como indicador foi obtido pelo processamento em liquidificador doméstico no laboratório da Universidade estadual de Roraima. Após a realização do experimento e aplicação dos conceitos químicos, os alunos participaram do terceiro momento em que foi aplicado um pós- questionário.

Resultado e discussão

Após a construção, adaptação e aferição dos instrumentos para a prática de titulação ácido-base, foram selecionados materiais do dia a dia a fim de atender uma proposta de experimentação para uma aprendizagem significativa. Neste sentido, foram selecionados e adaptados os experimentos para determinação da acidez do leite utilizando como indicador o repolho roxo. Durante o período do estágio supervisionado nos semestres de 2014.2 e 2015.1, foi observada a dificuldade das escolas públicas em promover aulas práticas, isso se dá ao fato dessas escolas não possuírem um espaço laboratorial adequado ou, quando possuem, deixam a desejar muitas vezes em equipamentos, instrumentos, materiais e reagentes necessários para realização das aulas práticas. Os instrumentos construídos e adaptados foram pensados de modo a permitir a semelhança com os instrumentos convencionais de laboratório. Todos os materiais utilizados foram adquiridos em supermercado ou em farmácia, com exceção da balança portátil que foi disponibilizada pelo laboratório de Química da Universidade Estadual de Roraima. Os instrumentos alternativos foram adaptados e construídos apenas para fins educacionais, porém fez-se necessária calibração e aferição dos volumes da bureta, pipeta e balão volumétrico. Após a calibração e aferição dos instrumentos, foi necessário levar uma proposta pedagógica que utilizasse os instrumentos construídos e adaptados. Para isso, foi elaborado um questionário para levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos e realizada uma reflexão acerca das questões respondidas. Pois na aprendizagem significativa o conhecimento prévio do estudante é de suma importância para o processo de ensino e aprendizagem (AUSUBEL apud MOREIRA, 2006). Assim, foi utilizado um roteiro para determinação da acidez do leite por titulação utilizando a proposta alternativa de titulação ácido-base. A figura 1 apresenta o gráfico referente às respostas sobre o que os estudantes pensam sobre “ácido”. Observa-se que 21% e 17% de alunos adotaram uma resposta mais genérica, relacionando o ácido a algo que corrói e algo que tem sabor azedo, respectivamente. Como 41% responderam que não sabiam ou deixaram em branco, nota-se uma quantidade significativa de alunos que não possuem domínio do referente assunto e/ou falta de motivação e interesse em responder. A motivação é imprescindível para o desenvolvimento do indivíduo, pois bons resultados de aprendizagem só serão possíveis à medida que o professor proporcionar um ambiente de trabalho que estimule o aluno a criar, comparar, discutir, rever, perguntar e ampliar ideias (SANTOS, 2013). Nota-se que os estudantes têm dificuldades em definir conceitos, o que é preocupante, pois estes são assuntos estudados no 1° ano do Ensino Médio. A figura 2 mostra o gráfico referente às respostas sobre o que os alunos pensam sobre “base”. Ao serem indagados sobre o que pensam sobre “base”, 50% dos estudantes, ou seja, uma quantidade expressiva de alunos não soube responder ou deixou em branco, o que pode também estar associado ao déficit de conhecimento sobre bases e/ou falta de interesse em responder a pergunta. Porém, 18% de estudantes relacionaram ao seu cotidiano levando em consideração o sabor de frutas “travosas” como exemplos apontaram caju e a manga verde, ou seja, responderam de forma contextualizada. É interessante quando o estudante tenta fazer contextualizações do conhecimento, uma vez que isto permite um desenvolvimento cognitivo do aluno, colaborando para um aprendizado significativo ao tornar o estudante mais ativo, reflexivo e crítico. Os estudantes quando questionados sobre a possibilidade de identificar a presença de ácidos nos alimentos, 52% dos estudantes responderam que é possível identificar a presença de ácido pelo gosto de algumas bebidas, provavelmente por saberem que os ácidos influenciam no sabor dos alimentos, tal como afirma Crexi (2009); 28% dos alunos disseram que não sabia, enquanto 16% falaram que lendo o rótulo dos alimentos provavelmente saberiam os valores nutricionais e composições dos alimentos; e somente 4% dos alunos mostraram ter conhecimento de que existem métodos de análise de acidez e que para isso são necessários equipamentos de laboratório. Estes resultados demonstram a falta de abordagem do método clássico de titulação no ensino médio. Um dos motivos pode estar associado à justificativa de falta de laboratório e materiais necessários. Entretanto é preciso investir em procedimentos didáticos alternativos (BERNARDELLI, 2004). Quando questionados sobre a importância do conhecimento da acidez dos alimentos, notou-se que 66% dos alunos, ou seja, a maioria disse que a importância de conhecer a acidez dos alimentos é por questões de saúde. Interessante a associação, uma vez que alimentos muito ácidos ou fora do padrão estabelecidos (adulterados) podem acarretar sérios problemas de saúde. Dos alunos, 18% não souberam dizer a importância de conhecer a acidez dos alimentos e 16% não responderam. Ao considerar os conhecimentos prévios dos alunos, foi realizada uma prática trazendo uma questão-problema ‘Como determinar a acidez no leite?’. Com esta problematização, foi possível notar que poucos tinham conhecimento que o leite possui característica ácida. Uma aluna que, ao saber da possibilidade de determinar a acidez no leite, argumentou: “Não sabia que leite era ácido.” Neste momento, percebeu-se a importância de estabelecer uma interação do que o aluno já sabe com o está aprendendo. O experimento de titulação do leite envolve não apenas união de conceitos, mas um processo de assimilação em que as novas informações modificam os efeitos subsunçores transformando-os em conceitos mais abrangentes (GUIMARÃES, 2009). No decorrer da aula, os voluntários de cada turma realizaram a prática e tiveram contato direto com as técnicas para a titulação, onde foram acompanhados e orientados a todo o momento como a intervenção do conhecimento, fazendo a caracterização de uma experimentação investigativa (OLIVEIRA; SOARES, 2010). Também é muito importante que o professor procure sempre que possível associar os nomes científicos e os nomes comerciais dos alimentos como, por exemplo, cloreto de sódio (sal de cozinha), bicarbonato de sódio (fermento), entre outros assim o aluno consegue perceber que a Química abrange o seu mundo (BELTRAN; CISCATO, 1991). No terceiro momento pedagógico, foi aplicado o pós – questionário. Uma das perguntas “Por que é importante consultar os rótulos dos alimentos consumidos?” apontou que 70% dos alunos responderam de acordo com o que foi abordado durante as práticas, a respeito da legislação que estipula os parâmetros de padronização de alimentos e que para 26% dos alunos é importante consultar os rótulos dos alimentos para saber sua composição e valores nutricionais; pois é pela rotulagem que as empresas produtoras de alimentos se comunicam com os consumidores. Outros 4% não souberam responder. Logo, a maioria dos alunos conseguiu compreender sobre a importância de consultar os rótulos dos alimentos, pois os mesmos trazem informações importantes do ponto de vista nutricional, químico e analítico. Ao serem questionados sobre se os instrumentos construídos e adaptados conseguiram suprir a necessidade da falta de instrumentos na escola, 96% dos estudantes disseram que sim, enquanto 4% disseram que supriu razoavelmente. Assim, os instrumentos ajudaram de maneira significativa na condução de uma aula proposta sobre titulação ácido-base. Segundo 98% dos estudantes, as aulas práticas são muito importantes para a compreensão dos conteúdos, enquanto apenas 2% disseram que são razoavelmente importantes. Assim, os instrumentos construídos e adaptados são eficientes numa proposta experimental de titulação ácido-base e podem ser utilizados em outros experimentos químicos como ferramentas para o ensino de química.

FIGURA 1

Gráfico das respostas dos alunos do 2º ano do Ensino médio de uma escola pública do município de Boa Vista/RR referentes ao que pensam sobre “ácido”.

FIGURA 2

Gráfico das respostas dos alunos do 2º ano do Ensino médio de uma escola pública do município de Boa Vista/RR referentes ao que pensam sobre “base”.

Conclusões

A presente pesquisa apontou propostas de materiais alternativos de fácil acesso, baixo custo e precisos para viabilizar práticas de titulação em escolas sem estrutura laboratorial. Além disso, os instrumentos podem ser utilizados em outros experimentos de Química, contribuindo assim, para a melhoria do aprendizado, uma vez que os instrumentos foram aprovados por meio de testes experimentais, estatísticos e didáticos. Logo, a inserção da prática de titulação ácido-base nas Escolas sem estrutura laboratorial adequada é possível com os materiais alternativos empregados neste trabalho. A proposta metodológica possibilitou aos alunos a compreensão de técnicas em análises químicas por meio da aprendizagem significativa, uma vez que os estudantes fizeram uso dos seus conhecimentos prévios para alcançar uma nova informação ou conhecimento. Foi possível a avaliação dos conhecimentos prévios e adquiridos dos estudantes participantes das atividades por meio de discussões e reflexões. A experimentação com abordagem de aprendizagem significativa possibilita que aluno tenha mais interesse pela disciplina de química e com isso consiga percebê-la em diversos aspectos da sua vida e da sociedade em que vive o que contribui para a sua formação cidadã. Portanto, materiais alternativos para titulação ácido-base no ensino médio podem contribuir para uma aprendizagem significativa em química, uma vez que traz uma relação dos conhecimentos em sala de aula com a importância das análises químicas, informações obtidas nos rótulos, bem como características dos alimentos para consumo e legislação.

Agradecimentos

Pibid - Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência CAPES-Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

Referências

BELTRAN, N. O.; CISCATO, C. A. M.. Química. São Paulo: Cortez, 1991.¬¬ – Coleção Magistério 2°grau. Série formação geral.

BERNARDELLI, M. S. Encantar para ensinar - um procedimento alternativo para o ensino de química. In: Convenção Brasil Latina Americana. CBEPPC- 1, 4., 9., Foz do Iguaçu. Centro Reichiano, 2004.

CREXI, V. T. Determinação físico-químicas na indústria de alimentos. Universidade Federal de Pampa. Curso de engenharia de alimentos. 2009.

GUIMARÃES, C. C. Experimentação no ensino de química: Caminhos e descaminhos rumo à aprendizagem significativa. Química Nova na Escola. 2009.

MOREIRA, M.A. A teoria da aprendizagem significativa e sua implementação em sala de aula. Brasília: Editora da UnB. 2006.

OLIVEIRA, N.; SOARES, M. H. F. B. As atividades de experimentação investigativa em ciência na sala de aula de escolas de ensino médio e suas interações com o lúdico. XV Encontro Nacional de Ensino de Química (XV ENEQ) – Brasília, DF, 2010.

PRADO, A. C. da; CÔRTES, C. E. S. Experimentos de titulação ácido-base utilizando indicadores naturais e materiais de baixo custo. Disponível em < https://sec.sbq.org.br/cdrom/30ra/resumos/T1379-1.pdf> Acesso em out. 2015.


SANTOS, E. S. Trabalhando com alunos: subsídios e sugestões: o professor como mediador no processo ensino aprendizagem. Revista do Projeto Pedagógico; Revista Gestão Universitária, n. 40. 2013.