Autores

Teles, V.L.G. (UERR) ; Nunes, K.S.S. (UERR) ; Coutinho, L.C.S. (UERR) ; Bekman, L. (ESCOLA ESTADUAL GONÇALVES DIAS) ; Lima, R.C.P. (UERR) ; Rizzatti, I.M. (UERR)

Resumo

Esta pesquisa foi desenvolvida a partir da reflexão da realidade vivenciada em uma escola pública de Boa Vista/RR, durante as ações do PIBID/QUÍMICA/UERR, em relação às metodologias aplicadas em sala de aula. Diante deste contexto, o objetivo deste trabalho foi desenvolver uma intervenção didática no estudo dos conceitos de ácidos e bases com abordagem na experimentação problematizadora e na Teoria da Aprendizagem Significativa de Ausubel. Todo o processo foi apresentado de forma contextualizada, considerando os Parâmetros Nacionais Curriculares para o Ensino Médio e enfatizando os conhecimentos prévios dos estudantes. Os resultados afirmam que a experimentação problematizadora pode ser uma proposta interessante para auxiliar no processo da aprendizagem no ensino de química.

Palavras chaves

Ação Problematizadoras; Experimentação; Materiais aAlternativos

Introdução

Atualmente o ensino de química é baseado no tradicionalismo, onde professor transmite o conhecimento e os alunos são meros ouvintes, sendo a memorização de fórmulas e cálculos predominantes. Esta vertente tem tornado o ensino de química monótono e pouco atrativo para os educandos. É preciso que haja mudanças, pois a maioria dos professores estão estagnados na metodologia do ensino tradicional, devido ser esta a forma que lhes foi ensinada e por isso, se sentem mais seguros (MENEGAZZO, STADLER, 2012). Os autores acreditam que não é possível utilizar apenas uma estratégia para repassar os conteúdos, pois existe uma diversidade de assuntos onde são necessárias aulas distintas. Acredita-se que é necessário mesclar, teoria e prática. A experimentação é considerada uma metodologia que motiva e desperta o interesse do indivíduo, devido às reações que ilustram como determinados fenômenos se comportam. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN para o Ensino Médio, o processo de experimentação pode ser entendido como um direito do aluno, pois acarreta discussões sobre assuntos da aula ministrada (BRASIL, 2000). Diante de ações didáticas é preciso uma relação mais articulada entre teoria e prática. Partindo deste pressuposto, a experimentação deve ser problematizadora do conhecimento, pois é por meio do diálogo da realidade observada, na problematização e na reflexão crítica de professor-aluno que se faz o conhecimento. Para Ausubel, Noval e Hanesian (1978) um dos fatores importantes neste processo são os conhecimentos prévios. Pois o que existe na estrutura cognitiva do estudante é o principal fator que influencia na aprendizagem significativa, pois são eles que irão servir de pontes cognitivas para que os novos conceitos sejam ancorados de forma não arbitrária e não literal. Na experimentação problematizadora, a leitura, a escrita e a fala estão como aspectos indispensáveis para uma discussão conceitual dos experimentos, despertando no educando o espírito crítico, a curiosidade e a não aceitação do conhecimento simplesmente transferido (FRANCISCO Jr, FERREIRA, HARTWIG, 2008). A postura do professor durante as discussões em cada momento deve ser de um orientador, como mediador do conhecimento, em que irá mostrar o caminho e não fornecer informações prontas. No Ensino médio são abordadas as principais teorias de ácido e base. Na teoria de Arrhenius, um ácido e uma base são aqueles compostos capazes de fornecer íons H+ e OH- em solução aquosa, cuja reação formará um sal (RUSSEL, 1994). Na teoria de Bronsted-Lowry um ácido é um doador de próton e uma base é uma espécie receptora de próton, ou seja, em uma reação ácido- base há transferência de H+, de uma espécie para outra. Enquanto para Lewis, um ácido é um aceitador de elétrons e uma base uma doadora de elétrons (ATKINS; JONES, 2012). Por conseguinte, há a teoria de Usanovich que considera um ácido toda substância que, com as bases, formam sais, cede cátions, se combinam com ânions e capturam elétrons (SILVA, SANTIAGO, 2012). Em Química, o pH (potencial hidrogeniônico) caracteriza uma substância. Esta propriedade pode variar conforme a temperatura, pois a 25 °C a medida do pH em soluções aquosas está relacionada em uma escala de 0 à 14. Nesta escala, os valores menores que 7, maiores que 7 e iguais a 7 indicam substâncias ácidas, básicas e neutras, respectivamente. Os indicadores ácido-base são substâncias orgânicas fracamente ácidas (indicadores ácidos) ou fracamente básicas (indicadores básicos) que apresentam cores diferentes para suas formas protonadas e desprotonadas; isto significa que mudam de cor em função do pH (BACCAN, GODINHO e BARONE, 1979). Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi desenvolver uma proposta de experimentação problematizadora no estudo de ácidos e bases a fim de somar para a aprendizagem no ensino de química.

Material e métodos

A pesquisa foi realizada com 63 estudantes de três turmas do 1º ano do Ensino Médio regular e profissionalizante de uma escola pública do município de Boa Vista/RR. Foram construídos kit pedagógicos contendo, cada um, 12 amostras não identificadas, indicadores ácido-base (repolho roxo e fenolftaleína), lâminas de vidro como suporte para as gotas das amostras e uma cartela com a escala de cores do indicador repolho roxo em relação ao pH, conforme apresentado na Figura 1. As amostras desconhecidas para medida do pH com o indicador repolho roxo foram: soda caústica, vinagre, detergente neutro, limpa forno, água sanitária, água destilada, bicarbonato de sódio, ácido clorídrico 0,1 mol/L, ácido muriático, amoníaco, leite, refrigerante, suco de limão e solução de hidróxido de sódio 0,1 mol/L. Foram utilizados como instrumentos de coleta de dados um pré- questionário com quatro questões, roteiro experimental e um pós-questionário com três perguntas. Na intervenção didática foram abordados três momentos pedagógicos de 60 minutos cada. No primeiro momento foi realizada uma problematização inicial sobre “Qual a importância do conhecimento do caráter ácido ou básico das substâncias do cotidiano?”. O pré-questionário foi aplicado para obter informações sobre os conhecimentos prévios dos estudantes. Após, foi promovida uma discussão sobre as perguntas formuladas. No segundo momento, as turmas foram divididas em grupos de quatro componentes. A cada equipe foi entregue o kit pedagógico para experimentação de ácido-base, em que foi utilizado o roteiro elaborado e o kit construído. Durante o experimento, foram discutidos procedimentos na investigação das soluções-problema. Após a experimentação, foi promovida uma discussão acerca dos procedimentos, indicadores utilizados, escala de pH e contextualização dos ácidos e bases. No terceiro momento pedagógico foi feita a aplicação do conhecimento, com utilização de um texto abordando ácido e base no dia a dia. O texto foi lido e discutido, finalizando com a aplicação do novo questionário.

Resultado e discussão

Foi realizado um levantamento dos conhecimentos prévios dos estudantes com uma problematização inicial, porém somente 35% dos estudantes responderam as questões. As respostas apontaram a importância para o corpo/saúde, a relação com reações químicas, referentes ao processo de neutralização entre os ácidos e as bases, marcas de medicamentos e à presença do cotidiano e suas aplicações. Na segunda questão do questionário, os alunos deveriam classificar as substâncias do dia a dia apresentadas como ácidas, básicas ou neutras. E 60% dos alunos acertaram a classificação do suco de limão, vinagre e refrigerante. Cerca de 71% classificou o bicarbonato como ácido e mais de 30% dos alunos classificaram de forma errônea, o leite, leite de magnésia e a água de cal. A terceira questão se referia a qual substância utilizar para neutralizar a ação do ácido no estômago, e mais de 21% dos alunos não responderam. A maioria das respostas (41%) apontou que para neutralizar a acidez no estômago é necessário o uso de uma substância neutra. Alguns afirmaram que buscaram “interpretar” a questão, onde associaram a característica da substância com a palavra “neutralizar”. Contudo, 38% se referiram às substâncias básicas, sendo um dos relatos: “Para neutralizar um ácido não se pode usar uma substância neutra porque o ácido continuará prevalecendo.” A quarta questão sobre “o que fazer para combater o excesso de acidez no estômago?” estimulou respostas relacionadas a ingestão de diferentes substâncias, onde 33,3% relacionou as marcas de medicamentos, 9,6% a substância básicas, 9,5% a substâncias neutras, 19,0% a líquidos citando “sucos, água, chás e leite.”, 3,2% a alimentação saudável e 1,6% afirmam que é necessário “ingerir doces.” Contudo, 23,8% dos alunos não responderam à questão. No segundo momento foi realizado o procedimento experimental e explicação do conteúdo com base nas informações sobre os conhecimentos prévios dos estudantes. O procedimento foi realizado com quantidades pequenas de substâncias, em que foram colocadas duas a três gotas das soluções e uma gota do indicador repolho roxo nas lâminas. Os estudantes observavam a coloração e registravam o pH correspondente com base na cartela de referência das cores do repolho roxo em relação ao pH. Neste momento, houve uma organização dos conhecimentos, onde compartilharam as observações e as hipóteses construídas em equipe, tais como: Grupo 1: “Uma das substâncias, através do cheiro, percebemos que era vinagre, e na tabela ficou com pH 2. Sendo ele ácido, as substâncias que forem classificadas com este pH também serão ácidas.” Grupo 2: “O neutro é o equilíbrio entre os ácidos e as bases, então na tabela ele seria o pH 7?” Grupo 3: “A água é uma substância neutra. Uma das substâncias foi identificada como pH 7, era incolor e sem cheiro, com isso pode ser classificada como água?” Após estes questionamentos realizou-se um procedimento complementar. Este foi com substâncias identificadas, porém, com outro indicador a fenolftaleína. Foram feitos os testes com o vinagre e leite de magnésia e 100% dos alunos classificam como substâncias ácida e básica, respectivamente. Neste momento, os estudantes relataram que a fenolftaleína poderia apresentar a mesma coloração para ácidos e neutros, pois para alguns, o detergente líquido seria ácido e para outros, neutro. Alguns resolveram testar o detergente líquido com o repolho roxo e concluíram que este era neutro, assim como a água. Os estudantes tiveram seu instintos investigativos motivados, pois buscaram outros meios para explicar determinado fenômeno e levantaram suas hipóteses e meios para compará-los. Foi observada a independência dos estudantes durante o experimento, uma vez que faziam suas próprias anotações com discussões entre si, enriquecendo o saber pessoal e social (Figura 2). Para Francisco Jr; Ferreira e Hartwing (2008), os estudantes não estão acostumados a observarem rigorosamente, a fazer anotações e a debatê-las, contudo, a experimentação problematizadora faz-se importante na motivação, tornando-os precursores de sua própria aprendizagem. No terceiro momento foi feita a leitura de um texto reunindo diversas informações divulgadas na mídia a respeito de ácidos e bases. Este texto permitiu uma reflexão quanto à acidez dos alimentos, reações no dia a dia e no organismo. Após as discussões para a sistematização do conhecimento de ácidos e bases, foi aplicado o pós-questionário com uma pergunta semelhante à problematização inicial. Importante ressaltar a diferença entre a quantidade de estudantes que responderam o pré-questionário (35%) e o pós-questionário (91,5%). Além disso, após a intervenção didática, observou-se um enriquecimento nas respostas dos estudantes que ainda relacionaram a ação dos ácidos e bases no organismo e no cotidiano, porém, de forma mais elaborada: “São fundamentais para o organismo, na digestão”; “É importante para o nosso dia, para a nossa saúde, principalmente para quem tem doenças estomacais!”. Observou-se ainda a relação com reações químicas, como pode ser observado nos relatos a seguir, antes e depois da intervenção didática. Antes: “Uma corta o efeito da outra”. Depois: “Para neutralizar um ácido se usa uma base, sendo que os dois formaram um sal, que não tem efeitos corrosivos.” Ainda nesta questão, os estudantes associaram a importância de conhecer o caráter dos ácidos e das bases com a presença no cotidiano e suas aplicações. Antes: “Para o cotidiano é importante conhecer, para identificá-las e usá- las de maneira adequada”; “Estão presentes nos medicamentos”. Depois: “Os ácidos e as bases são substâncias importantes para o cotidiano, pois estão presentes nos produtos de limpeza e beleza, nos alimentos e nas bebidas, porém é necessário conhecê-las, para que sejam usadas adequadamente”. Com esses resultados, ficou claro que houve uma interação dos conhecimentos prévios dos estudantes com aqueles adquiridos durante a intervenção didática. A solidificação das lições antes de introduzir material novo, assegura uma prontidão continuada do assunto e êxito na aprendizagem sequencialmente organizada. Dessa forma, segundo Ausubel (1978), um material novo nunca dever ser introduzido até que todas as etapas prévias tenham sido completamente dominadas, resultando em crescimento e modificação do conceito. Logo, a intervenção didática demonstra que é possível alcançar a aprendizagem significativa através da metodologia adotada, pois os estudantes demonstraram satisfação e alguns afirmaram que: “As aulas deveriam ser sempre assim, tivemos mais liberdade”; “Aprender ácidos e bases voltados para o cotidiano foi bastante produtivo”. É importante também ressaltar a opinião da professora de Química da escola: “Todas as aulas deveriam ser desta forma, porém, temos pouco tempo para planejamentos e desenvolvimento das aulas”. A experimentação problematizadora no estudo de ácidos e bases foi promissora, considerando que proporcionou aos alunos tanto a motivação quanto a aprendizagem, através do contexto dialógico oral e escrito.

FIGURA 01

Kit utilizado na experimentação para o estudo de ácido e base.

FIGURA 02

Estudantes realizando o procedimento experimental, discutindo e anotando as observações.

Conclusões

A experimentação problematizadora contribui com a motivação e a aprendizagem dos estudantes, que são os principais agentes do conhecimento. Um ponto positivo foi a autonomia dos estudantes quanto às suas anotações, compartilhamentos e discussões, enriquecendo o saber pessoal e social. A metodologia adotada foi bem aceita pelos estudantes e professor regente de química, pois retratou a química no dia a dia, por meio de materiais alternativos e envolvendo estudantes através da problematização e investigação. Portanto, os resultados dessa intervenção didática afirmam que a ação problematizadora no estudo de ácidos e bases pode ser uma boa de contribuir para a aprendizagem significativa no ensino de química.

Agradecimentos

À CAPES pelo Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) e pelo apoio financeiro.

Referências

ATKINS, P; JONES, L. Princípios de Química- 5 ed. Porto Alegre: Bookman, 2012.

AUSUBEL, D.P. NOVAK J.D e HANESIAN.H. Psicologia Educacional. 1º ed., Rio de Janeiro: Editora Interamericana, 1978.

BACCAN, N.; Andrade, J. C.; GODINHO, O. E. S.; BARONE, J. S.; Química Analítica Quantitativa Elementar, 2a ed., Campinas: Ed. Unicamp, 1979.

BRASIL, Ministério da educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília: Mec/Semtec. 364p. 2000.

FRANCISCO JUNIOR, W. E; FERREIRA, L H; HARTWIG, D. R. Experimentação Problematizadora: Fundamentos Teóricos para a aplicação em sala de aulas de ciências. Revista química nova na escola. n.30, 2008.

MENEGAZZO, R. C. S; STADLER, R. de C. da L. Indicadores de ácidos e bases: desenvolvendo experiências com materiais alternativos- In: Simpósio de ensino de ciência e tecnologia. Ponta Grossa, PR, 2012

RUSSEL, J. B. Química Geral. 2.ed,-São Paulo: Pearson Makron Books,1994.

SILVA, M.P. da; SANTIAGO, M.A. Proposta para o ensino dos conceitos de ácidos e bases: construindo conceitos através da História da Ciência combinando ao emprego de um software interativo de livre acesso. História da Ciência e ensino, v.5, p. 48-82, 2012.