Compostos isolados de Porcelia ponderosa (Annonaceae) como protótipos para o desenvolvimento de fármacos no tratamento da esquistossomose

ÁREA

Química de Produtos Naturais


Autores

Teixeira, T.R. (UNIVERSIDADE GUARULHOS) ; Cajás, R.A. (UNIVERSIDADE GUARULHOS) ; Souza, D.C.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC) ; Lago, J.H.G. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC) ; de Moraes, J. (UNIVERSIDADE GUARULHOS)


RESUMO

A esquistossomose é uma doença parasitária negligenciada, que afeta milhões de pessoas. O controle e tratamento da doença baseiam-se no uso do fármaco praziquantel, cujo apresenta limitações. Este estudo avaliou a eficácia de compostos derivados de Porcelia ponderosa (Annonaceae) em adultos de Schistosoma mansoni. Identificaram-se dois compostos (1 e 2) com atividade anti-helmíntica, demonstrando potencial terapêutico em concentrações inferiores a 50 µM. Análises in silico revelaram características farmacocinéticas favoráveis, sugerindo a avaliação em modelos animais. Em camundongos infectados, a administração oral resultou em uma redução superior a 50% da carga parasitária. Esses resultados representam um avanço significativo na busca por alternativas terapêuticas para a esquistossomose.


Palavras Chaves

Schistosoma; antiparasitário; produto natural

Introdução

A esquistossomose, uma doença parasitária e negligenciada que afeta cerca de 250 milhões de pessoas em mais de 70 países, é um sério problema de saúde pública, principalmente em regiões tropicais e subtropicais. A Organização Mundial da Saúde (OMS) adotou um plano ambicioso para o controle das doenças negligenciadas até 2030, no qual enfatiza a necessidade de investigar novos agentes anti- helmínticos, com o objetivo de controlar e, eventualmente, erradicar essas doenças como um problema de saúde pública (LAGO et al., 2018; WHO, 2021). O tratamento atualmente utilizado para a esquistossomose é baseado na administração do praziquantel (PZQ), medicamento eficaz, mas que tem suscitado preocupações crescentes em relação ao desenvolvimento de resistência por parte do parasito em algumas regiões. Além disso, têm sido reportadas baixas taxas de cura em diversas regiões, o que ressalta a necessidade de estratégias alternativas na busca por novos agentes terapêuticos (MENGARDA et al., 2022; FERREIRA et al. 2022). Diante desse cenário, a busca por terapias alternativas para o tratamento e controle da esquistossomose torna-se imperativa. A investigação do potencial terapêutico de produtos naturais emerge como uma estratégia promissora. A bioprospecção tem se concentrado principalmente em plantas medicinais, visto que estas apresentam uma ampla variedade de moléculas e têm sido uma fonte confiável de quimioterápicos (MENGARDA et al., 2020). Essa abordagem tem o potencial de oferecer soluções eficazes no combate a doenças parasitárias, e ainda, enriquece o conhecimento sobre as propriedades medicinais de plantas nativas (SANTOS et al., 2021). A família Annonaceae engloba plantas frutíferas de importância econômica, sendo a espécie Porcelia ponderosa encontrada no estado do Acre.


Material e métodos

Os compostos (1 e 2) provenientes de folhas P. ponderosa foram isolados e caracterizados por meio de técnicas cromatográficas e espectrométricas, no Laboratório de Química de Produtos Naturais da Universidade Federal do ABC. O material vegetal foi identificado e depositado em herbário. Para estabelecer e manter o ciclo do parasito, caramujos do gênero Biomphalaria glabrata e camundongos Swiss, foram criados e mantidos em condições laboratoriais no Núcleo de Pesquisa em Doenças Negligenciadas da Universidade de Guarulhos, SP, Brasil (MENGARDA et al., 2020). Para experimentos in vitro, vermes adultos foram coletados após 42 dias da infecção por meio de perfusão dos animais previamente infectados. Em seguida, um macho e uma fêmea foram alocados em placas de 24 poços, contendo meio RPMI 1640 tamponado com HEPES 25 mM, antibióticos e soro fetal bovino. Os parasitos foram posteriormente expostos a diferentes concentrações (50, 25 e 12,5 µM) dos compostos e incubados em estufa. Os testes foram realizados em triplicata e monitorados por até 72 horas por microscopia (XAVIER, 2020). As análises in silico envolveram a obtenção de parâmetros físico-químicos e propriedades farmacocinéticas por meio da plataforma SwissADME (http://www.swissadme.ch/index.php) (FERREIRA et al., 2022; DAINA, 2017). Nas análises in vivo, os camundongos previamente infectados com S. mansoni por via subcutânea, tiveram a administração dos compostos em dose única oral (400 mg/kg) para tratamento. Grupo de animais infectados e tratados somente com o veículo foram usados como controle. Todos os grupos experimentais de animais foram eutanasiados no 56º dia após a infecção. A eficácia terapêutica foi avaliada qualitativamente e quantitativamente por oogramas e pelo método de Kato-Katz (SILVA et al., 2017).


Resultado e discussão

Ao ser incubado junto aos parasitos na concentração de 50 µM, os compostos 1 e 2 demonstraram redução significativa na atividade motora, ambos resultando na morte de 30% dos parasitos machos em 24 horas e 100% em 48 horas. Para fêmeas, observou-se uma redução de 30% na atividade motora em 48 horas, com 100% de mortalidade em 72 horas. Diante da atividade inicial, a concentração foi reduzida para 25 e 12,5 µM, e o padrão de mortalidade e redução na motilidade foi mantido. Os compostos foram avaliados in silico para suas propriedades físico-químicas, farmacocinéticas e semelhança com fármacos. Os resultados são representados na Tabela 1 e Tabela 2. A análise computacional mostrou que os compostos atenderam aos parâmetros avaliados, ambos mostrando uma boa aderência aos parâmetros, incluindo absorção gastrointestinal e a avaliação das isoenzimas associadas ao citocromo, inferiram que os compostos não possuem características de moléculas promíscuas. Vale ressaltar, que a análise não detectou a presença de Compostos de Interferência Pan-Ensaios (PAINS) nos compostos (Tabela 1). A propriedades fármaco-similar (drug-like) dos compostos 1 e 2 foi avaliada por filtros computacionais comumente usados pelas principais empresas farmacêuticas. Como mostrado na Tabela 2, os compostos atenderam os dispositivos constantes na regra de Lipinski (Pfizer). Na avaliação da eficácia in vivo de 1 e 2, observou-se uma redução de 60% da carga parasitária em comparação com os grupos controles infectados e tratados apenas com veículos.

Tabela 1

Propriedades físico-químicas e farmacocinéticas para \r\nos compostos isolados de P. ponderosa.

Tabela 2

Propriedades de semelhança com fármacos.

Conclusões

Este estudo ressalta o potencial terapêutico dos compostos de P. ponderosa contra o S. mansoni. Em testes in vitro, esses produtos naturais reduziram a atividade motora e causaram a morte de vermes machos e fêmeas. Análises in silico indicaram propriedades físico-químicas e farmacocinéticas favoráveis. Em estudos in vivo, houve significativa redução na carga parasitária. Embora sejam necessárias pesquisas para confirmar eficácia e segurança, esses resultados sugerem que os compostos de P. ponderosa podem ser uma alternativa promissora para o tratamento e controle de helmintíases.


Agradecimentos

Esta pesquisa foi realizada com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). TRT agradece à CAPES pela Bolsa de Doutorado e pelo apoio concedido.


Referências

DAINA, A.; MICHIELIN, O.; ZOETE, V. SwissADME: A free web tool to evaluate pharmacokinetics, drug-likeness, and medicinal chemistry friendliness of small molecules. Scientific Reports, v. 7, p. 42717, 2017.
FERREIRA, L. L. G.; DE MORAES, J.; ANDRICOPULO, A. D. Approaches to advance drug discovery for neglected tropical diseases. Drug Discovery Today, v. 27, n. 8,2022.
MENGARDA, A. C. et al. Antiparasitic activity of piplartine (piperlongumine) in a mouse model of schistosomiasis. Acta Tropica, v. 105350, 2020.
MENGARDA, A. C. et al. Recent trends in praziquantel nanoformulations for helminthiasis treatment. Expert Opinion on Drug Delivery, v. 19, p. 383-393, 2022.
SANTOS, T. S. et al. In vitro and in silico evaluation of the antischistosomal activity of Porcelia ponderosa fruit extract. Journal of Ethnopharmacology, v. 267, p. 113572, 2021.
SILVA, M. P. et al. Antiparasitic activity of nerolidol in a mouse model of schistosomiasis. International Journal of Antimicrobial Agents, v. 50, n. 3, p. 467-472, 2017.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. A road map for neglected tropical diseases 2021–2030. Disponível em: <https://www.who.int/publications/i/item/9789240010352>. Acesso em: [data de acesso].
XAVIER, R. P. et al. H1-antihistamines as antischistosomal drugs: in vitro and in vivo studies. Parasites & Vectors, v. 13, n. 1, p. 278, 2020.

PATROCINADORES

CFQ PERKINELMER ACMA LABS BLUCHER SEBRAE CRQ XV CAMISETA FEITA DE PET LUCK RECEPTIVO

APOIO

UFRN UFERSA IFRN PPGQ IQ-UFRN Governo do Estado do Rio Grande do Norte Natal Convention Bureau Nexa RN