O uso de metodologia ativa por meio de um jogo de tabuleiro: estratégia pedagógica para o ensino de química.

ÁREA

Ensino de Química


Autores

Ferreira, A.D. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Souza, J.P.I. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ)


RESUMO

No ensino de Química, a presença de atividades lúdicas está ganhando cada mais espaço como materiais didáticos que, aplicados no processo de ensino e aprendizagem, auxiliam na construção do conhecimento. Em vista disto, este trabalho foi desenvolvido a partir da criação de um jogo de tabuleiro e tem como objetivo investigar as contribuições desse jogo no ensino e aprendizagem do conteúdo de Estequiometria. Para isso, afim de testa-lo como uma ferramenta de aprendizagem, uma pesquisa foi realizada em duas turmas de 2º ano do ensino médio de uma Escola Estadual situada na capital do Pará. Para obtenção dos dados foram utilizados um questionário, a observação direta sobre a aplicação do jogo e trechos de entrevistas com os alunos participantes. E os resultados expressos em gráficos.


Palavras Chaves

Ensino de química; Jogo didático; Estequiometria

Introdução

O avanço tecnológico e informacional trouxe consigo algumas notórias mudanças no ambiente escolar. O conglomerado de informações que chegam e saem dentre os alunos seria impossível de ser idealizada se pensássemos nessa ideia a alguns séculos atrás. Por outro lado, alguns estudiosos acreditam que essa facilidade em obter informação trouxe consigo algumas problemáticas dentro da sala de aula como a falta de interesse dos estudantes pelos assuntos abordados. Segundo Sales et al. (2020), a sala de aula, nesse contexto, já não é mais tão estimulante quanto antes. As aulas tradicionais, carregadas de informações faladas, já não são tão significativas, e não conseguem atender a todos os estudantes de uma mesma turma, não que elas sejam ruins, pois parte da atual geração foi formada nesse modelo de ensino. Em vista disto, os modelos de ensino-aprendizagem tiveram que se adaptar afim de se adequar as novas diretrizes impostas por esse avanço tecnológico. Diante desse cenário, torna-se importante buscar novas maneiras de se construir o conhecimento e este trabalho aborda uma dessas maneiras que é a utilização do lúdico como ferramenta auxiliadora. Para Bruner (1969), o interesse expresso através da curiosidade é um elemento gerador da aprendizagem, desde que se permita ao sujeito uma análise profunda do conceito. Isso mostra que a atividade lúdica dentro da sala de aula desperta a curiosidade dos alunos. Outro autor também relata “[...] que a aprendizagem que decorre do ato de brincar é evidente, sendo muito claro para o autor que o jogo não exercita apenas os músculos, mas a inteligência.” CHATEAU (1984). Assim, foi elaborado um jogo de tabuleiro para auxiliar alunos do 2º ano do ensino médio, de uma escola situada em Belém, afim de se obter uma melhoria no processo ensino-aprendizagem. Com essa abordagem didática procura-se desmistificar a ideia de que a química é uma disciplina sem sentido. Sendo assim, [...] grande parte das dificuldades dos alunos em aprender química é devido ao modo como ela é apresentada aos alunos, que na maioria das vezes é importada como uma disciplina que necessita de memorização, o que torna chato para os alunos e acaba criando barreiras entre as disciplinas e os alunos (SILVA e GUERRA, 2016, p. 15). O jogo desenvolvido foi testado em uma turma, tomando como base para fins comparativos uma segunda turma. Nesse sentido, o jogo foi desenvolvido, aplicado e avaliado como método de intervenção didática.


Material e métodos

Esta pesquisa de natureza qualitativa e do tipo explicativa ou causal, foi desenvolvida a partir da criação de um jogo didático voltado para alunos do 2º ano do ensino médio da escola Albanízia de Oliveira Lima. Cujo objetivo é “estabelecer relações de causa-efeito por meio da manipulação direta das variáveis relativas ao objeto de estudo, buscando identificar as causas do fenômeno.” (LAKATOS e MARCONI, 2001). Segundo Malhotra (2001), forma-se um experimento quando uma ou mais variáveis independentes são manipuladas ou controladas pelo pesquisador, medindo-se seu efeito sobre uma ou mais variáveis dependentes. Assim, para a avaliação deste mecanismo de aprendizagem, foram divididas algumas etapas, sendo elas: SORTEIO Afim de se obter maior fidedignidade nos resultados desta, foram realizados sorteios para selecionar as turmas participantes do processo. Assim, o primeiro sorteio foi feito dentre as três turmas do 2º ano (205, 204 e 203) selecionando uma para a participação da pesquisa como material de estudo de aplicação do jogo e outra como material de análise comparativa aplicando o conteúdo em sala. Então, a turma 204 foi retirada do processo de pesquisa por não ter sido sorteada. Dentre as turmas 205 e 203, foi feito um novo sorteio para que definisse em qual delas seria aplicado o jogo e qual seria avaliada somente com a ministração do conteúdo em sala. Por conseguinte, a turma 205 foi sorteada para ser material de estudo do jogo a ser aplicado e nomeada de turma do jogo (TJ), e a turma 203 como material de análise comparativa, nomeada de turma sem o jogo (TSJ). QUESTIONÁRIO Para determinar o nível de eficácia do respectivo jogo, foi desenvolvido um questionário com questões retiradas das próprias cartas do jogo “GameQuí” para avaliar a aprendizagem do conteúdo trabalhado, o desempenho e a qualidade do jogo. Em vista disto, em uma aula anterior a realização do jogo, foi aplicado o questionário nas turmas TJ e TSJ. Esse referido questionário foi desenvolvido com perguntas fechadas ligadas diretamente ao objetivo do jogo e direcionadas para uma vertente única que baseou-se em medir a eficácia do mesmo quanto ao ensino-aprendizagem. Assim, quanto a diferença do direcionamento de perguntas, “as abertas possibilitam respostas mais ricas e variadas e as fechadas maior facilidade na tabulação e análise dos dados.” (OLIVEIRA, 2001, p.37). Esse questionário foi aplicado em dois momentos da pesquisa afim de comparar os dados obtidos a partir da intervenção do jogo como material de ensino-aprendizagem. Entretanto, a formulação das questões foi alterada do primeiro questionário para o segundo sem que se perdesse a “linha de raciocínio” das mesmas quanto a sua originalidade. ELABORAÇÃO DO JOGO O jogo é constituído por um tabuleiro, um dado, 5 peões e 3 cores de cartas. Ele pode ser jogado em grupo e sua finalidade é chegar com o peão ao fim do percurso do tabuleiro. Para isso, os grupos precisarão responder perguntas e desenvolver respostas nos desafios.


Resultado e discussão

Durante o percurso do jogo, os alunos mostraram grande interesse e concentração, o que diferia das aulas usuais onde a concentração por parte dos mesmos era mínima, o que se acredita ter relação com a falta de interesse por parte dos alunos com os assuntos ministrados. A competição entre as equipes encorajou-os ainda mais a desenvolver as atividades propostas pela dinâmica do jogo “GameQuí”, vale ressaltar que essa mesma competição foi inteiramente saudável e estimulante, havendo cooperação entre os integrantes de cada grupo. Foi possível perceber também que o confronto entre as equipes instigava os participantes a se atentarem aos mínimos detalhes de cada resposta desenvolvida como: pontuação, numeração, interpretação etc. Essa percepção levou os professores organizadores da pesquisa a compreenderem mais sobre a capacidade cognitiva dos participantes. Ao diagnosticar moléculas ou elementos químicos, eles apresentaram percepções adquiridas na aula teórica. Estes aspectos discutidos em sala como molaridade, balanceamento, regra de três, serviram de esquema de assimilação para correlacionar o que se pedia nas questões do jogo. Em entrevista com um dos alunos, foi possível observar o aspecto motivacional associado ao jogo: “Pra ser sincero, a química é uma disciplina fácil, mas por algum motivo, alguns professores a deixam difícil com suas explicações mirabolantes e complexas. Se todas as aulas fossem assim, a química seria mais interessante.” Foi possível observar na fala do aluno, uma aprovação do jogo como material didático e sua indignação quanto ao atual modelo de ensino empregado nas escolas. Isso mostra que a presença do lúdico no processo de ensino-aprendizagem é percebida como algo benéfico para os alunos, despertando um maior interesse pela aprendizagem. Em dado momento do jogo, outro aluno mencionou: “Esse jogo é perfeito pra gente aprender estequiometria e qualquer outro assunto. Dá pra revisar também assuntos pra prova”. Mais uma vez, essa fala revela a percepção positiva que os alunos tiveram em relação a atividade realizada. Outros alunos também se pronunciaram sobre a utilização do jogo em sala de aula, como: “Eu amei o jogo, professor”; “o jogo é muito bom. Dá pra aprender jogando”; “Na próxima aula podemos jogar novamente?”; “esse jogo é seu, professor? Prefiro ele do que aulas normais”. Vale ressaltar que o jogo “GameQuí” não se trata apenas de um jogo de sorte ou azar, ele requer atenção, raciocínio e habilidade dos jogadores quanto ao assunto cobrado nas questões. Em vista disto, a utilização do jogo mostrou ser um recurso didático relevante para o ensino-aprendizagem. Para Soares (2013), os processos de ensino e aprendizagem podem ocorrer de forma prazerosa e divertida, pois sempre que possível, o professor pode inserir no seu plano de trabalho estratégias que abordem os conteúdos, e conceitos químicos desta forma. O questionário aplicado nas duas turmas antes da realização do jogo, teve como resultado um baixo índice de acertos, entretanto observou-se que a média de acertos das questões eram praticamente iguais, se comparadas, as duas turmas. Na turma em que o jogo foi aplicado (TJ), por exemplo, tem-se os resultados expresso em gráfico. Já na turma em que o conteúdo foi desenvolvido apenas no quadro (TSJ), como nas formas mais comuns de ensino, os resultados mostraram que as duas turmas estavam equiparadas quanto ao nível de conhecimento prévio sobre o assunto abordado. Isso nos mostrou que ambas as turmas estavam com um nível de conhecimento parcialmente iguais, o que favorece a avaliação do jogo como material de ensino- aprendizagem. Após esses primeiros resultados, na turma TSJ foi ministrado o assunto de Estequiometria desde seus conceitos como: Massa molar, Regra de três, Molaridade, Unidade de medidas etc, conceituando os assuntos, dando exemplos dos mesmos e resolvendo exercícios. Foi observado que uma parte da turma conseguiu desenvolver as atividades e interagir com o professor. Assim, na aula seguinte foi aplicado o segundo questionário para avaliar o nível de aprendizagem dos alunos e os resultados obtidos estão expressos em gráfico. Assim, é possível observar que a turma teve um avanço significativo se comparado aos dados de antes da aula, o que indica que a intervenção do professor influenciou na aprendizagem da turma. Na turma TJ, o assunto de estequiometria também foi ministrado como na turma TSJ, com os mesmos aspectos estabelecidos, mesmos conceitos, mesmos exemplos e mesmos exercícios, em outras palavras, seguindo o mesmo plano de aula estabelecido para ambas. Entretanto, na turma TJ foi separado um momento para que a aplicação do jogo fosse realizada. Os resultados do 2º questionário aplicado a esta turma são mostrados no gráfico. A análise do gráfico mostra claramente um aumento significativo no número de acertos, tanto em relação ao primeiro questionário, quanto em relação à turma TSJ. Com base nos resultados obtidos, é possível concluir que a aplicação do jogo teve um efeito positivo na aprendizagem da turma TJ. De forma indireta, os resultados indicam que é possível ensinar os conceitos de química de forma prazerosa para os alunos. É possível concluir que o jogo aplicado se apresentou como um recurso didático eficaz, cuja realização na sala de aula despertou o interesse dos estudantes, auxiliando no seu desenvolvimento socioemocional e na sua aprendizagem de conceitos associados à estequiometria. Ressalta-se ainda, que a proposta de jogo apresentada nessa pesquisa pode, também, ser utilizada em outras áreas do conhecimento dentro e fora da química. Esta proposta de jogo foi desenvolvida para atender uma dificuldade apresentada pelos alunos que foram mencionados acima. Entretanto, é possível utilizar o jogo “GameQuí” para outras áreas da Química.

Gráfico 1

Gráficos de acertos do 1º questionário aplicado na \r\nturma (TJ).

Gráfico 2

Gráficos de acertos do 2º questionário aplicado na \r\nturma (TJ) após aplicação do jogo como intervenção \r\ndidática.

Conclusões

Segundo Domingues e Recena (2010), a observação do comportamento espontâneo dos alunos provocado pela situação problema de planejar e elaborar jogos para a aprendizagem em química, constituiu-se em uma experiência lúdica para a maioria dos alunos. O diálogo entre o professor e os alunos e entre os alunos, tornou possível a observação de esquemas representativos do desenvolvimento mental ao confeccionar os jogos, e caracterizou-se pela fluidez e interação. A proposta desenvolvida neste trabalho excitou nos alunos alguns requisitos básicos para um desenvolvimento educacional significativo. Eles demonstraram interesse em buscar mais informações sobre a temática abordada nas aulas resgatando conceitos prévios promovendo interação com conhecimentos já incorporados. Os jogos num todo, possibilitam o desenvolvimento de algumas habilidades sociais e até mesmo afetivas, e assim eles foram se configurando um recurso importante no âmbito escolar. Com isso, com o objetivo da pesquisa de investigar o impacto gerado pelo jogo dentro de uma aula de química no 2º ano do ensino médio, percebeu-se que o entusiasmo gerado pelo jogo provocou a compreensão de saberes, acerca do conteúdo, ocorreu de forma espontânea e descontraída. Além disso, a aplicação do jogo, como atividade lúdica, trouxe ineditismo ao dia a dia escolar deles. Uma vez que a rotina encontrada nas salas de aula por parte dos alunos é marcada por falta de motivação e ausência de metodologias ativas de aprendizagem, principalmente nas aulas de química. Por fim, o jogo “GameQuí” teve uma boa aceitação pelos alunos e os resultados de testes conceituais apontaram que a sua aplicação teve um efeito positivo na aprendizagem dos alunos, o que indica que seu uso em sala de aula pode ser uma alternativa interessante para o ensino de estequiometria no ensino médio.


Agradecimentos

A Deus pela sabedoria proveniente dEle, a E.E.E.M Albanízia de Oliveira Lima pela hospitalidade, ao prof: Dr. José Pio pela parceria de sempre, a Profa: Dra. Ivanilce Costa pelo apoio, ao Programa Residência Pedagógica - CAPE


Referências

1. SALES, M. F.; et al. Jornada radioativa: um jogo de tabuleiro para o ensino de radioatividade; Revista Eletrônica Ludus Scientiae: Foz do Iguaçu; v. 4; n. 2; p. 74-87; ago./dez., 2020.
2. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos metodologia científica; 4.ed. São Paulo: Atlas, 2001.
3. MALHOTRA, N.; Pesquisa de marketing; 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.
4. DOMINGOS, D. C. A.; RECENA, M. C. P.; Jogos didáticos no processo de ensino e aprendizagem de química: a construção do conhecimento. Ciências & cognição, v. 15, n. 1, p. 272-281, 2010.
5. CHATEAU, J. O jogo e a criança. Trad. G. de Almeida. São Paulo: Summus Editora, 1984.
6. BRUNER, J.; Uma nova teoria de Aprendizagem. Nora Levy Ribeiro, Rio de Janeiro, Bloch Editores, 2a . Ed., 1969.
7. SILVA, P. S. S.; GUERRA, E. C. S. Jogos Didáticos Como Ferramenta Facilitadora no Ensino de Química. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação). Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás. Campus Inhumas. Curso de Licenciatura em Química, 2016.
8. SOARES, M. H. F. B. Jogos e atividades lúdicas para o ensino de química. Goiânia: Kelps, v. 196, 2013.
9. OLIVEIRA, M. F; Metodologia científica: um manual para a realização de pesquisas em administração; Catalão: UFG, 2001.

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