ÁGUA SUPERCRÍTICA APLICADA NO TRATAMENTO DE EFLUENTES DE INDUSTRIAS DE EDULCORANTES

ÁREA

Química Ambiental


Autores

Botelho de Oliveira, S. (IFG-CAMPUS GOIÂNIA) ; Pacheco da Silva, C. (IFG-CAMPUS GOIÂNIA) ; Pereira Barbosa, D. (PUC-GOIÁS) ; Milhomem, I. (UFG) ; Gonçalves Alonso, C. (UFG)


RESUMO

A SCWO é promissora para a degradação/oxidação de efluentes de edulcorantes artificiais, aplicados em alimentos, bebidas e fármacos, se tornando um problema na geração de efluentes. Este trabalho visa o uso de SCWO no tratamento desses efluentes em fluxo contínuo. Caracterização e testes de tratabilidade: 400 - 700 °C, 240 e 260bar, DQO e o COT em 13.285 mgO2.L-1 e 675 mg.L-1, fluxos 10 , 15 e 20 mL.min-1, tempo de detenção 20min por patamar de temperatura. Resultados mostraram eficiência na redução das concentrações do acessulfame 99%, sacarina 100% e ciclamato 98%.


Palavras Chaves

SCWO; Edulcorantes; Adoçantes artificiais

Introdução

Segundo o relatório mundial das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos, em todos os países, com exceção dos mais desenvolvidos, a maioria absoluta das águas residuais é lançada diretamente no meio ambiente sem tratamento adequado, causando efeitos danosos à saúde humana e ao meio ambiente. O descarte inadequado dos resíduos sólidos, a ineficiência das Estações de Tratamento de Esgotos e o lançamento de esgoto in natura nos corpos hídricos, são os fatores que mais contribuem para a entrada dos poluentes emergentes no meio ambiente (ANA, 2017a; WWAP, 2017). Os poluentes ou contaminantes emergentes referem-se a quaisquer compostos químicos naturais ou sintéticos, orgânicos e inorgânicos, presentes numa variedade de produtos comerciais como medicamentos, produtos de uso veterinário, embalagens de alimentos, produtos de higiene, edulcorantes, agrotóxicos, etc. (MONTEIRO et al., 2016; CHEN et al., 2018). Edulcorantes ou adoçantes são compostos, que podem ser de origem natural ou sintética, são substitutos do açúcar e usados nas indústrias alimentícias, farmacêuticos e produtos para cuidados pessoais. Os edulcorantes têm sido reconhecidos como um contaminante emergente, devido a sua persistência no ambiente possuindo característica recalcitrante, com ocorrência ubíqua, além de ainda não possuir regulação ambiental de sua disposição no meio ambiente, tendo um especial complicador, que é basicamente o aumento do consumo desses produtos, uma vez que o mesmo são substâncias que apresentam baixo ou nenhum valor energético, pelo fato de não serem metabolizadas pelo organismo humano, fazendo com que esses produtos sejam excretados praticamente íntegros (MONTAGNER et al., 2017). Estudos de monitoramento indicam que existem quantidades residuais dos edulcorantes acessulfame de potássio, ciclamato de sódio, sacarina de sódio e aspartame, nas águas superficiais, por ex. lagos, rios e águas costeiras. Um exemplo de fonte de sacarina são certos herbicidas sulfoniluréias, que tornam a sacarina como principal produto de degradação no solo (BUERGE et al., 2011; ROBERTS E HUTSON, 1998). De acordo com OECD-FAO Agricultural Outlook (Edition 2021), no mundo entre 2018 e 2020, foi consumido 23 kg de adoçantes por pessoal, a projeção é que para 2030 esse valor passe para 25 kg de adoçantes por pessoal (OECD-FAO, 2021). Uma concentração extremamente alta de aspartame é usada na indústria de alimentos (até 5602 mg/kg) na Coréia (M.-S. HÁ ET AL., 2013). Aspartame representa o maior segmento de produtos de adoçantes artificiais globalmente, é o adoçante artificial mais popular nos EUA e é usado em mais de 6.000 produtos alimentícios (MYERS R. L., 2007). Apesar de os Processos de Oxidação Avançados (POA) serem considerados como tecnologia de tratamento de água adequada para a remoção dos poluentes orgânicos não tratáveis por outras técnicas convencionais devido à sua alta estabilidade química e / ou baixa biodegradabilidade (OLLER et al., 2010), os tratamentos utilizando oxidação avançada, baseiam-se na geração de uma espécie transitória de elevado poder oxidante capaz de degradar os contaminantes, propiciando a sua completa mineralização na maioria dos casos. Algumas soluções de oxidação avançada foram empregadas no efluente de edulcorantes como a reação com Fenton, adição de Fentox, ozonização e utilização de fotocatálise com adição de dióxido de titânio, onde esses processos não se mostraram eficientes na degradação dos contaminantes. Uma alternativa de tratamento do efluente é a oxidação em água supercrítica com a utilização de reatores (SCWO). A oxidação supercrítica é uma tecnologia avançada que começou a despertar interesse como alternativa para o tratamento de efluentes bem como na geração de gases, uma vez que o processo de oxidação em água supercrítico é um processo de oxidação avançada (POA) (RIBEIRO, 2021). A tecnologia é baseada nas propriedades físico-químicas da água em condições de elevada temperatura e pressão, ou seja, acima do seu ponto crítico. Essa manipulação do ponto crítico da água faz com que o processo oxidativo seja muito elevado causando assim, a degradação da matéria orgânica presente nos efluentes, resultando assim um efluente tratado e a geração de gases, principalmente H2, CO, CO2 e CH4, gases esses que podem ser aproveitados em outros processos como geração de energia, sínteses químicas, etc (RIBEIRO, 2021).


Material e métodos

A amostragem do efluente foi realizado no tanque de efluente bruto da indústria, antes de ser encaminhado para as etapas de tratamento de equalização (adição de alcalinizante), aeração (adição de ureia, antiespumante e ácido fosfórico), sedimentação, filtração (areia) e, por fim, nanofiltração com posterior desinfecção. O efluente bruto foi analisado, tendo os resultados comparados aos valores estabelecidos na Resolução CONAMA nº 430 e RESOLUÇÃO Nº 068 /2009 da Agência Goiana de Regulação (AGR). Foram realizadas análises de COT das amostras do tratamento SCWO, com auxílio do analisador TOC Shimadzu, COT-L. A quantificação dos metais foi realizada por ICP-OES, Perkin Elmer 7300 DV. A quantificação de nitrato foi realizada por espectroscopia de absorção molecular UV-VIS (PerkinElmer, 365), método de redução em coluna de cádmio SMWW 4500-NO3 E. As análises de quantificação dos edulcorantes foram realizadas por CLAE, Young Lin YL9100HPLC, coluna C18 250 mm x 4,6 mm partícula 5 µm, detector UV-VIS. Os comprimentos de onda utilizados foram 192 nm para a sacarina sódica, ciclamato de sódio e o aspartame e em 227 nm o acessulfame de potássio, fase móvel solução de tampão fosfato 0,05M e acetonitrila (90:10) com vazão de 0,8 mL min-1. O estudo de SCWO foi realizado conforme o esquema do aparato experimental de um dos Reatores e Processos Catalíticos - UFG, utilizado para o tratamento e gaseificação do efluente, composto por um reator de fluxo contínuo construído em Inconel 625, pré-aquecedor, condensador e tubulações, construídos em aço inoxidável 316. O reator usado é semelhante a vários outros sistemas relatados na literatura (CASADEMONT et al., 2018; FERREIRA-PINTO et al., 2015). As reações de oxidação da matéria orgânica presente no efluente de uma indústria de edulcorantes foram realizadas em uma faixa de temperatura de 400 - 700 °C, pressão 1,72 Mpa ou 260 bar, com fluxo de alimentação foi se 10 mL min-1, 15 mL min-1 e 20 mL min-1 com tempo médio de retenção de 20 min para cada condição do estudo, vazão de alimentação e temperatura do reator.


Resultado e discussão

Os experimentos no reator SCWO foi realizado conforme o esquema do aparato experimental de um dos Reatores e Processos Catalíticos – UFG (Figura 1). Após o tratamento, o efluente apresentou uma elevação no pH em relação ao efluente bruto, passando de 6,37 até 8,45 a uma vazão de 20 mL min-1 e a 400 °C, essa elevação do pH pode ser em decorrência do processo de geração de CO2 e um possível deslocamento da reação na geração de carbonatos. Foi observado também a redução da condutividade elétrica que na amostra bruta apresentava valor de 2.490 µS cm-1, sendo que houve uma redução até 776 µS cm-1 a 600 °C na vazão de 15 mL min-1. A redução da condutividade está relacionada diretamente ao processo de mineralização e acumulo de sedimento no reator, uma vez que compostos inorgânicos reduzem a solubilidade no estado supercrítico. O sódio está presente na sacarina sódica e no ciclamato de sódio, já o potássio está presente no acessulfame de potássio, fato este que os resultados da análise do sódio e potássio servem como guia para evidenciar que está ocorrendo a oxidação dos compostos devido a característica do método de tratamento escolhido. Este tipo de tratamento promove a mineralização de compostos inorgânicos no próprio reator, promovendo sua deposição, gerando entupimento do reator, o que ocasionou o desmonte do mesmo 3 vezes. Na contramão do que foi observado com os metais, de acordo com que a decomposição da matéria orgânica aumenta, houve aumento da concentração de nitrato, este fato se dá pela presença do nitrogênio na estrutura molecular dos edulcorantes. Como o processo de água em condição supercrítica é um processo oxidativo energético, as formas nitrogenadas oxidam formando o nitrato dissolvido no efluente tratado. É importante destacar que apesar do aumento da disponibilidade do nitrato no efluente tratado, os valores não são suficientemente altos que caracterize o efluente como impróprio para lançamento em corpo d’água superficial ou rede coletora de efluente. Os resultados analíticos evidenciam que o efluente possui elevada carga orgânica, conforme resultados de DQO (13.285 mg O2 L-1), DBO (7.642 mg O2 L-1) e COT (675 mg L-1), dados que são relevantes e previsíveis por se tratar de um efluente bruto e que necessita de tratamento para seu lançamento. Mesmo com resultados de eficiência de remoção acima de 80%, os valores de concentração DQO se mantiveram acima do limite permitido pela legislação, uma vez que o valor máximo para lançamento do efluente em rede de coleta de efluentes sanitários e industriais da SANEAGO e Resolução da AGR é de 450 mg L- 1, a menor concentração de DQO se deu na temperatura de 700 °C com vazão mássica de 10 mL min-1, uma DQO de 771,00 mg L-1, isso ocorre devido ao maior tempo de permanência do efluente no interior do reator, uma vez que com a vazão de alimentação menor, o efluente fica mais tempo em condições supercríticas. Os resultados de COT também apresentaram comportamento de redução das concentrações e consequente aumento da eficiência de remoção com o aumento da temperatura e da vazão de alimentação do reator, conforme (Figura 2). Essa consonância entre os dados de DQO e COT é favorável à sugestão de uma condição a ser otimizada para melhorar a eficiência do tratamento, sendo que esta condição mais otimizado são de maior vazão de alimentação e maior temperatura. A elevação da temperatura do meio reacional também proporciona um aumento na ocorrência de radicais hidroxilas, o que favorece a dissolução de compostos orgânicos e sua posterior degradação (OKOLIE et al., 2019). Os dados relatados corroboram com a relação experimentalmente observada de temperatura e redução de COT neste trabalho (QIAN et al., 2019). O acessulfame (potássio 6-metil-1,2,3-oxatiazina-4(3H)-ona-2,2-dióxido), apresentou o maior concentração a 450 °C e 15 mL min-1, 11,54 mg L-1, tendo este um comportamento anômalo se comparado com os resultados de DQO, COT e nitrato, uma vez que há um pico de concentrações na temperatura de 450 °C e posteriormente, conforme a temperatura e a vazão de alimentação vão aumentando, as concentrações vão reduzindo, chegando a uma eficiência de remoção de acessulfame de potássio de 99%. A imida o-sulfobenzóica, ou sacarina sódica, apresentou um comportamento mais previsível do que o acessulfame de potássio, uma vez que com o aumento da temperatura e vazão de alimentação, a eficiência aumenta, consequentemente reduz a concentração do analito, chegando a 100% de eficiência de remoção a 700 °C com vazão de 10 mL min-1. O ciclamato de sódio ou N-ciclo-hexil-sulfamato de sódio, apresentou um comportamento tão anômalo quanto o acessulfame de potássio, uma vez que na temperatura de 450 °C ocorreu uma elevação na concentração e posteriormente de acordo com a elevação de temperatura e vazão de alimentação. Essas anomalias monstram que os resultados vão flutuando dependendo das condições de tratamento que são empregados, não podendo ser estabelecido apenas uma temperatura e vazão de alimentação como situação ótima. Posteriormente à preparação das amostras sintéticas, as mesmas foram submetidas ao tratamento em água em condição supercrítica, onde foi adotado as temperaturas extremas, 400 °C e 700 °C e as 3 vazões de alimentação, 10 mL min-1, 15 mL min-1 e 20 mL min-1, e foram avaliados os valores de eficiência de remoção de COT, DQO e a redução de aspartame. Os experimentos levaram a resultado importante da redução das concentrações de edulcorantes no efluente, como no caso do acessulfame de potássio que teve eficiência de redução de 99%, a sacarina sódica que teve eficiência de redução de 100%, o ciclamato de sódio que teve eficiência de redução de 98%. Para o aspartame, os resultados complementares confirmaram as suspeitas, apesar do tratamento com água em condições supercríticas terem se demostrado eficiente para a remoção genérica da maioria dos compostos orgânicos presentes na amostra bruta nas condições de operação das maiores temperaturas e vazão de alimentação, para o aspartame, esta regra não se demonstrou eficiente. Os resultados demostram que quanto maior a temperatura e a vazão de alimentação, menor é a eficiência de remoção, contudo, estes resultados evidenciam que é possível remover o aspartame por tratamento do efluente em água no estado supercrítico, pois a melhor eficiência de remoção do mesmo (95%) foi numa vazão de 20 mL min-1, temperatura 400 ºC. Conforme é sabido, as vias de reação envolvidas durante o tratamento por água em condição supercrítica da matéria orgânica, há a formação de álcoois, compostos aromáticos, aldeídos e cetonas, podendo assim, formar compostos desconhecidos que apresentam o mesmo comportamento analítico da determinação do aspartame, uma vez que a análise por CLAE não consegue elevada seletividade. Para a identificação e possível quantificação efetiva dos compostos gerados no processo seria a análise por Cromatografia Líquida de Alta Eficiência acoplada a Espectrometria de Massas Sequencial (LC-MS/MS), que é a técnica analítica que consegue melhor identificação.

Figura 1 - Modelo esquemático simplificado da unidade experimental de

Reator SCWO de fluxo contínuo construído em Inconel \r\n625, pré-aquecedor, condensador e tubulações, \r\nconstruídos em aço inoxidável 316

Figura 2 – Efeito da temperatura na eficiência de Remoção de COT

Figura 2 – Efeito da temperatura na eficiência de \r\nRemoção de COT

Conclusões

Por meio desse trabalho foi possível que o efluente tratado por SCWO atende aos limites estabelecidos em requisito legal, com a redução de DQO e COT, tendo em vista a possibilidade de tratar efluente reduzindo compostos orgânicos. No que se tange a produção de gases com proposito energético, apresentou baixa viabilidade na geração de gases combustíveis. A oxidação em água supercrítica para tratamento de resíduos é uma tecnologia promissora que consegue promover a oxidação de compostos orgânicos com eficiência, apresentando para DQO uma remoção acima de 90% e COT com remoção acima de 82% a 10 mL.min-1 e 700 °C, além de gerar gases combustíveis, contudo, como toda tecnologia em fase de maturação, apresenta alguns problemas como o entupimento do reatores devido a redução da solubilidade de inorgânicos, além da necessidade de se avaliar os custos energéticos da operação, que podem impedir uma expansão industrial do processo. É importante destacar que a DQO sendo um parâmetro chave para lançamento de efluentes em redes coletoras de esgotos de empresas concessionárias de saneamento, no caso de Goiânia, Goiás é a SANEAGO, os valores apresentaram com eficiência de remoção superior a 80% para todas as temperaturas de gaseificação e vazões de alimentação demonstra que é possível o lançamento do efluente alvo deste trabalho nas redes coletoras. Esses resultados, somados aos demais parâmetros físico-químicos analisados, mostram a possibilidade de reuso industrial após o tratamento. O sistema de tratamento com água em condições supercríticas, demostrou relativa capacidade de remoção dos edulcorantes, alvo deste estudo, uma vez que apresentou elevadas taxas de remoção de alguns desses compostos, o acessulfame de potássio, a sacarina sódica, o ciclamato de sódio e o aspartame, em faixas diferentes de temperatura e vazão de alimentação, dificultando a otimização e operacionalização de uma planta de tratamento em escala industrial.


Agradecimentos

Central Analítica do Instituto de Química da Universidade Federal de Goiás Laboratório do Grupo de Materiais e Catálise do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás – IFG, Campus Goiânia. Laboratório AQUALIT –


Referências

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