Produção de compósito catalítico de celulose bacteriana/pirita para tratamento de efluente têxtil por processo de oxidação avançada

ÁREA

Química Ambiental


Autores

Santana, R.M.R. (UFPE) ; Napoleão, D.C. (UFPE) ; Gomes, R.K.M. (UFPE) ; Silva, M.N.S. (UFPE) ; Freitas, R.A. (UFPE) ; Lucena, A.L.A. (UFPE) ; Vinhas, G.M. (UFPE) ; Duarte, M.M.M.B. (UFPE)


RESUMO

A busca por soluções para tratar diferentes contaminantes orgânicos é motivo de preocupação em todo o mundo. Embora, tratamentos físicos, químicos e biológicos sejam extensamente aplicados nas ETE convencionas, tais procedimentos não conseguem tratar poluentes como os corantes têxteis. Assim, este estudo avaliou as propriedades catalíticas de um compósito de CB/pirita para tratar efluente têxtil via POA. Observou-se ao final do trabalho que o catalisador proposto foi produzido de modo eficaz, uma vez que fixação do composto de ferro na celulose se adequadamente. O POA foto-Fenton como tratamento primário não apresentou bons resultados, mas quando aplicado após o processo de coagulação/floculação promoveu melhorias das condições do efluente previamente tratado na ETE.


Palavras Chaves

Foto-Fenton; Tratamento; Catálise

Introdução

Diferentes tecnologias de tratamento são avaliadas como métodos complementares aos processos já empregados nas estações de tratamento de efluentes (ETE) de indústrias têxteis. Os processos oxidativos avançados (POA), por exemplo, são investigados como um método capaz de promover de modo eficiente a degradação de compostos recalcitrantes, tal como os corantes sintéticos. Entre os POA está o processo foto-Fenton, que é capaz de mineralizar poluentes orgânicos persistentes a partir da geração de radicais hidroxilas, originados da decomposição catalítica de um forte agente oxidante na presença de íons de ferro (SHOKRI; FARD, 2022). O ferro pode ser oriundo de diferentes fontes, porém visando a facilidade de separação e recuperação do catalisador para reutilização, têm-se buscado direcionar os estudos para o uso desse metal provindo de materiais sólidos insolúveis. Dentre eles está o mineral pirita (FeS2), que possui alta atividade catalítica (ZHANG et al. 2022). Entretanto, embora seja de origem natural, partículas de pirita podem ser sintetizadas e aplicadas como catalisador. Conquanto, o seu uso em escala nanométrica conduz a um efeito de aglomeração e, diante disso, opções de substratos sólidos que imobilizem essas partículas e auxiliem nas reações de degradação passou a ser o foco de pesquisas (PANDEY et al. 2022; XIAO et al. 2022). Dentre os materiais investigados está a celulose bacteriana (CB), que é um polímero natural que apresenta características como elevada estabilidade mecânica e térmica, resistência à tração, grande área superficial, alto grau de pureza e biodegradabilidade. Sua estrutura de rede tridimensional formada por nanofibras interconectadas e estáveis possibilitam a incorporação de materiais nanométricos como as partículas de pirita sintetizada, produzindo compósitos (WAHID et al. 2019). Os trabalhos que utilizam CB para produzir compósitos geralmente são voltados para a área de medicina, embalagem de alimentos e engenharia de materiais. Quanto à formação de compósitos BC/metal, alguns elementos têm sido incorporados a esta matriz, podendo-se citar ouro (AYYAPPAN et al. 2022), prata (AYYAPPAN et al. 2022), óxido de zinco (HEYDARI et al. 2022) e óxido de ferro (PAVÓN et al. 2019). Especificamente para uso em POA, os compósitos CB/TiO2/ZnO (WAHID et al. 2022) e óxido de grafeno-TiO2/CB (LIU et al. 2017) foram produzidos para auxiliar na degradação de corantes têxteis através de fotocatálise heterogênea. Visto que até o momento não foram encontrados trabalhos relacionados ao emprego de celulose bacteriana para imobilização de pirita, principalmente com o objetivo de auxiliar nas reações de oxidação avançada, esta pesquisa teve por objetivo produzir um compósito inédito de CB/pirita para atuar como catalisador do processo foto-Fenton. Buscou-se avaliar a sua atividade catalítica através do tratamento de um efluente industrial proveniente de lavanderia têxtil.


Material e métodos

Síntese e produção dos materiais A síntese da pirita foi realizada através de método hidrotérmico, conforme metodologia descrita por Yu et al. (2020). Para a produção de hidrogéis de CB, empregou-se a bactéria K. hansenii (UCP-1619), cultivada em meio Hestrin-Schramm estéril. Para as etapas de preparação de inóculo e fermentação foi utilizado meio salino patenteado pelo grupo (BR 102020012400-5 A2). O inóculo foi preparado em frasco de Erlenmeyer, dispondo células de bactérias no meio salino estéril e adicionou-se 1% de etanol absoluto. O material foi incubado estaticamente (30 ± 1°C, 5 dias). Na fermentação, 2,42 mL de uma nova suspensão celular, composta por meio salino, 20% de inóculo e 1% de álcool, foram distribuídos em placas de cultivo de 24 poços e incubados estaticamente (30 ± 1°C, 7 dias). A CB formada em cada poço foi coletada, lavada com H2O destilada, esterilizada em autoclave (121 ± 1°C, 20 min) até a produção do CB/pirita (conforme Sriplai et al. (2018)). O compósito CB/pirita imerso em água destilada foi colocado em banho ultrassônico (1h) e seco em estufa (60 ± 1°C). Para determinar a concentração do ferro total presente no compósito foi utilizada a técnica de espectrofotometria de absorção atômica com chama, tendo sido previamente realizada a sua digestão ácida (APHA, 2017). A caracterização estrutural e morfológica se deu através de análises de FT-IR, DRX e MEV/ EDS. Ensaios fotocatalíticos via POA O CB/pirita foi aplicado como catalisador do processo foto-Fenton e a atividade catalítica investigada no tratamento de efluentes oriundos de uma lavanderia do agreste pernambucano. Eles foram coletados em 2 pontos distintos da ETE: após o tanque de equalização (efluente bruto - E1) e após o decantador (efluente tratado por coagulação/floculação - E2). Foi feita a caracterização físico-química das amostras através dos parâmetros pH, turbidez, DQO, ferro total e cor verdadeira. Esta foi determinada por meio dos coeficientes de absorção Durchsicht FarbZahl(DFZ), descrito pela International Organization for Standardization (ISO 7887:2011). O tratamento dos efluentes foi realizado com 200 mL de amostra (pH 5) e 4 membranas secas do compósito. Após 30 min no escuro, adicionou-se H2O2 (100, 200 e 300 mg/L) e os sistemas foram irradiados por lâmpada incandescente (300W, Osram) (SANTANA et al. 2017). A eficiência de cada tratamento foi avaliada com base na redução dos coeficientes DFZ e da DQO, e a quantificação da cor verdadeira se deu durante 180 min.


Resultado e discussão

Síntese de pirita e produção de CB e CB/pirita Por meio da metodologia de síntese utilizada, obteve-se partículas de pirita na forma de pó e o rendimento médio de produção por batelada foi de 1,32 ± 0,10 g. Hidrogéis de CB foram obtidos após 7 dias de fermentação, onde uma película branca de aspecto gelatinoso (diâmetro médio de 1,47 ± 0,10 cm) foi coletada da superfície do meio de cultura e seu formato se assemelhava ao do poço da placa de cultivo utilizada no processo de crescimento. O biopolímero foi empregado para imobilizar as partículas de pirita sintetizadas e originar o compósito CB/pirita (Figura 1). Na Figura 1, tem-se que a estrutura superficial da CB foi recoberta por partículas de pirita e dispostas de uniformemente na maior parte da membrana. Após a digestão ácida do compósito, verificou-se uma concentração total de ferro em solução de 54,76 ± 1,69 mg/L. Em seguida, as naturezas das partículas de pirita, da CB e do compósito foram atestadas através da caracterização. Os espectros de FT-IR também apresentados na Figura 1, permitem observar 3 bandas típicas, em torno de 805, 657 e 595 cm-1, refletindo o alongamento assimétrico de ligações S-O, a vibração de alongamento da ligação S-S e a vibração de alongamento da ligação Fe-S, respectivamente (YAO et al. 2022; RAVICHANDRAN et al. 2022). No espectro da CB verificou-se bandas características do material, associadas à vibração de alongamento assimétrico de ligações C-H nos grupos metil (-CH3) e metileno (-CH2) do polímero e à presença de ácidos produzidos na fermentação (TAPIAS et al. 2022). No espectro do CB/pirita, verificou-se uma banda relacionada à ligação Fe-S, confirmando e a incorporação da pirita. Após constatar a adequação das metodologias para a síntese e imobilização das partículas catalíticas, foram realizados os ensaios para tratamento dos efluentes têxteis. Os resultados da caracterização físico-química dessas amostras estão exibidos na Figura 2. Visto que algumas características não estavam conformes com os padrões exigidos pela legislação estadual e nacional para descarte de efluentes em corpos aquáticos, principalmente para o E2 já tratado na lavanderia, buscou-se avaliar o processo foto-Fenton como tratamento. Ele primeiro foi aplicado como método primário para o E1 (em substituição ao processo de coagulação/floculação) e depois como método terciário (polimento) para o E2 previamente tratado. Nos ensaios com o E1, ao ajustar o pH para 5, verificou-se com o passar do tempo a formação de flóculos na solução e depósito de lodo no fundo dos reatores. Com isto, concluiu-se que o POA proposto na pesquisa não poderia ser aplicado como tratamento primário, sendo necessário o emprego em conjunto com outros métodos de remediação, como o processo de coagulação/floculação aplicado na ETE. Sendo assim, procurou-se melhorar as condições do efluente anteriormente tratado pela empresa. Os resultados observados foram mais significativos, alcançando os padrões exigidos pelas legislações ambientais. Além disso, destaca-se que o compósito produzido apresentou atividade catalítica, sendo capaz de auxiliar no tratamento. Os dados quantitativos obtidos ao longo dos ensaios serão apresentados futuramente. As análises físico-químicas mostraram que os efluentes possuem caráter básico (pH > 9) e não se enquadram no padrão de lançamento de rejeitos estabelecido pela legislação (PERNAMBUCO, 2003). O E1 apresentou alto nível de turvação, relacionado à presença de corantes e partículas suspensas na amostra. Porém, os processos de coagulação/floculação da ETE da lavanderia reduziram em 90,47%. Quanto à DQO, os efluentes apresentaram elevados níveis de matéria orgânica, o tratamento da empresa exibiu 53,55% de eficiência, menor que os 80% exigido pela CPRH. O ferro total nos efluentes estava de acordo com a permitida pelo CONAMA (BRASIL, 2011). No que tange a cor, o E1 apresentou coloração azul intensa e o E2 um tom amarelado. A cor verdadeira mostrou que os padrões de 7,0 m-1 (DFZ436), 5,0 m-1 (DFZ525) e 3,0 m-1 (DFZ620) exigidos pela legislação ambiental alemã (Anhang 38, Allgemeinen Rahmen- Abwasser-VwV) para descarte de efluentes industriais não foram obedecidos. Esta norma foi utilizada já que no Brasil não há uma legislação específica que delimite padrões de cor para despejo de efluentes. Quando o efluente bruto da lavanderia foi submetido ao processo foto-Fenton ocorreu um evento de coagulação após mudar o pH. Ele pôde ser atribuído à precipitação do amido (constituinte do efluente da lavanderia) originado após a desengomagem das peças de roupas. Isto foi ponderado com base na literatura, onde o composto já foi investigado como auxiliar da floculação, figurando como alternativa aos coagulantes de alumínio utilizados (ABUJAZAR et al. 2022; HU; HU; YANG, 2022).

Figura 1:

Imagens do hidrogel de CB e do compósito CB/pirita \r\n(hidrogel e de membrana seca); Espectros de FTIR \r\nda pirita, CB pura e compósito.\r\n

Figura 2:

Caracterização físico-química de um efluente têxtil \r\nbruto e um tratado através de processos físico-\r\nquímicos.

Conclusões

Os resultados obtidos nesta pesquisa mostraram que as metodologias utilizadas para a síntese de partículas catalíticas de pirita e produção de celulose bacteriana foram apropriadas, o que foi constatado através das análises de caracterização. A partir dos materiais iniciais citados, produziu-se o compósito inédito de CB/pirita, cuja aplicação foi investigada para catálise através do processo foto- Fenton, o qual foi utilizado no tratamento de efluentes têxteis oriundos de lavanderia. Por meio da técnica de FT-IR foi revelado que a pirita foi incorporada à matriz polimérica, indicando que o método empregado para fixação do composto de ferro na celulose foi adequado. O emprego do POA foto-Fenton como tratamento primário substituto ao processo de coagulação/floculação realizado na ETE da lavanderia não apresentou bons resultados. Por outro lado, quando aplicado como metodologia complementar ao processo físico-químico de coagulação/floculação, o tratamento proposto na pesquisa foi capaz de melhorar as condições do efluente previamente tratado na ETE.


Agradecimentos

À FACEPE pela concessão da bolsa, à FADE/UFPE, à FACEPE (APQ 0947-3.06/22) e à Lavanderia Nossa Senhora do Carmo.


Referências

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