ÁREA
Química Ambiental
Autores
Barbosa, J.P.M. (UFPE) ; Cavalcanti, V.O.M. (UFPE) ; Lucena, A.L.A. (UFPE) ; Santana, R.M.R. (UFPE) ; Duarte, M.M.M.B. (UFPE) ; Napoleão, D.C. (UFPE)
RESUMO
A existência de contaminantes farmacêuticos no ambiente aquático vem sendo destacada como um problema ambiental mundial. Entre os fármacos mais utilizados, destacam-se o atenolol e o propranolol, β-bloqueadores largamente prescritos para a população. Dessa forma, o presente trabalho teve por objetivo propor tratamento via POA para os fármacos citados em solução aquosa, empregando o processo foto- Fenton heterogêneo. A partir da pesquisa realizada obteve-se degradações de 89,86% e 91,86% dos fármacos nos grupos funcionais correspondente aos λ de 215 e 280 nm, respectivamente. A partir dos resultados do planejamento fatorial, verificou-se que a melhor condição de trabalho se deu para 50 mg/L de peróxido de hidrogênio e 2,0 mg/L de pirita.
Palavras Chaves
POA; Radiação; Tratamento
Introdução
Os produtos farmacêuticos são um grupo de compostos amplamente utilizados pela população e que devido ao seu crescente consumo tem sido liberados na forma de contaminantes em diferentes matrizes ambientais (SHARMA et al. 2020). A ocorrência destes compostos e seus metabólitos em água residuais é um problema ambiental que tem sido relatado desde os anos 80, cuja preocupação vem aumentando a cada ano tendo em vista os efeitos ecotoxicológicos que estes podem causar tanto a fauna como a flora. Destacando-se efeitos no crescimento de fitoplâncton e algas, alterações nos sistemas reprodutivos de diferentes organismos aquáticos, como reversões de sexo, além de auxiliar no desenvolvimento de bactérias resistentes a antibióticos, afetando indiretamente a saúde humana (SAMAL; MAHAPATRA; ALI, 2022). Estes compostos atingem o meio ambiente por múltiplas rotas de entrada, desde a excreção de medicamentos parcialmente metabolizados, passando pelo descarte incorreto de produtos farmacêuticos não utilizados, assim como a partir da lavagem de maquinários da indústria farmacêutica e da liberação de efluentes destas sem tratamento adequado (SHOLA et al. 2022). Neste cenário e sabendo que os tratamentos convencionais presentes nas estações de tratamento de efluentes (ETE) não são capazes de realizar a degradação completa de contaminantes farmacêuticos, é necessária a aplicação de tratamentos que sejam eficientes na remoção destes compostos, como os processos oxidativos avançados (POA) (LOPEZ et al. 2022). Os POA se baseiam na intermediação de radicais hidroxila para oxidação de compostos recalcitrantes, não biodegradáveis e tóxicos, tendo a capacidade de oxidar compostos orgânicos completos em CO2, água e sais inorgânicos (LI et al. 2023). Diferentes tipos de POA podem ser aplicados para degradação de contaminantes farmacêuticos, um dos mais comuns e eficientes é o processo foto-Fenton, caracterizado pela combinação do efeito oxidativo do peróxido de hidrogênio e sua otimização a partir da aplicação de íons de ferro e irradiação luminosa num meio ácido (DU et al. 2022). O processo foto-Fenton pode empregar diferentes tipos de catalisadores homogêneos e heterogêneos. No caso dos heterogêneos, partículas de FeS2 (pirita) têm sido comumente utilizadas para acelerar a geração de radicais hidroxila e a degradação de poluentes orgânicos (DIAO et al. 2020). O presente trabalho teve por objetivo avaliar a degradação de uma mistura de fármacos atenolol e propranolol em solução aquosa via processo foto-Fenton utilizando um reator fotolítico de bancada com radiação sunlight. Para tal, foi elaborada metodologia de identificação e quantificação dos fármacos via espectrofotometria de ultravioleta/visível, estudado o efeito da influência das variáveis envolvidas no processo (concentração de H2O2, concentração de pirita e pH) através de um planejamento fatorial.
Material e métodos
Preparo das soluções de fármacos e identificação via espectrofotometria de ultravioleta/visível Os princípios ativos dos fármacos atenolol e propranolol foram obtidos da Farmácia Globo de Manipulação. A partir destes foi preparada uma solução estoque de 10 mg/L da mistura dos fármacos os dissolvendo em água destilada. Esta solução foi analisada em um espectrofotômetro de Ultravioleta/Visível (ThermoScientific), a partir da construção de curvas analíticas nos comprimentos de onda característicos: 215 nm e 280 nm. Tratamento dos fármacos utilizando processos oxidativos avançados Os ensaios de degradação da mistura de fármacos atenolol e propranolol empregando o processo foto-Fenton foram realizados num reator fotolítico de bancada equipado com lâmpada solar artificial (sunlight) (OSRAM, 300 W), conforme descrito por Santana et al. (2017), durante 1 h. As amostras foram quantificadas antes e após a realização dos ensaios de degradação utilizando a metodologia via espectrofotometria de UV/Vis. Com a eficiência do processo foto-Fenton sendo avaliada em função da porcentagem de degradação de cada um dos fármacos em estudo. Definição das condições de trabalho Para definição das condições de trabalho do tratamento via processo foto-Fenton foi construído um planejamento fatorial 23 com ponto central em triplicata, totalizando 11 experimentos. Para tal foram considerados como variáveis independentes, concentração de H2O2 ([H2O2]), concentração de pirita ([Pirita]) e pH. Em cada ensaio foram utilizados 50 mL da solução contendo a mistura de fármacos, durante tratamentos de 1 h. A matriz de planejamento aplicada no trabalho está apresentada mais adiante na Figura 1.
Resultado e discussão
Tratamento dos fármacos utilizando o processo foto-Fenton heterogêneo
Uma vez determinado o método de quantificação da mistura de fármacos, foram
realizados os ensaios de degradação. Estes envolveram a aplicação do processo
foto-Fenton, utilizando a pirita como catalisador sólido e a construção de um
planejamento fatorial, cujos resultados estão expostos na Figura 2. Nela também
estão expostas as cartas de Pareto obtidas com o auxílio do programa
Statistica 8.0 para 95% de confiança.
A partir da Figura 1 a) percebe-se que o ensaio de número 3 gerou os melhores
resultados de degradação dos fármacos, 89,86% para o propranolol e 91,86% para o
atenolol. Analisando a Figura 1 b), verifica-se que os efeitos principais do pH,
[Pirita] e da interação pH-[H2O2] foram significativos
para o comprimento de onda de 215 nm, enquanto para o λ de 280 nm, apenas o
efeito de interação de três fatores não foi significativo. De forma a se obter
uma melhor visualização e compreensão dos resultados encontrados, foram gerados
gráficos de superfície que permitiram uma análise mais detalhada dos efeitos de
interação (Figura 2).
Analisando a Figura 2 tem-se que para 215 nm as melhores condições experimentais
obtidas são encontradas ao fazer uso dos menores níveis de pH e
[H2O2], enquanto para 280 nm tem-se que [Pirita] e
[H2O2] conduzem a uma maior eficiência em seus maiores
níveis, independente da faixa de pH empregada.
A análise estatística do processo de degradação via utilização das superfícies
de resposta permite identificar de forma precisa os efeitos de cada interação
ocorrida durante o tratamento. A partir da Figura 5 observa-se que, para o λ de
215 nm, no menor nível de pH, e com uma menor [H2O2]
ocorreu um aumento na degradação dos fármacos. Este comportamento ocorre tendo
em vista que a reação foto-Fenton é favorecida em meios ácidos. Onde valores de
pH acima de 3,0 devem ser evitados de forma que não ocorra a precipitação do íon
férrico levando a redução da capacidade catalítica. Outro fator importante é a
[H2O2], uma vez que a degradação tende a aumentar quando
este parâmetro é elevado. Entretanto, adições em excesso do agente oxidante
tendem a favorecer a recombinação dos radicais hidroxila formados durante o
processo em outros radicais de menor potencial de oxidação (hidroperoxila e
superóxidos, por exemplo), comprometendo o rendimento do tratamento.
Para o λ de 280 nm, foi verificado que ao se combinar maiores [Pirita] e de
[H2O2], há o favorecimento da degradação da mistura de
fármacos em estudo. Isso ocorre porque ao se utilizar mais pirita, os íons
ferrosos presentes na superfície do catalisador irão sofrer oxidação e haverá
uma maior liberação de radicais hidroxila no meio, favorecendo o tratamento. De
toda forma, não foram verificadas grandes alterações, valores próximos a 4%, nos
percentuais de degradação ao se variar a [H2O2], indicando
que a concentração do catalisador tem uma maior influência do que a concentração
do oxidante no processo de degradação. Pode-se afirmar ainda que a variação da
concentração de H2O2, nos níveis estudados, não gerou
efeitos significativos no processo de degradação dos fármacos em estudo.
Por fim, foi verificado que ao se combinar um menor valor de pH com maiores
[Pirita] ocorre um favorecimento na degradação dos fármacos. Além disso, pôde-se
constatar que aumentar a concentração de pirita de 1,0 até 2,00 g/L influenciou
na eficiência do tratamento, visto que os percentuais de degradação obtidos
sofreram alterações significativas para este parâmetro.
a) Matriz de planejamento fatorial, Carta de Pareto para o λ de: b) 215 nm (erro puro = 2,3259) e c) 280 nm (erro puro = 0,077).
Superfícies de resposta, para interação: a) H2O2 x pH (215 nm), b) H2O2 x [Pirita] (280 nm), c) H2O2 x pH (280 nm) e d) [Pirita] x pH (280 nm).
Conclusões
Os resultados obtidos neste trabalho permitiram constatar que o processo foto- Fenton, catalisado a partir do mineral pirita, é uma alternativa viável para o tratamento da mistura de contaminantes farmacêuticos atenolol e propranolol em solução aquosa, com valores de degradação de 89,86% para o propranolol e de 91,86% para o atenolol nas melhores condições operacionais.
Agradecimentos
À FADE/UFPE pelo aporte financeiro.
Referências
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