AVALIAÇÃO DA INFLUÊNCIA DE ÍONS METÁLICOS MANGANÊS (II) E CROMO (III) E PORFIRINA IX NA ESTABILIDADE OXIDATIVA DE BIODIESEL

ÁREA

Química Inorgânica


Autores

Angilelli, K.B. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA) ; Toledo, F.M.L. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA) ; Alves, A.M. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA) ; Gonçales Filho, J. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA) ; Romagnoli, E.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA)


RESUMO

Compostos porfirínicos podem estar presentes no biodiesel devido a matéria-prima vegetal, ou pela adição de extratos de antioxidantes naturais, e em contato com íons de metais de transição podem levar a formação de espécies catalisadoras da oxidação. Esse trabalho visou avaliar o efeito da interação entre Mn (II) e Cr (III) e porfirina na estabilidade oxidativa de biodiesel. Amostras contendo biodiesel com a adição dos sais MnCl2.4H2O e CrCl3.6H2O, com e sem porfirina, foram testadas quanto a estabilidade oxidativa pelo método acelerado. As amostras com adição Cr(III) apresentaram períodos de indução bem similares ao controle, enquanto as amostras com Mn(II) apresentaram períodos de indução os menores valores para os ensaios, indicando o efeito catalítico da interação manganês-porfirina.


Palavras Chaves

complexo; catálise; oxidação

Introdução

Devido às limitações das reservas de combustíveis fósseis e os problemas ambientais resultantes da combustão destes, há um grande interesse em estudar fontes alternativas de energia, como os biocombustíveis. O biodiesel é um biocombustível produzido por meio de matérias primas renováveis, como biomassa, gordura animal e plantas e a queima deste combustível é relacionada a uma combustão mais limpa, pois resulta em menos emissão de óxidos de enxofre. Além disso, este combustível possui um maior ponto de fulgor, o que faz com que seu manuseio e armazenamento seja mais seguro (RESENDE et al, 2021; KUMAR, 2017; SPACINO et al, 2020). O biodiesel é formado pela reação de transesterificação de triglicerídeos que resulta na formação de um combustível rico em ésteres metílicos com cadeias insaturadas, isso lhe confere uma baixa estabilidade química, que é favorecida pela umidade, luz, altas temperaturas e contaminação por metais (SPACINO et al, 2020). A oxidação do biodiesel ocorre pelo mecanismo de oxidação lipídica, que é iniciado pela reação de espécies radicais com as insaturações presentes nos ésteres graxos e leva a formação de produtos que propagam essas reações de oxidação (KUMAR, 2017; RESENDE et al, 2021). A oxidação do biodiesel leva a perda de suas propriedades, que resultam em problemas relacionados ao sistema de injeção nos veículos e até problemas de desempenho no automóvel (RESENDE et al, 2021; KUMAR, 2017). Em razão de sua instabilidade química, o biodiesel ainda é utilizado de forma fracionada nos automóveis e são estudadas diversas formas de se obter um combustível final com maior estabilidade oxidativa. Os estudos abrangem desde o uso de diferentes matérias primas para a síntese do biodiesel, o uso de antioxidantes como aditivos, e até a influência de contaminantes na estabilidade oxidativa (RATUSZ et al, 2019; KIVEVELE; HUAN, 2015; SUNDUS; FAZAL; MASJUKI, 2017). Entre os contaminantes que influenciam a estabilidade do biodiesel encontram-se os metais de transição, estes são amplamente estudados na literatura, porque mesmo em concentrações de traço levam a catálise das reações de oxidação que acontecem no biodiesel (KUMAR, 2017). A presença dos metais no biodiesel está relacionada ao desgaste de peças automotivas e ao contato com superfícies metálicas durante o preparo, armazenamento e transporte do produto (KIVEVELE; HUAN, 2015). Antioxidantes naturais são estudados para serem empregados ao biodiesel para aumentar sua estabilidade oxidativa. São geralmente extratos ricos em fenóis, que agem atrasando ou até inibindo a oxidação do biodiesel por meio da formação de espécies químicas mais estáveis. Os antioxidantes no biodiesel reagem com os radicais livres que causam a oxidação e formam radicais mais estáveis (SCHAUMLOFFEL at al; 2021). Centros porfirínicos, presentes na clorofila por exemplo, podem estar presentes no biodiesel devido a sua matéria prima ou a adição de antioxidantes naturais. Complexos metaloporfirínicos são amplamente usados catalisadores de diferentes reações, que incluem reações de oxidação (ZHU et al., 2021; XIE; JINFENG et al., 2019; MO et al., 2020; HUANG et al., 2019). Desta forma faz-se importante a compreensão da influência deste componente na estabilidade oxidativa do biodiesel, principalmente na presença de metais de transição que compõem ligas metálicas, que podem ser usadas durante o preparo, transporte ou armazenamento do biodiesel e liberar esses metais para catalisar as reações de oxidação. Neste sentido o presente trabalho tem como objetivo apresentar o efeito da presença de Mn(II), Cr(III) e porfirinas na estabilidade oxidativa do biodiesel, por meio da avaliação do período de indução obtido pelo método de oxidação acelerada.


Material e métodos

Síntese do Biodiesel O biodiesel foi sintetizado por meio do processo de transesterificação do óleo de soja por catálise básica, que constituiu na adição de 250 mL de metanol e 5 g metóxido de sódio em 500 g de óleo de soja. Esta mistura foi mantida em aquecimento sob refluxo durante 2 h, no intervalo de temperatura de 60 a 65° C. Após o fim da síntese o biodiesel foi separado dos subprodutos por meio de um funil de separação e foi misturado com cerca de 300 mL de uma solução de HCl 0,2 mol L-1 (para neutralização), e por fim misturado com cerca de 300 mL de água destilada. Após separar a maior parte da água do produto por meio do funil de separação foi adicionada uma pequena quantidade de NaSO4. Determinação do período de indução O período de indução do controle e das amostras de biodiesel com adição de metais e porfirina foram determinados usando o método padrão de oxidação acelerada EN 14112 (2016), na temperatura de 110° C, para isso foi utilizado o equipamento Rancimat (Brand: Metrohm; Model: 873). Preparo das amostras As amostras foram preparadas por meio da adição de 9,875⋅10-4 e MnCl2.4 H2O e CrCl3.6 H2O no biodiesel. As amostras contendo porfirina foram preparadas por meio da adição de 10 mL de uma suspensão alcoólica de porfirina 1% m/v em 100 g de biodiesel, seguida da adição dos sais metálicos. Foi também observado o período de indução do biodiesel sem adição dos sais, e sem adição de sais e da porfirina, este último foi identificado como o controle. Determinação das constantes de velocidade As constantes de velocidade para a reação de oxidação foram determinadas a partir dos dados de condutividade elétrica obtidos pelo teste de oxidação acelerada, considerando a reação de primeira ordem, segundo a equação 1: lnΛ= lnΛ0 - k(tf-ti)⁡ Em que k representa a constante de velocidade da reação, Λ representa a condutividade no tempo t (h); Λ0 representa a condutividade inicial; e ti e tf, tempos inicial e final, respectivamente.


Resultado e discussão

Os períodos de indução determinados para cada amostra são apresentados na Tabela 1, nela é possível observar os efeitos das adições de metais e porfirina nas amostras de biodiesel. Efeito da influência do íon Cr(III) na estabilidade oxidativa Para as amostras com Cr(III) não foi observado muita diferença no período de indução do controle para as amostras, o que pode ser explicado pela grande estabilidade dos compostos de Cr(III). Neste estado de oxidação ele possui 3 elétrons d, que ficam em orbitais ligante, conferindo uma boa estabilidade eletrônica para o metal, desta forma, não é observada a catálise das reações de oxidação. Pode-se observar também que os períodos de indução da amostras contendo Cr(III), com e sem adição de porfirina não são tão diferentes, este comportamento também pode ser explicado pela estabilidade dos compostos de Cr(III) e que a presença dos das duas espécies juntas não resultou em nenhum efeito catalítico significativo (SPACINO et al, 2020). Além da estabilidade do metal, pode-se destacar os caráteres de interação que o metal e o ligante possuem como um fator que influencia na formação do complexo, enquanto a porfirina se comporta como uma base intermediária segundo a teoria de Pearson, o Cr(III) apresenta-se como um ácido duro, logo prefere fazer ligações com caráter mais iônico. Efeito da influência do íon Mn(II) na estabilidade oxidativa Enquanto que as amostras com cromo apresentaram estabilidade parecida, para o Manganês é observado uma grande diminuição nos tempos de indução e é observado um decréscimo de estabilidade do, que segue do controle, até a amostra com Mn(II) e porfirina. Esses dados indicam que há uma catálise do processo de oxidação em resultado da complexação do manganês com a porfirina. A diferença entre o período de indução do controle e da amostra com Mn(II) é um comportamento que é observado em outros trabalhos similares. E ao contrário do período de indução da amostra com cromo, o período de indução da amostra com o Mn(II) variou significativamente em relação ao controle. Este comportamento também é explicado pela estabilidade do metal. O Mn(II) possui 5 elétrons nos orbitais d, o que lhe confere uma energia de estabilização do campo cristalino nula, logo este metal está apto reagir e catalisar as reações de oxidação. Ao comparar a amostra com apenas com adição de manganês e a amostra com manganês e porfirina é observado um decréscimo, que como mencionado anteriormente pode ser relacionado com a complexação do manganês e a porfirina. Efeito da influência do íon Cr(III) na estabilidade oxidativa A adição da porfirina em todas as amostras que continham os metais levou aos menores tempos de indução, enquanto a adição da mesma no controle levou a um aumento no périodo de indução. O aumento no périodo de indução no caso do controle pode ser explicado pela presença de aromaticidade na porfirina que deslocaliza a os elétrons radicais e limita a oxidação, aumentando o périodo de indução e a estabilidade. Porém a presença dos metais no biodiesel promoveu a formação de complexos metaloporfirinicos, que agem como agentes catalisadores das reações de oxidação do biodiesel. Entre os dois metais estudados, apenas o Mn(II) mostrou ter levado a formação de um complexo com a porfirina. Complexos porfirínicos com o manganês são de extrema importância biológica, nas plantas esses complexos compõem a clorofila, que é responsável pela respiração de plantas, algas e cianobactérias. Há várias aplicações para o uso de complexos metaloporfirinicos com o manganês, principalmente nos estados de oxidação II, III e IV. As aplicações abrangem principalmente reações de hidrólise, redução da água, e para a catálise de epoxidações de alquenos (TRAYLOR; MIKSZTAL, 1989; PHILIP et al, 2021; REIS et al. 2022; ARASASINGHAM; HE; BEUICE, 1993). A epoxidação de alquenos é catalisada pela formação de um complexo octaédrico com metais e a porfirina (Figura 1) e em um dos dois sítios de coordenação remanescentes são ligados à um oxigênio, que promove o ataque a oxidação nas insaturações do alqueno. Quando isto ocorre há a formação de uma ligação entre este oxigênio e a cadeia atacada e depois este oxigênio é liberado do anel porfirínico formando um epóxido, como mostrado na Figura 5. Os resultados obtidos, que indicam que a presença de complexos metaloporfirinicos no biodiesel catalisam a reação de oxidação lipídica, podem explicar o comportamento observado por Spacino et al (2020), que observou que o extrato de Alecrim só poderia ser um bom antioxidante para o biodiesel na ausência de metais, já que o alecrim é uma erva rica em clorofila. Constantes de velocidade das reações A estabilidade do biodiesel foi medida por meio do método de oxidação acelerada, no qual o biodiesel é submetido à uma temperatura de 110° C e é borbulhado ar na amostra. Conforme a reação vai acontecendo são liberados alguns voláteis que são borbulhados em uma célula eletrolítica com água destilada, nela há um eletrodo que mede a condutância da água, que começa perto de zero e vai aumentando conforme são borbulhados os produtos voláteis. O período de indução refere-se ao ponto onde a reação de oxidação lipídica não pode mais ser controlada, graficamente este ponto é caracterizado pela inflexão da curva de condutância em relação ao tempo. Como é obtido um gráfico de condutância em relação ao tempo, é possível determinar a ordem e a constante de velocidade das reações, que é um fator muito importante para a compreensão da estabilidade do biodiesel. A Figura 7 apresenta a curvas de condutância em função do tempo para cada uma das amostras, nos gráficos também são apresentadas retas no período de indução. Em seguida foram plotados os gráficos do logaritmo natural da condutância em relação ao tempo, como os gráficos apresentaram um perfil linear pode-se afirmar que se trata de reações de primeira ordem. A Tabela 2 apresenta as constantes de velocidade para as reações de oxidação de cada amostra. Na Tabela 2 observa-se uma diminuição na constante de velocidade para a amostra de biodiesel com porfirina em comparação com o controle (B100). Esta amostra apresenta a menor constante de velocidade e maior período de indução (Tabela 1), logo maior estabilidade química. Também podemos observar que as amostras de biodiesel com Cr(III) com e sem porfirina apresentam constantes de velocidade muito semelhantes, o que é outra evidência de que a presença da porfirina e nas amostras com cromo não levaram a efeitos significativos na estabilidade oxidativa do combustível. Como o período de indução da amostra de biodiesel com adição de Mn(II) e porfirina foi o menor, a constante de velocidade desta amostra deveria ser maior que as demais, porém as amostras de Mn(II) apresentaram constantes de velocidade muito parecidas. Esta evidência, somada ao baixo ajuste linear do gráfico de logaritmo natural da condutância em relação ao tempo, indica que o mecanismo de oxidação desta amostra é diferente das demais amostras e que a oxidação desta amostra foge do comportamento das reações radicalares de oxidação lipídica.

Tabela 1

Períodos de indução para as amostras de biodiesel \r\ncontendo os íons Cr(III) e Mn(II), com porfirina e \r\nsem porfirina.

Tabela 2

Constante de velocidade para os processos de \r\noxidação das amostras.

Conclusões

Foi possível verificar os efeitos da presença de Mn(II), Cr(III) e porfirina na estabilidade oxidativa do biodiesel por meio da análise do período de indução obtido pelo método de oxidação acelerada. A presença de Cr(III) não levou a mudanças importantes na estabilidade oxidativa devido a estabilidade do metal neste estado de oxidação. Já a o Mn(II) apresentou-se como um metal capaz de catalisar as reações de oxidação do biodiesel, que pode ser explicado pela maior reatividade do metal neste estado de oxidação. A porfirina apresentou indícios de atividade antioxidante no biocombustível na ausência dos metais o que merece especial atenção em trabalhos futuros, porém na presença do manganês ajudou a catalisar as reações, o que pode ser explicado pela formação de complexos metaloporfirinicos


Agradecimentos

À Universidade Estadual de Londrina, e ao CNPq e Fundação Araucária pela concessão de bolsa de iniciação científica.


Referências

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KUMAR, Niraj. Oxidative stability of biodiesel: Causes, effects and prevention. Fuel. v. 190, p. 328–350, nov. 2017.

MO, LinQiang et al. full use of factors promoting catalytic performance of chitosan supported manganese porphyrin. Scientific Reports. v. 10, ago. 2020.

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RESENDE, Michelle. J. C., et al. Biodiesel: An Overview II. Sociedade Brasileira de Química. v. 0, n. 0, p. 1-44. 2021.

SCHAUMLOFFEL Lívia S. et al. Vegetable tannins-based additive as antioxidant for biodiesel. Fuel, v. 292, mai. 2021.

SCHIRMANN et al., 3,3′,5,5′-Tetramethoxybiphenyl-4,4′-diol: A new antioxidant enhancingoxidative stability of soybean biodiesel. Fuel. v. 237, p. 593–596, jun. 2019.

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SUNDUS, F; FAZAL, M. A; MASJUKI, H. H. Tribology with biodiesel: A study on enhancing biodiesel stability and its fuel properties. Renewable and Sustainable Energy Reviews. v. 70, p. 399-412, abr. 2017.

XIE, Jinfeng et al. Metalloporphyrin as a Biomimetic Catalyst for the Catalytic Oxidative Degradation of Lignin to Produce Aromatic Monomers. Waste and Biomass Valorization. v. 11, p. 4481–4489, jul. 2019.

ZHU, Yuchen et al. Efficient and selective oxidation of 5-hydroxymethylfurfural catalyzed bymetal porphyrin supported by alkaline lignin: Solvent optimization and catalyst loading. Molecular Catalysis. v. 514, p. 2468-8231, set. 2021.

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