ÁREA
Química de Materiais
Autores
Marinho, K.L.L. (UFOPA) ; de Araújo, C.F. (UFPA) ; Couto, N.A.F. (IFPA/PPGMAT) ; dos Santos, P.H.C. (UFPA) ; Rocha, I.A.B. (UFPA) ; Figueira, B.A.M. (UFPA/CANAN)
RESUMO
Neste trabalho foi avaliada a transformação de rejeitos de Mn da barragem do Kalunga (Pará) em argila aniônica com estrutura shigaita, após estudos de caracterização química e mineral dos rejeitos. As análises de caracterização envolvidas foram fluorescência de raios-X, difração de raios-X, microscopia eletrônica de varredura (MEV) e microscopia eletrônica de transmissão (MET). Os resultados obtidos mostraram que os rejeitos compostos por todorokita, lithiophorita, vernadita, criptomelana, hollandita, birnessita, quartzo, cristobalita, anatásio, hematita e com teor de MnO acima de 54 % (peso) foram convertidos com sucesso em material lamelar com estrutura de hidroxido duplo lamelar no sistema Mn-Al/SO4 (estrutura shigaita).
Palavras Chaves
Rejeitos de Mn; Amazonia; hidroxido duplo lamelar
Introdução
Atualmente, observa-se uma grande diversidade de trabalhos que propõem a reutilização de rejeitos minerais para produção de materiais de importância tecnológica (adsorventes, catalisadores, trocadores iônicos, sensores, cerâmicas, cimentos, etc.). Por exemplo, Shih e Chang (1996) propuseram o emprego de cinzas voláteis para obtenção de nano tuneis baseados em estrutura zeolítica. Hildebrando et al. (2013) utilizaram rejeitos de bauxita como material de partida para produção de zeolita P com controle da cristalinidade e morfologia. Mais adiante, Yagüe et al. (2018), investigaram o aproveitamento de rejeitos de mineração de carvão como material pozolânico para a indústria de cimentos. Com relação aos materiais com propriedades catalíticas e adsorventes, Wang et al. (2016) sintetizaram hidróxidos duplos lamelares (HDLs) por coprecipitação usando a escória de fabricação de aço como matéria-prima. Nascimento et al. (2019) obtiveram, também, HDL com estrutura nano piroaurita a partir de rejeito de mineração de lavagem de bauxita da Amazônia. Os hidróxidos duplos lamelares (HDLs), também conhecidos como compostos do tipo hidrotalcita, são membros do subgrupo das argilas aniônicas e possuem estrutura lamelar semelhante ao mineral brucita (CREPALDI & VALIM, 1998). Devido às diferentes composições químico- mineral dos rejeitos, é possível a produção de materiais com propriedades exclusivas. Por esse motivo, há um aumento de investigações acerca de síntese de HDL de rejeitos, minérios e/ou minerais. Conforme descrito por Zhang et al. (2019), HDL obtidos de rejeitos de lama vermelha e lama de níquel foram excelentes catalisadores para fixação de CO2 e cicloadição epóxidos. Da Silva et al. (2018) mostraram que rejeitos da indústria mineral do cobre foram convertidos com sucesso em compósito de HDL-zeolita para a retenção de corantes de azul metileno e cristal violeta, bem mais eficientes do que seus análogos sintéticos. Desse modo, este trabalho propõe a transformação de rejeito de mineração de Manganês da Amazônia em hidróxido duplo lamelar com estrutura shigaita.
Material e métodos
Cerca de um 1g do rejeito foi imerso em solução acida para obtenção de cations Mn2+. À solução, adicionou-se uma quantidade estequiometrica de Al2(SO4)3, que em seguida foi tratada hidrotermalmente a 75º C por 24 h. O precipitado obtido foi separado, lavado com agua deionizada e secado para caracterização. A técnica de difração de raios X (DRX) foi utilizada para identificação das fases minerais dos rejeitos e produto sintético. Um difratômetro de bancada D2Phaser (Bruker) com um goniômetro de varredura vertical e um tubo de cobre (CuKa = 1.5406 Å) de 400 W de potência, geometria Bragg-Brentano no modo contínuo, velocidade de varredura de 0,25° /min, tendo como sistema de detecção um detector rápido modelo LynxEye. A tensão foi de 30 kV e 10mA, respectivamente. Para o estudo de microscopia eletronica de varredura, a amostra de shigaita foi pulverizada e dispersa em suporte impregnado com grafite e metalizadas com ouro. Foram realizadas varreduras em todas as laminas para a obtenção de imagens e análises químicas por EDS (espectroscopia por dispersão de energia). O instrumento utilizado foi um microscópio da marca LEO-Zeiss, 430 Vp, em condições de análise utilizando imagens secundárias obtidas a 20 KV, com distancia de trabalho de 11 mm. Para a caracterização da shigaita por microscopia eletrônica de transmissão, usou-se um microscópio FEI TECNAI G2-20, com canhão termiônico de filamento de LaB6, sendo a tensão aplicada de 200 kV, com resolução de linha de 0,24 nm e de ponto 0,10 nm, aumento de 25x a 1.100.000x.
Resultado e discussão
A Figura 1 mostra os padrões difratométricos da amostra de rejeitos e de
shigaita sintetizada. Conforme pôde ser verificado (Fig 1a), há uma
predominância de minerais de Mn nos rejeitos, entre eles, todorokita (PDF 021-
0553), lithiophorita (PDF 01-073-2109), vernadita (PDF 015-0604), criptomelana
(PDF 004-0603), hollandita (PDF 01-078-0962) e birnessita (PDF 043-1456) .
Adicionalmente, minerais de silício (quartzo PDF 079-1906 e cristobalita PDF 01-
076-0934), titânio (anatasio PDF 01-071-1167), ferro (hematita PDF 01-073-2234),
aluminosilicato (caulinita PDF 029-1488) e alumínio (gibbisita PDF 007-0324).
Para o produto sintetizado (Fig. 1b), picos característicos de shigaita
romboédrica com grupo espacial R-3 foram verificados (PDF 00-038-0428) a 8, 16 e
24 º (2 theta) e são referentes aos planos basais (003), (006) e (009), típicos
de HDLs tipo shigaita (SOTILES et al., 2019). A morfologia de shigaita mostrou-
se formada por placas hexagonais bem definidas com superfície irregular e
tamanho variando de 0,5 a 2,5 μm, semelhante aos resultados já
relatados para esta estrutura por metodos usando reagentes
comerciais (PRING et al, 1992; GOMEZ et al., 2020). A composição química exibiu
os teores de Mn, Al, Fe, Na, O, S, Cl e C, relacionados à presença de espécies
iônicas de Mn2+, Al3+, Fe3+, Na+, SO42-, Cl- e CO32-. Vale ressaltar que os íons
Fe3+ se originaram dos rejeitos e estão em sítios octaédricos em camadas do tipo
brucita da estrutura shigaita. Além disso, a razão atômica Mn2+/Al3+ + Fe3+ =
2,55 está de acordo com a fórmula estequiométrica da shigaita, [Mn6Al3(OH)18]3+
[(SO4)2Na·12H2O]3- (KONIG & POLLMANN, 2004). As análises HR-TEM também mostraram
morfologia cristalina bem definida próxima a placas hexagonais ou pseudo-
hexagonais planas paralelas entre si. O comprimento dessas placas varia de 150 a
mais de 500 nm. As franjas de espaçamento da rede calculadas foram de ~ 0,365
nm, que correspondem ao plano interplanar (009) da shigaita. Esses resultados
comprovam a obtenção com sucesso de HDL de Mn e Al dos rejeitos da Amazonia.
Padrões DRX dos rejeitos de Mn (a) e produto \r\nsintetico shigaita (b)
Conclusões
Hidroxido duplo lamelar com estrutura e composição quimica especifica no sistema Mn-Al-SO4 (shigaita) foi obtido com sucesso, empregando-se rejeitos de Mn da Amazonia. O material lamelar se formou com elevado grau de cristalinidade, com morfologia em folhas (placas) e tamanho de cirstalito entre 150 e 500 nm. Estes resultados indicam os rejeitos com uma interessante materia-prima para sintese de shigaita
Agradecimentos
Os autores agradecem a Vale, CNPq e Centro de Tecnologia do Nordeste e CNPq pelo apoio técnico-cientifico.
Referências
CREPALDI, E. L; VALIM, J. B. Hidróxidos Duplos Lamelares: Síntese, Estrutura, Propriedades e Aplicações. Química Nova, 21 (3), 300, 1998.
HILDEBRANDO, E. A; SOUZA, J. A. S; ANGÉLICA, R. S; NEVES, R. F. Application of Bauxite Waste from Amazon Region in the Heavy Clay Industry. Materials Research, 2013.
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