• Rio de Janeiro Brasil
  • 14-18 Novembro 2022

ELETRICIDADE EM AULA DE QUÍMICA: ESTUDOS SOBRE A ÓTICA DA PLURIVERSALIDADE

Autores

N. S. V. Garcia, F. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS) ; P. N. Santos, G. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS) ; C. Benite, A.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS)

Resumo

Apresentamos neste trabalho um planejamento de aulas para o ensino de química sob a ótica da pluriversalidade, utilizando como contexto a lâmpada de Dendera para abordar conteúdos relacionados ao tema eletricidade. Inserimos aqui discussões sobre ciência e o protagonismo dos/as sujeitos/as negros na produção de conhecimento científico para promover uma educação para equidade racial.

Palavras chaves

AFROPERSPECTIVA; EGITO; ELETRICIDADE

Introdução

O currículo escolar tradicional alimenta e atualiza a ideologia racista ao apresentar um mundo em que negros e negras não têm contribuições históricas consideradas importantes na produção de conhecimento. Neste contexto concordamos com Almeida (2019), que após anos dentro do sistema educacional brasileiro as pessoas são convencidas e reproduzem a ideia de que homens e mulheres negras têm pouca propensão a trabalhos intelectuais. Segundo bell hooks (2013)¹ nos estabelecimentos de ensino guiados por práticas e materiais didáticos que reforçam estereótipos raciais, a escola é um local de reclusão, castigo, negação e castração da cultura negra. Uma educação para a equidade racial exige que professores tenham o compromisso político com o potencial libertador do conhecimento, reconheçam a sala de aula como também lugar de pensar a estrutura social e sua transformação. No ensino de química, o debate sobre as políticas e práticas de promoção da equidade racial como a lei 10.639/03, o Parecer CNE/CP 03/2004 e a Resolução CNE/CP 01/2004, tem registro a partir de 2007 (BENITE et al. 2019). A literatura específica traz debates sobre como o ensino de Ciências/Química pode contribuir para uma educação antirracista (JACOBUCCI, 2011; FRANCISCO JUNIOR, 2008). Com o intuito de ensinar química a partir de práticas pedagógicas que promovam a equidade racial, nesse trabalho trazemos a seguinte questão: quais aspectos um planejamento de aulas utilizando o tema eletricidade deve ter para colaborar com a equidade racial no ensino de química? Para atender a esta demanda, nos referenciamos na afroperspectiva do paradigma da pluriversalidade para denegrir o ensino de química em conjunto com o desenho metodológico do Design Science Research. OBSERVAÇÃO¹: Sobre o nome de bell hooks ser empregado em letra minúscula, de acordo com Furquim (2019) é prática que surge a partir de uma postura da própria autora que criou esse nome em homenagem à sua avó e o emprega em letra minúscula como um posicionamento político que busca romper com as convenções linguísticas e acadêmicas, dando enfoque ao seu trabalho e não à sua pessoa. Dessa forma o presente texto respeita a escolha da autora.

Material e métodos

A ideia deste trabalho surge da necessidade de se repensar aulas de química na educação básica para promoção da equidade racial. O tema eletricidade aparece no contexto do projeto de robótica para automatização da rega da horta escolar de um colégio estadual, localizado no centro de Aparecida de Goiânia, Goiás. Foi estabelecida uma parceria com o Laboratório de Pesquisa em Educação Química e Inclusão (LPEQI), da Universidade Federal de Goiás (UFG), por meio de professor em educação continuada, que é também professor da disciplina de química e constitui o quadro de professores do colégio. A partir das reflexões promovidas nos encontros dos estudantes da pós-graduação com a professora formadora, foi pensado quais eram as contribuições dos povos africanos para construção do conhecimento químico no tema eletricidade. Assim se iniciou a busca na literatura, chegando-se até a lâmpada de Dendera (OSMAN, 2015; CHILDRESS, 2000). Para a didatização desse conhecimento em uma perspectiva contra-hegemônica curricular, Noguera (2012) nos oferece a pedagogia da pluriversalidade. Esta nos permite ampliar a abordagem da origem do conhecimento científico, pois reconhece que todas as perspectivas são válidas, apontando como equívoco o privilégio ou eleição de um único ponto de vista. Em conjunto, utilizamos o desenho metodológico do Design Science Research. Este tem como objetivo projetar e desenvolver soluções satisfatórias contribuindo para a construção e o aprimoramento de práticas e teorias tanto no âmbito profissional quanto acadêmico (DRESCH et al., 2015).

Resultado e discussão

Considerando como público-alvo estudantes do ensino médio do projeto de robótica, o desenvolvimento do percurso desse trabalho foi realizado em quatro fases: 1) Incubação do Problema; 2) Refinamento da Solução; 3) Teoria Substantiva; 4) Teoria Formal. A Figura 1 apresenta um esquema das fases. A primeira fase ficou caracterizada pelo reconhecimento do problema. Este foi o momento em que se firmou a parceria Universidade e o Colégio com a sugestão de intervenção pedagógica de um planejamento de aulas. Na segunda fase verificamos entre os pares e na literatura se o planejamento tem os aspectos essenciais para solucionar o problema. Em seguida na terceira fase fizemos reflexão sobre o planejamento de aulas a partir das teorias e referenciais utilizados. Na quarta fase, como processo de aprimoramento fizemos a generalização, compreendendo o problema da relações raciais no fenômeno educacional como parte da estrutura social. Assim apresentamos na Figura 2 o planejamento de aulas como produto obtido do trabalho realizado. Concordamos com Munanga (2015) que a história de um povo é o ponto de partida do processo de construção de sua identidade e não é por acaso que todas as ideologias de dominação tentaram falsificar e destruir as histórias dos povos que dominaram. Desse modo, consideramos importante realizar no planejamento uma abordagem histórica da contribuição negra sobre conhecimento da eletricidade. Segundo Callegario et al. (2015), a utilização da história da ciência no ensino de química tem sido uma abordagem cada vez mais comum, pois favorece a aprendizagem de conceitos e visões mais adequadas sobre a origem e natureza do conhecimento científico. Dentro dessa perspectiva, elegemos como primeiro aspecto o resgate da memória ancestral do/a negro/a em sua experiência coletiva de produção intelectual a partir da lâmpada de Dendera. A lâmpada de Dendera, como indica Osman (2015), representada por hieróglifos no Templo de Hartor, seria um dispositivo elétrico de iluminação produzido no Antigo Egito. De acordo com Childress (2000), a ausência de cinzas ou tochas em locais com pouca visibilidade, como no referido templo, corrobora com a hipótese de que os egípcios desenvolveram tecnologias para iluminação a partir da produção de eletricidade. De acordo com Noguera (2012) a pedagogia da pluriversalidade nos convida a denegrir a educação, e esta pode ser descrita como um esforço de revitalizar as perspectivas esquecidas, problematizando os cânones, refazendo e ampliando currículos. Assim, ao partir da lâmpada de Dendera para introduzir o estudo de conhecimentos químicos sobre a eletricidade estamos fazendo o deslocamento epistêmico e denegrindo o ensino de química. Os povos do antigo Egito são negros e assumem nas aulas de química o papel de protagonistas enquanto percussores da produção de conhecimento sobre eletricidade. Ao criarmos um elo entre os egípcios e a produção de ciência, estamos promovendo a desconstrução de visões deturpadas sobre capacidade de produzir conhecimento do sujeito negro (CAMARGO et al., 2019). Neste sentido, a pedagogia da pluriversalidade oferece um conjunto de novas alternativas para o aprendizado e promoção da equidade racial em sala de aula (NOGUERA, 2012).

Figura 1. Esquema das etapas de realização do trabalho.

A figura 1 retrata o esquema para a produção do planejamento de aulas.

Figura 2. Planejamento de aulas.

Figura 2 apresenta o planejamento de aulas.

Conclusões

Levando para a sala de aula contribuições científicas a cerca do protagonismo de sujeitos negros na produção de ciência e tecnologia, o planejamento desenvolvido colabora com a promoção da equidade racial no ensino de química pois faz repensar estereótipos, possibilitando a criação de uma imagem positiva sobre o povo negro. Assim neste trabalho, propomos a ruptura com modelos e sistemas de ensino que subjugam e invisibilizam culturas, pois a equidade racial consiste também na equidade cultural, e esta deve ser colocada na pauta enquanto meta educacional.

Agradecimentos

Ao Laboratório de Pesquisas em Educação Química e Inclusão – LPEQI/UFG e ao Programa de pós-graduação em Educação em Ciências e Matemática – PPGECM/UFG.

Referências

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MUNANGA, Kabengele. Por que ensinar a história da África e do negro no Brasil de hoje? Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, Brasil, n. 62, p. 20–31, dez. 2015.
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