Autores
da Silva Neta, M.F.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS) ; Barros, E.S.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS) ; Guimarães, A.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS) ; Anunciação, D.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS)
Resumo
O uso de novas metodologias para o ensino de química é imprescindível, uma vez que
essa disciplina é tratada pelos alunos como desinteressante, de complexa
compreensão e de difícil aplicabilidade em seu cotidiano. Sendo assim, O objetivo
deste trabalho foi avaliar o processo de ensino-aprendizagem do conteúdo de
cinética química em uma turma de ensino básico, a partir o uso da experimentação.
Também foi verificado ponto de vista dos alunos sobre a disciplina e as
metodologias alternativas de ensino. Para este fim, foram realizados experimentos
de cinética química, com materiais de baixo custo e aplicados questionários antes
e depois dos experimentos, por meio dos quais foi constatado como os modelos de
abordagens práticas contribuem para o processo de ensino-aprendizagem dos alunos.
Palavras chaves
Ensino de química; Experimentação; Cinética química
Introdução
Nos últimos anos, o ensino de modo geral, mais especificamente o das ciências
(Química, Física e Matemática) tem sido caracterizado por muitos alunos como
desmotivador, desinteressante, desestimulante e de compreensão complexa, levando
os discentes a memorização dos conceitos apenas com a finalidade de aprovação na
disciplina, de acordo com Santos (2007), isso acontece devido ao fato dos alunos
não conseguirem identificar uma relação entre o que estudam e o cotidiano,
assim, o processo de aprendizagem não ocorre de maneira eficiente e satisfatória
para os discentes. Eichler e Del Pino (1998), no âmbito da química, defendem a
prerrogativa que uma química contextualizada e útil para o aluno, futuro
cidadão, deve ser uma química do cotidiano, buscando a aplicação do conhecimento
químico estruturado para investigar possíveis explicações para a facilitação da
leitura dos fenômenos químicos presentes em diversas situações na vida diária.
Nesse sentido, o uso de novas metodologias de ensino que proporcionem novas
possibilidades de aprender, valorizando o conhecimento do aluno e a sua
participação ativa na construção de novos saberes, constituem um ponto chave no
âmbito da experimentação.
A experimentação no ensino de química tem sido alvo de diversos estudos
(FERREIRA et al., 2010; GUIMARAES, 2009), os quais abordam as contribuições
positivas dessa metodologia, a qual, quando abordada de forma correta tende a
envolver o aluno, possibilitando uma maior aproximação com o conceitual, fazendo
com que o discente possa analisar e estudar fenômenos complexos através de
práticas fáceis, e desse modo, auxiliando no processo de ensino-aprendizagem.
Assim, a experimentação é uma maneira de envolver os alunos no processo de
ensino-aprendizagem buscando uma abordagem pratica da disciplina, pois, a mesma
tem forte persuasão sobre discentes, além do mais, segundo Giordan (1999), a
experimentação aborda três dimensões de suma importância no ensino: a dimensão
psicológica, a sociológica e a cognitiva. A primeira destas três dimensões
refere-se à experiência que os estudantes irão tirar do experimento, ou seja, um
experimento não está imune a falhas, tanto pode dar certo quanto pode dar
errado, com isso o estudante depara-se com uma situação em que terá de criar
modelos para explicar o rumo que o experimento tomar, a segunda dimensão vai de
encontro à aceitação social que todo conceito tem que desenvolver para ser
considerado cientifico, a terceira dimensão por sua vez, vai de encontro a uma
boa aprendizagem e tem o papel de alimentar os modelos mentais dos estudantes
através da experimentação.
Como discutido, o uso da experimentação no processo de ensino-aprendizagem pode
gerar uma série de benefícios, entretanto, nem sempre é possível realizar
experimentos em sala de aula uma vez que, nem sempre há espaço físico apropriado
para a realização dos experimentos e ainda há o fator custos. Nesse sentido,
possibilitar uma experimentação de baixo custo e operacionalmente acessível à
realidade das escolas é algo de suma relevância. Além disso, a utilização de
experimentos simples associados ao cotidiano favorece a aculturação nos
discentes de uma atitude crítica e reflexiva, já que esses passam a enxergar a
ciência no seu dia a dia (NOVAES et al., 2013).
Com isso, destacamos o tópico de cinética química, o qual tem por finalidade o
estudo da velocidade das reações, de processos químicos, além dos fatores que
afetam essas reações/processos. Assim, em sua maioria o ensino de cinética
química é realizado a partir de aulas expositivas e dialogadas que desconsideram
o conhecimento prévio dos alunos, o que tende a tornar o estudo distante e
tedioso (NOVAES et al., 2013; LIMA et al., 2000).
Considerando os aspectos abordados acima, este trabalho, teve como objetivo
avaliar o processo de ensino-aprendizagem em relação ao conteúdo de cinética
química em uma turma de ensino básico, a partir o uso da experimentação como
ferramenta facilitadora, bem como verificar o ponto de vista dos alunos sobre a
disciplina e as metodologias alternativas de ensino.
Material e métodos
A pesquisa foi realizada no mês setembro, do ano de 2022 em uma escola da rede
privada localizada na cidade de Maceió-AL. Participaram do estudo 21 alunos de
uma turma de 2º ano do Ensino Médio, com idades entre 15 a 17 anos, de ambos os
sexos. O direcionamento do estudo realizado é de caráter experimental e de
levantamento de dados. De acordo com Gil (2008), na pesquisa experimental busca-
se observar e controlar os fatores que influenciam determinado objeto de estudo.
Sobre a pesquisa de levantamento, o autor aponta que se trata de uma pesquisa
quantitativa, realizada com uma amostra representativa de um grupo de pessoas,
cuja a problemática se deseja investigar. Inicialmente, foram ministradas seis
aulas associadas aos conteúdos de cinética química conceituando as principais
noções sobre o tema, como definição, teoria das colisões, energia de ativação,
complexo ativado, cálculo da velocidade média de uma reação e os fatores que
influenciam na velocidade da mesma (temperatura, superfície de contato,
concentração e uso de catalisadores). Após o momento inicial, foi
disponibilizado aos alunos o link e o QR code de um questionário (figura 1a) via
Google Formulário contendo cinco perguntas. As três primeiras questões foram
sobre situações do cotidiano envolvendo o tema cinética, especificamente sobre
os fatores cinéticos que influenciam a velocidade de uma reação, entre essas
questões duas foram de múltipla escolha e uma discursiva. As demais questões,
foram relacionadas ao ponto de vista sobre a disciplina e metodologias
alternativas de ensino. Após a aplicação do questionário, foram realizados três
experimentos com materiais de baixo custo, para demonstrar como alguns fatores
afetam a velocidade de uma reação química, sendo os fatores observados,
temperatura, superfície de contato e catalisador. No primeiro experimento,
utilizou-se dois béqueres, um contendo água fria e o outro morna, onde foram
adicionados comprimidos efervescentes, para a avaliação do efeito da
temperatura. No segundo experimento, foram utilizados dois béqueres com água e
um comprido efervescente macerado e um inteiro, a fim de verificar o fator
superfície de contato. O terceiro experimento observou o efeito do uso do
catalisador, por meio do experimento conhecido como pasta de dente de elefante,
que demonstra a decomposição do peróxido de hidrogênio, para tanto utilizou-se
uma proveta, água oxigenada, detergente, corante e permanganato de potássio. Por
fim, após os experimentos, foi fornecido o acesso a um segundo questionário
(figura 1b) que possuía seis questões divididas em dois blocos: no primeiro
bloco foram replicadas as mesmas três primeiras perguntas do primeiro
questionário com o intuito de avaliar o progresso da aprendizagem após a
realização dos experimentos, já o bloco seguinte consistiu em três perguntas
sobre a opinião dos discentes sobre a experimentação na disciplina. Os dados
obtidos foram discutidos por meio de gráficos e abordagens discursivas.
Resultado e discussão
Como mencionado anteriormente no primeiro momento foi introduzido o conteúdo de
Cinética Química através do método tradicional de ensino com auxílio do quadro,
data show e livro didático. O emprego dessa metodologia de ensino-aprendizagem
viabilizou a exposição das principais definições teóricas e exemplificação dos
fenômenos químicos. No entanto, nesse processo o aluno comumente se comporta
como sujeito passivo do seu aprendizado, visto que o professor transmite os
conhecimentos e os alunos geralmente são ouvintes e reproduzem os conceitos
ensinados (MEZZARI, 2011). Assim, o ensino de química apenas por intermédio da
definição de conceitos, exemplos e realização de cálculos intensifica a ideia
generalista da alta complexidade da disciplina e dificuldade de associação com o
cotidiano, isso pode ser expresso pelo percentual de 75% de alunos que
responderam no questionário 1 que consideram o nível de dificuldade da
disciplina de química como difícil ou muito difícil (Figura 2a). Identificando
essa barreira na aprendizagem dos discentes foram questionadas as metodologias
que poderiam facilitar nesse processo onde foram sugeridos como alternativas a
aplicação de jogos didáticos, dinâmicas, experimentos e aula de campo. A partir
da figura 2b foi possível verificar que a maioria dos alunos acredita que a
experimentação e as aulas de campo seriam a melhor opção para possibilitar a
associação da teoria com a prática, tendo em vista que o primeiro recurso
possibilita na prática a visualização das reações químicas, já o segundo
viabiliza a investigação didática em um espaço informal. Com isso, essas duas
ferramentas ajudam a tornar o aluno um sujeito ativo no seu processo de
aprendizagem considerando que este discente irá desenvolver seu conhecimento por
meio das próprias vivências. Outra questão importante a ser considerada é que os
questionários foram compostos por dois tipos de perguntas: múltipla escolha e
discursiva. Segundo Gunther e colaboradores (2012), o primeiro tipo de questões
direciona o entrevistado a uma resposta específica e possibilita ao
entrevistador a quantificação das respostas pelo número de acertos e/ou erros.
Em contrapartida, as questões discursivas, popularmente conhecidas como abertas,
possibilita um pensamento mais elaborado para construção da resposta, porém as
respostas podem divergir entre os entrevistados ou entre o objetivo da pergunta.
Dessa maneira, nas perguntas de múltipla escolha o desempenho dos alunos foi
avaliado para a primeira e a segunda questão em aproximadamente 42 e 20 % de
acertos, respectivamente. Na terceira questão, discursiva, a maioria das
respostas dadas pelos alunos relacionava-se com conhecimento do senso comum e
não foram associadas diretamente aos conceitos teóricos abordados em sala de
aula no momento inicial. Segundo Aranha e Martins (1993) o senso comum é o
conhecimento espontâneo, resultante das experiências adquiridas ao enfrentar
problemas da existência, tem caráter acrítico e fragmentário, porém, de acordo
com os autores se faz necessário torna-lo articulado de forma coerente e
crítica. Seguidamente, foram realizados os três experimentos, com o auxílio de
alguns alunos, vale destacar a grande participação e interesse dos não apenas
destes, mas também dos demais discentes nos experimentos realizados. Como foi
relatado por Giordan (1999) os experimentos envolvem e tem forte persuasão sobre
os alunos, pois se tratam de uma abordagem prática da disciplina. Posteriormente
à realização e explicação dos experimentos, foi aplicado o segundo questionário.
A partir das três questões replicadas no questionário 1 e 2, foi possível
verificar que houve uma melhora no desempenho dos alunos após a inserção da
experimentação. Com relação às questões de múltipla escolha, houve um aumento de
acertos de aproximadamente 11 e 21 % (Figura 2c), nas questões 1 e 2,
respectivamente. Tais resultados, indicam que os experimentos auxiliaram e/ou
facilitaram o processo de ensino-aprendizagem, uma vez que envolvem o aluno,
possibilitando uma maior aproximação entre o teórico e o prático, fazendo com
que o aluno seja capaz de analisar e estudar fenômenos complexos por meio de
práticas simples (GUIMARÃES, 2009). Na terceira questão, que se tratava de uma
questão discursiva, houveram poucas alterações nas respostas, em relação ao
questionário aplicado anteriormente, onde os alunos responderam à questão com
base no senso comum. Porém, é importante destacar a resposta de alguns alunos no
questionário 2, que utilizaram expressões como “Colocar na geladeira para
diminuir o processo de decomposição da comida”; “A elevação da temperatura gera
um aumento na energia cinética”; e “Quanto maior a temperatura, mais rápida a
reação, porque a as moléculas se agitam mais. Sendo assim, as marmitas podem ser
colocadas no congelador para que não azede tão rápido”. Nessas respostas,
verifica-se a transformação do senso comum que Aranha e Martins relatam ser
necessária. Os alunos com as respostas destacadas correlacionaram senso comum e
o conhecimento científico adquiridos por meio da experimentação. Ao serem
questionados se os experimentos auxiliaram no seu entendimento 71% dos alunos
responderam que sim e 29 % responderam que parcialmente (Figura 2d), nenhum dos
alunos respondeu que não, o que evidencia a necessidade da utilização dos
experimentos, como ferramentas de ensino, sendo recomendados por 100% dos
alunos. Por fim, ao perguntar a opinião dos alunos sobre os experimentos, foram
obtidas apenas respostas positivas, como “Foi legal e auxiliou melhor no
entendimento”; “As experiências químicas são necessárias para abranger mais
nossos conhecimentos e estudos.”; “Achei muito interessante e deu pra entender
bastante sobre o assunto”; “Foi muito bom, deveriam acontecer mais vezes para um
melhor entendimento teórico e prático.”; “Achei bastante interessante e deu para
entender melhor.”; e “Achei muito interessante e amei a aula onde todos aprendem
de um modo divertido”. Tais repostas reforçam a importância do uso de novas
metodologias de ensino, que proporcionem novas possibilidades de aprendizado.
a) Questionário 1 (antes dos experimentos) e b) Questionário 2 (depois dos experimentos).
Respostas dos alunos sobre a disciplina e as metodologias de ensino: a), b) e d); e desempenho dos alunos nas perguntas sobre o conteúdo c).
Conclusões
De acordo com os resultados obtidos, foi possível constatar que a experimentação é
uma ferramenta facilitadora no processo de ensino-aprendizagem de química. Apesar
de a maiorias dos estudantes avaliados considerarem a disciplina difícil ou muito
difícil é notório que houve um melhor desempenho por parte destes, após o uso da
experimentação, uma vez que os experimentos fornecem aos alunos uma melhor
aproximação entre teoria e prática, fazendo com que haja uma ruptura das
barreiras levantadas pelo uso exclusivo do ensino tradicional. Ademais, foi
observado a importância de relacionar as atividades experimentais com o cotidiano.
A relevância da proposta do uso da experimentação foi evidenciada também, por meio
das declarações dos alunos, onde houve uma recomendação de 100%, para o uso desta
metodologia.
Agradecimentos
Referências
ARANHA, M. L. da A.; MARTINS, M. H. P. Filosofando: Introdução à Filosofia. 2 ed. rev. atual. São Paulo: Moderna, 1993.
DOS SANTOS, W. L. P. Contextualização no ensino das ciências por meio dos temas cts em uma perspectiva crítica. Ciência e Ensino. 1, número especial. 2007.
EICHLER, M. L. & DEL PINO, J. C. Carbópolis: meio ambiente resolução de problemas e software educacional. IV Congresso RIBIE, Brasília, 1998.
FERREIRA, L. H.; HARTWIG, D. R.; OLIVEIRA, R. C. Ensino Experimental de Química: Uma Abordagem Investigativa Contextualizada. Química nova na escola. 32. 2. 2010.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
GIORDAN, M. O papel da experimentação no ensino de ciências. Química Nova na Escola. 10. 43-49. 1999.
GUIMARAES, C. C. Experimentação no Ensino de Química: Caminhos e Descaminhos Rumo à Aprendizagem Significativa. Química nova na escola. 31. 3. 2009.
GUNTHER, H., & LOPES JÚNIOR, J. (2012). Perguntas Abertas Versus Perguntas Fechadas:: Uma Comparação Empírica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 6(2), 203–213
LIMA, J.F.L.; PINA, M.S.L.; BARBOSA, R.M.N. e JÓFILI, Z.M.S. A contextualização no ensino da cinética química. Química Nova na Escola. 11. 26-29. 2000.
MEZZARI, A. O uso da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) como reforço ao ensino presencial utilizando o ambiente de aprendizagem Moodle. Revista Brasileira de Educação Médica. Rio de Janeiro. v. 35, n. 1, p. 114-121, jan./mar. 2011.
NOVAES, F. J. M. et al. Atividades Experimentais Simples para o Entendimento de Conceitos de Cinética Enzimática: Solanum tuberosum – Uma Alternativa Versátil. Química nova na escola. 35. 1. 27-33. 2013.