• Rio de Janeiro Brasil
  • 14-18 Novembro 2022

A contribuição da experimentação como ferramenta facilitadora no processo de ensino-aprendizagem do conteúdo de cinética química

Autores

da Silva Neta, M.F.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS) ; Barros, E.S.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS) ; Guimarães, A.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS) ; Anunciação, D.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS)

Resumo

O uso de novas metodologias para o ensino de química é imprescindível, uma vez que essa disciplina é tratada pelos alunos como desinteressante, de complexa compreensão e de difícil aplicabilidade em seu cotidiano. Sendo assim, O objetivo deste trabalho foi avaliar o processo de ensino-aprendizagem do conteúdo de cinética química em uma turma de ensino básico, a partir o uso da experimentação. Também foi verificado ponto de vista dos alunos sobre a disciplina e as metodologias alternativas de ensino. Para este fim, foram realizados experimentos de cinética química, com materiais de baixo custo e aplicados questionários antes e depois dos experimentos, por meio dos quais foi constatado como os modelos de abordagens práticas contribuem para o processo de ensino-aprendizagem dos alunos.

Palavras chaves

Ensino de química; Experimentação; Cinética química

Introdução

Nos últimos anos, o ensino de modo geral, mais especificamente o das ciências (Química, Física e Matemática) tem sido caracterizado por muitos alunos como desmotivador, desinteressante, desestimulante e de compreensão complexa, levando os discentes a memorização dos conceitos apenas com a finalidade de aprovação na disciplina, de acordo com Santos (2007), isso acontece devido ao fato dos alunos não conseguirem identificar uma relação entre o que estudam e o cotidiano, assim, o processo de aprendizagem não ocorre de maneira eficiente e satisfatória para os discentes. Eichler e Del Pino (1998), no âmbito da química, defendem a prerrogativa que uma química contextualizada e útil para o aluno, futuro cidadão, deve ser uma química do cotidiano, buscando a aplicação do conhecimento químico estruturado para investigar possíveis explicações para a facilitação da leitura dos fenômenos químicos presentes em diversas situações na vida diária. Nesse sentido, o uso de novas metodologias de ensino que proporcionem novas possibilidades de aprender, valorizando o conhecimento do aluno e a sua participação ativa na construção de novos saberes, constituem um ponto chave no âmbito da experimentação. A experimentação no ensino de química tem sido alvo de diversos estudos (FERREIRA et al., 2010; GUIMARAES, 2009), os quais abordam as contribuições positivas dessa metodologia, a qual, quando abordada de forma correta tende a envolver o aluno, possibilitando uma maior aproximação com o conceitual, fazendo com que o discente possa analisar e estudar fenômenos complexos através de práticas fáceis, e desse modo, auxiliando no processo de ensino-aprendizagem. Assim, a experimentação é uma maneira de envolver os alunos no processo de ensino-aprendizagem buscando uma abordagem pratica da disciplina, pois, a mesma tem forte persuasão sobre discentes, além do mais, segundo Giordan (1999), a experimentação aborda três dimensões de suma importância no ensino: a dimensão psicológica, a sociológica e a cognitiva. A primeira destas três dimensões refere-se à experiência que os estudantes irão tirar do experimento, ou seja, um experimento não está imune a falhas, tanto pode dar certo quanto pode dar errado, com isso o estudante depara-se com uma situação em que terá de criar modelos para explicar o rumo que o experimento tomar, a segunda dimensão vai de encontro à aceitação social que todo conceito tem que desenvolver para ser considerado cientifico, a terceira dimensão por sua vez, vai de encontro a uma boa aprendizagem e tem o papel de alimentar os modelos mentais dos estudantes através da experimentação. Como discutido, o uso da experimentação no processo de ensino-aprendizagem pode gerar uma série de benefícios, entretanto, nem sempre é possível realizar experimentos em sala de aula uma vez que, nem sempre há espaço físico apropriado para a realização dos experimentos e ainda há o fator custos. Nesse sentido, possibilitar uma experimentação de baixo custo e operacionalmente acessível à realidade das escolas é algo de suma relevância. Além disso, a utilização de experimentos simples associados ao cotidiano favorece a aculturação nos discentes de uma atitude crítica e reflexiva, já que esses passam a enxergar a ciência no seu dia a dia (NOVAES et al., 2013). Com isso, destacamos o tópico de cinética química, o qual tem por finalidade o estudo da velocidade das reações, de processos químicos, além dos fatores que afetam essas reações/processos. Assim, em sua maioria o ensino de cinética química é realizado a partir de aulas expositivas e dialogadas que desconsideram o conhecimento prévio dos alunos, o que tende a tornar o estudo distante e tedioso (NOVAES et al., 2013; LIMA et al., 2000). Considerando os aspectos abordados acima, este trabalho, teve como objetivo avaliar o processo de ensino-aprendizagem em relação ao conteúdo de cinética química em uma turma de ensino básico, a partir o uso da experimentação como ferramenta facilitadora, bem como verificar o ponto de vista dos alunos sobre a disciplina e as metodologias alternativas de ensino.

Material e métodos

A pesquisa foi realizada no mês setembro, do ano de 2022 em uma escola da rede privada localizada na cidade de Maceió-AL. Participaram do estudo 21 alunos de uma turma de 2º ano do Ensino Médio, com idades entre 15 a 17 anos, de ambos os sexos. O direcionamento do estudo realizado é de caráter experimental e de levantamento de dados. De acordo com Gil (2008), na pesquisa experimental busca- se observar e controlar os fatores que influenciam determinado objeto de estudo. Sobre a pesquisa de levantamento, o autor aponta que se trata de uma pesquisa quantitativa, realizada com uma amostra representativa de um grupo de pessoas, cuja a problemática se deseja investigar. Inicialmente, foram ministradas seis aulas associadas aos conteúdos de cinética química conceituando as principais noções sobre o tema, como definição, teoria das colisões, energia de ativação, complexo ativado, cálculo da velocidade média de uma reação e os fatores que influenciam na velocidade da mesma (temperatura, superfície de contato, concentração e uso de catalisadores). Após o momento inicial, foi disponibilizado aos alunos o link e o QR code de um questionário (figura 1a) via Google Formulário contendo cinco perguntas. As três primeiras questões foram sobre situações do cotidiano envolvendo o tema cinética, especificamente sobre os fatores cinéticos que influenciam a velocidade de uma reação, entre essas questões duas foram de múltipla escolha e uma discursiva. As demais questões, foram relacionadas ao ponto de vista sobre a disciplina e metodologias alternativas de ensino. Após a aplicação do questionário, foram realizados três experimentos com materiais de baixo custo, para demonstrar como alguns fatores afetam a velocidade de uma reação química, sendo os fatores observados, temperatura, superfície de contato e catalisador. No primeiro experimento, utilizou-se dois béqueres, um contendo água fria e o outro morna, onde foram adicionados comprimidos efervescentes, para a avaliação do efeito da temperatura. No segundo experimento, foram utilizados dois béqueres com água e um comprido efervescente macerado e um inteiro, a fim de verificar o fator superfície de contato. O terceiro experimento observou o efeito do uso do catalisador, por meio do experimento conhecido como pasta de dente de elefante, que demonstra a decomposição do peróxido de hidrogênio, para tanto utilizou-se uma proveta, água oxigenada, detergente, corante e permanganato de potássio. Por fim, após os experimentos, foi fornecido o acesso a um segundo questionário (figura 1b) que possuía seis questões divididas em dois blocos: no primeiro bloco foram replicadas as mesmas três primeiras perguntas do primeiro questionário com o intuito de avaliar o progresso da aprendizagem após a realização dos experimentos, já o bloco seguinte consistiu em três perguntas sobre a opinião dos discentes sobre a experimentação na disciplina. Os dados obtidos foram discutidos por meio de gráficos e abordagens discursivas.

Resultado e discussão

Como mencionado anteriormente no primeiro momento foi introduzido o conteúdo de Cinética Química através do método tradicional de ensino com auxílio do quadro, data show e livro didático. O emprego dessa metodologia de ensino-aprendizagem viabilizou a exposição das principais definições teóricas e exemplificação dos fenômenos químicos. No entanto, nesse processo o aluno comumente se comporta como sujeito passivo do seu aprendizado, visto que o professor transmite os conhecimentos e os alunos geralmente são ouvintes e reproduzem os conceitos ensinados (MEZZARI, 2011). Assim, o ensino de química apenas por intermédio da definição de conceitos, exemplos e realização de cálculos intensifica a ideia generalista da alta complexidade da disciplina e dificuldade de associação com o cotidiano, isso pode ser expresso pelo percentual de 75% de alunos que responderam no questionário 1 que consideram o nível de dificuldade da disciplina de química como difícil ou muito difícil (Figura 2a). Identificando essa barreira na aprendizagem dos discentes foram questionadas as metodologias que poderiam facilitar nesse processo onde foram sugeridos como alternativas a aplicação de jogos didáticos, dinâmicas, experimentos e aula de campo. A partir da figura 2b foi possível verificar que a maioria dos alunos acredita que a experimentação e as aulas de campo seriam a melhor opção para possibilitar a associação da teoria com a prática, tendo em vista que o primeiro recurso possibilita na prática a visualização das reações químicas, já o segundo viabiliza a investigação didática em um espaço informal. Com isso, essas duas ferramentas ajudam a tornar o aluno um sujeito ativo no seu processo de aprendizagem considerando que este discente irá desenvolver seu conhecimento por meio das próprias vivências. Outra questão importante a ser considerada é que os questionários foram compostos por dois tipos de perguntas: múltipla escolha e discursiva. Segundo Gunther e colaboradores (2012), o primeiro tipo de questões direciona o entrevistado a uma resposta específica e possibilita ao entrevistador a quantificação das respostas pelo número de acertos e/ou erros. Em contrapartida, as questões discursivas, popularmente conhecidas como abertas, possibilita um pensamento mais elaborado para construção da resposta, porém as respostas podem divergir entre os entrevistados ou entre o objetivo da pergunta. Dessa maneira, nas perguntas de múltipla escolha o desempenho dos alunos foi avaliado para a primeira e a segunda questão em aproximadamente 42 e 20 % de acertos, respectivamente. Na terceira questão, discursiva, a maioria das respostas dadas pelos alunos relacionava-se com conhecimento do senso comum e não foram associadas diretamente aos conceitos teóricos abordados em sala de aula no momento inicial. Segundo Aranha e Martins (1993) o senso comum é o conhecimento espontâneo, resultante das experiências adquiridas ao enfrentar problemas da existência, tem caráter acrítico e fragmentário, porém, de acordo com os autores se faz necessário torna-lo articulado de forma coerente e crítica. Seguidamente, foram realizados os três experimentos, com o auxílio de alguns alunos, vale destacar a grande participação e interesse dos não apenas destes, mas também dos demais discentes nos experimentos realizados. Como foi relatado por Giordan (1999) os experimentos envolvem e tem forte persuasão sobre os alunos, pois se tratam de uma abordagem prática da disciplina. Posteriormente à realização e explicação dos experimentos, foi aplicado o segundo questionário. A partir das três questões replicadas no questionário 1 e 2, foi possível verificar que houve uma melhora no desempenho dos alunos após a inserção da experimentação. Com relação às questões de múltipla escolha, houve um aumento de acertos de aproximadamente 11 e 21 % (Figura 2c), nas questões 1 e 2, respectivamente. Tais resultados, indicam que os experimentos auxiliaram e/ou facilitaram o processo de ensino-aprendizagem, uma vez que envolvem o aluno, possibilitando uma maior aproximação entre o teórico e o prático, fazendo com que o aluno seja capaz de analisar e estudar fenômenos complexos por meio de práticas simples (GUIMARÃES, 2009). Na terceira questão, que se tratava de uma questão discursiva, houveram poucas alterações nas respostas, em relação ao questionário aplicado anteriormente, onde os alunos responderam à questão com base no senso comum. Porém, é importante destacar a resposta de alguns alunos no questionário 2, que utilizaram expressões como “Colocar na geladeira para diminuir o processo de decomposição da comida”; “A elevação da temperatura gera um aumento na energia cinética”; e “Quanto maior a temperatura, mais rápida a reação, porque a as moléculas se agitam mais. Sendo assim, as marmitas podem ser colocadas no congelador para que não azede tão rápido”. Nessas respostas, verifica-se a transformação do senso comum que Aranha e Martins relatam ser necessária. Os alunos com as respostas destacadas correlacionaram senso comum e o conhecimento científico adquiridos por meio da experimentação. Ao serem questionados se os experimentos auxiliaram no seu entendimento 71% dos alunos responderam que sim e 29 % responderam que parcialmente (Figura 2d), nenhum dos alunos respondeu que não, o que evidencia a necessidade da utilização dos experimentos, como ferramentas de ensino, sendo recomendados por 100% dos alunos. Por fim, ao perguntar a opinião dos alunos sobre os experimentos, foram obtidas apenas respostas positivas, como “Foi legal e auxiliou melhor no entendimento”; “As experiências químicas são necessárias para abranger mais nossos conhecimentos e estudos.”; “Achei muito interessante e deu pra entender bastante sobre o assunto”; “Foi muito bom, deveriam acontecer mais vezes para um melhor entendimento teórico e prático.”; “Achei bastante interessante e deu para entender melhor.”; e “Achei muito interessante e amei a aula onde todos aprendem de um modo divertido”. Tais repostas reforçam a importância do uso de novas metodologias de ensino, que proporcionem novas possibilidades de aprendizado.

Figura 1 -

a) Questionário 1 (antes dos experimentos) e b) Questionário 2 (depois dos experimentos).

Figura 2 -

Respostas dos alunos sobre a disciplina e as metodologias de ensino: a), b) e d); e desempenho dos alunos nas perguntas sobre o conteúdo c).

Conclusões

De acordo com os resultados obtidos, foi possível constatar que a experimentação é uma ferramenta facilitadora no processo de ensino-aprendizagem de química. Apesar de a maiorias dos estudantes avaliados considerarem a disciplina difícil ou muito difícil é notório que houve um melhor desempenho por parte destes, após o uso da experimentação, uma vez que os experimentos fornecem aos alunos uma melhor aproximação entre teoria e prática, fazendo com que haja uma ruptura das barreiras levantadas pelo uso exclusivo do ensino tradicional. Ademais, foi observado a importância de relacionar as atividades experimentais com o cotidiano. A relevância da proposta do uso da experimentação foi evidenciada também, por meio das declarações dos alunos, onde houve uma recomendação de 100%, para o uso desta metodologia.

Agradecimentos



Referências

ARANHA, M. L. da A.; MARTINS, M. H. P. Filosofando: Introdução à Filosofia. 2 ed. rev. atual. São Paulo: Moderna, 1993.
DOS SANTOS, W. L. P. Contextualização no ensino das ciências por meio dos temas cts em uma perspectiva crítica. Ciência e Ensino. 1, número especial. 2007.
EICHLER, M. L. & DEL PINO, J. C. Carbópolis: meio ambiente resolução de problemas e software educacional. IV Congresso RIBIE, Brasília, 1998.
FERREIRA, L. H.; HARTWIG, D. R.; OLIVEIRA, R. C. Ensino Experimental de Química: Uma Abordagem Investigativa Contextualizada. Química nova na escola. 32. 2. 2010.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
GIORDAN, M. O papel da experimentação no ensino de ciências. Química Nova na Escola. 10. 43-49. 1999.
GUIMARAES, C. C. Experimentação no Ensino de Química: Caminhos e Descaminhos Rumo à Aprendizagem Significativa. Química nova na escola. 31. 3. 2009.
GUNTHER, H., & LOPES JÚNIOR, J. (2012). Perguntas Abertas Versus Perguntas Fechadas:: Uma Comparação Empírica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 6(2), 203–213
LIMA, J.F.L.; PINA, M.S.L.; BARBOSA, R.M.N. e JÓFILI, Z.M.S. A contextualização no ensino da cinética química. Química Nova na Escola. 11. 26-29. 2000.
MEZZARI, A. O uso da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) como reforço ao ensino presencial utilizando o ambiente de aprendizagem Moodle. Revista Brasileira de Educação Médica. Rio de Janeiro. v. 35, n. 1, p. 114-121, jan./mar. 2011.
NOVAES, F. J. M. et al. Atividades Experimentais Simples para o Entendimento de Conceitos de Cinética Enzimática: Solanum tuberosum – Uma Alternativa Versátil. Química nova na escola. 35. 1. 27-33. 2013.

Patrocinador Ouro

Conselho Federal de Química
ACS

Patrocinador Prata

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

Patrocinador Bronze

LF Editorial
Elsevier
Royal Society of Chemistry
Elite Rio de Janeiro

Apoio

Federación Latinoamericana de Asociaciones Químicas Conselho Regional de Química 3ª Região (RJ) Instituto Federal Rio de Janeiro Colégio Pedro II Sociedade Brasileira de Química Olimpíada Nacional de Ciências Olimpíada Brasileira de Química Rio Convention & Visitors Bureau