• Rio de Janeiro Brasil
  • 14-18 Novembro 2022

VIABILIADADE DE REJEITO AGROINDUSTRIAL COMO PRECURSOR CATALÍTICO PARA APLICAÇÃO EM REAÇÃO DE TRANSESTERIFICAÇÃO.

Autores

Sobrinho, I.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Silva, A.C.D. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Ribeiro, T.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Silva, K.L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Santos, H.C.L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Gonçalves, M.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ) ; Conceição, L.R.V. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ)

Resumo

Um catalisador heterogêneo básico foi sintetizado variando os parâmetros de calcinação, temperatura (350 - 500 °C) e tempo (1 - 4 h), para determinar as melhores condições e menor gasto de energia na síntese das cinzas das cascas de feijão aplicadas na reação de transesterificação para a produção de biodiesel. O catalisador CCF/400-3 apresentou maior desempenho catalítico e foi caracterizado. A alcalinidade do catalisador são atribuídos as elevadas concentrações de óxidos e carbonatos metálicos formados durante o tratamento térmico aplicado sob as cascas. Posteriormente, o catalisador desativado parcialmente foi regenerado utilizando 10% de agente dopante de KOH e resultou em biodieseis com teores de ésteres elevados durante 3 ciclos sucessíveis de reação.

Palavras chaves

Resíduo agroindustrial; transesterificação; regeneração

Introdução

Os combustíveis fósseis por muitos anos são explorados, produzidos e consumidos em larga escala, tornando-se a principal matriz energética mundial (NIRAJ et al., 2021). Entretanto, nos últimos anos, a preocupação com o esgotamento das reservas energéticas e o aumento da poluição do meio ambiente ocasionados pelas emissões de gases, como o dióxido de carbono emitido em grande quantidade pelo consumo dessa fonte não renovável, contribuem para o aumento do efeito estufa (ZIVKOVIC et al., 2018; CHONG et al., 2021). Devido essas problemáticas, muitas pesquisas vêm sendo desenvolvidas a fim de buscar alternativas para substituição dos combustíveis fósseis, de maneira parcial ou total, por fontes de energia renovável (SEFFATI et al., 2020). O biodiesel tem se mostrado uma alternativa para esse impasse, pois apresenta propriedades energéticas semelhantes ao diesel de petróleo, além disso, é considerado sustentável, emite baixo teor dos gases de dióxido de carbono, dióxido de enxofre e substâncias tóxicas, pode ser usado em motores diesel sem nenhuma modificação, e é derivado de fontes renováveis, como gordura animal ou óleo vegetal (LI et al., 2019; RAHIMPOUR et al., 2016). O biodiesel pode ser obtido por reação de transesterificação na presença de um catalisador. Esta reação de óleos e/ou gorduras com álcoois de cadeia curta (metanol ou etanol), resulta na formação de ésteres alquílicos e glicerol (coproduto). Os catalisadores empregados podem ser de natureza homogênea ou heterogênea, e podem apresentar caráter básico, ácido ou enzimático (MAFFEI et al., 2014). Atualmente, os catalisadores homogêneos são utilizados na indústria de produção do biodiesel devido ao seu baixo custo e alta atividade catalítica, entretanto, apresentam desvantagens como favorecimento de corrosão dos equipamentos, dificuldades na purificação do produto e na recuperação do catalisador (SEMWAL et al., 2011). Em contrapartida, os catalisadores heterogêneos se destacam por serem facilmente separados do meio reacional por centrifugação ou filtração, serem menos corrosivos, mais seletivos, apresentarem elevada atividade catalítica, e principalmente, por serem facilmente regenerados e reutilizados (SUPAMATHANON et al., 2019). Alguns autores sintetizaram catalisadores heterogêneos a partir de resíduos de biomassas que normalmente são descartadas de maneira inadequada como sementes de cupuaçu (MENDONÇA et al., 2019), cascas de ovo (ODETOYE et al., 2021), cascas de arroz (CHE et al., 2018), cascas de banana (ZURENA et al., 2021), semente de açaí (LOURENÇO et al., 2021) evidenciando assim, a ampla disponibilidade de precursores e baixo custo de produção (MARIJA et al., 2020). Além disso, algumas biomassas quando submetidas ao tratamento térmico demostraram potencial catalítico e são utilizadas como catalisadores heterogêneos. Como o estudo desenvolvido por Niran et al. (2022) que utilizaram as cascas de batata como precursor na síntese de um catalisador heterogêneo básico para a produção de biodiesel. Observaram que na composição do catalisador era majoritariamente composta pelo potássio, na forma de óxido e carbonato, seguido de outros elementos alcalinos terrosos como cálcio, sódio, silício em quantidades menores caracterizando a alcalinidade do catalisador sintetizado. O Brasil ocupa a quarta colocação mundial na produção de feijão, no entanto, não está entre os maiores exportadores, devido a maior parcela dessa produção é designada ao consumo interno. Em 2019, segundos aos dados disponíveis pelo Banco do Nordeste, a produção de feijão chegou a 6,82 milhões de toneladas, entre os quais são cultivados diferentes tipos de feijões sendo, o carioca, mais popular e consumido no território brasileiro. Na produção de feijão são gerados resíduos tal como a vagem do feijão, a qual representa em média cerca de 58% do peso total, considerando a vagem com os grãos (COELHO et al., 2018). Portanto, o presente trabalho propõe a síntese de um catalisador heterogêneo básico proveniente das cascas de feijão, um precursor de baixo custo, de ampla disponibilidade e de fácil processamento, a fim de obter um catalisador eficiente na produção de biodiesel e minimizar os resíduos agroindustriais gerados pelas atividades antrópicas.

Material e métodos

Síntese, reutilização e regeneração do catalisador A síntese do catalisador foi realizada de acordo com o método descrito por Bharadwaj (2019) com adaptações. As cascas de feijão secas, coletas em comércio local, foram trituradas em moinho analítico da marca Quimis até obter-se um pó fino (~70 mesh). Em seguida, o material foi tratado termicamente em forno mufla variando as temperaturas (350 °C, 400 °C, 450 °C e 500 °C) e os tempos de calcinação (1 h, 2 h, 3 h e 4 h). Após, os catalisadores sintetizados foram resfriados à temperatura ambiente, macerados, pesados e armazenados em dessecador a fim de evitar contato com o ar atmosférico. Os catalisadores foram denominados como CCF/T-t, em que CCF significa Catalisador Casca de Feijão, T e t significam temperatura e tempo de calcinação. Além disso foi avaliado a reutilização do CCF/T-t para a produção de biodiesel. Após a primeira reação de transesterificação, o catalisador foi recuperado por centrifugação a 2000 rpm por 10 min, lavado e seco em estufa a 105 °C por 12 h. Em seguida, o catalisador foi utilizado na reação de transesterificação nas condições otimizadas em sucessivos ciclos de reação. Quando observou a sua desativação parcial, foi investigada a regeneração utilizando o método de impregnação úmida descrito por Foroutan (2022) com adaptações. O catalisador foi dopado com 10% de KOH variando a razão sólido:liquido de 1 g para cada 20 mL de KOH, sob agitação magnética e temperatura de 60 °C por 1 h. Logo após, o catalisador foi seco em estufa e calcinado nas temperaturas de 200 °C, 300 °C e 400 °C por 3 h. Microscopia eletrônica de varredura (MEV) A morfologia do catalisador foi analisada por microscopia eletrônica de varredura de alta resolução em um microscópio Tescan, modelo VEJA 3LMU operando com tensão de aceleração de 20 kV. Espectroscopia de Raios-X por dispersão em energia (EDS) A análise de EDS foi realizada em um sistema de micro-análise Oxford, modelo AZTec Energy X-Act, resolução de 129 eV. Teor de éster A determinação do teor de éster dos produtos das reações transesterificação do óleo soja com metanol foi realizada por cromatografia gasosa utilizando heptano como solvente, heptadecanoato de metila como padrão cromatógrafico e um cromatógrafo a gás (CG) modelo CP 3800 Varian equipado com detector de ionização de chama (FID), coluna capilar CP WAX 52 CB (30 m de comprimento, 0,32 mm de diâmetro e 0,25 μm de filme), fase móvel utilizando o gás Hélio com fluxo de 1 mL min-1, volume de injeção de 1 μL, com programação de temperatura inicial do forno de 170 °C, com taxa de aquecimento de 10 °C min-1, até 250 °C (mesma temperatura do FID e injetor) de acordo com metodologia adaptada da norma europeia EN14103 (SILVA et al., 2007).

Resultado e discussão

Neste trabalho avaliou-se a influência da temperatura e do tempo de calcinação na síntese do catalisador CCF por meio dos resultados obtidos na conversão em biodiesel, como ilustrados na Figura 1a e 1b. Os catalisadores sintetizados nas temperaturas de 350 °C, 400 °C e 450 °C, exibiram biodieseis com teores em ésteres >80%. Os resultados evidenciam que as calcinações da biomassa nessas temperaturas promovem a carbonização incompleta, resultando na presença de quantidades significativas de espécies carbonáceas da degradação dos principais componentes orgânicos, tais como hemicelulose, celulose e lignina (KUMAR et al., 2020). Enquanto que na síntese do catalisador à 500 °C resultou em um biodiesel com teor de éster de 48,9%. Deste modo, observa-se que a temperatura de calcinação da biomassa em 500 °C, proporciona um decréscimo das espécies carbonáceas no catalisador, sugerindo que a medida que se tem uma menor quantidade destas espécies no catalisador, ocorre uma menor dispersão das fases ativas (óxidos e carbonatos metálicos) no mesmo. Esta observação também foi relatado por Bunushree et al. (2020), em seus estudos acerca da síntese de catalisador a partir de biomassa de algas para aplicação na síntese de biodiesel. Os catalisadores sintetizados foram avaliados a partir do reuso por meio dos biodieseis produzidos na reação de transesterificação. As amostras de biodieseis produzidos no Ciclo 1 pelos catalisadores sintetizados nos tempos de 1 h, 2 h e 3 h apresentaram teores de ésteres >90%. Estes dados induzem que o intervalo de tempo de 1 h a 3 h foram suficientes para promover a carbonização incompleta da biomassa, resultando em quantidades significativas em compostos carbonáceos, como também, na formação das fases ativas, e assim, tornando em um catalisador eficaz para a produção de biodiesel. No entanto, quando o catalisador calcinado em 4 h foi empregado na reação de transesterificação, o biodiesel produzido apresentou teor de éster de 66,7%. Dessa forma, a síntese por 4 h proporciona maior quantidade degradadas de espécies carbonáceas, levando a uma redução significativa na área de superfície, além dá má dispersão das fases ativas na superfície e, consequentemente, ocorre uma diminuição da interação entre os sítios básicos com os reagentes. Assim, o tempo de calcinação igual ou superior à 4 h acarretam em diminuição da atividade do catalisador, que por sua vez desfavorece a formação dos ésteres na reação de transesterificação. Este comportamento também foram observados por Avhad e Marchetti (2015) e Dejean et al. (2017), os autores relatam que o tempo de calcinação influência na qualidade do biodiesel obtido via reação de transesterificação devido as variações das concentrações dos compostos de carbono e das espécies ativas formadas no catalisador sintetizado. Ademais, a figura 1b mostra a atividade dos catalisadores no ciclo 2 na reação de transesterificação. Os catalisadores sintetizados em 1 h, 2 h e 4 h demonstraram conversões abaixo de 16% em teor de éster. Enquanto, que para o catalisador sintetizado a 3 h produziu um biodiesel com 51,2% em ésteres. O decréscimo na conversão em biodiesel nos tempos de calcinação de 1 h e 2 h pode estar relacionado com o processo de formação do catalisador, uma vez que durante o tratamento térmico aplicado nestas condições de síntese pode resultar em uma fraca interação entre a parte inerte e os metais alcalinos presentes, desfavorecendo a atividade catalítica. Assim, os sítios básicos disponíveis no catalisador podem ter sido parcialmente lixiviados no meio reacional ao decorrer do processo reacional anterior. Tais observações também foram relatados nos trabalhos de Dejean et al. (2017) como um dos fatores que afetam o teor de éster dos biodieseis sintetizados no estudo. Entretanto, o catalisador calcinado em 3 h converte cerca de 50% dos triglicerídeos em biodiesel, devido a carbonização da biomassa adequada para a degradação parcial dos compostos orgânicos das cascas de feijão, e formação e dispersão dos grupos funcionais sobre a sua superfície que favorecem a conversão em biodiesel, como também é relatado por Hernández (2022). Porém, a diminuição na conversão em ésteres obtido no Ciclo 2 com o catalisador sintetizado à 400 °C por 3 h, indica a desativação parcial do catalisador sintetizado que pode ser relacionada à lixiviação de sítios ativos no meio reacional, ao preenchimento dos poros, à deposição de triglicerídeos e glicerol na superfície do catalisador e/ou perda de massa do catalisador durante a etapa de recuperação/purificação (CHANGMAI et al., 2020). Deste modo, com base no estudo realizado acerca da influência da temperatura e tempo de calcinação, determinou que as melhores condições ocorreram a 400 °C por 3 h, denominado de CCF/400-3, pois apresentou maior atividade catalítica comparado com os demais catalisadores sintetizados. A estrutura morfológica do CCF/400-3 foi observado por MEV com ampliação de 5000x. A figura 1c revela o complexo sistema de aglomerados de partículas, indicando que os pequenos agregados minerais estão distribuídos em formas e tamanhos irregulares, caracterizando uma morfologia esponjosa das cascas de feijão após a calcinação. Morfologias semelhantes foram relatadas em estudo que utilizaram biomassas para a síntese de catalisadores, tais como casca de vagem de cacau com casca de banana (OLATUNDUN et al., 2020), casca de laranja (CHANGMAI et al., 2020). A distribuição e identificação dos elementos químicos presentes na superfície do catalisador CCF/400-3 foi analisada por EDS, como é ilustrada pelas Figura 1d-e. É possível observar uma homogeneidade na distribuição dos elementos químicos presentes na superfície do catalisador, representados por cores distintas e em alguns pontos intensos que indicam concentração do elemento. Na região de análise, o potássio (azul) apresenta com maior densidade dentre os metais alcalinos. Ademais, a concentração de carbono evidenciado pela figura 1e em vermelho são atribuídos aos carbonatos metálicos e das espécies carbonáceas, resultado do tratamento térmico aplicado sob as cascas de feijão. Já a figura 4f mostra os picos e as porcentagens das concentrações dos elementos. O pico de maior predominância corresponde ao potássio com 13,51%, indicando o K como metal de maior contribuição na composição do catalisador alcalino sintetizado. Logo após, estão os metais alcalinos de cálcio (5,62%), magnésio (5,48%) e o sódio (0,3%). O silício com 0,31% e oxigênio com 38,8% estão relacionados como na presença de silicatos e, enquanto que o carbono com 35,97% é atribuído aos materiais carbonáceos derivados da decomposição parcial dos compostos orgânicos como relato anteriormente, e aos carbonatos metálicos formados. Esse comportamento morfológico também foram relatos para catalisadores heterogêneos a base de casca de Musa acuminata (DAIMARY et al., 2022) e sementes de açaí (MARES et al., 2021). O CCF/400-3 apresentou desativação parcial na produção de biodiesel após 2 ciclos sucessivos. Então, o catalisador recuperado foi regenerado por impregnação úmida utilizando 10% de KOH a fim de potencializar novamente sua propriedade catalítica. Na Figura 2 pode ser observado a influência da temperatura de calcinação na atividade catalítica. No entanto, é notório que a temperatura em 300 °C por 3 h proporcionou um catalisador eficaz para o objetivo desejado, mantendo rendimento de biodieseis por 3 ciclos sucessíveis. Nessa condição de síntese foi observado que as espécies carbonáceas se mantinham estáveis no decorrer da calcinação. Além disso, houve um aumento dos números de sítios catalíticos disponíveis e, consequentemente, na melhora de formação e dispersão dos sítios básicos sobre as espécies carbonáceas. Entretanto, o diferencial pode ser atribuído a ancoragem melhor das espécies metálicas sobre os materiais carbonizados. Observações semelhantes dos parâmetros de regeneração foi discutida no trabalho de Chellappan (2018).

Figura 1

a) Gráfico da temperatura e b) tempo de calcinação na síntese do catalisador, c) MEV, d) EDS, e) distribuição dos elementos químicos e f) espectro EDS

Figura 2

Gráfico da influência da temperatura de calcinação na regeneração de CCF/400-3 na conversão em éster

Conclusões

O trabalho avaliou o desempenho catalítico variando a temperatura e tempo de calcinação. O catalisador sintetizado a 400 °C por 3 h, denominado como CCFF/400- 3, atingiu o máximo rendimento no teor de éster em 2 ciclos sucessivos na reação de transesterificação. Na caracterização do catalisador observou a morfologia de aglomerados e a distribuição homogênea dos metais alcalinos terrosos presentes, combinados a oxigênio e carbonato, sendo o K2O e K2CO3 majoritários na composição de CCF/400-3. O catalisador foi reutilizado, entretanto, no ciclo 2 o biodiesel produzido apresentou teor de éster de 51,2%. Então, o catalisador foi regenerado com 10% KOH, 300°C por 3h demonstrando resultados promissores pois, CCF-10K manteve um rendimento significativo de biodiesel por 3 ciclos sucessivos apresentando teores em ésteres de 97,2%, 92,7% e 76%, respectivamente. Evidenciando que o método aplicado foi eficiente para aumentar o desempenho catalítico na produção de biodiesel. Portanto, as cascas de feijão que normalmente são descartadas de maneira inadequada quando são submetidas ao tratamento térmico, uma técnica simples, possuem potencial catalítico na reação de transesterificação para a conversão em biodiesel.

Agradecimentos

Ao professor Leyvison Rafael Vieira da Conceição, por ter sido meu orientador; ao Laboratório de Catálise e Óleoquímica e Laboratório de Pesquisa e Análise de Combustíveis.

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