• Rio de Janeiro Brasil
  • 14-18 Novembro 2022

PROPRIEDADES CATALÍTICAS TIPO FENTON HETEROGÊNEO DE UM ORGANOMETÁLICO BASEADO EM Fe3+ E FRAGMENTOS DE FOLHAS DE g-C3N4

Autores

Oliveira, E.F. (UFVJM) ; Oliveira, W.L. (UFVJM) ; Cruz, T.S. (UFVJM) ; Batista, W.V.F.C. (UFVJM) ; Teixeira, I.F. (UFSCAR) ; Pereira, M.C. (UFVJM) ; Mesquita, J.P. (UFVJM)

Resumo

Fragmentos de folhas de g-C3N4 funcionalizados com grupos funcionais ciamerulato foram preparados a partir da hidrólise de g-C3N4 em meio alcalino. Este material foi usado para coordenação de íons Fe3+ e sua atividade catalítica tipo Fenton heterogêneo foi avaliada a partir da cinética de degradação do corante índigo carmim. Os materiais foram caracterizados com DRX, FTIR e MEV-EDS. O catalisador apresentou atividade catalítica para a descoloração do corante tanto em meio ácido quanto em meio básico, sendo a taxa de descoloração de 88 e 99 % nos meios ácido e básico, respectivamente, em ~15 minutos de reação. Apesar dos bons resultados obtidos, ainda é necessária uma otimização das condições reacionais para obtenção de um material com eficiência catalítica ainda mais alta.

Palavras chaves

g-C3N4; ciamerulatos; reação de fenton

Introdução

Durante o último século, várias reações industriais foram desenvolvidas unicamente com base nos benefícios econômicos o que tem gerado graves danos ao meio ambiente, uma vez que a maioria dos processos catalíticos industriais usam catalisadores metálicos. Assim, o desenvolvimento e aplicação de novos catalisadores devem caminhar lado a lado com os conceitos modernos de processamento de compostos químicos, baseados na Química Verde (HOOSHMAND et al., 2019). Neste sentido, os catalisadores devem ser projetados com o objetivo de diminuir o impacto ambiental do processo como um todo e proporcionar maiores rendimentos, eficiência, economia e maior controle de seletividade. As alternativas consideradas tem sido o desenvolvimento de catalisadores livres de metais, tais como grafeno e nitreto de carbono grafítico (g-C3N4) ou o aumento da eficiência atômica com uso de metais menos tóxicos e não-nobres (CHOUDHAR, 2020; NAVALON et al., 2017). Neste contexto as principais alternativas tem sido o uso de estruturas baseadas em single-atoms e polímeros de coordenação (BIRADHA; GOSWAMI; MOI, 2020; WANG; LI; ZHANG, 2018). O grupo do Prof. Pérez-Ramírez (ETH-Zurique), relatou em 2018 a coordenação de single atoms de paládio em nitreto de carbono grafítico e melhorou profusamente a atividade catalítica em reações de acoplamento Suzuki (CHEN et al., 2018). Na catálise a polimerização por coordenação é usada para obter um polímero/catalisador que tenha alta atividade catalítica. A modificação no ambiente de coordenação do polímero baseado em single atom é eficiente para aperfeiçoar o seu desempenho catalítico, uma vez que é possível modificar a estrutura do material e dar origem a novas morfologias, topologias e agregar diversidades em geometrias de rede controlando assim as suas funcionalidades (BIRADHA; GOSWAMI; MOI, 2020). Recentemente, em 2022, Chu et al. desenvolveram um novo polímero de coordenação, Co@N–C, com unidades Co–O6 e fontes abundantes de átomos de nitrogênio e carbono. Este foi sintetizado a partir de 3,4-diidroxibenzaldeído (DB) e p- fenilenodiamina (PPDA). O catalisador apresentou uma alta eficiência catalítica para a eletrorredução eficiente de nitrato e degradação catalítica de corante tipo Fenton (CHU et al., 2022). Neste trabalho nós preparamos um composto organometálico formado por íons férricos e fragmentos de folhas de g-C3N4 polimérico funcionalizados com grupos funcionais ciamerulato. O material obtido foi usado para coordenação de íons Fe3+ e sua atividade catalítica tipo Fenton heterogêneo foi avaliada a partir da cinética de degradação do corante índigo carmim. A reação catalítica tipo Fenton é um tipo de reação amplamente aplicada na área catalítica, principalmente para a degradação de poluentes tóxicos. Contudo, esta requer que várias condições estejam ideais para que ocorra de maneira eficiente, como temperatura, concentração do metal ferro, mas principalmente o pH influencia na química da reação tipo Fenton. Em geral, esse tipo de reação exige que o meio esteja ácido, em pH 2,8-3,0. Caso contrário ocorre a precipitação do Fe como Fe(OH)3 (VASQUEZ; PRATO; VEDRENNE, 2018). O desenvolvimento e aplicação de um catalisador tipo Fenton heterogêneo, que possua grande eficiência quântica e que ainda possua uma alta estabilidade em diferentes faixas de pH ainda é um enorme desafio para a área catalítica. Nosso estudo promove um novo conceito sobre catalisadores heterogêneos do tipo Fenton para degradação eficiente do corante índigo carmim.

Material e métodos

A obtenção do g-C3N4 ocorreu através da policondensação térmica da melamina. Neste trabalho, 5 g de melamina foram tratadas termicamente a 550 °C durante 2 horas com uma rampa de aquecimento de 3 ºC.min-1 em atmosfera de N2. Após a obtenção do g-C3N4, o material passou por um processo de esfoliação/fragmentação química com KOH (5 molL-1). 0,5 g de g-C3N4 foi disperso em 40 mL de solução aquosa de KOH por 10 minutos. Em seguida, a mistura foi mantida em refluxo e agitação magnética por 6 horas a 80 °C. Posteriormente, a solução foi filtrada e lavada com etanol. Após a lavagem o material obtido foi seco em estufa (60 °C) por 24 horas. Para a incorporação do Fe3+ na estrutura do g-C3N4 0,5 g do material foi disperso em 50 mL de uma solução aquosa do metal com concentração de 0,1 mol.L-1 com pH~2. A mistura foi agitada durante 24 horas em temperatura ambiente. Após esse tempo a suspensão obtida foi filtrada e o sólido lavado com água até pH próximo a neutralidade e seco em estufa a 60 °C por 24 horas. Para confirmar a presença de Fe3+ na estrutura do g-C3N4 bem como a estabilidade estrutural dos íons no material suporte, 5 mg do material contendo íons de ferro foram dispersas em 15 mL de água. A solução permaneceu em agitação magnética por 5 minutos. Após a agitação a mistura foi centrifugada e o sobrenadante retirado. Ao sobrenadante foi adicionado gotas de uma solução de SCN-. A solução de SCN- foi também adicionada ao sólido precipitado e re-disperso em 15 mL de água. Os materiais foram caracterizados com diferentes técnicas. Os difratogramas de raios X foram obtidos com um equipamento Shimadzu XRD 6000. Espectros FTIR foram obtidos em um equipamento Varian 640ir. A morfologia das amostras investigada com um MEV Tescan (VEGA3 LMH). Todas as amostras sintetizadas foram depositadas em uma fita de carbono e posteriormente metalizadas com ouro utilizando um metalizador QUORUM (Q150RS). O mapeamento EDS foi obtido com o detector da Oxford Instruments acoplado ao microscópio. A avaliação das propriedades catalíticas tipo fenton heterogêneo foi realizada através do monitoramento da degradação do corante índigo carmim em pH 2, 7 e 9. O material g-C3N4, 15 mg, foi disperso em 30 mL de solução aquosa do corante com concentração 20 mg. L-1, em equipamento de ultrassom, Digital Ultrasonic Cleaner, modelo CD-4860. Após a dispersão foi adicionado à solução 25 μL de peróxido de hidrogênio 35%. A reação ocorreu à temperatura ambiente, sob agitação magnética constante, sendo a mesma acompanhada por espectroscopia de UV-VIS(Espectrofotômetro marca Varian, modelo Carry 50), em intervalos de 1 minuto para a análise da descoloração do corante. Com o intuito de comprovar a estabilidade do material e que este possa ser reutilizado após vários ciclos catalíticos foi realizado teste de reuso do catalisador, em uma solução do corante em pH 2. O teste foi realizado em condições semelhantes às descritas anteriormente, onde foram realizados cinco ciclos de 16 minutos.

Resultado e discussão

O uso de KOH concentrado na presença de g-C3N4, num primeiro momento leva a exfoliação da estrutura grafítica facilitando a hidrólise dos grupos funcionais amina (LI et al., 2021). A hidrólise “total” das aminas terciárias leva a quebra das ligações entre as unidades de s-heptazinas, liberando NH3 e formando grupos funcionais tipo ciamelurato (Figura 1A). Na Figura 1B são mostrados os difratogramas de raios X obtidos paras as amostras de g-C3N4 antes e após a reação com KOH. O difratograma obtido para a amostras de g-C3N4 apresenta os picos típicos em ~13º (100) e 27° (002) 2θ (ALOSAIMI et al., 2021; BODJDYS et al., 2008). Após a reação de exfoliação/fragmentação verifica-se a o desaparecimento do pico característico do empilhamento das folhas poliméricas formadas pelos anéis de s- heptazinas e ao surgimento de diferentes picos de difração. Os espectros FTIR são mostrados na Figura 1C. Observa-se tanto na amostra de g-C3N4 quanto na amostra tratada com KOH a presença da banda em 800 cm-1 característica no anel de triazina. Em adição, a amostra de g-C3N4 apresenta as típicas bandas observadas para o nitreto de carbono polimérico, estiramento N-H ao redor de 3000 cm-1, deformação N-H e absorções relativas às ligações C-N e C=N ao redor de 1600 cm-1 e 1200-1500 cm- 1, respectivamente. A baixa absorção observada para a amostra tratada com KOH, na região superior a 3000 cm-1, típica de νO-H, sugere a formação de estruturas com substituição de H+ por K+ (PAPAILIAS et al., 2015). A morfologia das partículas também é significativamente alterada após a exfoliação/fragmentação em meio alcalino (Figura 1D e Figura 1E). Enquanto que o g-C3N4 apresenta uma estrutura com um aspecto baseado em “folhas de papel amassado”, o que é característico desse material quando formado de maneira eficiente, o material esfoliado apresenta partículas em forma de bastão. Após a coordenação dos íons de ferro na estrutura dos fragmentos de folhas de g- C3N4 o padrão de difração sofre alterações significativas (Figura 1B), com os picos de difração similares aos observados em polímeros de coordenação baseados em ciamelurato (MOHAN, 2019). O espectro FTIR mostra fortes absorções na região de 3000 cm-1, devido a substituições de íons K+ por H+, formando grupos funcionais OH além da presença de moléculas de água coordenadas ao íon metálico complexado na estrutura (Figura 1C). Em adição, há um amento das absorções em baixos números de onda, características das ligações Fe3+ com os sítios de coordenação da estrutura dos fragmentos de folhas de g-C3N4 baseados no ciamerulato. A presença de Fe3+ na estrutura foi comprovada qualitativamente usando o íon SCN- por meio da formação de um complexo avermelhado (Figura 2A) e quantitativamente com espectroscopia energia dispersiva de raios X (Figura 2B, Figura 2C, Figura 2D e Figura 2E). O mapeamento mostra uma distribuição relativamente homogênea dos íons de ferro por toda a estrutura do material, com uma concentração ao redor de 4%. A eficiência de um catalisador é determinada principalmente pelo pH das soluções nas quais o material será incorporado, principalmente quando se trata de reações do tipo fenton, uma vez que há uma grande influência no potencial de oxidação dos radicais reativos. À vista disto, o desempenho catalítico do g-C3N4@Fe3+ foi avaliado em diferentes valores de pH, sendo estes, pH 2, 7 e 9. O catalisador do tipo Fenton foi avaliado pelo monitoramento da descoloração do corante modelo índigo carmim. Na Figura 2E é apresentado o gráfico com as curvas de concentração relativa obtidas durante a descoloração do corante em diferentes valores de pH (WANG, 2021). Embora haja uma diferença nas regiões de pH, a degradação do corante pelo catalisador permanece semelhante, com uma degradação média do corante de mais de 80 % para o pH 2 e 99 % de degradação para o pH 7 e 9, em um tempo 16 minutos. Para determinação da constante de velocidade de fotodegradação foi usado o modelo cinético Langmuir–Hinshelwood, o qual considera que a degradação catalítica do corante ocorre como uma reação de pseudo-primeira ordem. A determinação de k’ permite uma análise quantitativa do desempenho das amostras de g-C3N4 dopadas ou não, por meio da comparação das constantes de velocidade aparente. Quanto maior a constante de velocidade aparente da reação melhor o desempenho catalítico em termos de cinética de reação (SONG et al., 2018). A amostra de pH 7 apresentou a maior constante de velocidade aparente, 13,29×10- 2, enquanto que as amostras de pH 2 e 9 apresentaram uma constante de 5,54×10-2 e 12,06×10-2, respectivamente. Apesar das amostras apresentarem constantes distintas, o que seria esperado pela degradação do corante ter sido sucedida em diferentes meios, os resultados foram satisfatórios. Apesar do fato de catalisadores dopados com o metal ferro serem bastante afetados pelo pH do meio, os resultados obtidos demonstram a eficiência do catalisador desenvolvido e sua estabilidade bastante alta atuando em diversas faixas de pH (SONG et al., 2018; WANG, 2021). Para verificar a estabilidade do catalisador desenvolvido foi realizado o teste de reuso em pH 2 em cinco ciclos durante 16 minutos. O pH em questão foi escolhido por ser o mais próximo da reação de fenton convencional, que ocorre na faixa de pH 3 a 4, onde há o maior desempenho da reação. Apesar do pH em questão ter sido o que apresentou o menor desempenho entre os demais, ainda assim os resultados mostram a eficiência e estabilidade do catalisador g-C3N4@Fe3+. Com uma porcentagem de degradação no ciclo 1, 2, 3, 4 e 5 de 89, 85, 66, 51, e 38 %, respectivamente (SONG et al., 2018; WU et al., 2017).

Figura 1: Caracterizações dos materiais

Mecanismo de fragmentação das folhas de g-C3N4 (1A), Difratogramas de raios X (1B), Espectros FTIR (1C), Imagens MEV: g-C3N4 (1D), g-C3N4@KOH (1E).

Figura 2: Caracterizações dos materiais

Teste da presença e estabilidade do Fe3+ no g-C3N4 (2A), Imagens EDS: C (2B), N (2C), Fe (2D), O (2E), Degradação do corante em pH 2, 7 e 9 (2F).

Conclusões

Um novo material baseado em íons Fe3+ coordenados em fragmentos de folhas de g- C3N4 funcionalizados com ânions ciamerulatos foi preparado e demonstrou atividade catalítica tipo Fenton heterogêneo tanto em meio básico quanto em meio ácido. O tratamento químico de g-C3N4 com KOH além de promover a esfoliação do material fragmenta a estrutura por meio da hidrólise das aminas terciárias formando aníons ciamerulatos que forma fortes ligações com os íons metálicos. O catalisador férrico apresentou uma estrutura cristalina similar a polímeros de coordenação. O catalisador se mostrou eficiente em 3 ciclos de reutilização. Apesar dos bons resultados obtidos, ainda se faz necessário uma otimização das condições reacionais para obtenção de um material com maior eficiência catalítica e reusabilidade. Em adição, mais caracterizações e estudos são necessários para elucidação completa da estrutura do material.

Agradecimentos

Agradecemos a CAPES, CNPq (102190/2022-4), FAPEMIG (APQ-02629-17, CEX-112-10), SECTES/MG, e a UFJVM.

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