• Rio de Janeiro Brasil
  • 14-18 Novembro 2022

INFLUÊNCIA DA ADIÇÃO DE CERA DE ABELHA E TWEEN80 NA SOLUBILIDADE DE FILMES DE ÁGAR

Autores

Alves de Holanda, N.N. (UFERSA) ; de Souza Carvalho, L.J. (UFERSA) ; de Lima Leite, R.H. (UFERSA) ; Mendes Aroucha, E.M. (UFERSA) ; Gomes dos Santos, F.K. (UFERSA) ; Gomes de Menezes, F.L. (UFERSA)

Resumo

O ágar pode ser uma matéria prima para bioplásticos mas seu uso esbarra na sua solubilidade em água. Lipídeos podem alterar a solubilidade em água deste material. Este trabalho teve como objetivo estabelecer o efeito da adição de cera de abelha e do surfactante tween80 na solubilidade de filmes de ágar. Utilizou-se um Planejamento Central Composto (CCD) e Metodologia de Superfícies de Resposta (SRM). As solubilidades dos filmes de ágar aditivados com 10% de glicerol (plastificante), cera de abelha e tween80 variaram entre 19,5% e 30,1% a 25ºC. O modelo obtido descreveu 88,5% da variação da solubilidade como função das concentrações de cera e tensoativo. Encontrou-se um mínimo na solubilidade correspondente a 18,9% para filmes de ágar contendo 6,48% de tween80 e 47,74% de cera de abelha.

Palavras chaves

Ágar-ágar; Bioplásticos; Hidrocoloides

Introdução

A poluição causada pelo descarte excessivo de plásticos convencionais derivados do petróleo e não biodegradáveis é um problema global que tem alcançado relevância atualmente e vem sendo pauta de muitos debates e discussões (GARRIDO et al., 2021). Nessa perspectiva, um caminho que vem obtendo resultados promissores é a produção de bioplásticos compostos de elementos à base de matérias primas naturais (LEITE et al., 2020). Normalmente produzidos por meio do emprego de biopolímeros, como as proteínas e os polissacarídeos, os bioplásticos apresentam vantagens em relação aos plásticos convencionais: são biodegradáveis e possuem um ciclo de vida mais curto quando comparados com os plásticos de origem fóssil; se decompõem em dióxido de carbono, metano e água, sendo a degradação das macromoléculas contidas nos bioplásticos resultante da ação de microrganismos de ocorrência natural, como bactérias, fungos e algas, em ambientes microbiologicamente ativos (TONETTO et al., 2020). Um biopolímero promissor é o ágar-ágar, ou simplesmente ágar, extraído de diversos gêneros e espécies de algas marinhas vermelhas, da classe Rodophyta. Tais algas que contém o ágar são classificadas como agarófitas e o teor de ágar presente nelas pode variar de acordo com as condições do mar: temperatura da água, intensidade de radiação solar, tensão de oxigênio e concentração de dióxido de carbono (MOSTAFAVI & ZAEIM, 2020). O ágar é uma mistura heterogênea de dois tipos de polissacarídeos: a agarose, um polímero neutro, e a agaropectina, um polímero com carga sulfatado. A agarose, fração gelificante, é uma molécula linear neutra, essencialmente livre de sulfatos, formada de cadeias repetidas de unidades alternadas -1,3 D-galactose e -1,4 3,6-anidro-L- galactose (MOSTAFAVI & ZAEIM, 2020). A agaropectina, fração não-gelificante, é um polissacarídeo sulfatado composto de agarose e porcentagens variadas de éster sulfato, ácido D-glucurônico e pequenas quantidades de ácido pirúvico. A agarose é o componente principal, representando cerca de 70% do total. Em relação as suas propriedades, o ágar-ágar é insolúvel em água fria, mas se dissolve rapidamente em água quente. O ágar é um material polimérico que absorve uma quantidade de água cerca de até vinte vezes o seu próprio peso, isso se dá pelo seu alto índice de hidrofilicidade, característica que proteínas, polissacarídeos e plastificantes possuem. Essa condição pode afetar diretamente propriedades como a solubilidade e a sorção de umidade dos filmes produzidos através dessa fonte, que por causa da sua grande afinidade com a água oferecem fraca barreira ao vapor. Para contornar essas adversidades, componentes hidrofóbicos naturais como as ceras podem ser adicionados à matriz biopolimérica (BRANDELERO et al., 2013). A cera de abelha é um lipídio comercialmente conhecido e que tem sido muito utilizado em diversos ramos da indústria de cosméticos, farmacêutica e de alimentos. Devido à sua alta hidrofobicidade e excelente resistência à umidade, a cera de abelha é um constituinte favorável para a preparação de filmes comestíveis em combinação com polissacarídeos ou proteínas (OLIVEIRA, 2017). O processo direto de homogeneização entre materiais hidrofóbicos em uma matriz hidrofílica não pode ser realizado com bons rendimentos pois estamos lidando com polaridades diferentes, o que leva à adição de um tensoativo auxiliar na formação e estabilização dessas misturas (OLIVEIRA, 2017, MINCHENG et al., 2017). A solubilidade em água é uma das mais significativas propriedades dos filmes comestíveis, tanto nas suas aplicações, quanto na proteção dos alimentos com elevada atividade de água, ou ainda quando os filmes entram em contato com a água em todo o percurso da comercialização e distribuição dos alimentos, uma vez que eles já estejam embalados. A solubilidade acaba também influenciando outras propriedades de barreira, como a permeabilidade ao vapor de água, porque para obter baixa transferência de vapor dentro de ambientes com faixa de umidade relativa alta faz-se necessário a utilização de material com baixo índice de solubilidade, com o propósito de garantir a integridade do produto, boa propriedade de barreira à umidade e consequentemente maior vida de prateleira (GOUDARZI & SHAHABI-GHAHFARROKHI, 2018; TONGDEESOONTORN et al. 2011). Uma questão que surge é como a adição de matérias hidrofóbicos como a cera de abelha e surfactantes como o tween80 influencia propriedades como a solubilidade de filmes biopoliméricos. Conhecer a solubilidade em água é importante para a aplicação deste tipo de filme em embalagens e coberturas em alimentos. Neste trabalho utilizou-se um planejamento central composto (CCD) e metodologia de superfícies de respostas (SRM) para estabelecer um modelo empírico capaz de descrever a solubilidade dos filmes em função das concentrações de cera de abelha e tween80 utilizadas nas misturas filmogênicas precursoras de filmes de ágar-cera de abelha-tween80-glicerol.

Material e métodos

Os materiais usados neste estudo são foram o ágar-ágar em pó (grau alimentício), fabricado por AGARGEL Indústria e Comércio, o surfactante tween 80 P.S (polissorbato 80), número de hidroxilas 65-80, valor de saponificação 45-55, glicerol P.A. ACS C3H5(OH)3, e a cera de abelha fornecida pela associação de apicultores de Mossoró/RN-Brasil. Os filmes constituídos de ágar, glicerol, tween80, cera de abelha e água foram preparados usando metodologias adaptadas de estudos anteriores (Menezes et al., 2021; Oliveira et al., 2018). O percentual de matéria seca (glicerol, ágar, cera e tween80) foi fixado em 3% da mistura filmogênica, sendo o restante (97%) constituído do solvente (água). O glicerol foi utilizado como plastificante constituindo 10% do total de matéria seca em todos os filmes. A determinação da solubilidade dos filmes de ágar foi realizada segundo metodologia descrita por Menezes et al. (2021) e Oliveira et al. (2018). Neste procedimento, pequenos quadrados (4cm x 4cm) dos filmes foram cortados e usados como amostras. As amostras foram secas a uma temperatura de 105°C, por 1 hora, em estufa (TE-394/2, Tecnal – Brasil). Em seguida foram dispostas em dessecador até atingir a temperatura ambiente (25ºC) para então serem pesadas, fornecendo assim os valores correspondentes à massa inicial. Uma vez determinada a massa inicial das amostras, foi realizada a imersão destas em 50 mL de água destilada, sob agitação de 200 rpm, por 24 horas, a 25°C, utilizando uma mesa agitadora (TE-1401, Tecnal – Brasil), após esse tempo os filmes não solubilizados foram retirados e secos nas mesmas condições usadas na determinação da massa inicial, para então serem pesados para a obtenção da massa final não solubilizada. A solubilidade dos filmes em água foi calculada através da Equação 01. S = ((m_i-m_f)/m_i )x100 (1) Onde S é a solubilidade em água em %, mi é a massa inicial do filme em g, e mf é a massa final do filme em g. O planejamento das composições dos filmes para este estudo foi feito através de um planejamento central composto com dois fatores (X1 = % cera e X2 = % tween80) e uma variável de resposta (Y = solubilidade em água - %). Foram utilizados quatro pontos em fatorial, quatro pontos axiais (em estrela) e três repetições no ponto central, perfazendo um total de onze pontos experimentais. As repetições no ponto central foram utilizadas na estimação da variância e considerou-se a homoscedasticidade ao longo do domínio experimental. Os resultados experimentais para a solubilidade dos filmes de ágar produzidos foram ajustados a um modelo empírico polinomial quadrático do tipo: Y = b0 + b1X1 + b2X2 + b11X12 + b22X22 + b12X1X2, onde b0 é o intercepto, b1 e b2 são os coeficientes lineares, b11 e b22 os coeficientes quadráticos e b12 o coeficiente de interação entre os fatores. O modelo ajustado foi utilizado na obtenção de uma superfície de isoresposta. A análise estatística foi realizada com auxílio do programa Statística 13.2 (TIBCO Inc., USA).

Resultado e discussão

A Tabela 1 mostra os valores codificados e reais assumidos pelos fatores no planejamento experimental, com os respectivos valores encontrados para a variável de resposta (solubilidade dos filmes) para cada formulação das misturas filmogênicas utilizadas na obtenção dos filmes de ágar. Analisando a Tabela 1, é possível perceber que a solubilidade dos filmes variou entre 19,45% e 30,91%, tendo-se obtido a menor solubilidade na formulação 6 -contendo 50% de cera e 5,5% de tween80, e a maior solubilidade na formulação 5 – contendo 25% de cera e 1% de tween80. O ajuste de um modelo quadrático completo com interação entre os fatores (Y = b0 + b1X1 + b2X2 + b11X12 + b22X22 + b12X1X2) aos dados experimentais demonstrou que os maiores efeitos são encontrados para o termo linear do fator X1 (concentração de cera de abelha) e para o termo quadrático do fator X2 (concentração de tween80). O menor efeito foi encontrado para o termo de interação entre os fatores. Eliminando-se os termos de baixa contribuição para o ajuste do modelo aos dados experimentais encontrou-se o modelo que maximiza o valor de R2ajustado, ou seja, estabeleceu-se o modelo com o menor número de termos que permite à descrição adequada da variável de resposta em função dos fatores experimentais. A Tabela 2 apresenta o modelo proposto para a descrição da solubilidade dos filmes e os dados da ANOVA encontrados para a regressão. O modelo obtido foi capaz de explicar 88,5% da variação observada para a solubilidade dos filmes em função dos fatores experimentais. Além disso, o modelo pode ser considerado descritivo para o fenômeno observado considerando que o valor de Fcalculado foi superior ao valor de Fcrítico. A confirmação da adequação do modelo empírico na descrição da solubilidade dos filmes de ágar permite a obtenção de uma superfície de isorespostas (Figura 1) que pode facilitar a compreensão da variação desta propriedade em função das concentrações de cera de abelha e tween80 utilizadas na mistura filmogênica. A Figura 1 demonstra que o aumento da concentração de cera de abelha provoca uma diminuição da solubilidade dos filmes de ágar em água. Essa diminuição está relacionada com a natureza hidrofóbica da cera, que é adicionada justamente com a intenção de diminuir a solubilidade dos biofilmes, com o objetivo de tornar os filmes mais resistentes quando em ambientes úmidos (KHANZADI et al., 2015; CAZON & VAZQUEZ, 2020; SANTACRUZ et al., 2015). Porém, a adição de cera sem a adição de um tensoativo pode não ser eficaz devido à desestruturação da matriz biopolimérica quando da adição de um material hidrofóbico que tende a formar aglomerados no interior da estrutura (KHANZADI et al., 2015). A Figura 1 mostra também que a adição do surfactante tween80 até uma quantidade adequada reduz a solubilidade dos filmes de ágar, porém, quando se adiciona um excesso do surfactante ocorre um aumento da solubilidade dos filmes. Uma possível explicação para este comportamento é que em baixas concentrações as moléculas anfifílicas do tensoativo auxiliam na dispersão da cera hidrofóbica na matriz hidrofílica do polímero e estabilizam a estrutura, porém, um excesso do tensoativo tende a facilitar a solubilização da cera quando em contato com a água. Convém lembrar também que a molécula do tensoativo possui grupos hidrofílicos que podem também contribuir com o aumento da hidrofilicidade do material biopolimérico. A superfície de isoresposta apresenta um ponto de mínimo de solubilidade para concentrações de cera e tween80 iguais a 47,74% e 6,48%, respectivamente. Neste ponto, a solubilidade do filme atinge um valor mínimo de 18,9%. A Tabela 3 compara os valores obtidos para a solubilidade de filmes de ágar obtidos neste trabalho com outros filmes descritos na literatura. Os dados da Tabela 3 mostram que as solubilidades dos filmes obtidos neste estudo são da mesma ordem de grandeza de outros obtidos na literatura. Esperava-se que a solubilidade dos filmes contendo cera de abelha estivesse abaixo dos valores dos filmes de ágar da literatura. Contudo, as condições utilizadas nos ensaios de solubilização dos filmes no presente estudo foram mais severas – agitação, temperatura mais elevada e maior volume de solvente utilizados.







Conclusões

A partir da produção dos filmes, e posteriormente a análise da solubilidade em água, foi possível perceber a redução dos valores desta propriedade com a incorporação da cera de abelha/tween80 em filmes de ágar, constatando que o aumento da % de cera diminuiu significativamente a solubilidade em água dos filmes. No entanto, as concentrações de surfactante influenciaram na solubilidade quando adicionados em concentrações adequadas diminui a solubilidade dos filmes, porém, altas concentrações podem aumentar a solubilidade dos filmes. Recomenda-se a utilização de uma concentração de tween80 de 6,48% na mistura filmogênica para a obtenção de menores valores de solubilidade.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Universidade Federal do Semi-Árido por propiciar os meios para a realização desta pesquisa.

Referências

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