Autores
Guerra, B.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO) ; Almeida, C.M.S. (INMETRO) ; Araújo, J.R. (INMETRO) ; Valaski, R. (INMETRO) ; Jakomin, R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO) ; Rocco, M.L.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO)
Resumo
As células solares orgânicas se destacam entre as energias renováveis pela sua versatilidade, baixo custo e fácil produção. Porém, sua eficiência e tempo de vida são menores que em células inorgânicas. Apesar disso, a eficiência teve um aumento significativo na última década graças, principalmente, à síntese de non-fullerene small molecules (NFSM) para compor a camada ativa. Neste trabalho, a superfície de filmes finos de um polímero doador com NFSM, PBDB-T:ITIC e PBDB-T:o-IDTBR, e com um derivado de fulereno, PBDB-T:PC71BM, foram comparadas por XPS e AFM. Observou-se um comportamento antagônico de acordo com o aceptor. Uma superfície mais rugosa e rica em polímero foi observada nos filmes com NFSM, enquanto o filme com PC71BM mostrou uma superfície mais suave e rica no aceptor.
Palavras chaves
Células solares orgânicas; small molecules; filmes finos
Introdução
O consumo energético mundial cresceu ao longo dos anos, impulsionado pelo aumento da população e pela necessidade de desenvolvimento tecnológico e socioeconômico. Ainda hoje essa matriz energética contém uma grande contribuição de fontes não-renováveis, que trazem uma preocupação com sua escassez em um futuro próximo, além de afetarem negativamente o ecossistema do planeta. Em relação à energia elétrica, os dispositivos fotovoltaicos, também conhecidos como células solares, ganharam um grande destaque de opção renovável na última década. Particularmente, as células solares orgânicas chamam atenção pelos materiais leves e baratos e por serem aplicáveis no procedimento de produção rolo-por-rolo, além de poderem ser flexíveis e com cores e dimensões variadas, tornando sua implementação bastante versátil. Há limitações dessa tecnologia quanto às tecnologias inorgânicas, como sua menor eficiência e seu menor tempo de vida útil (BRONSTEIN et al., 2020). Porém, houve um forte investimento nas pesquisas para aprimorar seus materiais, melhorando a morfologia com a bulk-heterojunction e o tratamento térmico e os compostos da camada ativa. Como resultado sua eficiência dobrou do ano de 2010 para 2020. A síntese de um novo tipo de conjunto de moléculas, chamadas de non-fullerene small molecules (NSFM), foi particularmente responsável por essa evolução. As NSFM são moléculas orgânicas poliaromáticas, policonjugadas e com cerca de 150 átomos que podem ser moldadas para funcionar tanto como doadores ou aceptores de elétrons (HATTON, 2018). Neste trabalho, foi realizada uma análise de superfície comparando filmes finos utilizando como doador o polímero PBDB-T e como aceptores não-fulerenos o ITIC e o o-IDTBR, e o PC71BM como derivado de fulereno, aceptor muito utilizado antes das NSFM.
Material e métodos
Foram preparadas soluções a 20 mg/mL em clorobenzeno dos compostos puros PBDB-T, ITIC, PC71BM e o-IDTBR. Em seguida, foram feitas três soluções em proporção 1:1, misturando-se o doador com um dos aceptores. Os filmes finos foram confeccionados por spin coating, tomando-se uma alíquota de 100 µL da solução mistura, depositando-a sobre um substrato de ITO/vidro e rotacionando-a a 2800 rpm por 40 s. Por fim, a amostra passou por um tratamento térmico sob uma placa aquecida a 150 °C por 15 min. O mesmo procedimento foi adotado para as três blendas, onde cada uma foi identificada de acordo com o seu aceptor, acrescida do sufixo “-f” para diferenciá-las do composto puro. A análise química da superfície foi feita por Espectroscopia de Fotoelétrons Excitados por Raios-X (XPS), no equipamento da Omicron NanoTechnology, com fonte de Al-Kα sob tensão de 15 kV. Os espectros survey e os espectros de alta resolução (HR - high resolution) de C1s, N1s, S2p e O1s foram obtidos utilizando, respectivamente, energia de passagem de 160 eV e 20 eV e step de 1,0 eV e 0,05 eV. As medidas de topografia foram realizadas com microscópio de força atômica (AFM) JPK modelo Nanowizard, coletando imagens de 5 x 5 μm com 256 x 256 pixels no modo tapping, que foram tratadas pelo procedimento flatten.
Resultado e discussão
Os espectros survey não exibiram elementos alheios às amostras, indicando a qualidade dos filmes produzidos. As atribuições dos espectros survey estão de acordo com a literatura (WANG et al, 2019; CORREA, 2017, RAFIQUE et al, 2020) e apresentaram apenas ambientes químicos provenientes dos componentes dos filmes. A exceção foi o espectro HR-O1s do PCBM-f (Figura 1), onde há um alargamento da banda para maiores energias, podendo indicar água adsorvida no aceptor. Os espectros HR-O1s das amostras mostram indícios de satélites entre 535-539 eV. Na Figura 2A comparam-se as porcentagens elementares experimentais com seu valor teórico, considerando as proporções dos componentes na solução mistura. O ITIC-f e o OIDTBR-f possuem menor valor de nitrogênio experimental, de modo que a superfície é mais rica no doador. No PCBM-f, como o enxofre experimental possui menor valor, há menos doador na superfície. Foram observados resultados similares para filmes com os aceptores não-fulerenos (WANG et al, 2020) e para o derivado de fulereno (ZHAO et al, 2017). Uma possível explicação para o ITIC:PBDB-T é que a energia superficial do ITIC é maior, devido a sua geometria, o que faria a molécula evitar a superfície exposta e se depositar preferencialmente no bulk, mais propenso a formar ligações intermoleculares. Como as geometrias são parecidas, a mesma ideia vale para o o-IDTBR. A média da RMS para o PCBM-f foi 1,71±0,07 nm, valor menor do que o medido para o ITIC-f (3,9±0,2 nm) e para o OIDTBR-f (4,3±0,3 nm). Na Figura 2B nota-se um aspecto mais granular e uniforme do PCBM-f, enquanto os com as NFSM exibem um aspecto mais contorcido e rugoso, que advém do enovelamento da maior quantidade do doador na superfície.
Espectros em alta-resolução do O1s
Caracterizações química (A) e morfológica (B) da superfície.
Conclusões
Percebe-se um comportamento antagônico entre o PCBM-f e os filmes com NFSM. Devido às topologias, o PC71BM tende a se depositar com maior concentração na superfície, enquanto as NFSM se concentram no bulk do material. Esses dados, junto com uma maior RMS, podem indicar uma segregação de fases que prejudica a eficiência da camada ativa e requerem uma maior investigação do seu perfil de profundidade. Também, possíveis satélites nos espectros de HR-O1s podem advir da estrutura polimérica do doador, porém, é necessário maiores análises para elucidar a questão.
Agradecimentos
Agradecemos ao INMETRO pelas instalações laboratoriais, à CAPES pela bolsa de estudo e à FAPERJ (Edital: E_12/2021) pelo financiamento do projeto.
Referências
BRONSTEIN, H. et al. The role of chemical design in the performance of organic semiconductors. Nature Reviews Chemistry, v. 4, p 66-77. 2020.
CORREA, R. de S. Estudo espectroscópico de polímeros semicondutores para aplicação em eletrônica molecular. Trabalho de conclusão de curso (Bacharel em Química). Instituto de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.
HATTON, R. A. Chapter 12: Organic Photovoltaics. In: LETCHER, T. M. & FTHENAKIS, V. M. A Comprehensive Guide to Solar Energy Systems With Special Focus on Photovoltaic Systems. 1 edª. London: Academic Press, 2018. p. 255-277.
RAFIQUE, et al. An insight into the air stability of the benchmark polymer:fullerene photovoltaic films and devices: A comparative study. Organic Electronics, v. 6, p. 105456. 2020.
WANG, Y. et al. Stability of Nonfullerene Organic Solar Cells: from Built-in Potential and Interfacial Passivation Perspectives. Advanced Materials, v. 9, n. 19, p. 1900157. 2019.
WANG, L. et al. Quantitative Determination of the Vertical Segregation and Molecular Ordering of PBDB-T/ITIC Blend Films with Solvent Additives. ACS Applied Materials & Interfaces, v. 12, n. 21, p. 24165–24173. 2020.
ZHAO, W. et al. Ternary Polymer Solar Cells based on Two Acceptors and One Donor for Achieving 12.2% Efficiency. Advanced Materials, v. 19, n. 2, p. 1604059.