Autores
Lima, F.S. (UFPA) ; Silva, E.F. (UFPA) ; Martins, R.B.P. (UFPA) ; Martins, L.S. (UFPA)
Resumo
O Brasil se sobressai a outros países por possuir em seu território um vasto
acervo de plantas oleaginosas, que podem ser aplicadas em diversas finalidades. O
óleo de andiroba (Carapa guianensis) é a espécie que mais se destaca, pois além de
do seu uso medicinal, ele possui muitas outras aplicações, dentre as quais aponta-
se a produção de sabões que é o foco deste estudo. Sabão é o produto resultante da
hidrólise básica de gorduras animais ou vegetais. Diante disso, o presente
trabalho objetiva-se em verificar a qualidade do sabão produzido artesanalmente
utilizando o óleo de andiroba em combinação com o extrato aquoso de cinzas, além
de aplicar analises físico-químicas no óleo. O óleo está bem conservado e o sabão
produzido está de acordo com os padrões estabelecidos pela ANVISA.
Palavras chaves
Óleo de Andiroba; Saponificação; Lixívia
Introdução
O Brasil possui um vasto acervo de plantas oleaginosas, por esse motivo o país
tem se destacado, haja vista que, os óleos vegetais(OV) podem ser aplicados com
diversas finalidades, como na produção de combustíveis minerais(MELO,2010; SILVA
,2005;). Na literatura encontra-se também inúmeros trabalhos voltados para a
aplicação do óleo vegetal residual na produção de sabões, sendo essa prática uma
alternativa para que esses óleos oriundos de fritura não sejam despejados
incorretamente na natureza (RODRIGUES et al, 2021; SOUZA, 2013; KRÜGEL, 2018).
No entanto, outras variadas espécies de OV podem ser aplicados na fabricação de
sabão, como óleos de: Castanha-do-Pará, Babaçú, dendê, entre outros. (CAOBIANCO,
2015; MENDONÇA,2021). Caobianco (2015) destaca que, os óleos vegetais de dendê e
babaçú são os mais utilizados na fabricação de sabões. Diante desse contexto o
presente trabalho traz a aplicação do óleo vegetal de andiroba (Carapa
guianensis) na fabricação de sabão artesanal. A andiroba é uma das inúmeras
espécies de plantas oleaginosas encontradas no Brasil, trata-se de uma árvore
que pode ser encontrada principalmente na Amazônia e também na África e América
central, pertencente à família Meliaceae, sua altura pode chegar até 30 metros e
seu diâmetro a 120 centímetros. O período de amadurecimento dos frutos ocorre
duas vezes ao ano, fevereiro-março e junho-julho. Segundo Ribeiro et al (2021),
o óleo de andiroba vem sendo aplicado na medicina com múltiplas finalidades,
dentre as quais os autores destacam algumas ações como: anti-inflamatória,
redutora nas dores causadas por reumatismo ou artrite, redutora de algumas
doenças respiratórias, entre outras, e ressaltam os efeitos terapêuticos do óleo
de andiroba no combate a algumas doenças. A graxa é um dos principais
ingredientes na fabricação de sabão e consiste em vários compostos químicos
simples de ésteres. Esses ésteres são classificados como mono, di ou
triglicerídeos. Os glicerídeos normalmente contêm dois ou três ácidos graxos
diferentes em sua estrutura. Assim, óleos e gorduras são misturas de vários
glicerídeos de ácidos graxos, cuja composição depende do tipo e origem da
matéria-prima, que pode ser de origem animal ou vegetal(CASTRO, 2009). A
fabricação de sabões é uma atividade que possui cerca de 4500 anos de
existência, e ao longo desse período a indústria saboeira evoluiu, sofreu
modificações na técnica, graças a muitas experiências práticas e a estudos
teóricos da natureza química das matérias primas, desenvolvidas por incansáveis
pesquisadores(LIMA et al, 2014). Nesse sentido, além dos óleos e gorduras,
outros materiais podem ser empregados na confecção dos sabões, até mesmo as
cinzas de madeira. Estas são provenientes da queima de vários produtos
orgânicos. Por isso, a composição química das cinzas depende da origem. E pode
ser composta com altos teores de sódio, potássio, cálcio, silício e magnésio,
que se apresentam na forma de carbonatos e óxidos (VENQUIARUTO, et al, 2018). A
presença destes compostos são responsáveis pela alcalinidades das cinzas. Tais
componentes são gerados durante a queima de combustíveis, e ao adicionar água às
cinzas, os óxidos solúveis(K2O, CaO, Na2O) se transformam em hidróxidos(KOH,
Ca(OH)2,NaOH), que são bases fortes e formam um extrato alcalino que pode ser
utilizado na fabricação de sabões. O sabão é como um sal de ácido graxo, o qual
é obtido pela hidrólise básica de gorduras animais ou vegetais (MENDONÇA,2021;
BALDASSO et al. 2010; RUSSELL, 1994, p. 1216,). O aquecimento de gordura animal
ou óleo vegetal na presença de um álcali resulta na reação de saponificação
(VENQUIARUTO, et al, 2015). A reação que ocorre entre o óleo e a solução aquosa
de álcali transforma-se em glicerol e em uma mistura que contém ácidos graxos e
sais alcalinos denominadas sabões. De acordo com Lima e colaboradores (2014), o
poder de limpeza do sabão está ligado ao fato de suas moléculas possuírem
caráter anfótero, visto que, essa propriedade permite que óleo, gordura e água
se misturem ao mesmo tempo, ajudando a limpar sujeiras. A molécula contém duas
extremidades, sendo, uma extremidade carboxílica polar, hidrofílica, e outra
extremidade hidrocarbônica que é apolar, solúvel em óleos. Esta estrutura
permite que os sabões dispersem pequenos glóbulos de óleo em água,
possibilitando a limpeza de sujidades. Contudo, para que os sabões e/ou
sabonetes estejam aptos a serem utilizados e não apresentem riscos para seus
consumidores, faz-se necessário avaliar a qualidade do produto. Por
esse motivo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária estabelece padrões de
qualidade a serem seguidos para tais produtos. Diante do exposto, o presente
estudo teve como objetivo, verificar a qualidade do sabão produzido a partir da
combinação do óleo de andiroba (Carapa guianensis) com o extrato aquoso de
cinzas, mediante testes qualitativos e quantitativos, além de aplicar análises
no óleo.
Material e métodos
O preparo do sabão realizado neste estudo teve como base o trabalho de Pinheiro
e Giordan (2010), onde os autores desenvolveram uma pesquisa, afim de investigar
os saberes popular em relação ao processo de preparo artesanal do “sabão de
cinzas”, o qual é produzido por um grupo de mulheres no interior de Minas
Gerais. Então, para a produção do sabão que foi realizada neste trabalho,
seguiu-se a metodologia aplicada por Venquiaruto et al (2015), com algumas
adaptações, portanto, optou-se por utilizar o óleo vegetal de andiroba(Carapa
guianensis) como matéria-prima, além da lixívia da cinza de madeira para fazer a
hidrólise alcalina. Vale ressaltar que, a produção do sabão foi realizada na
localidade de Boa Vista do Iririteua, situada no município de Curuçá no estado
do Pará. As análises físico-químicas foram desenvolvidas no Laboratório de
Síntese e Biotransformação, localizado no prédio do Laboratório de fármacos,
vinculado ao programa de pós graduação em química (PPGQ) da Universidade Federal
do Pará, campus do Guamá. A produção do sabão desenvolveu-se em três etapas:
coleta, preparo da lixívia e a hidrólise alcalina. E utilizou-se os seguintes
materiais: aproximadamente 3 kg de cinzas de madeira, 150 mL de óleo de
andiroba, água, 1 balde de plástico com capacidade para 25 L, 1 panela de
alumínio, 1 colher de pau, 1 peneira de plástico, 1 pano de algodão e fogão a
lenha. As cinzas foram coletadas na residência de um moradora da localidade
citada. Outra moradora da mesma localidade doou 400 mL do óleo de andiroba, que
foi utilizado para produzir o sabão e para as análises laboratoriais. As cinzas
foram peneiradas e depositadas em um balde de plástico e em seguida adicionou-se
água quente. A mistura foi filtrada com o auxílio de um pano de algodão, para
retirar os compostos insolúveis. O óleo de andiroba(150 mL) foi colocado na
panela de alumínio juntamente com uma quantidade da lixívia extraída das cinzas,
a mistura foi levada ao fogo , por um período de três a quatro horas por dia,
durante 7 dias . O restante da lixívia foi adicionada aos poucos, ao todo
utilizou-se aproximadamente 25 litros da solução alcalina. Retirou-se uma
pequena quantidade da mistura e colocou-se em um recipiente com água agitando
com as mãos, para verificar se o sabão ja estava pronto. O produto final foi
derramado ainda quente em um recipiente de plástico. O índice de acidez do
andiroba foi determinado de acordo com a metodologia desenvolvida pelo instituto
Adolfo Lutz (2008). O pH foi caracterizado conforme a metodologia de Pereira et
al. (2018). A massa específica foi determinada com base no método do picnômetro,
recomendado pelo Instituto Adolfo Lutz (2008). E utilizou-se o protocolo CD 3C-
91 da AOCS (2009) para determinar o índice de saponificação (IS). O teste de
alcalinidade e o pH do sabão foi realizado conforme a metodologia apresentada
por Prates (2006). O teste de espuma foi realizado de acordo com Cheah &
Cilliers (2005).
Resultado e discussão
Em conformidade com a metodologia citada para cada análise, efetuou-se os
cálculos para obtenção dos resultados. Na Tabela 1 estão
contidos os resultados das análises feitas no óleo de andiroba (Carapa
guianensis). Na
qual observa-se que, o valor de pH obtido foi de 5,39; A média
do índice de acidez foi de 2,64 mg.KOH/g; a massa específica ficou em torno de
0,9019 e para o índice de saponificação obteve-se uma média de 235,43.
O valor de potencial Hidrogeniônico obtido nesta pesquisa encontra-se entre os
resultados encontrados por Silva e colaboradores (2014), que ao caracterizarem
três grupos de óleo de andiroba de lugares diferente, obtiveram valores médios
de 4,95 (supermercado), 5,80 (Bragança) e 5,83 (Ver-O-Peso). O índice de acidez
obtido está entre os valores encontrados por outros autores como para Cruz et al
(2011) que analisaram 4 amostras e obtiveram valores entre 5,11 e 13,59 mg.
KOH/g. No entanto observou-se uma diferença significativa em comparação com
outros autores como para Ralph, Figliuolo & Nunomura (2014) que analisaram 3
amostras de óleo de andiroba e alcançaram resultados entre 67,44 e 68,63 (mg
NaOH/ g óleo). Apesar da disparidade nos resultados em comparação com estes
autores, salienta-se que os achados neste estudo, encontram-se dentro dos
padrões estabelecidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, levando em
consideração o Regulamento técnico para óleos vegetais, gordura vegetais e creme
vegetal, que define uma acidez máxima de 4,0 mg. KOH/g para óleos prensados a
frio e não refinado (ANVISA, 2005). Ressalta-se ainda que, o óleo de andiroba
analisado é de boa qualidade e está em ótimo estado de conservação podendo ser
utilizado nana fabricação de sabões devido ao seu baixo índice de acidez, dado
que, “o índice de acidez elevado aponta um alto grau de degradação do óleo
(RALPH, FIGLIUOLO & NUNOMURA, 2014; SILVA, 2018). E segundo Caobianco(2015), os
OV’s com excesso de acidez livre não são convenientes na produção e sabões, o
que não é o caso do óleo analisado neste estudo.
Em relação a massa específica e índice de saponificação notou-se que os
resultados estão em concordância com a literatura, visto que, outros autores
obtiveram resultados aproximados, sendo valores entre 0,86 e 0,88 kg/m3 para
densidade (RALPH, FIGLIUOLO & NUNOMURA, 2014; SILVA et al, 2014) e 238,84mg.KOH
g-1 para o índice de saponificação encontrado por Oliveira et al (2016). Estes
afirmam que o resultado encontrado para o índice de saponificação “é um
indicativo de que o óleo da semente de andiroba possui ácidos graxos em sua
formação de peso molecular parecido ao da maioria dos óleos vegetais, como o de
soja, cujos índices de saponificação, são superiores a 181 mg. KOH/g-1”
(OLIVEIRA et al 2016).
Os resultados dos testes qualitativos e quantitativos aplicados ao sabão
produzido estão contidos na Tabela 2. O pH obtido foi 10, e a média de
alcalinidade foi 0,08 %, estando concordância com os padrões estabelecidos pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária, que determina o pH no entorno de 10,4
e alcalinidade máxima de 0,5% (ANVISA, 2008). Porém, para uma possível
comercialização do sabonete, faz-se necessário estudos dermatológicos que
garantam a segurança do produto, já que, o pH está contido entre 9,5 e 10
(ANVISA, 2007).
Para formação de espuma, os resultados foram significativos, visto que,
obteve-se valores aproximados a encontrados na literatura para a fabricação de
sabões com óleos vegetais, como em estudo desenvolvido por Souza (2013), que
obteve resultados entre 1,8 e 2,1 centímetros, para o sabão produzido com óleo
de algodão residual de fritura sem adição de extratos de própolis e eucalipto.
Resultado das análises aplicadas no óleo vegetal utilizado para a produção do sabão.
Resultados dos testes qualitativos e quantitativos aplicados no sabão produzido com óleo de andiroba(Carapa guianensis).
Conclusões
Com base na literatura consultada, depreende-se que o óleo de andiroba (Carapa
guianensis) possui diversas aplicações além do seu uso medicinal. Em relação ao
óleo analisado neste trabalho, os resultados apontam que o mesmo está em ótimo
estado de conservação a apto a ser utilizado na produção de sabões, pois possui
índice de acidez adequado para essa finalidade.
Fundamentado nos testes qualitativos e quantitativo aplicados ao produto
resultante da hidrólise alcalina aplicada ao óleo de andiroba (Carapa guianensis)
em combinação com o extrato aquoso de cinza, compreende-se que o óleo vegetal de
andiroba tem um potencial relevante na produção de sabões, visto que, os
resultados indicam que o sabão produzido neste estudo está em conformidade com os
padrões estabelecidos pela ANVISA.
Vale ressaltar que o produto pode ser considerado de baixo custo, pois o óleo de
andiroba pode ser extraído de maneira artesanal e as cinzas de madeira podem ser
coletadas em residências de famílias que utilizam a lenha como combustível para o
cozimento de alimentos ou em casas de farinha.
Destacamos que estudos dermatológicos que garantam a segurança do produto devem
ser aplicados para uma possível comercialização do sabão.
Agradecimentos
A Univesrsidade Federal do Pará e ao Laboratório de Planejamento e Desenvolvimento
de Fármacos.
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