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60º COngresso Brasileiro de Química

EXPERIMENTAÇÃO: uma alternativa didática na formação de professores de química durante a pandemia de Covid-19 (SARS-Cov-2).


ÁREA

Ensino de Química

Autores

Jacaúna, M.C. (UEA) ; Mendes, L.N.T. (UEA) ; Pereira, K.L. (UEA) ; Souza, E.R. (UEA) ; Souza, A.L.S. (UEA) ; Bello, J.S.R. (UEA) ; Frois, D.O. (UEA) ; Eleuterio, C.M.S. (UEA) ; Assis Júnior, P.C. (UEA)

RESUMO

Este estudo é resultado dos experimentos realizados por acadêmicos do curso de Licenciatura em Química, ofertado pela Universidade do Estado do Amazonas, nas aulas de Didática, durante a pandemia de Covid-19. A proposta da disciplina envolveu o estudo de teorias pedagógicas e de pressupostos básicos que fortaleceram a formação do professor e o exercício da docência. Os experimentos sugeridos pelos professores formadores tinham o propósito de relacionar os conteúdos curriculares da Química com o momento vivenciado, fortalecer as aulas síncronas e mostrar que a partir de materiais do cotidiano, de fácil acesso e baixo custo, é possível mediar o conhecimento e contribuir com a aprendizagem dos estudantes.

Palavras Chaves

Práticas Experimentais; COVID-19; Formação Docente

Introdução

As atividades práticas experimentais são alternativas importantes utilizadas pelos professores do ensino de Ciências, que auxiliam os estudantes na compreensão dos conteúdos disciplinares trabalhados em sala de aula. Para Viviani e Costa (2010) esse tipo de atividade se apresenta no contexto escolar como um recurso didático que complementa às aulas teóricas. O professor ao ministrar uma aula teórica vinculada às atividades experimentais, chama a atenção dos estudantes, proporciona a observação e gera discussão sobre o tema apresentado, desenvolvendo o senso crítico dos estudantes e gosto pela disciplina estudada. Para Souza (2011); Kundlastch, Agostini e Rodrigues (2018) as atividades experimentais se configuram uma importante estratégia para promover a aprendizagem dos conteúdos disciplinares vinculados a ciência Química. Em função disso, Silva, Machado e Tunes (2013) mostram a importância dos futuros professores conhecerem as potencialidades e limitações desse recurso no ensino de Química, bem como saibam planejar e conduzir atividades experimentais em diferentes contextos de nossa realidade educativa. Isso é fato! Os resultados das atividades realizadas pelos acadêmicos do Curso de Licenciatura em Química da Universidade do Estado do Amazonas – UEA, nas aulas de Didática, durante a pandemia, corroboram a afirmação de Silva, Machado e Tunes (2013). Esses autores afirmam que a experimentação pode ser entendida como uma atividade que permite a articulação entre fenômenos e teorias. Esse fragmento é sustentado pelos PCN+ (BRASIL, 2002) que demonstram a possibilidade de realizar as experimentações de diferentes maneiras como, por exemplo, experimentos de laboratório, demonstrações em sala de aula, simulações virtuais, vídeos, filmes e estudos do meio. Em meio as mudanças sociais que envolveram o aparecimento do novo coronavírus, em março de 2020, devido a necessidade de praticar o isolamento social para evitar o contágio da doença, órgãos governamentais e vigilâncias em saúde, como a Organização Mundial da Saúde – OMS, sugeriram o fechamento e a suspensão das atividades presenciais em todas instituições de ensino. Deste modo, a UEA precisou se adequar a essas mudanças e, visando atender aos protocolos, suspendeu as aulas presenciais e passou a oferecer as aulas e atividades práticas de forma remota. Para isso, foram utilizadas plataformas digitais: WhatsApp, Google Meet, Google Class Room etc. Essa substituição afetou diretamente na metodologia dos professores. Nesse período, professores responsáveis pela disciplina de Didática, mostraram que mesmo num momento atípico como esse que se vivencia, é possível reinventar a prática docente. Para que as atividades pudessem ser realizadas no contexto do estudante, propuseram atividades que possibilitassem tecer diálogo entre os conteúdos da química e o fenômeno do coronavírus que, exige práticas de segurança e proteção: higienização corporal (água, sabão, álcool), o uso de equipamentos próprios como: máscaras, toucas, aventais, luvas, protetor ocular e facial etc. Com bases nessas informações foram sugeridos três experimentos: 1º) produção de um álcool utilizando matéria prima presente no cotidiano do estudante de química; 2º) confecção de um sabão reutilizando óleo residual de cozinha e o 3º) elaboração de um polímero de adição também utilizando material de fácil acesso, baixo custo e de conhecimento dos estudantes. Esses experimentos corroboraram o estudo da química orgânica que envolvia a função álcool, processo de fermentação, reação de saponificação, estudo de biomoléculas (ácidos graxos, óleos e gorduras), polímeros de adição, reação de polimerização e também a eficácia destes produtos para combate à propagação da doença transmitida pelo vírus. Para este trabalho, somou-se ainda a necessidade de investir em meios sustentáveis, dando origem a uma pesquisa do tipo qualitativa investigativa e sustentável. Essa dinâmica metodológica foi corroborada por Delizoicov e Angotti (2000) que consideram mais convenientes um trabalho experimental que dê margem a discussão e interpretação dos resultados obtidos (quaisquer que tenham sido). O professor nessa dinâmica atua como mediador do conhecimento, amplia conceitos, apresenta leis e teorias envolvidas na experimentação e o professor, é visto como orientador crítico da aprendizagem, que se distancia dos antigos modelos de ensinar os conteúdos e rompe com a postura autoritária e dogmática de ensinar Ciências. Bizzo (2002) adverte que o experimento, por si só não garante a aprendizagem do estudante, nem é suficiente para modificar a forma de pensar dos estudantes, o que exige acompanhamento constante do professor regente e dos formadores de professores, que devem pesquisar quais são as explicações apresentadas pelos estudantes para os resultados encontrados e propor se necessário, uma nova situação desafiadora. Fato revelado na realização dos experimentos e contextualizado nas aulas de Didática.

Material e métodos

Para o desenvolvimento deste estudo, adotamos uma abordagem do tipo quali- quantitativa pelo fato deste estudo possuir características qualitativas e quantitativas, por apresentar um aspecto mais abrangente da experimentação e da relação com o objeto de estudo. De acordo com Gatti (2004) os conceitos de quantidade e qualidade não são totalmente dissociados, na medida em que de um lado a quantidade é uma interpretação, uma tradução, um significado que é atribuído à grandeza com que um fenômeno se manifesta (portanto é uma qualificação dessa grandeza) e, de outro, ela precisa ser interpretada qualitativamente, pois sem relação a algum referencial não tem significação em si. Esses fragmentos foram corroborados pelos procedimentos e resultados dos experimentos. A experimentação neste estudo se constituiu como método de procedimento que segundo Higa e Oliveira (2012) é a base para a introdução do estudante nos processos científicos. Os materiais utilizados nos experimentos foram de fácil acesso e de baixo custo e os procedimentos seguiram as orientações publicadas em sites, artigos e outros materiais bibliográficos. Para produção do álcool utilizamos cana-de- açúcar, fermento biológico e água. Pedaços de cana-de-açúcar descascados foram triturados em 300mL de água, a mistura foi filtrada, o fermento biológico foi adicionado e transferido para um recipiente para iniciar o processo de fermentação (24 horas). Após a esse processo o sobrenadante (solução fermentada) foi transferida para um destilador caseiro (panela de pressão) acoplado a um tubo de silicone passando pelo interior de uma garrafa pet com água gelada. A solução fermentada foi levada ao fogo até ao processo de destilação do álcool. Para produzir o sabão caseiro foram utilizados óleo residual de cozinha filtrado; 500mL de água fervida; 250g de soda cáustica; detergente e sabão em pó. Em um recipiente de plástico foi transferida a água quente e a soda cáustica que foi homogeneizada continuamente com um pedaço de madeira, até dissolução total do soluto. Em seguida, foi despejado 1L de óleo filtrado usado, o detergente e o sabão em pó, resultando uma pasta consistente, que foi depositada em uma assadeira de alumínio forrada com um saco plástico até total solidificação. O polímero foi produzido com amido de macaxeira (Manihot esculenta); 500mL de água; 100mL de vinagre; 100mL de glicerina e corante alimentício. Em um liquidificador foram adicionados 300mL de água, porções de macaxeiras descascadas que foram trituradas, a mistura foi filtrada e deixada em repouso para decantar. O sobrenadante foi descartado e o amido levado ao fogo com 200mL de água, vinagre, glicerina e 3 gotas de corante. Após apresentar aspecto gelatinoso foi despejado em um recipiente de vidro para secar por 7 dias. Os resultados subsidiaram os diálogos entre os conteúdos disciplinares e o momento pandêmico.

Resultado e discussão

Para o desenvolvimento deste estudo, adotamos uma abordagem do tipo quali- quantitativa pelo fato deste estudo possuir características qualitativas e quantitativas, por apresentar um aspecto mais abrangente da experimentação e da relação com o objeto de estudo. De acordo com Gatti (2004) os conceitos de quantidade e qualidade não são totalmente dissociados, na medida em que de um lado a quantidade é uma interpretação, uma tradução, um significado que é atribuído à grandeza com que um fenômeno se manifesta (portanto é uma qualificação dessa grandeza) e, de outro, ela precisa ser interpretada qualitativamente, pois sem relação a algum referencial não tem significação em si. Esses fragmentos foram corroborados pelos procedimentos e resultados dos experimentos. A experimentação neste estudo se constituiu como método de procedimento que segundo Higa e Oliveira (2012) é a base para a introdução do estudante nos processos científicos. Os materiais utilizados nos experimentos foram de fácil acesso e de baixo custo e os procedimentos seguiram as orientações publicadas em sites, artigos e outros materiais bibliográficos. Para produção do álcool utilizamos cana-de- açúcar, fermento biológico e água. Pedaços de cana-de-açúcar descascados foram triturados em 300mL de água, a mistura foi filtrada, o fermento biológico foi adicionado e transferido para um recipiente para iniciar o processo de fermentação (24 horas). Após a esse processo o sobrenadante (solução fermentada) foi transferida para um destilador caseiro (panela de pressão) acoplado a um tubo de silicone passando pelo interior de uma garrafa pet com água gelada. A solução fermentada foi levada ao fogo até ao processo de destilação do álcool. Para produzir o sabão caseiro foram utilizados óleo residual de cozinha filtrado; 500mL de água fervida; 250g de soda cáustica; detergente e sabão em pó. Em um recipiente de plástico foi transferida a água quente e a soda cáustica que foi homogeneizada continuamente com um pedaço de madeira, até dissolução total do soluto. Em seguida, foi despejado 1L de óleo filtrado usado, o detergente e o sabão em pó, resultando uma pasta consistente, que foi depositada em uma assadeira de alumínio forrada com um saco plástico até total solidificação. O polímero foi produzido com amido de macaxeira (Manihot esculenta); 500mL de água; 100mL de vinagre; 100mL de glicerina e corante alimentício. Em um liquidificador foram adicionados 300mL de água, porções de macaxeiras descascadas que foram trituradas, a mistura foi filtrada e deixada em repouso para decantar. O sobrenadante foi descartado e o amido levado ao fogo com 200mL de água, vinagre, glicerina e 3 gotas de corante. Após apresentar aspecto gelatinoso foi despejado em um recipiente de vidro para secar por 7 dias. Os resultados subsidiaram os diálogos entre os conteúdos disciplinares e o momento pandêmico.

Figura 2 - Desenho procedimental do estudo



Conclusões

Este estudo mostrou que atividades práticas se apresentam no processo formativo uma viável estratégia didática para relacionar os conteúdos disciplinares com situações reais do cotidiano dos estudantes. Além disso, permitiu que os estudantes utilizassem materiais de baixo custo, de fácil acesso e matéria prima de seu contexto geográfico (cana de açúcar, macaxeira etc.). O diálogo entre os conteúdos da Proposta Curricular de Química do Ensino Médio com o momento pandêmico está visível no desenho procedimental. Conteúdos da Química Orgânica como função álcool, fermentação, biomoléculas, reação de saponificação e polimerização, são alguns exemplos que corroboram a dinâmica da disciplina de Didática. A Educação Ambiental também se fez presente quando a partir da reutilização do óleo de fritura foi possível produzir sabão. De modo geral, as práticas experimentais contribuíram com a nossa formação acadêmica mesmo nesse momento tão atípico que a sociedade enfrenta.

Agradecimentos

Aos colegas e professores pela parceria e orientações.

Referências

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