COMPOSIÇÃO QUÍMICA E ATIVIDADE ANTIFÚNGICA DE EXTRATOS ALCOÓLICOS DE PRÓPOLIS VERDE DA CAATINGA DO NORTE DO CEARÁ.

ISBN 978-85-85905-25-5

Área

Produtos Naturais

Autores

Frota, V.M. (UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ) ; Luz, L.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ) ; Costa, M.F. (INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA) ; Mendonça, L.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ) ; Gomes, L.C.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ) ; Fernandes, J.A.B. (INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA) ; Fontenelle, R.O.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ) ; dos Santos, H.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ) ; Zocolo, G.J. (EMBRAPA AGROINDÚSTRIA TROPICAL) ; Rodrigues, T.H.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ)

Resumo

A própolis é uma mistura complexa de substâncias, sendo sua composição química variável de acordo com as características edafoclimáticas da região onde é produzida. O objetivo deste trabalho foi realizar pela primeira vez o estudo sobre a determinação da composição química, rendimentos dos extratos e atividade antifúngica contra cepas de Candida albicans dos extratos de própolis verde do norte do Ceará obtidos com etanol e1 etanol/água (7:3). A variação da composição do solvente influenciou nos rendimentos dos extratos, contudo ambos apresentaram composição química semelhante com predominância de flavonóides. Além disso, os extratos apresentaram importantes resultados de atividade antifúngica frente a C. albicans, o que agrega valor econômico a um novo produto apícola no mercado local.

Palavras chaves

Própolis verde; Flavonóides; Candida albicans

Introdução

A própolis é uma mistura complexa de substâncias de caráter resinoso produzidas pelas abelhas a partir dos exsudatos de plantas para selar frestas na colméia e como barreira contra insetos invasores (AGÜERO et al., 2011). A composição de cada tipo diferente de própolis é dependente de alguns fatores como localização geográfica, biodiversidade local, e condições edafoclimáticas de determinada região (SILVA et al., 2015). A própolis verde brasileira está entre as mais importantes do mundo, sendo exportada para a China, Japão e Alemanha (FERREIRA et al., 2017). Além disso, a própolis é considerada responsável pela baixa incidência de bactérias e fungos na colmeia, atribuído as suas propriedades antimicrobianas, sendo uma das mais investigadas. São relatados alto potencial antibacteriano, antifúngico e antiviral; além de outras atividades biológicas benéficas, como antioxidante, antiinflamatória, antitumoral, hepatoprotetor, imunoestimulante, antimutagênico, dentre outras. Por estas razões ganhou ampla aceitação, e atualmente também é aplicada como constituinte de biocosméticos e produção de alimentos funcionais (ORYAN et al., 2018; ZABAIOU et al., 2017). A composição química da própolis difere significativamente de acordo com sua origem geográfica e botânica, principalmente porque as abelhas coletam as resinas e exsudados das plantas e fontes disponíveis, que variam de região para região de acordo com o clima, o terreno, a disponibilidade de água e outros fatores ambientais (AGÜERO et al., 2011). A heterogeneidade química da própolis é assim facilmente compreensível, pois é uma mistura complexa de compostos derivados de várias plantas e que são processados por enzimas salivares de abelhas. Esta diversidade química traz uma questão crucial de padronização, mesmo que as abelhas, por si só, não mudem seu produto químico e composição (ZABAIOU et al., 2017). Em geral, as inúmeras propriedades da própolis são associadas aos flavonoides, ácidos fenólicos, terpenos e ésteres presentes nessa matriz; sendo atribuída aos flavonoides a maioria das atividades biológicas. A literatura sugere um mecanismo de ação baseado na inibição da síntese do DNA. Embora existam poucos estudos em relação aos mecanismos de ação antimicrobiana dos flavonoides, esses compostos também podem atuar na inibição de diferentes componentes e funções das células microbianas (ORYAN et al., 2018). Muitos trabalhos relatam atividade antimicrobiana, especialmente atividade antifúngica para a própolis, frente às leveduras do gênero Candida spp., e aos dermatófitos do gênero Trichophyton spp. (FREIRES et al. 2016). Nesse sentido, a presença de compostos da classe dos flavonoides na composição de várias amostras de própolis, podem explicar suas promissoras propriedades antifúngicas. Além disso, a toxicidade de determinadas substâncias antifúngicas convencionais e o aumento da resistência microbiana a essas drogas têm incentivado na busca de novas moléculas químicas, especialmente no ambiente farmacológico (FREIRES et al. 2016). Nessa perspectiva, o presente trabalho busca a determinação do rendimento e composição química polifenólica via LC-MS dos extratos alcoólicos da própolis verde da Caatinga proveniente da região norte do Ceará, além da avaliação do potencial antifúngico contra cepas de Candida albicans.

Material e métodos

Coleta da própolis: A própolis verde da Caatinga produzida por abelhas Apis mellifera é proveniente do apiário instalado na Fazenda São Vicente, distrito Caioca (Sobral-CE). As amostras foram coletadas entre 7 a 15 dias depois da exposição dos coletores no período chuvoso da região. Obtenção dos extratos: Uma massa de 3 g de própolis moída foi submetida à extração com etanol (100%) e etanol (70%) na proporção de 1:10 por maceração a frio, em triplicata. Após a obtenção dos extratos, a eliminação do solvente (etanol) ocorreu por evaporação a 40°C, sendo a água residual eliminada por liofilização dos extratos. Os rendimentos dos extratos nos diferentes solventes foram calculados segundo a equação a abaixo: Rendimento (%)=(massa extrato (g))/(massa inicial de própolis (g))×100 Após a obtenção dos extratos secos, os mesmos foram estocados sob refrigeração e ao abrigo da luz para as posteriores análises de determinação da composição química e ensaios biológicos. Composição química via LC-MS: Inicialmente, os extratos foram submetidos a um procedimento de limpeza utilizando o cartucho SPE (C-18) e eluição com metanol, seguida da filtração em filtro de PTFE de 0,22 um. O perfil cromatográfico foi obtido em sistema de cromatografia LC-MS de alta resolução UPLC-ESI-QTof-MS/MS (Waters, Milford, MA, EUA). Para separação dos constituintes químicos dos extratos, foi utilizada uma coluna cromatográfica analítica de fase estacionária C-18 (1,7 μm; 250 × 2,1 mm) operando na temperatura de 40 °C. Como fase móvel, utilizou-se uma combinação de 0,1% de solução aquosa de ácido fórmico e metanol a 0,1% de ácido fórmico no fluxo de 0,4 mL/min. As corridas cromatográficas foram conduzidas em modo gradiente com variação de 5 à 95% do metanol, e volume de injeção de 5 μL. O analisador de massas foi operado no modo de ionização negativo na faixa de massas de 50 e 1180 Da (SOUSA et al., 2016). Atividade antifúngica: Para os ensaios biológicos, as amostras foram preparadas por diluição em óleo mineral a 10% de DMSO na concentração de 10 mg/mL. Para a determinação da Concentração Inibitória Mínima (CIM) e Concentração Fungicida Mínima (CFM) empregou-se o método de microdiluição em caldo em placas de poliestireno de 96 poços, contendo 100 μL do meio RPMI, mais 100 μL de suspensão microbiana, e o extrato etanólico de própolis em um intervalo de concentração de 2,5 a 0,004 mg/mL (CLSI M27-A3, 2008). Foram conduzidos o controle negativo se adição de extratos de própolis, o positivo pelo uso de anfotericina e o controle de contaminação do meio. As culturas foram incubadas a 37°C/48h, e em seguida realizou-se a leitura dos resultados e determinação da (CIM) e (CFM).

Resultado e discussão

Os resultados dos rendimentos dos extratos etanólicos (100% de etanol) e hidroalcoólicos (70% de etanol) foram determinados em termos de porcentagem da massa original da própolis in natura, sendo o maior rendimento (70,59 ± 8,96%) obtido no extrato etanólico, seguido do hidroalcoólico (36,08 ± 3,03%). Além disso, verifica-se que os valores obtidos estão de acordo com os valores de referência da legislação nacional vigente que estabelece valor mínimo de 35% (BRASIL et al,. 2001). Em amostras de própolis também de Apis mellifera do Sul e do Nordeste, foram obtidos 58,46% e 42,62% de rendimento para extratos hidroalcoólicos (FREIRES et al., 2016), resultados pouco superiores aos obtidos neste trabalho. A investigação do potencial da própolis verde da região norte do Ceará foi conduzida inicialmente pela determinação da composição química polifenólica (ácidos fenólicos e flavonóides) pela análise dos extratos em sistema UPLC-MS/MS (Tabelas 1 e 2) que tem sido extensivamente caracterizado por vários estudos recentes (UZEL et al., 2005; XAVIER et al., 2015). Na Tabela 1, constam os resultados da composição química do extrato etanólico de própolis verde da Caatinga. Observa-se uma composição rica em flavonóides como quercetina, isorhamnetina (quercetina metilada), 3,7- dimetilquercetina, e galangina-5-metil-éter. Também foram identificados flavonóis metilados, kaempferide e rhamnetin, flavona (apigenina) e uma flavanona, sakuranetina. Na Tabela 2, observa-se composição química bastante similar à Tabela 1, sendo o quantitativo de flavonóides identificados no extrato hidroalcoólico pouco inferior aos etanólico. Evidências químicas sugerem que Baccharis dracunculifolia é a principal fonte de resina para própolis verde do sudeste, no entanto, fortes indícios com base em observações e na literatura, indicam que a própolis verde da Caatinga, pode ter origem botânica de Mimosa hostilis, popularmente conhecida como jurema-preta (FERREIRA et al., 2017). Embora seja comum a detecção de ácidos fenólicos, flavonóides e fenilpropanóides em extratos de própolis (ORYAN et al., 2018), somente os flavonóides foram detectados na própolis verde da Caatinga (Tabelas 1 e 2). De uma maneira geral, na própolis do Brasil já foram relatados a presença de quercetina e apigenina glicosiladas e/ou metiladas e isorhamnetina, em amostras do nordeste (Piauí e Bahia), centro-oeste (Goiás) e sudeste (Minas Gerais) (RIGHI et al., 2013). Em estudos recentes de própolis do nordeste (Rio Grande do Norte) do Brasil (FERREIRA et al., 2017), foram detectados flavonoides metilados derivados de quercetina, kaempferol e isorhaminetina, resultado similar ao deste estudo. Além isso, na própolis verde (Minas Gerais) foram detectados os seguintes flavonoides, isorhamnetina, kaempferide e sakuranetina, compostos também identificados na própolis verde da Caatinga no norte do Ceará (SZLISZKA et al., 2013). Os flavonóides são antioxidantes, depuradores de radicais livres, e quelantes de metais, com capacidade de inibir a peroxidação lipídica. Por esta razão, são frequentemente utilizados como os principais índices na avaliação pureza e composição da própolis. São os principais marcadores químicos encontrados na própolis e a literatura já relata sua relação com diversas atividades biológicas, em especial as antimicrobianas (ORYAN et al., 2018). Mais de 90% das infecções invasivas por Candida podem ser atribuídas a cinco espécies: C. albicans, C. glabrata, C. parapsilosis, C. tropicalis, C. krusei. e C. albicans, sendo esta, a espécie a mais investigada (UZEL, et al., 2005). Nesse sentido, avaliou-se o potencial antifúngico dos extratos etanólicos e hidroalcoólicos de própolis verde da Caatinga frente a cepas de C. albicans (LABMIC 0101 e LABMIC 0102). Os resultados mostraram que as leveduras testadas foram igualmente inibidas por ambos os extratos de própolis com valores de CIM de 0,039 ug/mL e CFM de 0,078 ug/mL para os dois extratos alcoólicos. Isso demonstra que possivelmente o solvente não influenciou nas propriedades antifúngicas da própolis embora a composição tenha sido pouco influenciada. Nos estudos de FREIRES et al. (2016), os autores testaram duas própolis do Brasil (sudeste e nordeste) e obtiveram valores de CIM na faixa de 2,0 – 4,0 ug/mL e CFM entre 250 – 500 ug/mL contra C. albicans CBS 562, resultados bem superiores ao deste trabalho. Os flavonóides são responsáveis pela maioria das atividades biológicas dessa matriz. Essas moléculas apresentam um mecanismo de ação antimicrobiana atribuído ao anel B dos flavonóides que é capaz de ligar-se via pontes de hidrogênio com as bases nitrogenadas dos ácidos nucléicos impedindo sua replicação (ORYAN et al., 2018). Além disso, existem trabalhos (PIPPI et al., 2015; ORYAN et al., 2018) que sugerem possíveis efeitos sinérgicos entre flavonóides e algumas drogas (antibióticos, antifúngicos, anti-inflamatórios) potencializando o efeito do medicamento, e ampliando as possibilidades de uso da própolis.

Tabela 1. Caracterização química do extrato etanólico de própolis ...



Tabela 2. Caracterização química do extrato hidroalcoólico de própolis



Conclusões

Os resultados obtidos neste trabalho permitiram a determinação da composição química e propriedades biológicas da própolis verde da Caatinga no norte do Ceará. Ao se variar a composição do solvente de extração, verificou-se uma diferença expressiva valores de rendimentos obtidos. Por outro lado, a variação do solvente pouco influenciou na composição química dos extratos de própolis obtidos. Os flavonoides kaempferide, quercetin, e seus derivados metilados identificados em ambos os extratos de própolis verde da Caatinga atuam como fortes responsáveis para a maioria das atividades biológicas. Levando-se em consideração os resultados da atividade antifúngica, percebe-se que os extratos alcoólicos de própolis verde apresentaram resultados satisfatórios de CIM e CFM frente às cepas de C. albicans testadas. Por fim, este estudo além de agregar valor adicional à própolis potencializa um produto local com perspectivas promissoras de aplicações terapêuticas.

Agradecimentos

FUNCAP, FINEP, CNPQ e Embrapa Agroindústria Tropical (Laboratório Multiusuário de Química de Produtos Naturais - LMQPN).

Referências

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