Caracterização fitoquímica de Extratos da Folha da Virola sebifera (mucuíba)
ISBN 978-85-85905-25-5
Área
Produtos Naturais
Autores
Silva, R.M. (UFT) ; Ribeiro, C.L. (UFT) ; Fernandes, R.M.N. (UFT) ; Dias, T.S.S. (UFT) ; Lacerda, G.E. (UFT) ; Scapin, E. (UFT)
Resumo
O Cerrado, segundo maior bioma do país, abriga uma rica flora dentre as savanas do mundo.O estado do Tocantins encontra-se na zona de transição geográfica entre o cerrado e a floresta amazônica, entretanto, ainda existem lacunas referentes ao conhecimento científico do ponto de vista fitoquímico e farmacológico produzido pelas espécies desse bioma. Nesse contexto o objetivo desse estudo foi realizar uma caracterização fitoquímica da espécie Virola sebifera coletada no Tocantins. A presença de fenóis, alcaloides, flavonoides, taninos, glicosídeos antraquinônicos foi cofirmada. A caracterização por CLAE identificou ácido siríngico, ácido p-cumárico, ácido rosmarínico, ácido clorogênico, morina e quercetina, sugerindo atividades antioxidante, fotoprotetora, antidepressiva, dentre outras.
Palavras chaves
Virola sebifera; fitoquímico; Tocantins
Introdução
As plantas se mostram como um importante recurso para a produção de novos medicamentos, sendo uma fonte promissora de produtos naturais biologicamente ativos. Nos últimos anos, tem aumentado o interesse no aproveitamento de fontes naturais, principalmente no que se refere às plantas para o uso farmacêutico, sendo que, na última década houve um significativo crescimento no uso de medicamentos fitoterápicos (BRESOLIN & CECHINEL FILHO, 2010). A investigação fitoquímica tem por objetivo verificar a presença de grupos de metabólitos secundários e caracterizar constituintes químicos presentes em espécies vegetais que podem apresentar funções biológicas como: lignóides com propriedades inseticida, anti-inflamatória, antioxidante, antiviral entre outros; flavonóides com atividade antiviral, antioxidante, anti- inflamatória e antitumoral; alcalóides conhecidos por seu potencial citotóxico; taninos com atividades bactericida, antioxidante, antiviral; saponinas com ação hemolítica, anti-inflamatória e antiviral (SIMÕES et al., 2017). O Estado do Tocantins encontra-se na zona de transição geográfica entre o cerrado e a floresta amazônica, onde o Bioma Amazônia ocupa cerca de 9% do território do Estado de Tocantins, o restante do território (91%) é ocupado pelo Bioma Cerrado (SILVA, 2007). O Cerrado, segundo maior bioma do país, ocupa 21% do território nacional, é considerado um hotspot mundial, e dado a sua mega biodiversidade (MEYERS et al., 2000) abriga uma rica flora dentre as savanas do mundo além de deter cerca de 5% da biodiversidade do planeta (MMA, 2009). Diversas espécies do cerrado vêm sendo utilizadas pelas suas propriedades medicinais (AQUINO; OLIVEIRA, 2006). A Virola sebifera é uma das espécies de Myristicaceae que ocorre frequentemente nos Cerrados da América Central e do Sul (DENNY et al., 2007). No Brasil ocorre em cerrados e em florestas úmidas e é popularmente conhecida por "ucuuba", "urucuba", "mucuíba” (RODRIGUES, 1980). Estudos descrevem a utilização de diversas formas extrativas da Virola sebifera e seus metabólitos secundários como lignanas, neolignanas, flavonóides, policetídeos e outros (KATO et al., 1985; HARROWEN et al., 1998; MARTINEZ, 1999; DENNY et al., 2008; BICALHO, 2011). A espécie em estudo pertence à família Myristicaceae e o gênero Virola. O interesse pela família Myristicaceae foi inspirado por sua etnofarmacologia, onde Gottlieb, em 1979, fez uma revisão descrevendo as pesquisas sobre essas plantas indicando a necessidade de estudos fitoquímicos e farmacológicos desta família (MARTINEZ, 2000). A espécie Virola sebifera apresenta uma rica fonte de pesquisa e os exemplos estudados mostraram-se promissores, demonstrados por meio das atividades biológicas já encontradas como antioxidante, anti-inflamatória, antimicrobiana, antiproliferativa e inseticida (REZENDE et al., 2005; DENNY et al., 2007; CARVALHO, et al., 2010; BARRETO et al., 2011; BICALHO, 2012). Porém, cabe ressaltar a necessidade, sempre, pela busca de novas moléculas bioativas com ação biológica. Visto que as pesquisas encontradas na literatura com Virola sebifera no Brasil estão concentradas principalmente em São Paulo, Goiás e Belém sendo que, não há relato de estudos dos constituintes químicos e atividades biológicas, com a referida espécie no Estado do Tocantins. E segundo Bessa (2013) os metabólitos secundários podem apresentar, para a mesma planta, alterações a partir das diferenças ambientais. Na medicina popular a mucuíba possui diversas indicações terapêuticas, com destaque para o tratamento de úlcera, inflamações e feridas, sendo utilizada para o tratamento dessas enfermidades as cascas e as sementes da planta (COSTA et al, 2008; FENNER et al, 2006). Diante disso, o objetivo é realizar o estudo fitoquímico dos extratos obtidos a partir da folha da V. sebifera, coletada no estado do Tocantins, com o intuito de identificar compostos químicos que possibilitem a busca de novas moléculas ativas com finalidade terapêutica.
Material e métodos
O material botânico foi coletado no município de Porto Nacional-Tocantins. O material foi levado para estufa à 60°C por 48 horas, em seguida foi triturado em moinho de facas e armazenado sob ausência de luz. EXTRAÇÃO A preparação do extrato bruto foi realizada pela extração a frio em Ultrassom e à quente em Soxhlet. Na extração a frio, o material vegetal (5 gramas do pó da folha) foi misturado com 80 mL de etanol 70%, em um béquer (500mL) e extraído sucessivamente por ultrassom. O frasco da amostra foi imerso em um banho de ultrassom (USC1600, ULTRASONIC CLEANER, UNIQUE, São Paulo, Brasil) que possui frequência de 40 kHz (135 W), por um ciclo de 1 h em temperatura ambiente. Para cada extração de solvente, o processo foi repetido cinco vezes combinando os sobrenadantes. Finalizado esta etapa a amostra foi filtrada. A extração a quente foi realizada por meio do Soxhlet, a partir de 5 g do pó da folha vegetal em 200 ml do solvente. Inicialmente foi realizada a extração utilizando etanol 70% para obtenção do extrato bruto. Também foi realizada a extração sequencial, por meio do Soxhlet, usando os solventes n- hexano, metanol e etanol 70%, em ordem crescente de polaridade, para extrair os componentes máximos. Todos os extratos obtidos tiveram os solventes recuperados em evaporador rotativo a -600 mmHg (Fisaton 801, Brasil) e a 45 °C. As amostras concentradas foram congelados a -70º C e depois liofilizados no Liofilizador de bancada L101 da LIOTOP, finalizando o processo com o armazenamento em uma frasco âmbar a 4°C. Triagem Fitoquímica Os extratos foram submetidos a uma série de testes fitoquímicos qualitativos de identificação, de acordo com a metodologia desenvolvida por Simões et al. (2017), SBFgnosia (2009), Mouco et al. (2003), Amorim et al. (2008) e Adzu et al. (2015), na qual o extrato obtido é analisado através de reações de coloração e/ou precipitação, para identificação das principais classes de constituintes químicos. Caracterização por HPLC Os extratos foram analisados por cromatografia líquida de alta eficiência utilizando um cromatógrafo Shimadzu®(série LC-10 Avp, Kyoto, Japão), equipado com uma bomba LC-10AD, desgaseificador DGU-14A, Detector UV-vis SPD- 10A, forno coluna CTO-10A, injetor manual Rheodyne (circuito de 20 μL) e um integrador CLASSE LC-10A.A separação foi realizada utilizando uma coluna Phenomenex Luna de fase reversa C18 de 250 × 4,6 mm de tamanho de partícula de 5 µm. A fase móvel consistiu de ácido fosfórico 0.1% em água (fase A) e acido fosfórico 0.1% em água/acetronitrila/metanol (54:35:11 v/v) (fase B), fluxo: 1 ml/ min; temperatura: 22 ° C. Detecção UV a 280 nm. Os compostos foram identificados pela comparação entre os tempos de retenção das amostras com os padrões autênticos, tais como ácido gálico, rutina, naringina, morina hidratada, quercetina, ácido siríngico, ácido p-cumárico, ácido rosmarínico e ácido clorogênico (Sigma®). As amostras foram filtradas com membrana (Millipore) de 0,22 μm antes da injeção.
Resultado e discussão
Após as reações de triagem fitoquímica os extratos apresentaram resultados
satisfatórios preliminares, indicando uma potencialidade no que tange a
bioatividade da planta. A Tabela 1 demonstra os resultados quanto a presença
ou ausência de grupos metabólitos secundários.
Os extratos das folhas de Virola sebifera indicaram a presença de alguns
metabólitos secundários: flavonóides, taninos, antraquinona e alcalóides na
maioria dos métodos extrativos. Apenas saponina e fitoesteróis foram
ausentes em todas as formas extrativas.
Na reação de caracterização de taninos com o reagente acetato de chumbo
combinado com ácido acético glacial foi confirmada a sua presença somente na
extração metanólica obtida por meio do processo extrativo a quente
(Soxhlet). Os taninos são caracterizados principalmente por sua capacidade
de complexar com outras moléculas, incluindo macromoléculas tais como
proteínas e polissacarídeos. Seu efeito sobre o processo de cura de feridas,
queimaduras, úlceras pépticas está diretamente relacionado à formação do
complexo tanino/proteína, que gera uma camada protetora sobre a área lesada,
possibilitando que ocorra o processo fisiológico de cura (SANTOS; MELLO,
2010).
A presença de alcalóides nos testes foi evidenciada assim como foi
verificado por Denny et al. (2007) no estudo dos extratos e da fração
orgânica das folhas de V. sebifera para a atividade antiproliferativa na
amostra da planta seca.
Os testes de flavonóides foram positivos, estes são um grupo de interesse
econômico e, principalmente, farmacológico, pois, possuem atividades
antitumorais, anti-inflamatórias, antioxidantes, antivirais, entre outras
(SHIRWAIKAR et al, 2004).
A classe das antraquinonas também encontrada nesta espécie é um metabólito
de de ação terapêutica laxativa. Provoca irritações no intestino grosso
aumentando a motilidade. Este mecanismo está associado à liberação ou ao
aumento da síntese de histamina, e diminuição da reabsorção de água, sendo
que isto acontece com a inativação da bomba de Na+/K+-ATPase (ROSÁRIO;
ALMEIDA, 2016).
Na caracterização por CLAE foi avaliado os extratos etanólicos brutos no
método a frio e a quente, conforme Figura 1A e 1B.
Os cromatogramas dos extratos brutos (etanol 70%) demonstraram que a espécie
Virola sebifera possui uma matriz de compostos fenólicos, dentre eles,
ácidos fenólicos (ácido siríngico, ácido p-cumárico, ácido rosmarínico e
ácido clorogênico) e flavonóides (morina e quercetina). Os métodos
extrativos apresentam diferenciações quanto aos compostos identificados e
quanto à quantidade extraída dos compostos idênticos.
Dos 4 compostos verificados nos dois extratos citamos dois flavonoides:
quercetina e morina hidratada. Bicalho et al., (2012) afirmaram que o estudo
fitoquímico do extrato metanólico das folhas de V. sebifera levou ao
isolamento e identificação de quercitrina, isoquercetina, rutina, afzelina,
quercetina-3-metoxi-7-0-β-D-glicosídeo. Já Silva et al (2018) identificaram
os mesmos metabólitos nos extratos brutos da casca da V.sebífera.
A morina possui reconhecida atividade antioxidante, antidiabética, inibidora
da proliferação de células, indutora de apoptose, inibidora da tirosinase,
anti-inflamatória, anti-hipertensiva, antibacteriana e neuroprotetora, no
processo de enzimas cardiotônica e também na doença de Parkinson (JUNG et
al., 2010; ZHANG et al., 2010; VANITHA et al., 2014; LEE; BAEK; NAM, 2015;
MIYAZAKI et al., 2018). A estrutura da morina representa uma forma isomérica
de quercetina, que apesar de ser considerada como um dos flavonóides com
maior potencial antioxidante, uma maior eficácia da morina foi verificada em
alguns processos oxidativos. A forma hidratada da morina é mais ativa e
exibe níveis de toxicidade muito baixos e a sua administração crônica é bem
tolerada. (WILSON; ORTEGA; QUINTANA, 2011; JAPIASSU, 2018). A presença dos
dois compostos nos extratos brutos das folhas da V.sebífura podem indicar um
potente antioxidante, em especial ao extrato bruto via soxhelt, por
apresentar picos maiores quando comparado ao outro extrato.
Os outros dois compostos presentes nos extratos: ácido siríngico e ácido p-
cumárico, podem entrar no rol de estudos dos compostos fenólicos de origem
vegetal com atividade antioxidante, com o intuito de encontrar antioxidantes
menos tóxicos que possam ser usados em produtos alimentícios. Na tentativa
de se elucidar as diferenças de potencial antioxidante existentes entre os
ácidos fenólicos, foi detectado que o ácido siríngico por possuir dois
grupamentos de metoxila possui ação antioxidante maior que o ácido p-
cumárico (SOARES, 2002).
Analisando outras atividades Garcia et at. (2017) observaram que o ácido
siríngico exerce um efeito tipo-antidepressivo acompanhado por uma atividade
protetora contra o estresse oxidativo mais pronunciada no hipocampo.
Os ésteres derivados do ácido p-cumárico têm sido amplamente pesquisados
quanto a sua atividade biológica, sendo descritas atividades despigmentante,
antioxidante, antitumoral, anti-inflamatória, anti-adipogénica e
antimicrobiana, esta relatada para o metil, etil e isopropil p-cumarato
(PEREIRA , 2017).
Dos metabólitos exclusivos dos extratos, o ácido clorogênico foi
identificado apenas no extrato obtido pelo método a quente. Este metabólito
é bastante utilizado no tratamento de doenças do sistema nervoso central,
como ansiolítico e também contra os sintomas da depressão (LORENZI, 2002;
DALCOL et al., 2007). É também responsável por formação das características
organolépticas de substâncias (TRUGO; MACRAE, 1984; FARAH et al., 2006).
O metabólito ácido rosmarínico foi identificado apenas no extrato obtido
pelo método a frio, este ácido apresenta atividade antioxidante,
antinociceptiva, antiapoptótica, antiapoptose, antiamnésica, bactericida,
antiviral, protetora cardiovasculares, neuroprotetora, fotoprotetora, anti-
inflamatória (QIAO et al., 2005; LEE et al., 2008; JIANG et al, 2009;
SÁNCHEZ-CAMPILLO et al., 2009; BULGAKOV; INYUSHKINA; FEDOREYEV, 2012).
EU- EXTRATO BRUTO ULTRASSOM EB- EXTRATO BRUTO SOXHLET EH- EXTRATO HEXANICO SOXHLET EM- EXTRATO METANOLICO SOXHLET EE- EXTRATO ETANOLICO EXAUSTAO SOXHL
A- EXTRATO BRUTO ULTRASSOM B- EXTRATO BRUTO SOXHLET
Conclusões
A caracterização por CLAE dos extratos estanólicos obtidos pelos métodos a frio (Ultrassom) e a quente (Soxhlet) das folhas da V. sebífera coletadas no estado do Tocantins, identificou a presença de alguns metabólitos secundários confirmados na triagem fitoquímica. Mesmo a espécie V. sebífura sendo uma planta com estudos diversos, cabe ressaltar, que pesquisas com a espécie V. sebifera, no Estado do Tocantins, demonstrando seus constituintes químicos e suas atividades biológicas ainda não foram concretizadas. Os compostos identificados sugerem uma variedade de finalidades terapêuticas como anti-inflamatória, antioxidante, neuroprotetora, bactericida, antimicrobiana, fotoprotetora, inibidora de enzimas, antidepressiva, dentre outras. O estudo se fundamentou na ampliação do conhecimento fitoquímico da Virola sebifera na região, mas ressaltamos que estudos posteriores podem apresentar resultados com fins farmacológicos efetivos.
Agradecimentos
Agradecimentos à equipe de Laboratório de Química da Universidade Federal do Tocantins e ao Programa de Institucional de Bolsas de Iniciação Científica CNPq.
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