PRODUÇÃO DE PERFUMES:USO DA EXPERIMENTAÇÃO QUÍMICA COMO FERRAMENTA AUXILIAR PARA O ENSINO DE ALGUMAS FUNÇÕES ORGÂNICAS

ISBN 978-85-85905-25-5

Área

Ensino de Química

Autores

Cruz, Z.D.S. (UFERSA) ; Silva, V.C.M. (ESCOLA ESTADUAL TRISTÃO DE BARROS) ; Cruz, M.D.S. (UFERSA) ; Galvão, E.L. (UFERSA)

Resumo

O presente trabalho objetivou utilizar o tema gerador “produção de perfumes” para auxiliar no ensino de algumas funções orgânicas que fazem parte do conteúdo escolar do ensino médio. Para isso foi selecionada uma escola pública na cidade de Currais Novos/RN, onde se trabalhou o tema gerador proposto inicialmente a partir de uma vídeo-aula de produção própria. Na sequência realizou-se uma oficina para a produção de perfumes artesanais e a extração de óleos essenciais utilizando um destilador construído a partir de materiais de baixo custo. Com base em questionários aplicados antes e após as intervenções, os alunos relataram ter se motivado para pesquisar mais, bem como demostraram ter adquirido conhecimentos significativos sobre o tema estudado e sobre as funções orgânicas envolvidas.

Palavras chaves

Compostos aromáticos; Hidrodestilação; Óleos essenciais

Introdução

É notório que a química é de extrema importância para toda a sociedade, já que cotidianamente nos deparamos com ela em diversas situações do dia-a-dia, por exemplo, quando tomamos alguma medicação, usamos produtos de limpeza, nos perfumamos, etc. (MAGALHÃES, 2007). Ela nos rodeia, mesmo quando não a percebemos. Em decorrência disso, entender seus conceitos básicos torna-se uma necessidade e a escola tem nisso um papel primordial. Porém, o ensino da química, principalmente no Ensino Médio de algumas escolas públicas, vem sendo realizado com muitas limitações estruturais, o que acarreta falta de atratividade e de identificação com o que é ensinado. Isso consequentemente dificulta a compreensão dos estudantes e acaba por desestimulá-los. Além disso, o ensino da química se tornou delimitado a conceitos já preestabelecidos, decorações de fórmulas e de normas automáticas (MARTINS, 2013). Como exemplo, na química orgânica a molécula do anel aromático para alguns alunos, se torna a memorização de um hexágono com uma bola central, não correspondendo à realidade microscópica (COSTA; SANTANA, 2016). Sabemos que compreender a relação de todos os conceitos, sejam eles ambientais, econômicos, sociais ou tecnológicos pode proporcionar aos estudantes um entendimento interligado com suas vidas, o que torna o conhecimento de fato significativo. Por exemplo, aprender como acontecem as transformações químicas, bem como o uso adequado dos equipamentos faz com que absorvam melhor o conhecimento, seja analisando o cozimento de alimentos, a produção de produtos, a ação de materiais de limpeza, dentre outros exemplos (ROSA; SCHNETZLER, 1998). Segundo Wartha, Silva e Bejarano (2013), o ensino interligado com o cotidiano faz com que haja uma atuação didática a qual pode descrever o dia a dia como algo complementar, visto que é na prática que se assume uma melhor explanação dos conhecimentos químicos. Os autores afirmam ainda que apresentar aos estudantes a disciplina da química e estudá-la relacionando com os acontecimentos do dia a dia é de fato uma ajuda à compreensão dos fenômenos químicos existentes. Logo, o uso de temas que acabam por revelar as circunstâncias diárias é apoiado tanto por profissionais da ciência como pelos professores da educação em geral (WARTHA; SILVA; BEJARANO, 2013). Com base nisso, o presente trabalho objetivou utilizar o tema gerador “produção de perfumes” para auxiliar no ensino de algumas funções orgânicas que fazem parte do conteúdo escolar do ensino médio.

Material e métodos

O trabalho foi desenvolvido na Escola Estadual Tristão de Barros, localizada no município de Currais Novos/RN. A turma a ser trabalhada foi selecionada com base em conversas com os professores de química e análise curricular dos conteúdos de cada turma. Consistiu em uma turma eletiva da disciplina de química, composta por alunos do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, com idades entre 15 e 18 anos. Inicialmente, os discentes responderam a um questionário, contendo perguntas sobre a relação deles com a disciplina de química, sobre o tema produção de perfumes e sobre algumas funções orgânicas (compostos aromáticos e álcoois), de modo a se investigar seus conhecimentos prévios. Na sequência, foi produzida uma vídeo-aula sobre o tema gerador produção de perfumes abordando: a história do perfume; sua composição; principais funções orgânicas envolvidas; definição de óleos essenciais, possíveis fontes e principais técnicas de extração, e ainda algumas curiosidades sobre os perfumes. Após a produção da vídeo-aula, surgiu a ideia de envolver a turma em alguma atividade prática que tivesse relação com o tema em estudo. Com isso, foi montada uma oficina com o propósito de se extrair óleo essencial em escala de laboratório através da hidrodestilação e de se produzir um perfume artesanal. Devido à escassez de vidraria e de equipamentos no laboratório da escola foi proposto utilizar materiais não convencionais para montagem do destilador, como tubos e conexões de PVC, garrafas, mangueiras, fogareiro elétrico, etc. Para a produção do perfume foram adquiridas em lojas especializadas 4 essências diferentes, álcool, fixador, propilenoglicol e água destilada. A exibição da vídeo-aula ocorreu na sala multifuncional, com recursos áudio-visuais existentes na própria escola. Na semana seguinte, foi realizada a “oficina perfumada”. Previamente à realização da oficina, o destilador de óleos essenciais foi projetado e testado. Durante a oficina, procedeu-se a explicação sobre a técnica da hidrodestilação e etapas para montagem do destilador. Foi utilizado cravo-da-índia como matéria-prima para obtenção do óleo essencial. Os discentes ainda ajudaram com a trituração e pesagem da matéria-prima. Na sequência, a turma foi dividida em quatro equipes para proceder a produção do perfume artesanal, uma vez que dispúnhamos de apenas 4 tipos de essências. Cada equipe recebeu material necessário para produzir 100mL de perfume e um roteiro explicativo orientando a produção. Ao final da oficina, aplicou-se outro questionário objetivando avaliar a aprendizagem por parte dos estudantes, bem como obter impressões e sugestões sobre a metodologia utilizada.

Resultado e discussão

Os resultados foram divididos em quatro módulos, correspondendo às etapas de desenvolvimento do projeto, que foram: análise pré-experimento, vídeo aula, oficina e análise pós-experimento. Para a análise pré-experimento foi aplicado um questionário que teve como finalidades a caracterização da turma, bem como investigar a relação pessoal dos discentes com a disciplina da química e ainda analisar os conhecimentos prévios dos alunos quanto ao tema a ser trabalhado. A turma escolhida consistiu numa turma mista, composta por discentes do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, com idades entre 15 e 18 anos. Trata-se de uma turma eletiva da disciplina de química, na qual os alunos se matriculam na optativa de sua preferência. A turma formada por 27 alunos, era composta majoritariamente por discentes do sexo feminino (96,3%), com apenas 1 discente do sexo masculino (3,7%). Questionados sobre a futura área de atuação pretendida, 52% dos discentes relataram desejar a área da saúde, 33% a área das ciências humanas e apenas 15% a área das ciências exatas. Quando questionados sobre a afinidade com a disciplina da química, 63% dos discentes afirmaram sentir alguma dificuldade de compreensão da disciplina, 26% afirmaram sempre ter dificuldades e 11% afirmaram raramente entender os conteúdos. Quando questionados sobre a produção de perfumes, 48% afirmaram já ter ouvido falar como o perfume é produzido e quais seus principais componentes, enquanto 52% afirmaram não ter conhecimento a respeito. Ao serem questionados quanto aos óleos essenciais, 48% relataram saber do que se tratava e as possíveis fontes de obtenção e apenas 15% afirmaram conhecer algum tipo de aplicação na indústria. Com respeito às formas de obtenção dos óleos essenciais, apenas 4% relataram conhecer alguma técnica de extração. Com base na análise dos resultados do questionário, conversa com o professor de química da turma e análise da grade curricular, foram definidos os conteúdos a serem explorados na estrutura da vídeo-aula, os quais foram: a história do perfume; sua composição; principais funções orgânicas envolvidas; definição de óleos essenciais, possíveis fontes e principais técnicas de extração, e ainda algumas curiosidades sobre os perfumes. A exibição da vídeo-aula ocorreu na sala de recursos áudio-visuais da escola. Após a exibição da mesma foram sanadas algumas dúvidas dos alunos e propostas algumas pesquisas complementares sobre o tema. A oficina foi realizada uma semana depois, no laboratório da escola. Consistiu em duas etapas principais: a montagem de um extrator de óleos essenciais a partir de materiais não convencionais e a produção de um perfume artesanal. O extrator foi previamente projetado e testado antes da oficina e foram adotados os materiais que obtiveram maior eficiência, associados ao menor custo. A oficina teve início com o detalhamento sobre a técnica da hidrodestilação e principais componentes de um destilador e seguiu-se a montagem do equipamento. Na sequência os alunos participaram do preparo da matéria-prima escolhida (cravo-da-india) e observaram a obtenção do óleo essencial do cravo. A segunda etapa consistiu em dividir a turma em 4 grandes grupos para iniciar a produção do perfume artesanal. Cada equipe produziu 100mL de perfume, obedecendo a seguinte proporção: 76 mL de álcool, 10 mL de essência, 2mL de fixador, 2mL de propileno glicol e 10 mL de água destilada (DIAS; SILVA, 1996). Todos os discentes demonstraram interesse e empolgação durante as atividades desenvolvidas. Por fim, um segundo questionário foi aplicado como uma forma de analisar a eficácia da metodologia utilizada. Quando questionados sobre a utilização da vídeo-aula como recurso auxiliar ao ensino da disciplina da química, 79% consideraram interessante, 21% classificaram como inovador e 0% classificou como cansativo. Quando questionados sobre a oficina realizada, 87% consideraram ótima e 13% consideraram como boa. Entre os que consideraram boa, apontaram como falhas a pequena quantidade de material disponível para produção dos perfumes, o que exigiu a estruturação da turma em grandes grupos. Ainda assim,100% afirmaram que associar os conteúdos da grade curricular a situações cotidianas tornou a disciplina mais atrativa e mais prazerosa. Quanto ao aprendizado, 92% acertaram a definição de óleos essenciais e 88% acertaram fontes de obtenção dos óleos, 87% acertaram as questões sobre a técnica da hidrodestilação e 83% acertaram as questões sobre as funções orgânicas envolvidas. Os resultados foram bastante satisfatórios e demonstraram a eficácia da metodologia utilizada.

Conclusões

O tema gerador escolhido (produção de perfumes) e a metodologia diferenciada utilizando vídeo-aula e oficinas com demonstrações experimentais se mostrou eficaz no auxílio do ensino do conteúdo das funções orgânicas, como observado na análise dos resultados. Dentro do tema gerador escolhido ainda foi possível trabalhar diversos outros conhecimentos como: história e composição química do perfume, definição e aplicação dos óleos essenciais, noções sobre algumas técnicas de extração, entre outros. A montagem do extrator de óleos essenciais utilizando materiais não convencionais instigou docentes e discentes sobre como promover a experimentação química sem necessariamente dispor de um laboratório bem equipado e serviu também de estímulo para que os professores da disciplina de química desejassem fazer o mesmo para outros conteúdos da disciplina. Por fim, os discentes se mostraram entusiasmados com a metodologia utilizada e isso refletiu no aprendizado, conforme demonstrado pelas respostas do questionário pós-experimento. Com isso, podemos concluir que uma abordagem interligada ao cotidiano e associada a práticas experimentais facilita a compreensão dos conteúdos e torna a disciplina de química mais atrativa aos olhos dos discentes.

Agradecimentos

Agradecemos a Escola Estadual Tristão de Barros por permitir a realização do trabalho e aos professores e discentes envolvidos.

Referências

COSTA, A. V. A.; SANTANA, G, P. Experimentos de extração de óleos essenciais na abordagem de hidrocarbonetos. Scientia Amazonia, v. 5, n. 2, 59-64, 2016.

DIAS, S. M; SILVA, R. R. Perfumes: uma química inesquecível. Química Nova Escola, n. 4, nov., 1996.

MARTINS, A. R. A temática perfume como contexto para o ensino de química. Monografia, 2013.

MAGALHÃES, M. Tudo que você faz tem a ver com Química. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2007.

ROSA, M. I. F. P. S; SCHNETZLER, R. P; O Conceito de Transformação Química. Química Nova na Escola, n. 8, novembro, 1998.

WARTHA, E. J.; SILVA, E. L.; BEJARANO, N. R. R. Cotidiano e contextualização no ensino de Química. Química Nova na Escola, v. 35, n. 2, p. 84-91, 2013.

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