Relato de experiência de uma abordagem por projeto: utilizando a água como temática para aprendizagem de conteúdos da Química

ISBN 978-85-85905-25-5

Área

Ensino de Química

Autores

Monteiro, N.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO-CAMPUS CAA) ; Raimundo, L.H. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO-CAMPUS CAA) ; Silva, J.R.T.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO-CAMPUS CAA) ; Pereira, P.D.M. (INSTITUTO FEDERAL DE PERNAMBUCO- CAMPUS CARUARU)

Resumo

Esse trabalho tem como intuito apresentar um relato de experiência dos bolsistas do Programa Residência Pedagógica do Instituto Federal de Pernambuco – IFPE, a cerca da construção de um projeto de ensino, utilizando o Dia Mundial da Água como data comemorativa para concretização deste propósito. Neste projeto os alunos ficaram responsáveis por criarem seus temas, sendo eles relacionados à temática da água proposta pelos residentes, e desenvolverem seus trabalhos, com o auxílio dos residentes e o preceptor. Estas elaborações possibilitaram tanto aos que estavam na função de professores, como também aos discentes, observações importantes da sala de aula, como o protagonismo dos estudantes e as consequências da inovação metodológica na turma.

Palavras chaves

Projeto de ensino; Contextualização; Ensino por temáticas

Introdução

Desde o início dos tempos que temos a química como algo ligado ao nosso cotidiano. Ações tão imperceptíveis, mas que fazem uma grande diferença, temos como exemplo a alimentação que é fundamental para o ser humano e onde ocorre uma grande quantidade de reações químicas que fornecem energia ao corpo. Observando essa importância, percebe-se o quão necessário é o seu ensino nas salas de aula, mas para que isto seja significativo é essencial que seja relacionado ao contexto social dos alunos e não ensinado de forma isolada e fragmentada, pois desta forma é onde se perpetua perguntas como: “Para que vou estudar isso?”, “onde vou usar?” ou até afirmações do tipo “isso não serve para nada”. Envolver a contextualização no ensino é para Silva (2003, p. 26) “um dos recursos para realizar aproximações/inter-relações entre conhecimentos escolares e fatos/situações presentes no dia-a-dia dos alunos”. Desse modo, incluir a ideia de abordagens com temáticas em projetos de ensino se torna ainda mais interessante, pois torna possível que os alunos participem de maneira mais ativa durante todo o processo de realização das ações em que serão envolvidos diretamente, e com isso eles se tornarão mais responsáveis na construção de seu conhecimento. O ensino abordando temáticas busca apresentar de forma inter- relacionada e contextualizada o conhecimento e não deve ser entendido como um pretexto para apenas apresentar um conteúdo químico, mas sim, de tratar também da abordagem de dados, informações e conceitos para que se possa conhecer a realidade, avaliar situações e soluções, e propor formas de intervenção na sociedade. Com isso, os temas escolhidos devem possibilitar o estudo da realidade para que assim o aluno consiga dar sentido e significado ao seu aprendizado, relacionando o conhecimento já adquirido ao conhecimento químico (MARCONDES, 2008). Analisando o que o autor Marcondes (2008) coloca com relação ao trabalho com temáticas, podemos fazer uma aproximação de ideias interligando essa abordagem com a metodologia de ensino por projetos, em que, a mesma demanda um olhar reflexivo do professor na elaboração do mesmo, pois um projeto de ensino não será considerado de ensino se não envolver questões que possibilitem o exercício da cidadania por parte dos alunos. Sendo assim, os projetos de ensino não podem apenas ser uma desculpa para apresentação dos conteúdos da Química, mas precisa realizar o processo de contextualização e inter-relação do conhecimento científico com a realidade do aluno, para mais tarde ser proposto possíveis intervenções naquela comunidade, e o aluno exercer sua cidadania, além de que a partir dele (projeto de ensino), o aluno possa conseguir consolidar uma aprendizagem significativa e que consiga fazer relações da química com situações do cotidiano. A água no mundo é uma das principais substâncias que comprometem a qualidade de vida no planeta terra, sabendo disto, classificamos ela de duas formas: doce e salgada, tendo a primeira como a mais adequada para consumo. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, a água doce não está distribuída de forma homogênea pelo planeta, completando com a informação de que apenas 0,3% constitui a porção superficial, estando em rios e lagos, devido a isso percebemos a importância de cada vez mais tentar solucionar problemas que a envolvem (por exemplo, sistemas de tratamento caseiros), incluindo modos de diminuir a sua utilização em situações do cotidiano que levam a um desgaste desnecessário. A escolha da temática desse projeto partiu da importância da água para a cidade de Caruaru, região do Agreste do Estado de Pernambuco, visto que há uma grande utilização tanto nela como nas cidades vizinhas, que produzem tecidos, e nessa produção é utilizada para lavagem das peças grande quantidade de água, que em seguida sofre descarte em rios ou em esgotos, dispensando quaisquer processos de reutilização. A partir da observação do uso da água na cidade de Caruaru-PE, surge uma série de possibilidades de ensinar conteúdos da Química abordando os procedimentos que envolvem a água, sendo então uma estratégia interessante para romper as críticas dos alunos a respeito da disciplina de química, a qual, para eles, não faz o menor sentido estudá-la, pois não compreendem a aplicação dos conceitos químicos na realidade deles. Diante disso, a maioria dos estudantes perde o interesse pela ciência química e nosso papel como professores se torna ainda mais complexo, pois se faz necessário adotar metodologias de ensino que possibilite “Fazer com que nossos alunos e alunas incorporem o conhecimento químico em quantidade suficiente para que, no mínimo, gostem da Química, que tem sido, sem dúvida, uma tarefa complicada” (QUADROS, 2004, p. 26). Diante disso, o objetivo desse trabalho é relatar uma parte da experiência, voltada para estruturação de um projeto, do primeiro semestre de 2019 no Programa da Residência Pedagógica.

Material e métodos

O presente trabalho foi realizado no Instituto Federal de Pernambuco – IFPE, no Campus Caruaru, com os alunos dos cursos de Segurança do Trabalho, Edificações e Mecatrônica, sendo todos eles de Química I e os discentes participantes do Programa de Residência Pedagógica. De início lançamos para os discentes a realização do evento do dia mundial da água na instituição de ensino, deixando-os cientes deste acontecimento prosseguimos com a divisão das turmas, dos cursos citados, em pequenos grupos para realização dos trabalhos. Cada equipe determinou o assunto que abordaria na apresentação do evento, sendo relacionado à temática principal: a Água proposta; Após essa determinação ocorreram encontros entre os grupos e os residentes para as orientações, em alguns casos sendo online, traçando em conjunto todo o trabalho a ser desenvolvido por eles. Finalizando o projeto com as apresentações das atividades desenvolvidas pelas turmas nos corredores do IFPE, demonstrando aos que atravessavam diversos aspectos relacionados à Água.

Resultado e discussão

Como resultado da nossa proposta para o evento do dia da água, obtivemos doze grupos apresentando seus trabalhos pelos corredores do instituto. abaixo nas figuras A e B, apresentamos alguns trabalhos produzidos pelos alunos. Com a realização desse projeto observamos que em cima das produções dos alunos seria possível desenvolver diferentes conteúdos de Química em sala de aula, caso essas apresentações fossem realizadas durante as aulas da disciplina. Uma vez que fosse delimitado o cronograma do projeto de ensino, os grupos poderiam em dias diferentes por um tempo pré-definido apresentarem suas propostas e em cima delas o professor poderia desenvolver/ revisar os conteúdos da disciplina. Levando em consideração as produções acima, as que abordam temas como “Técnicas para eliminação de impurezas da água x o incidente de Brumadinho (apresentando experimentalmente um método que utiliza filtros como pedras, areias, dentro outros)” e “Processos de tratamento de água na ETA”, seria possível discutir em turmas de 9° ano do fundamental II e 1° ano do médio assuntos do tipo: elemento químico, substâncias, misturas e processos de separação de mistura entre outros, tanto pela primeira proposta como pela segunda apresentada pelos alunos. Sobre a primeira proposta seria possível ainda discutir sobre a natureza dos metais e suas propriedades, como também seus impactos na vida humana e o conteúdo de ligação metálica, uma vez que foi apresentado o incidente de brumadinho e abordado pelos alunos o fato da água está contaminada e haver presença de metais pesados. Dessa forma, coloca-se em evidência o que o autor Marcondes (2008) argumenta sobre o processo de ensino sendo abordado por temáticas, o qual para ele esse ensino deve buscar apresentar de forma inter-relacionada e contextualizada o conhecimento e não deve ser entendido como um pretexto para apenas apresentar um conteúdo químico, mas sim, de tratar também da abordagem de dados, informações e conceitos para que se possa conhecer a realidade, avaliar situações e soluções, e propor formas de intervenção na sociedade. Incentivar a discussão sobre os impactos na vida humana e na natureza por fenômenos e materiais que são objetos de estudo da ciência Química, possibilita o rompimento do ensino fragmentado, como também abre espaço para que os alunos reflitam sobre a realidade e percebam que o entendimento sobre determinado conhecimento/conteúdo, apresentado-lhe pela disciplina, é importante e tem relevância no meio. Com os temas “Processo de Dessalinização da Água”, “Proporção de Água Doce e Salgada no Mundo” e “Tratamento de Água” seria possível abordar o conteúdo de ligações químicas, iniciando com as iônicas e em seguida abordar as covalentes. Uma vez que no processo de dessalinização temos a remoção do sal, o professor poderia questionar a turma se o sal que está presente nas águas do mar é o mesmo que utilizamos em casa (o Cloreto de Sódio) e após a discussão, usar do cloreto de sódio para explicar a ligação iônica, desenvolvendo todo o conceito em cima da fórmula do cloreto de sódio (NaCl). Sendo a ideia geral dos temas, a “água”, o professor poderia continuar a construção de conhecimento à respeito das ligações químicas ainda demonstrando fórmulas, dessa vez a da própria água, e em cima dela abordar a ligação covalente. Segundo Quadros (2004) em cima da temática da água é possível discutir em sala de aula como se dá a ocorrência de água potável e sua escassez, estados físicos da matéria por meio de questionamentos dos estados líquido, sólido e gasoso que a água pode existir, e por meio da extração do sal do mar pode-se ainda discutir ligações iônicas. Desse modo, em cima desses temas seria possível explorar um pouco mais o conhecimento de Química, não ficando apenas com as ligações químicas, como a autora sugere, e de fato, a discussão de água potável e sua escassez estiveram presentes nos temas “Proporção de Água Doce e Salgada no Mundo” e “Tratamento de Água”, apresentado pelos alunos, os quais trouxeram gráficos para ilustrar a quantidade de água no mundo e em que estados físicos se encontram cada uma delas, o que possibilitaria tratar sobre estados físicos da matéria e atrelado a esse estudo, explicar também transformações Físicas e Químicas. É possível ainda discutir sobre os conceitos de dissolução e solubilidade ao se tratar da diferença entre água doce e salgada. Quadros (2004, p. 29) aponta que “essa classificação deve-se ao grau de concentração de certos sais nelas dissolvidos”. E como não encontramos na natureza a água em sua forma pura, pois a mesma dissolve a grande maioria das substâncias químicas, por isso então considerada um solvente universal, a autora sugere que por meio de questionamentos a respeito do por que não identificamos certas substâncias ali dissolvidas na água (como o sal) seja possível discutir tais conceitos. Com os temas “Poluição dos Rios x Transposição do Rio São Francisco” e “Poluição Humana x vida afetada na terra e mares” seria possível adentrar numa discussão a respeito do papel de cidadão de cada ser humano em sociedade, e despertar um olhar crítico e reflexivo dos alunos sobre os impactos que causamos ao meio ambiente que prejudica outras formas de vida, como também nos prejudica, pois a natureza também responde de maneira agressiva quando tratada dessa forma. Poderíamos adentrar num estudo sobre ácido-base em meio à discussão da poluição humana versus vida nos mares e terra afeitadas, contextualizando com o fato da extinção dos corais no mar que traz diversos impactos dentre eles econômicos e sociais. Mas, em uma abordagem Química, é sabido que o processo de acidificação pode-se alterar a questão da solubilidade de alguns materiais, nesse caso quando na atmosfera temos a presença de grande quantidade de Gás Carbônico (CO2) fruto da poluição humana, esse gás ao reagir com a água do oceano pode produzir o Ácido Carbônico (H2CO3) que reduzirá o pH daquele meio. Uma vez que a estrutura dos corais é formada por carapaça constituída pelo sal Carbonato de Cálcio (CaCO3), eles conseguem ser seres pouco solúveis à água do oceano, contudo com o processo de acidificação a solubilidade desse sal sofre alteração, tornando então solúveis e levando assim os corais à óbitos. Com o tema “uso da água em Usinas Hidrelétricas” apresentado por um grupo, poderia ser discutida a questão da transformação da água em energia, que ocorre nas usinas. Os alunos que apresentaram esse tema trouxeram em forma de maquete a representação de uma usina hidrelétrica e explicaram como a mesma funciona, seus benefícios e malefícios. Em cima dessa proposta, o professor poderia ampliar os conhecimentos dos alunos apresentando os processos de transformação de energia potencial em energia mecânica que ocorrem nas turbinas movimentadas pela força da água que percorre por elas, causando a seguir a conversão dessa energia mecânica em elétrica. Uma vez que “a água, tema escolhido para gerar o conhecimento químico, pode introduzir outros assuntos ou problemas que exigem novos conceitos, alguns deles interdisciplinares, como é o caso da Climatologia, da taxa de transferência de energia e de muitos outros” (QUADROS, 2004, p. 28) Dessa maneira, a ideia da abordagem de ensino por projeto surge como possibilidade de rompimento da lógica tradicionalista que trabalha de forma única e exclusivamente com um caráter conteudista, fragmentando por vezes os conhecimentos e não desenvolvendo nos alunos a cidadania, e, uma vez entendido que o papel da escola é preparar seus estudantes para o exercício pleno dessa cidadania, assim como também desenvolver habilidades e competências que os possibilitem a aprenda a ser, a aprender e a fazer, destacamos nesse trabalho como essa estratégia metodológica pode ser interessante.

figura A.

Imagens de alguns trabalhos apresentados no evento .

figura B.



Conclusões

As ideias apresentadas nesse trabalho a respeito dos possíveis conteúdos de Química que poderiam ser discutidos em cima dos projetos elaborados pelos alunos são apenas algumas dentre diversas que podem ser discutidas com base no ano que se pretenda ensinar, no geral, por se tratarem alunos de primeiro ano do ensino médio, citamos conteúdos vistos nesse nível. A proposta aqui apresentada, não a nomeamos como um projeto de ensino em sua real natureza, pois não ocorreu a discussão e nem o desenvolvimento dos conhecimentos da disciplina de Química em cima das propostas apresentadas pelos alunos. No entanto, destacamos muito sobre projeto de ensino, pois em sua estruturação seguimos a ideia de um ao sugerir apenas à temática “Água” e os discentes sugerirem o que eles poderiam trabalhar em cima dela, ou seja, foi uma decisão conjunta entre os pesquisadores (em função de professores) com os aprendizes. Destacamos ainda que o projeto foi bastante enriquecedor, pois muito observamos a respeito do protagonismo dos estudantes e interesse em participar do projeto, o que nos leva a discussão da importância em inovar as metodologias de ensino na tentativa de atrair mais a participação dos estudantes em sala de aula e o interesse pela disciplina de Química.

Agradecimentos

Referências

MARCONDES, M. E. R. Proposições metodológicas para o ensino de química:oficinas temáticas para a aprendizagem da ciência e o desenvolvimento da cidadania. Uberlândia, 2008. Revista Em Extenção. 7 v . Disponível em: revistadeextensao.proex.ufu.br. Acesso em: 08 set. 2011.

QUADROS, M. L. A água como tema gerador do conhecimento químico. Química Nova na Escola. n. 20, p. 23-31, 2004.

SILVA, L. F.; Carvalho, L. M. de. A temática ambiental e o ensino de Física na escola média: algumas possibilidades de desenvolver o tema produção de Energia Elétrica em larga escala em uma situação de ensino. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 24, n. 3, set, 2003.

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