Avaliação do efeito da radiação ionizante sobre a fluorescência de pontos quânticos de CdSe.
ISBN 978-85-85905-25-5
Área
Materiais
Autores
da Silva, A.C.O. (IFPE) ; Alves, R.M.D.A. (IFPE) ; da Silva, R.D. (IFPE) ; Benevides, C.A. (CRCN-NE) ; Lima, M.V.F. (IFPE) ; de Menezes, F.D. (IFPE)
Resumo
Na ultima década, grupos de pesquisa vem estudando o comportamento da fluorescência de pontos quânticos (QDs) expostos a radiação ionizante. O objetivo deste trabalho é a observação da fluorescência de QDs de CdSe em meio orgânico, frente a irradiação com fótons de raio-X. Nos ensaios de irradiação, amostras de QDs de CdSe em diclorometano ou tolueno foram preparadas e irradiadas com fótons de energia média de 100 keV, com doses entre 0 e 5.0 Gy. As análises da fluorescência dos QDs mostraram um aumento considerável da radiossensibilidade dos QDs com a presença do diclorometano, com uma redução de quase 100% da fluorescência para uma dose de 5.0 Gy, demonstrando a simplicidade de modular a radiossensibilidade dos QDs apenas com a inserção de organoclorados no meio de dispersão.
Palavras chaves
pontos quânticos; radiação ionizante; dosimetria
Introdução
Atualmente, vários tipos de sistemas dosimétricos são utilizados para a execução da dosimetria de radiações em diferentes ambientes. Dentre os mais utilizados, destacam-se: (i) os filmes dosimétricos; (ii) dosímetros termoluminescentes (TLDs); (iii) dosímetros Fricke; (iv) canetas dosimétricas; (v) dosímetros pessoais digitais; (vi) dosimetria citogenética e; (vii) mais recentemente, dosímetros com luminescência opticamente estimulada (OSL). Cada um desses sistemas possuem suas vantagens e limitações, o que permite a escolha do sistema mais adequado para cada tipo de aplicação. Contudo, estes sistemas, atualmente utilizados, possuem como principal limitação o custo financeiro seja para a produção do dosímetro, como para o processamento dos dosímetros e as leituras dos valores de doses absorvidas (AISNBURY et al, p. 573, 2011). Sob este panorama, a busca de novos sistemas dosimétricos com respostas equivalentes aos sistemas descritos, porém economicamente mais viáveis para preparação e leitura, vem sendo alvo de pesquisa por grupos no mundo inteiro. No Brasil, a grande maioria das pesquisas de novos dosímetros visam metodologias baseadas em sistemas do tipo TLDs ou sistemas baseados em dispositivos semicondutores. Em ambos os casos, a infraestrutura e equipamentos necessários para estas pesquisas ainda esbarram na limitação do elevado custo para a viabilização destes dosímetros. Na ultima década, grupos de pesquisa no mundo inteiro vem estudando o comportamento espectroscópico de pontos quânticos, dispersos em meio aquoso ou orgânico, expostos a diferentes neveis de radiação ionizante. Em 2006, Campbell e Crone publicaram resultados sobre a cintilação de compósitos de pontos quânticos e polímeros condutores expostos a feixe de elétrons com energia da ordem de 3 keV (CAMPBELL e CRONE, p.77, 2006). Em 2008, Witners e colaboradores publicaram trabalho referente ao efeito de degradação de pontos quânticos de CdSe/ZnS (seleneto de cadmio recoberto com sulfeto de zinco) após exposição a diferentes doses de radiação gama, onde o fenômeno foi monitorado através da fluorescência das amostras (WITNERS et al, p. 173101, 2008). Em 2009, Stodilka e colaboradores publicaram os resultados de uma pesquisa onde pontos quânticos de seleneto de cádmio (CdSe) foram irradiados com uma fonte de Co-60 e sua fluorescência foi reduzida com o aumento da dose recebida (STODILKA et al, p. 2580, 2009) . Neste caso, os pesquisadores observaram variações da fluorescência desde doses de 0,1 Gy até doses de 100 Gy. Em 2010, Gao e colaboradores publicaram os resultados da aplicação de pontos quânticos para a confecção de um detector de estado solido para monitoração de feixes de raios-X (GAO et al, p. 285502, 2010). Em 2013, Lecavalier e colaboradores propuseram o uso de pontos quânticos dispersos em meio liquido para aplicação como cintiladores, apresentando resultados bastante favoráveis (LECAVELIER et al, p. 11629, 2013). Desta forma, estes trabalhos vem abrindo as possibilidades de se estudar este tipo de material para pesquisas de novos dosímetros para radiações ionizantes. O objetivo deste trabalho é avaliar o efeito causado pela irradiação com um feixe de fótons de raio-X em QDs dispersos em meio orgânico, na ausência ou presença de solvente organoclorado, sobre a fluorescência das nanopartículas.
Material e métodos
Para a síntese dos QDs, pesou-se 128mg de óxido de cádmio (CdO), 600mg de Ácido Miristico (utilizado como estabilizante para os Qds) e 100mg de dióxido de selênio (SeO2). Em seguida, adicionou-se o CdO e o ácido mirístico a um erlenmeyer, e aqueceu-se a mistura até a temperatura de 150ºC, para a conversão do óxido no sal de miristato de cádmio. Em outro erlenmeyer, adicionou-se o dióxido de selênio à 10 mL de 1-octadeceno e aqueceu-se a mistura até 180ºC, até a total dissolução do óxido. A esta solução, adicionou-se rapidamente o sal de cádmio previamente preparado e manteve-se a mistura a 150ºC durante dois minutos, para a obtenção dos QDs de CdSe. Por fim, a amostra obitida foi purificada precipitando-se com etanol e dissolvendo-se o precipitado obtido em ciclohexano. O procedimento de purificação foi realizado duas vezes. Para fins de estudo da radiossensibilidade, as amostras foram preparadas adicionando-se 100 µL de QDs 2mg/mL em 5 mL de diclorometano ou 5 mL de tolueno. Em seguida, as amostras foram irradiadas utilizando um equipamento Pantak (HF-160) gerador de raio-x, operando em uma tensão de 100 kV, com corrente variando entre 5 e 18 mA. As amostras foram irradiadas com doses no intervalo entre 0,0 e 5,0 Gy, com uma taxa de dose de 0,73 Gy/min. As irradiações foram realizadas no Laboratório de Metrologia do Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste (CRCN-NE). Os espectros de fluorescência foram obtidos utilizando-se um espectrofotômetro Ocean Optics HR2000, utilizando-se como fonte de excitção um LED com emissão em 400 nm.
Resultado e discussão
Para fins de estudos de radiossensibilidade, optou-se pelas irradiações de amostras de QDs em diclorometano (DCM) e comparou-se o comportamento com os de amostras irradiadas em tolueno, com as mesmas condições de irradiação de raio-X. Os espectros das amostras em tolueno irrradiadas com raio-X e das amostras irradiadas em DCM encontram-se nas Figuras 1 e 2, respectivamente.
Como pode ser observado comparando-se os espectros apresentados nas Figuras 1 e 2, a simples mudança do solvente utilizado para a dispersão dos QDs de tolueno para DCM aumenta de forma significativa a radiossensibilidade dos QDs frente aos efeitos de degradação dos fótons de raio-X. Enquanto que no caso dos QDs em DCM com uma dose de 5.0 Gy a intensidade da fluorescência reduziu-se praticamente em 100%, para as amostras em tolueno é necessária uma dose de 50.0 Gy para que houvesse uma redução de aproximadamente 40% da fluorescência da amostra não irradiada.
Podemos discutir o comportamento das amostras em relação a geração de radicias livres no meio devido a interação com os fótons de raio-X. A literatura já relata há mais de três décadas que solventes organoclorados, como o diclorometano utilizado nos experimentos, quando irradiados com fótons de alta energia, são capazes de gerar radicais Cl* estáveis e moléculas de HCl, dentre vários outros radicais oriundos da radiólise das moléculas do solvente (ALFASSI et al, p. 1380, 1989). Estes radicais e moléculas geradas durante a irradiação das amostras atuam como agentes de degradação da superfície dos QDs, o que resulta diretamente no comprometimento do processo de excitação e fluorescência das nanopartículas, tendo como consequência a diminuição na intensidade da fluorescência dos QDs. Por outro lado, a irradiação de solventes como o tolueno embora também produzam radicais livres quando irradiados com fótons de alta energia, a reatividade destes é menor do que os gerados pelo DCM. Propõe-se então que o meio de dispersão dos QDs é de suma importância para modular a radiossensibilidade das nanopartículas.
Desta forma, observa-se que de maneira prática podemos modular a radiossensibilidade dos QDs apenas modulando-se a composição do meio de dispersão, o que possibilita a produção de futuros dosímetros para diferentes faixas de detecção de doses de radiação ionizante.
QDs irradiados em Tolueno
QDs irradiados em DCM
Conclusões
Frente aos experimentos realizados e as observações feitas, pode-se então concluir que há possibilidade de se incorporar pontos quânticos em uma matriz orgânica contendo solventes organoclorados para aumentar a radiossensibilidade dos QDs frente a radiação ionizante sem perder a sua fluorescência antes das irradiações. Também é plausível concluir a viabilidade da produção deste material em escala industrial como dosímetro de radiações ionizantes, visando aplicações que envolvam doses entre 0 e 50 Gy.
Agradecimentos
Agradecemos a FACEPE e ao IFPE pelo financiamento a este trabalho.
Referências
AINSBURY, E. A, et. al. Review of retrospective dosimetry techniques for external ionising radiation exposures. Radiat. Prot. Dosim. 147:4 (2011) 573.
ALFASSI, Z. B., MOSSERI, S., NETA, P. Reactivities of chlorine atoms and peroxyl radicals formed in the radiolysis of dichloromethane. J. Phys. Chem. 93 (1989) 1380.
CAMPBELL, I. H., CRONE, B. K. Quantum‐Dot/Organic Semiconductor Composites for Radiation Detection. Adv. Mater. 18 (2006) 77.
GAO, X., KANG, Q. S., YEOW, J. T., BARNETT, R. Design and evaluation of quantum dot sensors for making superficial x-ray energy radiation measurements. Nanotechnology. 21 (2010) 285502.
LECAVALIER, M., GOULET, M., ALLEN, C. N., BEAULIEU, L., LARIVIERE, D. Water-dispersable colloidal quantum dots for the detection of ionizing radiation. Chem. Comm. 49 (2013) 11629.
STODILKA, R. Z. et. al. Optical Degradation of CdSe/ZnS Quantum Dots upon Gamma-Ray Irradiation. J. Phys. Chem. C. 113 (2009) 2580.
WITNERS, N. J., SANKAR, K., AKINS, B. A., MEMON, T. A., et. al. Rapid degradation of CdSe∕ZnS colloidal quantum dots exposed to gamma irradiation. Appl. Phys. Lett. 93 (2008) 173101.