EFEITO DO TRATAMENTO TÉRMICO EM BANHO-MARIA SOBRE A QUALIDADE DOS MÉIS DE ABELHA Melípona Subnitida e Apis mellífera L.
ISBN 978-85-85905-25-5
Área
Alimentos
Autores
de Paiva, C.A. (UFERSA) ; Aroucha, E.M.M. (UFERSA) ; Pereira, G.E.S. (UFERSA) ; Silva Júnior, C.M.F. (UFERSA) ; dos Santos, F.K.G. (UFERSA) ; Leite, R.H.L. (UFERSA) ; de Menezes, F.L.G. (UFERSA) ; de Almeida, J.G.L. (UFERSA)
Resumo
O trabalho tem como finalidade realizar o estudo do efeito do tratamento térmico em banho-maria sobre as características de qualidade dos méis de abelha (Melípona Subnitida e Apis mellífera L.). Os méis foram coletados na cidade de Grossos-RN, as análises foram realizadas no laboratório de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal Rural do Semiárido. Foram realizadas as seguintes análises físico-químicas: HMF (hidroximetilfurfural), acidez titulável, pH cor e umidade. Uma das amostras foi analisada sem o aquecimento (tempo zero), enquanto as outras três amostras passaram por aquecimento a 95°C por 10, 20 e 30 minutos, sendo as análises realizadas em triplicatas das amostras. Com exceção de cor e HMF, para espécie Melípona, as demais características sofreram influência do aquecimento.
Palavras chaves
Apis mellífera; Melípona Subnitida; hidroximetilfurfural
Introdução
O mel é uma substância viscosa, aromática e açucarada obtida através do néctar das flores e/ou de substâncias sacarínicas, coletados pelas abelhas melíficas que é transportado para a colméia onde sofre mudanças na sua concentração e composição química, sendo armazenado em alvéolos (BRASIL, 2000; ROSSI et al., 1999; ALVES et al., 2009). A composição química do mel está diretamente ligada à origem floral do néctar, região geográfica e a espécie de abelha que o produziu, sendo a abelha Apis mellifera L. responsável por quase todo o mel produzido no mundo (SILVA et al., 2004; BONTEMPO, 2008). E uma pequena quantidade de mel, mas não menos importante, produzido pelas abelhas sem ferrão conhecidas como Meliponíneos. O mel de Apis mellifera L. possui legislação normatizadora, tanto no âmbito nacional (BRASIL, 2000) como internacional (CODEX ALIMENTARIUS, 2001), para os padrões de qualidade, diferente dos méis de Meliponíneos que apresentam uma composição físico-química e sensorial (sabor e aroma) distinta do mel de Apis mellifera L.; e não existe legislação vigente que ateste a sua qualidade. As características distintivas do mel não são, principalmente, devido aos seus principais componentes de açúcar, que podem ser encontrados em muitos produtos doces, mas é devido à presença de múltiplos componentes secundários originados do néctar e das próprias abelhas. Muitos dos componentes menores, como compostos fenólicos, que conferem seu aroma, sabor e algumas de suas atividades biológicas específicas, são instáveis ao longo do tempo e termolábeis (TOSI et al., 2004). O aquecimento tem um efeito negativo no mel devido à perda das substâncias menores (TOSI et al., 2004). A qualidade do mel pode ser afetada não apenas por práticas fraudulentas, mas também pelo uso de condições inadequadas de armazenamento ou pela aplicação de tratamentos térmicos severos. Mel recém extraído é líquido, mas durante o armazenamento o mel se cristaliza mais cedo ou mais tarde. Os méis cristalizados não são populares entre os consumidores e só podem ser comercializados como liquefeitos. O aquecimento suave (32-40 °C) é usado principalmente para liquefazer o mel cristalizado e para destruir o fermento. Para evitar danos provocados pelo calor de substâncias sensíveis, recomenda-se não aquecer o mel a mais de 40 a 50 °C. Entretanto, altas temperaturas (80–100 °C) também são aplicadas para fins de liquefação e/ou pasteurização. Além do longo período de armazenamento, altas temperaturas podem afetar adversamente a composição química dos méis (CASTRO-VAZQUEZ et al., 2008 , MORALES et al., 2009 ). Sabe-se que longos períodos de armazenamento ou altas temperaturas produzem derivados de furano , HMF que é o aldeído acíclico formado a partir de hexoses pela ação da acidez normal nos açúcares de mel. A frutose é mais sensível que a glicose à reação que forma HMF (JEERING e KUPPERS, 1980, CRANE, 1982 ). Devido a poucas informações na literatura sobre a influência do aquecimento nas características de qualidade de méis, o presente estudo objetivou avaliar o efeito deste tratamento nas características físico-químicas de diferentes méis de melípona e Apis.
Material e métodos
Amostras (500 gramas) de méis de abelha Jandaíra (Melipona Subnitida) e Italiana (Apis Mellifera L.) foram coletados em dezembro de 2018, no município de Grossos, Rio Grande do Norte. Logo em seguida foram transportados para o laboratório de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA), no campus Mossoró, onde cada amostra dos dois méis foi dividida em 12 tubos de ensaio contendo aproximadamente 30 gramas de mel. Uma alíquota de cada mel foi analisada em triplica, imediatamente antes do tratamento térmico. E as demais amostras foram analisadas após tratamento térmico em banho-maria a 95°C por 10, 20, 30 minutos. As amostras foram feitas em triplicatas. O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado com amostras de mel de abelha Jandaíra e Italiana submetido a três temperaturas de aquecimento, com três repetições. As avaliações físico-químicas realizadas em triplicata foram as seguintes: pH - com o uso de um potenciômetro; Hidroximetilfurfural (HMF) – o método usado foi o quantitativo, através da espectrofotometria a 284 e 336 nm, de acordo com MARCHINI et al. (2004); Acidez - foi realizada baseada na neutralização da solução ácida de mel, mediante o uso de uma solução de NaOH ; Umidade – determinada através do refratômetro de Abbé; Cor – Foi utilizado o método da espectrofotometria a 284 e 336 nm, analisando conforme a escala de Pfund. Os dados foram submetidos à análise de variância com auxílio do software SISVAR (FERREIRA, 2010). Os tratamentos (0, 10, 20 e 30 minutos de aquecimento) foram comparados pelo teste de Tukey a 5 % de probabilidade. Para construção dos gráficos utilizou-se o programa Sigma Plot.
Resultado e discussão
As características físico-química dos méis de abelha Jandaíra (Melipona
subnitida) e Italiana (Apis Mellifera L.) estão dispostas nas figuras 1 e 2.
E como pode-se observar nas mesmas, a maioria das características avaliadas
apresentou comportamento distinto entre as espécies como também foi
influenciado pelo tempo de aquecimento.
Para acidez, observou-se que os méis de abelha jandaíra (Melipona Subnitida)
apresentam valores bem superior em relação ao mel de abelha italiana (Apis
Mellifera L.), e que ambos foram influenciados pelo tempo de aquecimento
(Figura 1- A e B). Para Melipona, o maior valor desta característica foi de
88,23 meq/kg com um tempo de aquecimento de 10 minutos, apresentando assim
diferenças significativa, uma vez que, sem aquecimento esse valor foi de
55,76 meq/kg. Para o mel de Apis, o maior valor também foi observado aos 10
minutos de aquecimento (31,70 meq/kg), porém com valor bem inferior ao de
Melipona. De acordo com ARAÚJO (2104) a composição química do mel é
dependente de vários fatores, dentre eles, espécie de abelha produtora e
forma de armazenamento.
O pH dos méis de Apis foi ligeiramente superior ao de Melipona (Figura 1- C
e D), ambos sofreram influência do tempo de aquecimento. Para o mel de Apis
o maior pH foi encontrado aos 20 minutos de aquecimento (3,8), diferindo
assim do mel não aquecido, o qual apresentou pH de 3,74. Já para o de
Melipona o maior pH foi observado quando o mel não sofreu aquecimento (3,3),
diferindo dos demais tempos de aquecimento. Os valores estão de acordo com
os encontrados por AL- GHAMDI et al. (2019), os quais encontraram valores
médio de 3,62 para mel de Apis, já para mel de Melipona, ARAÚJO (2014),
encontrou valores variando de 3,3 a 5,8, os quais estão de acordo com o do
presente estudo para o mel sem aquecimento.
O HMF apresentou comportamento distinto para os tempos de aquecimento, o mel
de Melipona não apresentou diferenças significativas para este tratamento
(Figura 1-E). A maior média foi encontrada com 20 minutos de aquecimento
(76,43 mg/kg), enquanto a menor observou-se aos 10 minutos de aquecimento
(63, 80 mg/kg). Já para o mel de Apis foi observado influência do
aquecimento nesta característica, onde o mel não aquecido apresentou média
de 73,33 mg/kg. O aquecimento do mel ocasiona a perda de substâncias
aromáticas termolábil. As perdas são proporcionais à temperatura e ao tempo
de aquecimento. Os danos causados pelo aquecimento podem ser evidenciados
pela medição de parâmetros de controle de qualidade, como o conteúdo de
hidroximetilfurfural (HMF) (TOSI, et al 2008). Para o mel de Apis, o
comportamento encontrado nesse estudo, está de acordo com os encontrados por
AL-GHAMDI et al. (2019), onde os mesmos observaram aumento do HMF com
elevação da temperatura e tempo de armazenamento.
A umidade também apresentou comportamento distinto entre as espécies
estudadas, como pode-se observar a figura 2-A e B, onde os méis proveniente
de Melipona apresentaram valores superiores aos de Apis, com médias variando
de 23,4 a 27,20, sendo os mesmos influenciados pelo tempo de aquecimento. O
mel de Apis apesar de apresentar médias menores (19,40 a 19,70) quando
comparado ao de Melipona, o mesmo também sofreu influência do tempo de
aquecimento. De acordo com a CPAMN (2013) a colheita do mel realizada em
dias chuvosos ou com alta umidade relativa do ar, faz aumentar os índices de
umidade no mel. A característica higroscópica do mel faz este produto
absorver água, o que de certa forma compromete a sua qualidade,
principalmente se for oriundo de favos não operculados ou armazenado de
forma inadequada (MARCHINI, MORETI; OTSUK, 2005).
A cor dos méis apresentou comportamento distinto para as diferentes
espécies. Onde o mel de Apis apresentou médias bem maiores quando comparado
com de Melipona (Figura 2- C e D), tal comportamento se deve a
características intrínsecas e/ou néctar das espécies. Quanto ao aquecimento,
este teve influência apenas no mel de Apis onde a maior média foi observada
quando o mel não foi aquecido (0,8570) enquadrando-se assim na cor âmbar, de
acordo com MARCHINI et al. (2004). Para o mel de Melipona não houve
diferenças significativas para o tempo de aquecimento, conforme os valores
encontrados (Figura 2-C) sua classificação de cor é extra âmbar claro,
segundo escala de Pfund.
Acidez (A e B); pH (C e D); HMF (E e F) de méis de abelha (esquerda Melipona, direita), submetido a diferentes intervalos de aquecimento a 95ºC.
Umidade (A e B); Cor (C e D); de méis de abelha (esquerda Melipona, direita Apis), submetido a diferentes intervalos de aquecimento a 95ºC.
Conclusões
Os resultados encontrados evidenciam que existe particularidade entre méis de diferentes espécies de abelhas quando submetidos ao aquecimento. Os méis de Melípona subnitida submetidos até 30 min a 95°C não apresentam mudança significativa no teor de HMF e cor, mas os méis de Apis melífera L. são significativamente alterados.
Agradecimentos
A UFERSA, CAPES e CNPq
Referências
AL GHAMDI- AHMAD.; MOHAMMED, S.E.A.; ANSARI, M.J.; ADGABA, NURU. Comparison of physicochemical properties and effects of heating regimes on stored Apis mellifera and Apis florea honey. Saudi Journal of Biological Sciences. 106, 845-848, 2019.
ALVES, E.M., TOLEDO, V.D.A.A.D.; MARCHINI, L. C.; SEREIA, M.J.; MORETI, A.C.D.C.C.; LORENZETTI, E.R.; SANTOS, A.A. Presença de coliformes, bolores e leveduras em amostras de mel orgânico de abelhas africanizadas das ilhas do alto rio Paraná. Ciência Rural, v. 39, n. 7, p. 2222-2224, 2009.
ARAÚJO, F.G. Comparação das características físico-químicas e antioxidantes de méis de diferentes espécies de abelhas. 2014, 66p. Dissertação (Mestrado em Produção Animal) – Universidade Federal Rural do SemiÁrido Mossoró RN, 2014.
BONTEMPO, M. Mel: uma vida doce e saudável. São Paulo: Alaúde Editorial. 2008.
BRASIL. Ministério da Agricultura. Instrução normativa 11, de 20 de outubro de 2000. Regulamento técnico de identidade e qualidade do mel. Diário Oficial, Brasília, 20 de outubro de 2000, Seção 1, p. 16-17.
CASTRO-VAZQUEZ, L., DIAZ-MAROTO, M.C., GONZALEZ-INAS, E.D., PEREZ-COELLO, M.S. Influence of storage conditions on chemical composition and sensory properties of citrus honey. J. Agric. Food Chem. 56, 1999–2006, 2008.
CODEX ALIMENTARIUS. Revised codex standard for honey codex stan 12- 1981, Rev.2 [2001].24th session of the Codex Alimentarius in 2001. Disponível em: htt://www.codexalimentarius.net/download/standards/310/CX12.pdf. Acesso em 12 de agosto de 2019.
CPAMN (Centro de Pesquisa Agropecuária do Meio-Norte). Rastreabilidade da Cadeia Apícola. Disponível em: http://www.cpamn.embrapa.br/apicultura/rastreabilidade.php. Acesso em: 12 agosto. 2019.
CRANE, E. Learning about honey through fructose. Bee World 63, 147–167, 1982.
FERREIRA DF. 2010. Sistemas de análises de variância para dados balanceados: Programa de análises estatísticas e planejamento de experimentos. Sisvar versão 5.3 (Biud 75). Lavras, Universidade Federal de Lavras.
JEERING, N.J., KUPPERS, F.J.E., 1980. High performance liquid chromatography of furfural in honey and spirits. J. Assoc. Off. Anal. Chem. 63, 126.
MARCHINI, L. C., SODRÉ, G. S., MORETI, A.C.C.C. Mel Brasileiro: composição e normas; Ribeirão Preto: A.S. Pinto, 2004.
MARCHINI, L. C.; MORETI, A.C.C.C.; OTSUK, I. P. Análise de agrupamento, com base na composição físico-química, de amostras de méis produzidos por Apismellifera L. no Estado de São Paulo. Ciência e Tecnologia de Alimentos, v. 25, n. 1, p. 8-17, 2005.
MORALES, V., SANZ, M.L., MARTIN-ALVAREZ, P.J., CORZO, N., 2009. Combination use of HMF and furosine to assess fresh honey quality. J. Sci. Food Agric. 89, 1332– 1338.
ROSSI, N. F., MARTINELLI., L.A., LACERDA, T.H.M., CAMARGO, P.B., VICTÓRIA R.L. Análise da adulteração de méis por açúcares comerciais utilizando-se a composição isotópica de carbono. Ciência e Tecnologia de Alimentos, v. 19, 199-204,1999.
TOSI, E., RÉ, E., LUCERO, H., BULACIO, L. Effect of honey high temperature and short time heating on parameters related to quality, crystallization phenomena and fungal inhibition. Lebensm-wiss. U-Technol. 37, 669–678. 2004.
TOSI, E.; MARTINET. R.; ORTEGA, M.; LUCERO, H.; RÉ, E. Honey diástase activity modified by heating. Food Chemistry. 106, 883-887. 2008.
SILVA, C.L.; QUEIROZ, A.J.M.; FIGUEIREDO, R.M.F. Caracterização físico-química de méis produzidos no estado do Piauí para diferentes floradas. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v. 8, p. 260-265, 2004.