Avaliação do Teor de Hidroximetilfurfural (HMF) em mel de Uruçu Amarela (Melipona flavolineata) Submetido a Processo de Desumidificação com Aquecimento
ISBN 978-85-85905-25-5
Área
Alimentos
Autores
Gomes da Silva, A. (EMBRAPA) ; Enê Chaves de Oliveira, M. (EMBRAPA) ; Santiago Pereira, D. (EMBRAPA)
Resumo
A uruçu amarela (Melipona flavolineata) é uma das abelhas sem ferrão mais exploradas para produção de mel no estado do Pará. A comercialização do seu mel no estado geralmente é feita informalmente, visto que o mel desta abelha apresenta elevada umidade e não se adequa ao padrão estabelecido pelo Ministério da Agricultura(MAPA). Uma das formas de se contornar esta restrição consiste em desumidificar o mel da uruçu. Neste trabalho esta desumidificação foi efetuada nas temperaturas de 50, 55 e 65°C e o teor de HMF foi monitorado. Em todas as temperaturas avaliadas, ao se atingir umidade inferior a 20%, o teor de HMF ficou inferior ao limite máximo de 60 meq/Kg permitido. Estes resultados demonstraram a viabilidade da desumidificação do mel de uruçu amarela e permitiram registro do MAPA
Palavras chaves
Hidroximetilfurfufral-HMF; uruçu-amarela; mel
Introdução
Os produtos derivados da abelha, em especial o mel, foram os primeiros recursos e alimentos utilizados pelo homem e pelas civilizações antigas. Atualmente, o homem faz uso abundante do alimento sem desconsiderar o seu valor nutricional e suas qualidades medicinais que também foram exploradas na antiguidade (SILVA, 2006; MOREIRA, 2001). A constituição do mel depende, principalmente, do néctar das plantas e por isso a sua produção depende de uma produção grande e de qualidade das flores existentes no raio de ação das abelhas. Quimicamente predomina no mel os açúcares, principalmente D-frutose e D- glicose. Existem ainda outros componentes minoritários como ácidos orgânicos, enzimas, e partículas sólidas coletadas pelas abelhas (GOIS, 2013; SILVA, 2006). Historicamente a produção de mel no mundo está baseada na exploração de abelhas do gênero Apis, destacando-se a Apis melifera. Em vista disto, o padrão mundial de qualidade para mel é baseado no mel desta espécie. Entretanto, há outros gêneros de abelhas sociais que produzem mel e que são explorados em comunidades locais pelo mundo. No caso da Amazônia, destacam-se os meliponíneos que, as evidências indicam, tiveram sua domesticação inicial pelos povos pré- colombianos (SILVA et al, 2012). O mel de melípona é um alimento natural, rico em nutrientes e tendo na sua leve acidez um fator distintivo. Estes méis destacam-se ainda por apresentar elevado teor de água (umidade), que os torna menos densos que o mel das abelhas do gênero Apis (AZEREDO et al., 2000). Esta elevada umidade torna o mel de melíponas suscetível à ação deletéria de microorganismos, o que exige medidas adequadas para o seu processamento e armazenamento. Refrigeração, pasteurização (VENTURIERI, 2006), desumidificação ou Maturação (DRUMMOND, 2011) são processos adequadas para manter a qualidade do mel de melíponas. A refrigeração destaca-se por ser uma técnica que não somente minimiza perdas microbiológicas, mas também se destaca por minimizar perdas sensoriais e nutricionais. Por outro lado, manter a cadeia de refrigeração de um produto implica em logísticas específicas que encarecem o produto. As técnicas que usam o aquecimento, como a pasteurização e desumidificação, geralmente levam a mudanças sensoriais do produto, embora sejam mais baratas de serem implementadas. A maturação, por outro lado, transforma o mel por meio da fermentação e gera condições que estabilizam as características do produto, mesmo em tempos elevados de armazenamento. Segundo a instrução normativa nº 11 de 20 de outubro de 2000, do Ministério da Agricultura e Abastecimento (MAPA), entende-se por mel o produto alimentício produzido pelas abelhas melíferas, a partir do néctar das flores ou das secreções procedentes de partes vivas das plantas ou de excreções de insetos sugadores de plantas que ficam sobre partes vivas de plantas, que as abelhas recolhem, transformam, combinam com substâncias específicas próprias, armazenam e deixam madurar nos favos da colmeia. E esta mesma instrução normativa estabelece ainda que o produto mel deve ter umidade abaixo de 20% (BRASIL, 2000). Excetuando-se a desumidificação, mesmo com os processos descritos anteriormente, os méis de melípona não atendem os requisitos da normativa 11 (SILVA et al, 2006) porque apresentam umidades superiores a 20%. Em vista disto, uma das alternativas para colocar o mel de melíponas no mercado consiste em efetuar a desumidificação dos mesmos. Este processo, entretanto, deve ter um controle adequado de temperatura e acompanhamento do teor de Hidroximetilfurfural (HMF) no mel, visto que este composto causa problemas à saúde e tem sua produção acelerada quando o mel é aquecido. O HMF é um aldeído cíclico que se forma por desidratação da frutose em meio ácido (pH <3,9), e quando submetido ao calor esse processo é acelerado (PASSAMANI, 2005). O limite máximo permitido para o HMF na normativa 11 do MAPA é de 60 meq.kg-1 (Brasil, 1985).
Material e métodos
O experimento foi realizado nos Laboratórios de Agroindústria e de Análises de Sistemas Sustentáveis (LASS), na Embrapa Amazônia Oriental, utilizando-se o equipamento Homogeneizador descristalizador desumidificador para mel encamisado em aço inox 304 inox 304/200 kg, conforme indicado na figura 1. Cada experimento foi efetuado com cerca de 100 kg de mel, evitando o processamento na capacidade máxima do equipamento que leva a elevados tempos de processamento e, consequentemente, aquecimento. O mel de abelhas uruçu amarela foi disponibilizado por meliponicultores do proveniente de meliponários dos estados do Amazonas e do Pará. O processo de desidratação foi realizado em banho maria sob agitação constante, em temperaturas distintas de 40ºC, 50ºC e 55ºC. A cada 12 horas foram coletadas alíquotas que foram avaliadas em triplicata quanto ao HMF. A análise de HMF foi efetuado segundo metodologia do Instituto Adolfo Lutz:175/IV Méis – Determinação de hidroximetifurfural. Na qual a determinação do HMF foi realizada conforme a descrição a seguir: Pesaram-se 5 g de cada amostra em béquer identificado, adicionaram-se 25 ml de água e transferiram-se para um balão de 50 ml. Posteriormente, adicionou-se 0,50 ml da solução de Carrez 1 – Ferrocianeto de Potássio {15 g de K4Fe(CN)6.3H2O em 100 ml de H2O} e misturou-se; o mesmo foi feito com a solução de Carrez 2 – Acetato de Zinco {30g de Zn(Oac)2.2H2O} e completou-se o volume com água destilada. Realizou-se a filtragem com papel de filtro as amostras e descartaram-se os primeiros 10 ml. Pipetaram-se 5 ml do filtrado em dois tubos de ensaio, adicionando-se, no primeiro, 5 ml de H2O, e no segundo, 5 ml de NaHSO3 como referência. Mediu-se a absorbância da amostra, utilizando um espectrofotômetro nos comprimentos de onda de 284 e 336 nm. Para o cálculo da quantidade de HMF, utilizou-se a fórmula:HMF (mg / kg mel) = (A284 - A336) x 149,7 x 5 x D / g da amostra. Sendo: Fator = 149,7 = (126/16830) (1000/10) (1000/5) onde: 126 = Peso molecular do HMF;16830 = Absortividade molecular do HMF a 284 nm;1000 = conversão de g para mg;10 = diluição de 5 g de mel para 50 ml;100 = conversão de g para Kg; P = massa da amostra em g, A284 = leitura da absorbância a 284 nm, A336 = leitura da absorbância a 336 nm, 5 = massa nominal da amostra, D = Fator de diluição, caso exista.
Resultado e discussão
Os resultados encontrados para a
determinar o teor de HMF das amostras de
mel
de abelhas sem ferrão estão serão
apresentados nos gráficos 1 e 2 a seguir.
Os valores de Hidroximetilfurfural (HMF)
experimentalmente apresentaram
variação de 12 a 50 meq.kg–1, mesmo em
tempos de processamento superiores a 3
dias de desumidificação. Em todas as
condições o teor de HMF manteve-se
dentro dos limites estabelecidos pela
Comissão de Nacional de normas e Padrão
para alimentos e bebidas (CNNPA), e também
inferior aos 60 meq/kg da Normativa
11 do MAPA.
O fato do mel de melíponas apresentar
maiores teores de compostos
antioxidantes (LIRA et al,2014) em
comparação ao mel de Apis, e possivelmente
outros compostos ainda não identificados,
pode justificar esta maior
estabilidade quanto à produção de HMF.
Os resultados obtidos neste trabalho
permitiram verificar a viabilidade da
desumidificação a quente do mel de uruçu
amarela e levaram ao registro de
produto no Ministério da Agricultura por
empresa paraense.
Gráfico 1. Análise sob o efeito da temperatura ( normalizada em 50°C) dentro dos parâmetros físicos químicos do mel de melipona.
Gráfico 2. Análise sob efeito da temperatura normatizada em 55°C (2.A) e 65°C (2.B) dentro dos parâmetros físicos químicos do mel de melipona.
Conclusões
Os valores de Hidroximetilfurfural (HMF) experimentalmente apresentaram variação de 12 a 50 meq.kg–1, mesmo em tempos de processamento superiores a 3 dias de desumidificação. Em todas as condições o teor de HMF manteve-se dentro dos limites estabelecidos pela Comissão de Nacional de normas e Padrão para alimentos e bebidas (CNNPA), e também inferior aos 60 meq/kg da Normativa 11 do MAPA. O fato do mel de melíponas apresentar maiores teores de compostos antioxidantes (LIRA et al,2014) em comparação ao mel de Apis, e possivelmente outros compostos ainda não identificados, pode justificar esta maior estabilidade quanto à produção de HMF. Os resultados obtidos neste trabalho permitiram verificar a viabilidade da desumidificação a quente do mel de uruçu amarela e levaram ao registro de produto no Ministério da Agricultura por empresa paraense.
Agradecimentos
À Fundação Eliseu Alves pelo financiamento da pesquisa e a Embrapa por ceder o espaço físico do laboratório para realização das análises.
Referências
AZEREDO, L. C.; AZEREDO, M. A. A.; BESER, L. B. de O. Características físico-químicas de amostras de méis de melíponas coletadas no Estado de Tocantins. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE APICULTURA, 13, 2000. Anais. Florianópolis: Confederação Brasileira de Apicultura, 2000. 1 CD-ROM.
BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Secretaria de Inspeção de Produto Animal. Portaria nº 6, de 25 de julho de 1985. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 jul. 1985. Seção 1, p. 14.
DRUMMOND, M. S. Maturação do mel de abelhas nativas sem ferrão: novo panorama de consumo no mercado gastronômico. 2011. 1-3 f. Em Anais do XVIII Congresso Brasileiro de Apicultura, Cuiabá, Mato Grosso, Brasil.
GOIS, G. C. et al. Composição do mel de apis mellifera: requisitos de qualidade. Acta Veterinaria Brasilica, v.7, n.2, p.137-147, 2013
LIRA, A. F. et al. Estudo comparativo do mel de apis mellifera com méis de meliponíneos. Acta Veterinaria Brasilica, v.8, n.3, p.169-178, 2014
MOREIRA, R. F. A.; MARIA, C. A. B. Glicídios no mel. Química Nova, v. 24, n. 4, p. 516-525, 2001.
PASSAMANI, L. Estudos das características físicas, químicas e microbiológicas de compostos de mel produzidos no estado do Rio de Janeiro. 2005. 70 f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Instituto de Tecnologia, Rio de Janeiro.
SILVA, R. A. da et al. Composição e propriedades terapêuticas do mel de abelha. Alimentos e Nutrição, Araraquara, v. 17, n. 1, p. 113 – 120, 2006.
SILVA, R. A.; RODRIGUES, L. M. F. M.; LIMA, A.; CAMARGO, R. C. R. Avaliação da qualidade do mel de abelha Apis mellifera produzido no município de Picos, estado do Piauí, Brasil. Revista Higiene Alimentar, São Paulo. v. 20, n. 144, p. 90-94, Set, 2006.
SILVA, W. P. Abelhas sem ferrão: muito mais do que uma importância econômica. Natureza on line, Santa Teresa, v. 10, n. 3, p. 146-152, 2012. Disponível em: <www.naturezaonline.com.br>. Acesso em: 30 de julho de 2019.
VENTURIERI, G.C. et al. Caracterização e pasteurização de méis de abelhas uruçu cinzenta (melipona fasciculata) e africanizada (apis mellifera) produzidos no estado do Pará, Brasil. Congressos, Seminários e Encontros Brasileiros de Apicultura. Anais. 4. Ed. 2006.