Tratamento e Caracterização Físico-Química de diferentes Coprodutos Agroindustriais

ISBN 978-85-85905-25-5

Área

Alimentos

Autores

Hassemer, G.S. (URI - ERECHIM) ; Puton, B.M.S. (URI - ERCHIM) ; Valduga, E. (URI - ERECHIM) ; Junges, A. (URI - ERECHIM)

Resumo

O desenvolvimento de estratégias para utilizar resíduos e/ou coprodutos da agroindústria auxilia no equilíbrio entre produção e meio ambiente. A moagem úmida é uma das principais formas de processamento do milho e gera a água de maceração de milho (AMM). A indústria do arroz, com água de parboilização de arroz (APA) e a indústria de balas com efluente da lavagem de drageadores (EIB) também geram coprodutos que poderiam ser empregados na biotecnologia. O presente estudo buscou caracterizar estes coprodutos para verificar suas propriedades físico-químicas, buscado novas formas de utilização para os mesmos. Os dados apontam que os coprodutos apresentam potencial de uso em processos biotecnológicos, contudo deve-se considerar as necessidades específicas do processo desejado.

Palavras chaves

Efluentes; Caracterização; Agroindústria

Introdução

O desenvolvimento de novas formas de utilizar coprodutos e/ou coprodutos oriundos da cadeia produtiva da indústria de alimentos auxilia no aumento do equilíbrio entre produção e meio ambiente (NDUBUISI EZEJIOFOR; ENEBAKU; OGUEKE, 2014; ARAÚJO et al., 2015). O milho é um dos grãos mais consumidos mundialmente, constituindo uma das principais bases da alimentação humana. Existem ainda diversos processos que alteram os grãos do milho de forma a gerar diferentes produtos, estes processos, no entanto acabam gerando coprodutos que não são consumidos ou utilizados pela indústria. Um dos principais processos é a moagem úmida do milho que gera como coproduto a água de maceração de milho (AMM) (ARAÚJO et al., 2015). A AMM é um líquido viscoso contendo grande parte dos elementos solúveis presentes no milho, é rica em vitaminas, aminoácidos e minerais, contendo aproximadamente 50 % (m/m) de sólidos e pH levemente ácido (3,7 a 4,7) (SIGMA-ALDRICH, 2010). Este coproduto é oriundo da etapa de maceração dos grãos de milho em água, sendo que o intuito deste processo é causar alterações nas propriedades do grão pela remoção de seus compostos solúveis. Os grãos ficam em contato com uma solução diluída de dióxido de enxofre (SO2) por 30 a 48 h a 50 a 55 ºC, o líquido é removido e a fração insolúvel é processada para dar origem ao germe, farelo, amido e glúten. A AMM sofre então um processo de concentração via evaporação (USDA - UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE., 2010). A utilização da AMM ainda é restrita, geralmente utilizada como ingrediente na alimentação animal. Contudo, devido a sua composição nutricional existe a possibilidade de utilização da mesma em processos biotecnológicos (SIGMA- ALDRICH, 2010; USDA - UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE., 2010; ARAÚJO et al., 2015). Outro processo que gera um grande volume de coprodutos é a parboilização de arroz. Atualmente, o Brasil é o maior produtor de arroz entre os países da América e Europa, produzindo na safra de 2016/2017 mais de 8,38 milhões de toneladas (CHILDS; RASZAP, 2017). O processo de parboilização é amplamente utilizado no Brasil, sendo que a parboilização consiste na imersão do grão de arroz em água em uma temperatura superior a 58 ºC. Isso faz com que o amido presente no grão seja gelatinizado e subsequentemente retrogradado. A parboilização é realizada em três etapas principais (ABIAP, 2013): a) Maceração; o arroz com casca é colocado em tanques com água aquecida por algumas horas. Neste processo, as vitaminas e sais minerais que se encontram na película e germe penetram no grão; b) Gelatinização: o arroz úmido é submetido a um aumento na temperatura e pressão causando alterações na estrutura do amido. Isto faz também com que o grão seja compactado; c) Secagem: Os grãos são secos para posterior descascamento, polimento em seleção (ABIAP, 2013). A água gerada neste processo (APA) é rica em fósforo e nitrogênio, apresentando uma proporção de N/F de 2 a 5. A APA apresenta ainda uma coloração que varia entre o amarelo claro e castanho, baixa viscosidade e pH ácido. Outra indústria cujos coprodutos poderiam ser empregados na biotecnologia é a de confeitos e balas. De modo geral, o setor possui grande diversidade de produtos e processos, com 25 empresas atuando no Brasil (ABICAB, 2018). Segundo Miah et al. (2018), a indústria possui 3 setores principais, produtos à base de chocolate, produtos à base de açúcar (caramelos, balas, gomas de mascar) e produtos de confeitaria (bolos, biscoitos recobertos com chocolate, etc.). Os principais coprodutos da indústria vêm na forma de efluentes, ricos em açúcares e/ou gorduras, o que faz com que os mesmos possam causar impactos graves ao meio ambiente caso sejam descartados sem tratamento adequado. Entretanto, a alta demanda química e bioquímica de O2 em conjunto com o grande volume de efluente gerado torna o tratamento adequado dos efluentes um processo custoso (MAQBOOL et al., 2017; PAPADAKI et al., 2018). Desta forma, a caracterização físico-química destes materiais permitirá uma melhor compreensão de suas possíveis aplicações em diferentes processos biotecnológicos.

Material e métodos

Ao longo do estudo, diversas metodologias foram empregadas para quantificação de diferentes compostos presentes nos coprodutos. As características dos métodos utilizados encontram-se descritos na sequência. 2.1. Coprodutos agroindustriais: Foram empregados 3 coprodutos da agroindústria de alimentos: água de parboilização de arroz (APA) cedida pela Indústria Nelson Wendt (Pelotas, Rio Grande do Sul), dois lotes de água de maceração de milho (AMM) cedida pela Corn Products (Mogi Guaçu, São Paulo) e dois lotes de efluente da lavagem de drageadeiras da indústria de balas (EIB) adquirido em uma indústria de balas e doces da região do Alto Uruguai. 2.2. Densidade O perfil de densidade dos coprodutos foi realizado utilizando um densímetro com escala 0/20. Os testes foram realizados sob temperatura de 25 ºC com água destilada como controle (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008). 2.3. Carbono orgânico e nitrogênio total A concentração de carbono orgânico total (COT) e nitrogênio total (NT) presente nos coprodutos foi quantificada utilizando um analisador de carbono e um analisador de nitrogênio acoplados a um injetor automático e utilizando ar sintético como gás de arraste. A concentração de COT foi medida pelo método indireto, ou seja, utilizando as reações de oxidação do carbono orgânico e inorgânico presentes na amostra para determinar o carbono orgânico total. 2.4. Minerais totais e componentes minerais A caracterização do perfil mineral do EIB e de dois lotes de AMM foi realizada utilizando o método de minerais totais (cinzas) onde as amostras foram incineradas em forno mufla a 550 ºC até a obtenção de cinzas claras com peso constante (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008). Os mesmos coprodutos foram também submetidos a quantificação da concentração dos componentes minerais específicos (Ca, Cu, Fe, Mg, Na e Zn). Esta análise foi realizada por espectrometria de absorção atômica em chama FAAS, empregando como fonte de radiação, lâmpadas de cátodo oco específicas para cada um dos minerais e chama de ar/acetileno e óxido nitroso/acetileno. As leituras de Mg e Fe foram realizadas no FAAS, no modo absorção. Para eliminar possíveis interferências foi adicionado cloreto de lantânio 1 % na determinação de Mg e Ca, solução de Ca a 1000 ppm, para determinação do elemento Fe. Os cálculos dos teores dos minerais nas amostras foram baseados em curvas de calibração obtida com as soluções padrão de cálcio (10 a 50 mg/L), cobre (0,2 a 2 mg/L), ferro (0,5 a 4 mg/L), magnésio (4 a 20 mg/L), sódio (10 a 300 mg/L) e zinco (0,2 a 3 mg/L).

Resultado e discussão

A Tabela 1 apresenta a densidade, a concentração de carbono orgânico total (COT) e nitrogênio total (NT) dos coprodutos da agroindústria (água de parboilização de arroz - APA, água de maceração de milho – AMM e efluente da indústria de balas - EIB). Tabela 1 – Densidade, concentração de carbono orgânico total (COT) e nitrogênio total (NT) dos coprodutos agroindustriais. De modo geral, os coprodutos apresentaram valores de densidade similares, exceto a AMM, ambos os lotes, apresentaram maior densidade média. Isto se dá devido a este composto se tratar de uma mistura heterogênea e apresentar grande quantidade de sólidos em suspensão. Os dados obtidos para AMM estão de acordo com o que é apresentado pela literatura, que aponta que a densidade média na faixa de 1,2 a 1,4 g∙cm-3 (HOFER et al., 2018; USDA - UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE, 2010). Observando os dados encontrados na Tabela 1, para carbono orgânico e nitrogênio total, fica evidente que dentre todos os coprodutos, a AMM Bruta (Lote 2) apresentou a maior concentração de nitrogênio total e a menor quantidade de carbono orgânico. Em contrapartida, a EIB (Lote 1) teve um comportamento inverso, com alta concentração de carbono orgânico e menor de nitrogênio total. Em relação a APA, nota-se que a mesma apresenta teores baixos de nitrogênio e de carbono, diferindo consideravelmente dos demais coprodutos. A caracterização de carbono e nitrogênio é importante, para definir a composição destes nutrientes no meio de cultivo. Após a determinação das concentrações de nitrogênio total e carbono orgânico, avaliou-se os componentes minerais (Ca, Cu, Fe, Na, Mg e Zn) dos coprodutos brutos (Tabela 2). Tabela 2 – Composição mineral (Ca, Cu, Fe, Na, Mg e Zn) dos coprodutos agroindustriais. Em relação ao teor de minerais totais da AMM do Lote 1 (4,052 ± 0,37 g) apresentou uma concentração significativamente maior que o Lote 2 (2,031 ± 0,23 g), sendo que o Lote 1 também apresentou uma densidade levemente superior que o Lote 2. Os dados encontrados mostram que dentre os componentes avaliados, as maiores concentrações de cálcio, sódio e magnésio foram encontradas na amostra de APA. As amostras de EIB apresentam valores intermediários para cálcio e sódio, contudo a concentração de cálcio do lote 2 foi menor que o valor encontrado nas amostras do lote 1 de EIB. Para os índices de cobre, ferro e zinco, ambos permaneceram abaixo do limite de detecção do método em ambos os lotes. Os lotes de AMM em contrapartida, possuíram os menores valores cálcio e foram o único coproduto que apresentou traços de cobre, ferro e zinco, com AMM Lote 2 sendo mais rica nestes componentes. Para sódio, os valores encontrados foram os mais baixos, contudo não foi notada diferença entre os lotes de AMM. Focando na concentração de magnésio presente, neste caso houve uma diferença entre os lotes de AMM, com o Lote 1 apresentando uma concentração maior que o Lote 2. Observando os valores referentes a concentração de minerais nas diferentes amostras, é possível perceber que os valores obtidos para AMM foram maiores do que os dados encontrados por Hofer et al. (2018), com valores de cobre, cálcio e zinco consideravelmente mais elevados (0,005 mg/L, 0,361 mg/L, 0,105 mg/L respectivamente). Em contrapartida, a concentração de magnésio foi menor do que o reportado pelos mesmos autores (6,4 mg/L). O perfil mineral da APA em contrapartida, permaneceu consideravelmente abaixo dos valores encontrados por Colet et al. (2017), sobretudo no que se refere a quantidade de sódio e cálcio. Os dados encontrados apontam também que o EIB apresenta baixo teor de minerais, com os maiores sendo cálcio e sódio, algo previsível, uma vez que este efluente é oriundo da lavagem das drageadeiras utilizados na produção de balas e confeitos. Além disso, é possível perceber ainda que o EIB de modo geral, apresenta baixas quantidades de minerais, com valores de Cu, Fe e Zn abaixo do limite de detecção do método. Isto indica que a utilização do EIB, como único componente do meio de cultura, que acarretará em deficiência de componentes minerais necessários para a manutenção do metabolismo celular (MUTIARA et al., 2014; GRUMEZESCU; HOLBAN, 2018).

Tabela 1 – Densidade, COT e NT dos coprodutos agroindustriais.

*APA – água de parboilização de arroz, AMM – água de maceração de milho; EIB – efluente da indústria de balas.

Tabela 2 – Composição mineral (Ca, Cu, Fe, Na, Mg e Zn) dos coprodutos

N/D – Não detectado

Conclusões

Com base na caracterização dos resíduos agroindustriais AMM, APA e EIB, é possível concluir que os coprodutos apresentam potencial de utilização como substratos em processos biotecnológicos, porém torna-se necessária a otimização da concentração dos mesmos para que estes se adaptem às particularidades do processo. Os dados sugerem que o carbono presente na EIB (249,50 g/L para Lote 1 e 171,75 g/L para o Lote 2) bem como os compostos nitrogenados presentes em ambos os lotes de AMM (40,34 g/L e 56,14 g/L, respectivamente) quando adicionados à APA que é rica em minerais podem suprir adequadamente as necessidades de diferentes micro-organismos, porém é necessário que exista um equilíbrio entre a concentração dos componentes. Isto torna claro que são necessários mais estudos, desta vez focando nos efeitos de diferentes concentrações dos coprodutos no crescimento celular do micro- organismo e na produtividade do biocomposto de interesse.

Agradecimentos

Os autores agradecem a CAPES, URI – Erechim e a todos os envolvidos no projeto.

Referências

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