USO DE REVESTIMENTOS COMESTÍVEIS A BASE DE QUITOSANA E FÉCULA DE MANDIOCA COM CERA DE CARNAÚBA NA CONSERVAÇÃO DE GOIABAS
ISBN 978-85-85905-25-5
Área
Alimentos
Autores
de Menezes, F.L.G. (UFERSA) ; Aroucha, E.M.M. (UFERSA) ; dos Santos, F.K.G. (UFERSA) ; Leite, R.H.L. (UFERSA) ; de Paiva, C.A. (UFERSA) ; de Almeida, J.G.L. (UFERSA)
Resumo
Este trabalho busca avaliar os potenciais efeitos dos revestimentos biopoliméricos a base de fécula de mandioca e quitosana com cera de carnaúba, como alternativa para manutenção da qualidade pós colheita de goiabas. Foram desenvolvidos filmes de quitosana 2%, e uma blenda de fécula/Quitosana (2:1) com cera de carnaúba, em seguida as soluções filmogênicas foram utilizadas como revestimento em goiabas. O filme de quitosana 2% apresentou uma coloração mais amarelada e uma maior luminosidade e o filme da blenda apresentou menores valores de TPVA. Como revestimento mostraram indicadores significantes quanto a conservação pós- colheita de goiaba com a manutenção de perda de massa e dos parâmetros de cor, garantindo grande relevância no desenvolvimento e uso de materiais sustentáveis.
Palavras chaves
Biopolímero; Revestimento; Goiaba
Introdução
A goiaba (Psidium guajava L.) é originária de regiões tropicais, apreciada por ser saborosa e por suas propriedades nutricionais. Podendo ser consumida “in natura” ou processada em forma de doce, geleias e sucos. Ela é uma excelente fonte de fibra alimentar, pectina, vitamina A, fósforo, vitamina C, cálcio, ferro, tiamina, niacina, riboflavina e caroteno, etc. (MURMU e MISHRA, 2018). A goiaba é uma fruta climatérica, apresentando alta taxa respiratório e rápido metabolismo fisiológico, tendo, portanto, uma vida útil relativamente curta (3 a 4 dias) à temperatura ambiente (28 ± 2 ° C), (OLIVEIRA, et al., 2018). Nesse sentido, tecnologias devem ser empregadas para permitir um maior tempo de comercialização desse fruto, haja vista que as grandes centrais de consumidores ficam distante do local de produção. Diversos fatores limitam a exportação e importação, gerando a busca por técnicas inovadoras e de baixo custo, que venham prolonga a vida útil dos frutos e garantir sua qualidade. Assim, embalagens não só acondicionam, mas pode manter a qualidade dos alimentos por maior tempo, no entanto, a maioria das embalagens é fabricada com polímeros sintéticos, que gera problema ambiental, sendo a utilização de materiais biodegradável uma alternativa que poderia reduzir as perdas pós-colheita e os impactos ambientais (LUCHESE et al., 2015). A utilização de filmes e coberturas biodegradáveis são opções viáveis para incremento de qualidade, segurança, estocagem e transporte de alimentos (MACHADO; BENELLI; TESSARO, 2017), em conjunto com o uso do frio, uma técnica já utilizada e bastante eficaz, por reduzir a atividade respiratória dos frutos e, consequentemente, sua senescência. Neste contexto, o uso de revestimento comestível é uma tecnologia pós- colheita desenvolvida para prolongar a vida de prateleira dos frutos que surge em resposta às demandas dos consumidores por segurança alimentar, preço, ausência de conservantes químicos, e amigo do ambiente (FORMIGA et al., 2019). Estes revestimentos são camadas finas de materiais comestíveis que podem ser aplicadas diretamente no alimento ou formadora de um filme para acondicioná-los, aumentando a proteção da fruta na prevenção da perda de água, mudanças de cor, lesões mecânicas e até deterioração microbiana (OLIVEIRA et al., 2018; SANTOS et al., 2018 ). Devido ao baixo custo, caráter sustentável e bom desempenho quando associados à refrigeração, os revestimentos comestíveis representam uma alternativa viável. Em goiaba, resultados promissores foram obtidos com revestimentos à base de amido de mandioca com incorporação de cera de abelha (OLIVEIRA et al., 2018), à base de goma de caju e carboximetilcelulose (FORATO et al., 2015), à base de goma arábica, caseinato de sódio e óleo essencial de canela e capim-limão (MURMU e MISHRA, 2018), à base de quitosana (SILVA et al., 2018), à base de hidroxipropilmetilcelulose e cera de abelha (FORMIGA et al., 2019), à base de zeína reticulados com ácido tânico (SANTOS et al., 2018). A fécula e quitosana são polímeros naturais de natureza biodegradável e não tóxico. Devido a característica hidrofílica desses, há a necessidade de adicionar lipídios, substâncias hidrofóbicas, capazes de reduzir a taxa de transmissão do vapor de água, dentre eles a cera de carnaúba em revestimentos aumenta a resistência a vapor de água e reduz as perdas gerais de peso, quando aplicados sobre frutos (CHIUMARELLI; HUBINGER, 2012) Embora filmes biopoliméricos a base de féculas (OLIVEIRA et al., 2018) e de Quitosana (SILVA et al., 2018) tenha sido relatado para conservação pós colheita de goiaba, pouco tem sido relatado a utilização blendas biopoliméricas desses polímeros com adição de cera de carnaúba para melhorar as propriedades funcionais de goiabas. Assim, em virtude das fragilidades dos possíveis danos pós-colheita da goiaba e de sua importância nutricional e econômica, este trabalho busca avaliar os potenciais efeitos dos revestimentos biopoliméricos a base de fécula de mandioca e quitosana com cera de carnaúba visando prolongar a qualidade pós-colheita de goiaba.
Material e métodos
Os experimentos foram realizados no Laboratório de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal Rural do Semi-Árido-UFERSA. Este foi dividido em duas etapas: Primeiro foi obtido dois biofilmes, um de Quitosana e um da mistura biopolimérica de fécula de mandioca e Quitosana com incorpora de cera de carnaúba e em seguida, foi avaliado o uso das formulações como revestimento para aumentar a vida de prateleira de goiaba. A quitosana com 85% de desacetilação foi obtida da POLYMAR (Indústria e Com. Imp. e Exp. Ltda – Brasil). A solução filmogênica formadora de filme de quitosana 2% foi preparada dissolvendo pó de quitosana em solução de ácido acético a 1% até completa dissolução. As dispersões de fécula aquosas foram aquecidas a 70±5 °C e mantidos a esta temperatura por 30 min em agitação constante até gelatinização e em seguida foi obtido a solução filmogênica formadora de filme da blenda de fécula:quitosana (2:1). Nesta formulação foi adicionado cera de carnaúba (2,5%) e em relação a massa seca total e como surfactante foi utilizado Tween 80. O glicerol foi utilizado com plastificante (20% w/w). Cerca de 60g de solução foram depositadas em placas de acrílico com dimensões de 15 cm e deixados para secar pela evaporação do solvente durante 4 à 6h. Todos os filmes foram preparados em triplicata, condicionados a 23°C e 55% de umidade relativa e caracterizados. As goiabas foram adquiridas no estado de maturação fisiológica e inspecionadas para retirada de possíveis injúrias, posteriormente foram lavadas em solução de hipoclorito de sódio (100 ppm) por 10 minutos e separados de acordo com a composição dos revestimentos, imersas nas soluções filmogênicas cerca de 60s e secas à temperatura ambiente por 1h. As mesmas foram transportadas para a câmara fria regulada a 15±2 °C e 90±5% de umidade relativa. Frutos não revestidos foram incluídos como controles e para os quatros tempos de armazenamento (0, 4, 8, 12 dias) foram analisados perda de massa e os parâmetros de coloração. Os dados foram avaliados pela análise de variância e teste Tukey (p<0,05) com o auxílio do software SISVAR.
Resultado e discussão
Os filmes biopoliméricos apresentaram boa formação de géis em cada solução
filmogênica individual, bem como na blenda (quitosana+fécula com cera de
carnaúba), boa aparência, miscibilidade e de fácil manuseio permitindo a
remoção dos mesmos das placas de acrílico. A Tabela 1 mostra os valores
obtidos da taxa de permeabilidade ao vapor de água (TPVA), espessura e
propriedades de cor.
A espessura do filme de quitosana foi 0,0842 mm e para a mistura
(blenda+cera) foi 0,0941 mm. Houve diferença estatística (p<0,05) comparando
a blenda com o filme individual. Essa variação nas espessuras dos filmes
biodegradáveis é decorrente do processo casting, que pode gerar filmes de
espessuras diferentes dependendo da massa aplicada. Valores inferiores foram
detectados por Baron et al. (2017) em misturas de Quitosana e pectina cuja
espessura de filmes foi de 0,082 mm.
O filme de Quitosana apresentou uma coloração mais amarelada, parâmetro b*,
mostrando diferença significativa (p<0,05), que pode ser associada à cor
natural do pó de Quitosana. O parâmetro L geralmente sofre redução devido à
cor amarela da Quitosana, no entanto, aqui a luminosidade sofreu uma redução
no filme da blenda, possivelmente devido a presença de cera.
A taxa de transmissão do vapor de água deve ser baixa, pois
filme que barra a passagem de vapor de água mantém a aparência do produto
fresco por maior tempo, esse parâmetro é importante na escolha do filme para
cobertura em frutos. Na tabela 1 encontra-se os valores para a TPVA. Estes
foram menores para a mistura Fécula, Quitosana e cera de carnaúba. A TPVA
está relacionada com fatores tais como a estrutura do filme, a quantidade de
material hidrofílico/hidrofóbico, a mobilidade da cadeia polimérica devido à
presença de plastificantes e a relação entre regiões amorfas e cristalinas
(AZEVEDO et al., 2017).
Para a qualidade dos frutos, observa-se um aumento progressivo
de perda de massa ao longo do tempo de armazenamento em todos os frutos
(Figura 1A). O fruto perde massa, devido à transpiração além do consumo do
substrato do fruto decorrente do processo respiratório. No entanto, os
frutos com revestimento mostraram uma redução de perda de massa. Essa
redução é importante, haja vista que índices maiores de perda de massa podem
prejudicar a aparência e consequente peso do produto durante a
comercialização. O revestimento modifica a atmosfera ao redor do fruto, de
modo a reduzir o gradiente de vapor de água (ALQURASHI et al., 2017).
A goiaba, sem revestimento, apresentou redução acentuada do ângulo hue,
evidenciando uma mudança mais rápida da cor verde para o amarelo no decorrer
dos 12 dias, seguida pelas goiabas revestidas com quitosana e posteriormente
com a blenda (Figura 1B), que apresentaram cor amarela-esverdeada. Indicando
um atraso na despigmentação dos frutos em comparação com os frutos controle,
cuja coloração amarela foi acentuada. De mesma forma, Silva et al. (2018)
verificaram que goiabas revestidas com Quitosana tiveram a maturação
retardada com drástica redução da intensidade respiratória e retardo no pico
climatérico, principalmente para as maiores concentrações de Quitosana (2,0%
e 3,0% Quitosana).
Ademais, a formação de blendas com dois polímeros de natureza hidrofílica
como a Quitosana e a fécula são geralmente utilizadas para melhorar suas
propriedades devido a formação de ligações diferentes que pode ocorrer na
mistura e que não ocorreriam em matrizes contendo apenas um dos polímeros
(BAHRAMI et al., 2017).
Os valores de cromaticidade (c*) variaram com o tratamento, mostrando
maiores valores nos frutos controle e revestidos com Quitosana. (Figura 1C).
O que sugere influência de fécula e da cera na redução da cromaticidade nos
revestimentos com a blenda. Em relação ao tempo, ocorreu um leve aumento na
cromaticidade. Tal comportamento juntamente com a diminuição dos valores de
Hue no fruto controle (Figra 1B) evidencia uma degradação dos pigmentos
verdes de clorofila e a síntese de carotenóides ou a exposição deste com a
degradação da clorofila (FORMIGA et al., 2019), conforme pode ser observado
na Figura 1E.
Os frutos apresentaram valores de luminosidade da casca variando com o tempo
de armazenamento e tratamento (Figura 1D). Os frutos controle aumentaram a
luminosidade até o oitavo dia de armazenamento, indicando que, durante o
armazenamento, esses frutos passaram por um processo de maturação mais
rápido (OLIVEIRA et al., 2018). Ao contrário, frutos com revestimentos
apresentaram pouco acréscimos nos valores de luminosidade da casca e,
portanto, contribuíram para retardar o processo de senescência dos frutos.
Resultados semelhantes foram evidenciados em goiaba revestidas com
biopolimeros por Oliveira et al. (2018 e Forato et al. (2015).
Perda de massa (A), ângulo hue (B), Cromaticidade (C), luminosidade (D) e (E) aparência inicial e após doze dias das goiabas com soluções filmogênicas
Conclusões
Os filmes obtidos foram homogêneos, coesos e com boa aparência. Quanto a caracterização, o filme de quitosana 2% apresentou coloração mais amarelada e maior luminosidade em relação à blenda (quitosana-fécula-cera de carnaúba). A blenda apresentou menores valores de TPVA. De modo geral a aplicação dos revestimentos mostraram indicadores significantes quanto à conservação pós- colheita de goiaba, barrando a perda de massa e mantendo os parâmetros de cor por mais tempo, garantindo grande relevância no desenvolvimento e uso de materiais sustentáveis para o futuro.
Agradecimentos
Universidade Federal Rural do Semi-Árido pelo suporte técnico
Referências
AL-QURASHI, A. D.; AWAD, M. A.; MOHAMED, S. A.; ELSAYED, M. I. Postharvest chitosan , trans -resveratrol and glycine betaine dipping affect quality, antioxidant compounds, free radical scavenging capacity and enzymes activities of ‘Sukkari’ bananas during shelf life. Scientia Horticulture, v. 219, p.173-181, 2017.
AZEVEDO, V. M.; BORGES, S. V.; MARCONCINI, J. M.; YOSHIDA, M. I.; NETO, A. R. S.; PEREIRA, T. C.; PEREIRA, C. F. G. Effect of replacement of corn starch by whey protein isolate in biodegradable film blends obtained by extrusion. Carbohydrate Polymers, v. 157, p. 971–980, 2017.
BAHRAMI, R.; LÖBLING, T. I.; SCHMALZ, H.; MÜLLER, A. H. E.; ALTSTÄDT, V. Synergistic effects of Janus particles and triblock terpolymers on toughness of immiscible polymer blends. Polymer, v. 109, p. 229–237, 2017.
BARON, R. D.; PÉREZ, L. L.; SALCEDO, J. M.; CÓRDOBA, L. P.; SOBRAL, P. J. DO A. Production and characterization of films based on blends of chitosan from blue crab (Callinectes sapidus) waste and pectin from Orange (Citrus sinensis Osbeck) peel. International Journal of Biological Macromolecules, v. 98, p. 676–683, 2017.
CHILLO, S.; FLORES, S.; MASTROMATTEO, M.; CONTE, A.; GERSCHENSON, L.; DEL NOBILE, M. A. Influence of glycerol and chitosan on tapioca starch-based edible film properties. Journal of Food Engineering, v. 88, n. 2, p. 159–168, 2008.
CHIUMARELLI, M.; HUBINGER, M. D. Stability, solubility, mechanical and barrier properties of cassava starch – Carnauba wax edible coatings to preserve fresh-cut apples. Food Hydrocolloids, v. 28, n. 1, p.59-67, 2012.
FORATO, L. A.; BRITTO, D.; RIZZO, J. S.; GASTALDI, T. A.; ASSIS, O. B.G. Effect of cashew gum-carboxymethylcellulose edible coatings inextending the shelf-life of fresh and cut guavas. Food Packaging and Shelf Life, v.5, p.68-74, 2015.
FORMIGA, A. S.; PINSETTA JUNIOR, J. S.; PEREIRA, E. M.; CORDEIRO, I. N. F.; MATTIUZB, B. H. Use of edible coatings based on hydroxypropyl methylcellulose and beeswax in the conservation of red guava ‘Pedro Sato’. Food Chemistry, v.290, p.144-151, 2019.
LUCHESE, C. L.; FRICK, J. M.; PATZER, V. L.; SPADA, J. C.; TESSARO, I. C. Synthesis and characterization of biofilms using native and modified pinhão starch. Food Hydrocolloids, v. 45, p. 203–210, 2015.
MACHADO, C. M.; BENELLI, P.; TESSARO, I. C. Sesame cake incorporation on cassava starch foams for packaging use. Industrial Crops And Products, v. 102, p.115-121, 2017.
MATTOS, D. G.; PAIVA, P. D. O.; NERY, F. C.; VALE, R. P.; SARTO, M. T.; LUZ, I. C. A. Water relations in post-harvested torch ginger affected by harvest point and carnauba wax. Postharvest Biology And Technology, v. 127, p.35-43, 2017.
MURMU, S. B.; MISHRA, H. N. The effect of edible coating based on Arabic gum, sodium caseinate and essential oil of cinnamon and lemon grass on guava. Food Chemistry, v.245, p. 820-828, 2018.
OLIVEIRA, V. R. L.; SANTOS, F. K. G.; LEITE, R. H. L.; AROUCHA, E. M. M.; SILVA, K. N. O. Use of biopolymeric coating hydrophobized with beeswax in post-harvest conservation of guavas. Food Chemistry, v.259, p.55-64 2018.
SANTOS, T. M.; SOUZA FILHO, M. D S. M.; SILVA E. D. O.; SILVEIRA, M. R. S. D.; MIRANDA, M.R.A.D.; LOPES, M.M.A.; AZEREDO, H.M.C. Enhancing storage stability of guava with tannic acid-crosslinked zein coatings. Food Chemistry, v.257, p.252-258, 2018.
SILVA, W. B.; SILVA, G. M. C.; SANTANA, D. B.; SALVADOR, A. R.; MEDEIROS, D. B.; BELGHITH, I.; SILVA, N. M.; CORDEIRO, M. H. M.; MISOBUTSI, G. P. Chitosan delays ripening and ROS production in guava (Psidium guajavaL.) fruit. Food Chemistry, v.242, p.232-238, 2018.