Poríferas de Fernando de Noronha: potencial anticâncer e prospecção química
ISBN 978-85-85905-23-1
Área
Produtos Naturais
Autores
Fagundes, T.S.F. (UFF) ; da Silva, L.R.G. (UFF) ; Brito, M.F. (UFF) ; Chagas, H.A. (UFF) ; Santos, L.S.S. (UNIFESP) ; Rigato, D.B. (UNIFESP) ; Jimenez, P.C. (UNIFESP) ; Muricy, G.R.S. (UFRJ) ; Cass, Q.B. (UFSCAR) ; Valverde, A.L. (UFF)
Resumo
O câncer é ainda hoje um grande problema de saúde pública mundial e demanda por novos fármacos para o seu tratamento. Nesse contexto o ecossistema marinho tem se mostrado uma extraordinária fonte de substâncias com potencial para serem usadas na quimioterapia. Neste trabalho foi realizada uma investigação preliminar do potencial citotóxico de extratos de diferentes esponjas de Fernando de Noronha utilizando a linhagem celular HCT-116, e 25 delas tiveram resultados promissores. Um estudo inicial de desreplicação por LC-MS com a amostra mais ativa, uma esponja do gênero Plakortis, permitiu sugerir a ocorrência de 36 substâncias de diferentes classes e ainda indicou 3 substâncias que podem contribuir para o potencial citotóxico da amostra.
Palavras chaves
Produtos Naturais Marinho; Anticâncer; LC-MS
Introdução
O câncer é uma das principais causas de morte por doença no mundo. Estima-se que, no Brasil, para o biênio 2018-2019, a incidência seja de 1,2 milhões de novos casos (INCA, 2018). A quimioterapia destaca-se como uma das principais formas de tratamento, entretanto seus efeitos colaterais ocasionam muito desconforto aos pacientes e, muitas vezes, o abandono da terapia (ROSAS et al, 2013). Mais além, apesar do sucesso de diversos esquemas terapêuticos já em uso clínico, em inúmeros outros casos sofre-se ainda com baixa eficácia dos tratamentos. Neste cenário, os produtos naturais marinhos surgem na década de 60 como uma valiosa fonte de novas substâncias dotadas de grande potencial farmacológico, principalmente antitumoral (COSTA-LOTUFO et al, 2009). Invertebrados marinhos, por exemplo, são organismos que se utilizam do metabolismo secundário para sobreviver nos oceanos em condições competitivas e agressivas produzindo assim substâncias citotóxicas e com características estruturais únicas (RODRIGUES et al, 2015). Desse modo, o objetivo desse trabalho é avaliar o potencial citotóxico contra células tumorais em cultura, bem como analisar o perfil químico de extratos brutos e frações de espécies de esponjas marinhas coletadas no arquipélago de Fernando de Noronha.
Material e métodos
As amostras de esponjas utilizadas no trabalho foram coletadas em março de 1998 nas águas de Fernando de Noronha (PE) e permaneceram armazenadas em freezer até sua extração pelo método de maceração estática com EtOH e, posteriormente, MeOH:AcOEt 1:1 (v/v). Os extratos brutos obtidos de cada esponja foram submetidos ao teste de atividade citotóxica, frente a linhagem celular HCT-116 (câncer colo-retal humano), pelo ensaio com MTT (MOSMANN, 1983). Extratos ativos foram submetidos à partição liquido-liquido em pequena escala, por gradiente de polaridade (Hexano, AcOEt, BuOH, H2O) e suas frações foram analisadas por CCD utilizando dois sistemas de eluentes (AcOEt:MeOH:H2O (20:4:2) e CH2Cl2:MeOH (9,5:0,5)) e dois reveladores químicos (soluções de vanilina sulfúrica e Liebermann-Burchard). Por fim, o extrato bruto mais ativo, FN98-053, foi analisado por cromatografia líquida acoplada a espectrometria de massas (LC-ESI-QqTof) utilizando coluna de fase inversa e gradiente exploratório 5-100% de H2O:MeOH em 0,1% de ácido fórmico.
Resultado e discussão
O teste de atividade citotóxica com 47 extratos brutos de esponjas revelou
que 25 amostras foram capazes de inibir acima de 50,0% da proliferação
celular, na concentração de 50 µg/mL. Dentre as amostras ativas já foram
identificadas esponjas pertencentes às famílias Raspailiidae, Hymedesmiidae,
Niphatidae, Plakinidae e Geodiidae. A amostra FN98-053, esponja do gênero
Plakortis, destacou-se por sua potente bioatividade (99,7% de inibição da
proliferação celular). Os extratos ativos submetidos ao processo de partição
geraram quatro frações de polaridades distintas. Os perfis químicos das
frações de 8 desses extratos já foram analisados por CCD e revelaram a
presença de terpenoides (revelação com vanilina sulfúrica), esteroides e
triterpenos (revelação com Liebermann-Burchard) (WAGNER et al, 2001) em
todas as amostras, principalmente nas frações em hexano e AcOEt. Com o
extrato bruto mais ativo, FN98-053, iniciou-se um estudo de desreplicação
por LC-ESI-QqTof, a partir do qual, pode-se sugerir, com base nas massas
moleculares, a presença de 36 substâncias, dentre elas alcaloides, esteróis
e, principalmente policetídeos, que já foram identificadas no gênero
Plakortis. Na análise, dois íons que se destacaram pela elevada intensidade
foram atribuídos aos alcalóides tiazínicos tiaplakortona A e B (DAVIS, 2013)
com erros menores que 2,1 ppm. Ainda, sugeriu-se a presença de policetídeos
como plakortina, ácido isoespiculoico A e ácido norespiculoico A, os quais
já possuem atividade citotóxica descrita na literatura (HIGGS et al, 1978;
BERRUE et al, 2007) e, podem ser as responsáveis pela bioatividade observada
na amostra.
Conclusões
As esponjas marinhas de Fernando de Noronha apresentaram-se como fontes promissoras de substâncias com potencial anticâncer. Além disso, a análise preliminar de uma amostra do gênero Plakortis permitiu sugerir a presença de algumas substâncias responsáveis pela citotoxicidade. No entanto, estudos químicos e biológicos adicionais são cruciais para determinar os princípios ativos do extrato desta esponja.
Agradecimentos
Rosângela de Almeida Epifanio (in memorian), UFF, CAPES, CNPq, FAPERJ
Referências
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