CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DO FUTURO PROFESSOR DE QUÍMICA: SABERES DOCENTES E O ESTÁGIO SUPERVISIONADO

ISBN 978-85-85905-23-1

Área

Ensino de Química

Autores

Ferraz, V. (IFRJ/NILOPOLIS) ; Magalhaes, V. (IFRJ/NILÓPOLIS)

Resumo

A articulação entre o processo de construção da identidade do futuro professor de Química e a consolidação dos saberes docentes a partir do estágio supervisionado é o que norteia o objeto de estudo deste trabalho. Foi realizada uma pesquisa qualitativa com os alunos das disciplinas Estágio Supervisionado I e II do curso de Licenciatura em Química do IFRJ/Nilópolis. A finalidade da pesquisa foi analisar se o futuro professor compreende o significado da construção da identidade do professor e também quais são os fatores que influenciam esse processo. Concluiu-se que os respondentes entendem a relação proposta e associam a estruturação desses saberes as atividades que realizam nas escolas campo de estágio e aos encontros presenciais promovidos pelas disciplinas.

Palavras chaves

Identidade do professor; Saberes Docentes; Estágio Supervisionado

Introdução

A formação de professores é um assunto essencial nos debates e estudos dos pesquisadores da área da Educação e Ensino. Os saberes, as habilidades e as competências necessárias para que o professor seja capaz de atuar em sala de aula são os principais objetos de estudo encontrados na literatura científica. (CARDOSO,2016; GEE,2001; PIMENTA,1996). De acordo com Pimenta, a natureza do trabalho docente é ensinar como contribuição ao processo de humanização dos alunos historicamente situados (PIMENTA, 1997). Dessa forma, é fundamental perceber que esse processo de humanização dos alunos está diretamente relacionado não só à formação sociocultural e científica do professor, mas também ao processo de construção de identidade desse profissional. Assim, surge, então, a necessidade de compreender de que maneira a identidade do futuro professor é construída a partir das suas vivências durante sua formação acadêmica e principalmente nas experiências em sala de aula possibilitada pelo estágio supervisionado. De forma geral, pode-se entender identidade como o conjunto de saberes, habilidades, características que torna o indivíduo único. Entretanto, é importante ressaltar que a construção da identidade, seja pessoal ou profissional, é um processo que sofre influência do ambiente em que o indivíduo está inserido. O presente trabalho abordará o conceito de identidade considerando dois sistemas: a identidade individual e a identidade coletiva. O objetivo é compreender como a identidade do futuro professor é estabelecida a partir da relação dialógica presente nos encontros com o professor orientador da disciplina Estágio Supervisionado e também das experiências vivenciadas na escola-campo de estágio. A identidade individual está diretamente relacionada com o núcleo da personalidade do indivíduo e a identidade coletiva é a associação desse núcleo de personalidade quando da existência de uma relação grupal. Porém, é necessário perceber que esses dois sistemas identitários são interdependentes no que se refere à consolidação de um conjunto complexo de identificação (CARDOSO, M.I.S.T et al, 2016). Considerar-se-á, então, a identidade profissional como um processo que é desenvolvido ao longo da vida do indivíduo e que sofre influências internas e externas na interação com o outro (CARDOSO,2016). Há, assim, a possibilidade de os indivíduos interferirem no mundo ao mesmo tempo em que suas intervenções são condicionadas pelas suas estruturas pessoais e sociais. É nesse sentido que a identidade profissional é entendida como individual e coletiva (LOPES, 2007). A identidade profissional, independente da área de formação, demanda um conjunto de saberes que habilita o indivíduo para o exercício da sua profissão. Deste modo, a identidade profissional do futuro professor é baseada em um conjunto de saberes teóricos e experienciais que se apresentam em um saber agir conforme a situação e em conformidade com o contexto de um indivíduo (FREIRE, 1996). À medida que os saberes experienciais têm influencia na identidade profissional é possível admitir que constantemente haja a transformação da identidade do professor. O sujeito sempre estará tendo experiências que ocasionarão pequenas alterações na sua identidade. Baseando-se neste contexto é essencial entender como o estágio supervisionado, no ensino superior do curso de licenciatura, interfere no processo de (re)construção diária da identidade profissional do futuro professor de Química. Assim, é fundamental saber que o Estágio Supervisionado para o curso de Licenciatura do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro – Campus Nilópolis consiste em três disciplinas ministradas nos quinto, sexto e sétimo períodos da graduação. Os futuros professores devem cumprir quatrocentas horas de estágio. Essas quatrocentas horas compreendem atividades a serem realizadas na escola campo de estágio e encontros semanais com os professores orientadores das disciplinas. Nesses encontros é discutida a formação de professores, de forma geral e abrangente, articulando ensino, pesquisa e extensão, em uma realidade mundial pós- industrial.

Material e métodos

Para entender a relação entre o estágio supervisionado e o processo de construção da identidade do futuro professor, foi aplicado um questionário aberto para 16 alunos do curso superior em licenciatura em química do IFRJ/Nilópolis. A intenção foi obter resultados qualitativos para posterior uma análise. Dos dezesseis alunos respondentes, sete alunos cursaram a disciplina Estágio Supervisionado I e nove alunos cursaram as disciplinas Estágio Supervisionado I e II. Os tópicos norteadores do questinário seguem: 1 – O que você entende sobre identidade, em específico, identidade do professor? 2 – A identidade é um fenômeno individual ou coletivo? Explique sua resposta. 3 – Os encontros na disciplina de estágio supervisionaram ajudaram na sua formação profissional em relação aos saberes docentes? Se sim em que ajudou? Se não o que faltou para esse auxílio na formação? 4 – Como o estágio contribuiu no processo de construção da sua identidade como futuro professor? É essencial informar que durante a pesquisa não houve, com os respondentes, abordagens conceituais sobre o tema discutido neste trabalho. Além disso, os resultados apresentados demonstram a visão apontada pelos alunos licenciandos em Química (futuros professores). É imprescindível a fim de que se compreenda a apresentação e discussão dos resultados esclarecer alguns critérios utilizados pelos autores na análise dos dados obtidos: As respostas que possuem similaridades, em termos conceituais, foram agrupadas e discutidas com base nos textos científicos. As respostas que não apresentavam coerência em relação aos conceitos encontrados na literatura científica foram dispensadas neste trabalho, por escolha dos autores. Em cada tópico foram escolhidas apenas duas respostas, como exemplo, para elucidar o conceito discutido. A escolha foi baseada, na percepção dos autores, a partir do que se considera uma resposta que apresenta maior coerência com as referências utilizadas para a elaboração deste trabalho. Nos exemplos há a identificação da(s) disciplina(s) cursada(s) pelo aluno respondente.

Resultado e discussão

Questão 1) Identidade do professor Dos dezesseis entrevistados apenas cinco respostas apresentavam dados coerentes com os encontrados na literatura científica. De forma geral, as respostas, em conformidade com o conceito de identidade profissional do professor, referiam-se a identidade como algo que caracterize um indivíduo. Que é conjunto de características adquiridas ao longo da vida do docente em diferentes áreas de experiência. Os dados obtidos vão de encontro com o proposto por Gee que informa que: As pessoas podem construir ativamente o mesmo traço identitário de diferentes maneiras, e podem negociar e contestar o modo como seus traços devem ser entendidos (por eles e por outros) em termos das diferentes perspectivas da identidade. (Gee, 2001, p,108) Resposta: Aluno 1 (Estágio I) – A identidade é algo particular a alguém, algo que o caracterize. A identidade do professor é a maneira singular com a qual ele reproduz as técnicas e métodos aprendidos, após serem processadas mentalmente e combinar-se com suas experiências, seus conhecimentos e sua personalidade. Aluno 8 (Estágio I) – O termo identidade do professor traduz todas as suas vivencias, saberes e características do professor. É de maneira geral a combinação dos aspectos econômicos, sociais, religiosos, culturais, físicos, racial, orientação sexual entre outros e como eles se encontram em sala de aula. Questão 2) Identidade individual e Identidade Coletiva Pela mesma razão do item 1 somente quatro respostas foram consideradas. Todas as respostas mostram o entendimento sobre o processo de construção de identidade abarcar tanto o âmbito individual como o coletivo. Ainda que algumas respostas (alunos 5 e 7) demonstrem o entendimento sobre a identidade exclusivamente relacionado com o método utilizado pelo professor para o ato pedagógico, é possível resgatar o que é ressaltado por Dubar: “não se faz a identidade das pessoas sem elas e, contudo, não se pode dispensar os outros para forjar a sua própria identidade” (DUBAR, 1997), ou seja, a identidade do indivíduo é construída a partir dele mesmo e de suas experiências adquiridas no âmbito social. Respostas dos alunos: Aluno 5 (Estágio I) – Ambos. O professor tem sua personalidade individual, ele possui seus ideais e suas opiniões de como deve trabalhar e planejar suas aulas. No entanto, é preciso modificar um pouco sua forma de trabalhar dependendo do ambiente em questão. Escola com ensino normal, escolas técnicas e escolas militares exigirão diferentes metodologias, sem contar cada turma com seus alunos específicos. É importante o professor ser inteligente e esperto para perceber quando sua metodologia não está muito adequada para uma determinada turma, principalmente se percebe que poucos prestam atenção nas aulas. Aluno 7 (Estágio II) - Coletiva e individual. Coletiva porque de acordo com os ensinamentos e exemplos que o professor tem em sua vivência acadêmica e em contato com a sala de aula, no estágio, por exemplo, ele pode absorver as características que achar ser boas e pertinentes a sua metodologia de ensinar. E individual, pois cabe ao professor escolher qual metodologia usar e saber filtrar o que pode ser bom ou ruim para o ensino tanto para ele com professor quanto para seus alunos. Questão 3) Estágio Supervisionado e Saberes Docentes Embora nas respostas dos entrevistados não haja a menção da palavra identidade, assim como na própria pergunta, a intenção foi verificar se os futuros professores entendem a necessidade de discutir os saberes docentes e então, de alguma forma, mesmo sem usar o conceito “identidade” relacionariam os conceitos sobre saberes docentes e construção de identidade. É fundamental destacar que esse tópico refere-se ao entendimento da construção dos saberes docentes a partir dos encontros presenciais que ocorrem na disciplina Estágio Supervisionado com o professor do IFRJ. Os quatro respondentes concordam que a discussão sobre os saberes docentes tem um impacto direto na projeção do “tipo” de professor que se deseja ser complementada pela necessidade do “tipo” de professor que é preciso ser. O termo precisar está relacionado com o que uma sociedade pós-industrial espera da formação de um profissional no mundo moderno. E é nesse cenário que a construção da identidade desse futuro professor não só ocorre, mas também impõe o desenvolvimento de habilidades e competências específicas para a atuação profissional, conforme salienta Tardiff; “A relação dos docentes com os saberes não se reduz a uma função de transmissão dos conhecimentos já constituídos. Sua prática integra diferentes saberes, com os quais o corpo docente mantém diferentes relações. Pode-se definir o saber docente como um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais. (TARDIFF, 2007, p,41) Resposta dos alunos: Aluno 1 (Estágio I) – Nos encontros eram fornecidos pelo professor textos de pesquisas sobre prática do estágio, com concepções teóricas de variadas fontes. A partir destas leituras, conciliando-as com a vivência do estágio, foi possível refletir sobre a profissão que exercerei quando formada, e o tipo de profissional que pretendo ser. Aluno 9 (Estágio II) – Os encontros me ajudaram a entender o tipo de professora que quero ser, além de ter me dado o suporte para, além de entender, buscar meios para me tornar essa professora. Questão 4) Estágio Supervisionado e a construção do processo de identidade do futuro professor Neste tópico, a intenção era de que os futuros professores conseguissem descrever se os momentos de contato com o ambiente escolar, na escola campo, influenciam na composição da identidade profissional. Foram consideradas 5 respostas. De acordo com as respostas, verifica-se que as interações que ocorrem nesses encontros (ambiente escolar – professor supervisor - futuro professor) trazem a tona a percepção sobre as adequações pessoais para estruturar o profissional em formação. Diante disso, concebe-se, portanto, que os saberes experienciais incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer e saber-ser (TARDIFF,2007), delimitando assim o processo de construção de identidade profissional do futuro professor. Resposta dos alunos; Aluno 3 (Estágio II) – O estágio me possibilitou a enxergar e vivenciar o cotidiano do ambiente escolar. T oda essa experiência me influenciou a possuir uma identidade como professor que buscasse minimizar o máximo das problemáticas assistidas no estágio. Aluno 10 (Estágio II) – A partir das experiências vivenciadas no estágio, pude perceber o quanto importante ele é para a formação docente. Pude perceber as dificuldades que os professores possuem em realizar suas aulas com metodologias diferenciadas, as dificuldades que os alunos possuem. Isso fez que cada vez mais pudesse refletir sobre a minha prática docente e acredito que possa contribuir cada vez mais na minha futura prática.

Conclusões

- Em relação aos dados obtidos foi possível perceber que, embora os licenciandos que já cursaram as disciplinas Estágio Supervisionado I e II apresentassem um desenvolvimento mais completo em suas respostas, a percepção sobre o a construção da identidade do professor é possibilitada já no primeiro momento de encontro (Estágio Supervisionado I) entre futuro professor e ambiente escolar. - De forma geral, todos os respondentes entendem a relação entre construção da identidade do futuro professor e os saberes docentes necessários para exercer a profissão. Associam também a estruturação desses saberes não só as atividades que realizam nas escolas campo de estágio, mas também aos encontros semanais com o professor orientador da disciplina. - A maioria dos respondentes entende o processo de construção de identidade do futuro professor como a existência de fenômenos individuais e coletivos que se relacionam constantemente. - Percebeu-se que os futuros professores compreendem que o processo de construção da identidade profissional ocorre ao longo da vida profissional e que a identidade construída é reconstruída sempre que novas experiências e ambientes são visitados pelo professor. - A partir da análise dos resultados, verificou-se que a observação do comportamento dos professores supervisores e dos alunos são fatores que mais influenciam, na visão dos futuros professores, o processo de construção da identidade do professor. - Há em alguns dos futuros professores participantes desta pesquisa o entendimento deslocado de que unicamente os métodos de ensino utilizados pelo professor caracterizam a sua identidade.

Agradecimentos

Aos alunos participantes desta pesquisa, ao professor que auxiliou na confecção deste trabalho, e ao IFRJ pelo espaço de pesquisa e estudo.

Referências

CARVALHO, A. M. P. Prática de Ensino: Os Estágios na Formação do Professor. São Paulo: Pioneira, 1985.
CARDOSO, M. I. S. T; BATISTA P. M. F; GRAÇA A. B. S. A identidade do professor: desafios colocados pela globalização, Universidade do Porto, Porto, Portugal, Revista Brasileira de Educação v. 21 n. 65 abr.-jun. 2016
DUBAR, C. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. Porto: Porto Editora, 1997.
FREIRE, A. M. Concepções Orientadoras do Processo de Aprendizagem do Ensino nos Estágios Pedagógicos. Colóquio: Modelos e Práticas de formação Inicial de Professores, Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, Universidade de Lisboa. Lisboa, Portugal, 2001.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, 34. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GEE, J. P. Identity as an Analytic Lens for Research in Education. Review of Research in Education, Washington, DC: American Educational Research Association; Sage, v. 25, p. 99-125, 2001.
LOPES, A. La construcción de identidades docentes como constructo de estrutura y dinámica sistémicas: argumentación y virtualidades teóricas y prácticas. Profesorado – Revista de Currículum y Formación del Profesorado, Granada: Universidade de Granada, v. 11, n. 3, p. 1-25, 2007.
PIMENTA, S. G.; Formação de professores – Saberes da Docência e Identidade do Professor; R. Fac. Educ. São Paulo, v.22, n.2, p.72-89, jul./dez, 1996.
TARDIF M.; RAYMOND D.;Saberes, tempo e aprendizagem do trabalho no magistério Educação & Sociedade, ano XXI, no 73, Dezembro/00
TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 8. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.

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