COLETA E REAPROVEITAMENTO DE ÓLEOS LUBRIFICANTES AUTOMOTIVOS USADOS OU CONTAMINADOS: UM ESTUDO DE CASO EM SÃO LUÍS - MA.
ISBN 978-85-85905-23-1
Área
Ambiental
Autores
Gonçalves, C.L. (UNIVERSIDADE CEUMA) ; Cutrim, F.G.S.F. (UNIVERSIDADE CEUMA) ; Nunes, H.V.L. (UNIVERSIDADE CEUMA) ; Villis, P.C.M. (UNIVERSIDADE CEUMA) ; Farias, A.P.P. (UNICEUMA)
Resumo
Este trabalho visa verificar quais os métodos de coleta e destinação dada ao óleo lubrificante usado ou contaminado (OLUC) descartado pelos postos de combustíveis e oficinas mecânicas autorizadas à troca do mesmo em automóveis em São Luís-MA. A pesquisa possui um método quantitativo e interpretativo, sendo efetuada por meio de questionários, por amostragem, propiciando um levantamento de dados aliado a análises documentais e revisões bibliográficas. Notou-se que ainda existe um gargalo na implementação da legislação, evidente na quantidade e distribuição das empresas aptas para realizar coleta, transporte e reciclagem deste material, além da fiscalização reduzida e seletiva, sendo necessária uma reforma e ampliação na logística desse setor, que não atende atende adequadamente a capital.
Palavras chaves
óleo lubrificante; coleta; reciclagem
Introdução
Nos últimos 15 anos a frota de veículos automotores no Brasil cresceu mais de 100% (O DIA, 2016), um dos reflexos da situação socioeconômica do Brasil neste período, o que levantou algumas questões relacionadas à sustentabilidade e a interação da sociedade com o meio ambiente. Qual seria o impacto desta situação que se consolidou, e como lidaríamos com ela da maneira mais adequada? Dentre os inúmeros produtos derivados do petróleo que são consumidos em larga escala e estão diretamente relacionados ao exposto acima devido ao impacto ambiental que causam, um dos mais importantes e preocupantes é o óleo lubrificante. Ele representa cerca de 2% dos derivados do “ouro negro” comercializados pelo mundo, mas com a ressalva de ser um dos poucos dentre eles a não ser consumido totalmente durante o uso (QUINTANILHA, 2009). A maior parcela de sua utilização está ligada ao setor automotivo, enquanto a parcela restante é destinada aos maquinários do setor industrial, como sistemas hidráulicos, turbinas, ferramentas de corte, geradores e outros tipos de motores estacionários. Sua função primordial, como o próprio nome diz, é lubrificar os equipamentos, protegendo-os contra os desgastes mecânicos e físico-químicos, além de atuar na sua regulação térmica. Por conta desse trabalho, parte do óleo é queimado durante o processo, enquanto um acúmulo de contaminantes ocorre no mesmo, simultaneamente, como metais provenientes do desgaste das próprias máquinas e equipamentos, aditivos não consumidos, combustível não queimado, poeira, água, entre outras impurezas. A união desses fatores diminui a eficiência do óleo para cumprir as suas especificações, criando a necessidade de trocá-lo, momento em que ele passa a ser especificado como óleo lubrificante usado ou contaminado (OLUC), ou “óleo queimado”, no jargão popular. Segundo a Resolução nº 362 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), os OLUC's são definidos como "óleos lubrificantes acabados que, em decorrência do seu uso normal ou por motivo de contaminação, tenha se tornado inadequado à sua finalidade original”. Sabendo-se que o descarte inadequado do OLUC gera danos ambientais graves na água e no solo, e que sua combustão não controlada produz gases residuais nocivos, a NBR nº 10.004 classifica-o como resíduo perigoso, devido seu grau de toxicidade (ABNT, 2004). Com isso pressupõe-se que o OLUC exija um gerenciamento logístico adequado, pois ele representa um risco elevado de dano ambiental, caso não receba um tratamento específico. Esse tratamento é mencionado na Resolução CONAMA nº 362, pois ela especifica que todo óleo lubrificante usado ou contaminado deverá ser recolhido e coletado, recebendo uma destinação final que não afete o meio ambiente de maneira negativa, e propiciando a recuperação máxima dos seus constituintes. Para tal, ele deve ser encaminhado à reciclagem, através do processo de rerrefino. Mesmo com a legislação vigente determinando claramente que todo óleo lubrificante usado ou contaminado deve ser reciclado (BRASIL, 2005), ainda existem pessoas que, por falta de informação ou simples má intenção, cometem ato ilícito ao dar fins escusos ao OLUC, pondo em risco sua própria saúde e daqueles que habitam a sua volta. A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) é responsável pelas Leis, Resoluções e Portarias que regulamentam toda a cadeia de importação, produção e circulação interna dos óleos lubrificantes no Brasil. Entretanto, levando-se em consideração seu potencial poluidor pós-uso, faz-se necessário a existência de normativas especiais, dedicadas a regulamentar a destinação final adequada dos óleos lubrificantes usados ou contaminados, como as Resoluções do CONAMA e as Portarias Interministeriais. Para a legislação brasileira em vigência, a técnica de reciclagem mais segura do OLUC, em termos ambientais e sustentáveis, é o processo de rerrefino, sendo assim a única destinação final permitida no país, diferente de outros países, que possibilitam seu aproveitamento para fins energéticos. Apesar da Resolução CONAMA nº 362 especificar que os OLUC's devem ser obrigatoriamente destinados à reciclagem através do processo citado, ela também traz uma ressalva que permite sua substituição por outro processo tecnológico com a mesma finalidade, desde que sua eficácia seja ambientalmente equivalente ou superior ao primeiro. Vale a pena ressaltar que o descumprimento das diretrizes relacionadas à coleta, transporte, gerenciamento e rerrefino de OLUC's está sujeita a severas punições, previstas nas sanções dispostas na Lei nº 9.605/1998 e no Decreto nº 6.514/2008, conforme determinação explícita na Resolução CONAMA nº 450. Diante disto, este trabalho tem como objetivo analisar o sistema de coleta e reaproveitamento do óleo lubrificante automotivo usado ou contaminado (OLUC) na cidade de São Luís - MA, avaliando a efetividade do mesmo e identificando os mecanismos de fiscalização e controle do município.
Material e métodos
Esta pesquisa analítico-descritiva tratou-se de um estudo de caso no município de São Luís, capital do Estado do Maranhão. Com método quantitativo e interpretativo, a pesquisa foi efetuada através da aplicação de questionário em postos de combustíveis e oficinas mecânicas para levantamento de dados, por amostragem, além de análises documentais de legislações vigentes e relatórios, e revisão bibliográfica de artigos com a mesma temática. O questionário foi elaborado com questões objetivas e em sua maioria fechadas, com algumas semiabertas e uma aberta, sendo aplicado durante o horário de expediente, em entrevistas informais com um funcionário responsável pelo gerenciamento e/ou execução da atividade de troca de óleo de cada estabelecimento visitado, sendo eles: 4 postos de combustíveis, 4 oficinas mecânicas de grande porte (concessionárias), 4 oficinas mecânicas de médio porte e 8 oficinas mecânicas de pequeno porte, situadas em bairros de padrões econômicos distintos.
Resultado e discussão
Com a tabulação dos dados obtidos através da aplicação do questionário,
algumas informações evidenciaram a problemática abordada neste trabalho, mas
não de maneira extrema, como prevíamos. Dentre as 20 empresas visitadas, 55%
apresentavam local adequado para efetuar a troca de óleo, sendo 100% dos
postos de combustíveis e das oficinas de grande porte (concessionárias), e
75% das oficinas de médio porte, enquanto 100% das oficinas de pequeno porte
não atendiam esse pré-requisito. Porém, 75% das empresas afirmaram possuir
certificado de permissão para este tipo de serviço, emitido pela ANP, onde
os 25% restantes são representados por parte das oficinas mecânicas de
pequeno porte, já que as mesmas geralmente encontram-se dentro dos bairros,
e por não chamarem tanta atenção, dificilmente são notadas pelos órgãos
fiscalizadores.
Quanto à destinação dada ao OLUC, 95% das empresas entregam seus volumes
acumulados aos caminhões de coleta de duas empresas certificadas pela ANP,
que encaminham o mesmo para a reciclagem, mas apenas 60% delas dão o mesmo
destino às embalagens dos óleos trocados. Essa discrepância ocorre, pois,
enquanto as empresas coletoras pagam uma taxa, mesmo que simbólica,
estipulada pela legislação vigente, pelo volume de OLUC coletado, o mesmo
não se aplica às embalagens, e as oficinas são obrigadas a contratar outras
empresas para efetuar o descarte desse material, gerando-lhes um custo
adicional. Assim, 40% das oficinas depositam suas embalagens contaminadas de
óleo lubrificante no lixo comum, que acaba parando nos aterros sanitários da
cidade, e consequentemente terminam por contaminar o solo e os lençóis
freáticos.
Conforme mencionado no parágrafo anterior, a grande maioria das oficinas
visitadas afirmam que são pagas pelo volume de OLUC cedido às empresas
coletoras, com apenas 10% delas não recebendo nenhum tipo de remuneração
pelo mesmo, o que nos leva a acreditar que devem se tratar de empresas
clandestinas, cuja destinação dada ao OLUC é incerta e provavelmente
inadequada. Vale notar que, dentre as oficinas atendidas por empresas
coletoras autorizadas pela ANP, 15% delas possuem reservatórios para
armazenagem do OLUC cedidos pela própria empresa, o que só reforça a ideia
de que o investimento nesse mercado é válido, pois o retorno financeiro
parece evidente, conforme observamos a cada etapa desta pesquisa.
A frequência da coleta efetuada é outro forte indicador da importância deste
mercado. Em 55% das empresas entrevistadas essa coleta é efetuada
mensalmente, com apenas 10% delas acontecendo bimestral e trimestralmente.
Outros 10% já ocorrem quinzenalmente, enquanto os 15% restantes englobam
situações atípicas, como coletas de 20 em 20 dias, duas vezes por semana e
até 3 vezes por semana (figura 1).
Dentre os tipos de recipientes de armazenagem do OLUC, a maior parte das
oficinas possuíam tambores de metal, geralmente com capacidade de 200 L
(duzentos litros) cada, assim como os tambores de plástico (figura 2). A
exceção foram os postos de gasolina, com três deles possuindo tanques
subterrâneos, de plástico ou fibra de vidro, com capacidade entre 500 L
(quinhentos litros) e 1.000 L (mil litros).
Correlacionado a isso temos que 25% das oficinas possuem capacidade de
acúmulo de até 200 L de OLUC, outros 25% conseguem acumular até 500 L
(quinhentos litros), 35% das empresas chegam a acumular 1.000 L (mil
litros), e os 15% restantes têm capacidade de acúmulo de OLUC superior a
1.000 L (mil litros).
Também notamos que o padrão visto no quesito de local adequado para a troca
de óleo se repetiu quando perguntamos sobre a presença de uma caixa de
separação água/óleo - 60%, já que se trata de um pré-requisito para
autorização da construção de oficinas mecânicas e postos de combustíveis,
visto que ambos trabalham com óleos, gorduras e materiais de limpeza
agressivos, cujos efluentes provenientes da manutenção de suas áreas e
equipamentos não podem ser despejados diretamente na rede de esgotos
domésticos. E assim como acontece com as embalagens dos óleos lubrificantes
trocados, o material utilizado na limpeza do OLUC, como flanelas, estopas,
trapos e serragem, é recolhido por empresas especializadas (55%), enquanto
os 45% restantes são descartados no lixo comum, tendo o mesmo fim e causando
o mesmo prejuízo mencionado anteriormente.
Apesar de todas as inconformidades evidentes mencionadas, apenas 50% dessas
empresas receberam algum tipo de visita de caráter fiscalizatório, sendo
100% dos postos de combustíveis e das concessionárias, 25% das oficinas de
pequeno porte e nenhuma das quatro oficinas de médio porte, com a imensa
maioria delas efetuadas pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SEMA),
enquanto nenhuma foi efetuada pelo IBAMA, mesmo que a Resolução nº 362/2005
do CONAMA especifique que ambas são responsáveis por tal processo. Desta
forma, apenas 10% das oficinas receberam uma notificação, ambas relacionadas
à ausência de caixa separadora de água/óleo, enquanto nenhuma delas foi
multada. Esse levantamento retrata o quão ineficiente e seletivo é o sistema
de fiscalização, que propicia gargalos no sistema de coleta e deixa brechas
para a clandestinidade desse mercado, que termina refletindo no meio
ambiente.
Quando perguntados sobre o conhecimento a respeito das legislações vigentes
que abordam esta temática, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos e as
Resoluções pertinentes do CONAMA e da ANP, 70% dos funcionários
entrevistados afirmaram possuir alguma noção sobre as diretrizes impostas
por elas, já que eram obrigados a cumpri-las. Mas quando o assunto passou a
ser os impactos ambientais causados pelo descarte e reuso inadequado do
OLUC, foi quase unanimidade, 95% delas possuíam conhecimento sobre o
assunto. Pode-se dizer que isso é um reflexo da sociedade atual, pois ela
está mais engajada na preocupação com o meio ambiente, afinal de contas
vivemos na era da sustentabilidade.
Esses valores são de certa maneira justificáveis, pois 60% dos mesmos
funcionários já receberam algum tipo de treinamento formal sobre os
procedimentos adequados que envolvem e sucedem a troca de óleo. Por outro
lado, apenas 50% dos clientes demonstram algum interesse sobre a destinação
que é dada ao OLUC retirado de seus automóveis. Isso só demonstra que,
apesar da sociedade atual apresentar um certo grau de interesse pelo
desenvolvimento sustentável, boa parte dela não possui conhecimento sobre o
OLUC e os impactos gerados por ele. Desta forma, fica claro que também
existe uma deficiência nas políticas públicas voltadas para a
conscientização e educação da população a respeito desses óleos
lubrificantes usados ou contaminados, haja vista que uma sociedade
consciente força as empresas a fazerem o mesmo, pois o mercado costuma não
perdoar qualquer tipo de publicidade negativa.
Gráfico sobre a frequência da coleta de OLUC nas oficinas.
Gráfico sobre o tipo de recipiente disponível nas oficinas.
Conclusões
Em vista dos dados obtidos, conclui-se que o crescimento na frota de veículos tem elevado o consumo de óleos lubrificantes. Segundo o Relatório de Coleta de OLUC (BRASIL, 2016), apenas 39,5% do OLUC proveniente da comercialização de óleos lubrificantes no Brasil foi coletado em 2015. Dessa fração, apenas 28% dos 32% previstos para o Maranhão foram coletados. Apesar da ausência de empresas coletoras neste estado, constatou-se que duas empresas exercem essa função em São Luís. Uma delas possui uma filial situada na Bahia, e a outra, no Pará. Ambas possuem frotas de veículos adequados para efetuar a coleta do OLUC, e o fazem periodicamente, apesar da distância percorrida. Contudo, levando-se em consideração que apenas São Luís e mais 7 municípios do Maranhão são atendidos por elas, e ainda assim não em sua totalidade, a maioria do OLUC acumulado é descartado e reutilizado incorretamente, causando danos ambientais e à saúde pública. Também verificamos que o Maranhão só possui um decreto estadual – Decreto nº 17.764 – que acrescenta dois artigos ao Regulamento do ICMS, dispondo sobre o documento a ser utilizado na coleta e transporte do OLUC e disciplinando o procedimento de sua coleta, transporte e recebimento, seguindo os padrões impostos pelas normas do CONAMA e da ANP. Porém, não encontramos nenhuma lei estadual capaz de adaptar essas resoluções federais para a realidade do estado. Em virtude desses fatos, questionou-se que, se empresas efetuam esse tipo de serviço mesmo com os entraves de tempo e distância, então este é um processo lucrativo; logo, qual a justificativa para não existir uma empresa local ou uma filial no Maranhão, para cobrir a demanda do estado? Diante desses aspectos conclui-se que existe um enorme gargalo na implementação da legislação vigente, evidente na quantidade e distribuição das empresas aptas para realizar a coleta, o transporte e a reciclagem desse material, sendo necessária uma reforma e ampliação na logística desse setor em São Luís.
Agradecimentos
Referências
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 10.004 - Resíduos sólidos - Classificação. Rio de Janeiro, 2004.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Coleta de óleo lubrificante usado ou contaminado - dados de 2015. Brasília, DF. 27 jun. 2016. Disponível em: <http://www.sinir.gov.br/documents/10180/164231/Relatorio_CONAMA_OLUC_2016_270616.pdf/43f0392b-dfc7-42f8-b0e2-f01221269d5a>. Acesso em: 10 out 2016.
BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Resolução n. 362, de 23 de junho de 2005. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=466>. Acesso em: 7 maio 2016.
BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Resolução n. 450, de 6 de março de 2012. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res12/Resol450.pdf>. Acesso em: 7 maio 2016.
O DIA. Observatório da Mobilidade. Frota de carros no Brasil mais que dobra em dez anos. Rio de Janeiro, RJ. 29 fev. 2016. Disponível em: <http://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/observatorio/2016-02-29/frota-de-carros-no-brasil-mais-que-dobra-em-dez-anos.html>. Acesso em: 9 nov. 2016.
QUINTANILHA, Lilian. Reaproveitamento de Óleos Lubrificantes Usados através do Rerrefino. Revista Meio Ambiente Industrial. São Paulo, v. 13, n. 77. p. 28 - 35, jan. - fev. 2009.