AVALIAÇÃO DO POLI(ETILENO-CO-ACETATO DE VINILA) COMO REDUTOR DE PONTO DE FLUIDEZ EM SISTEMAS MODELO CONTENDO N-PARAFINAS, ISOPARAFINAS E PARAFINAS CÍCLICAS
ISBN 978-85-85905-23-1
Área
Materiais
Autores
Alves, B. (IMA/UFRJ) ; Pereira, P.H. (IMA/UFRJ) ; Nunes, R. (COPPE/UFRJ) ; Lucas, E. (IMA/UFRJ)
Resumo
Um dos desafios que a indústria do petróleo enfrenta atualmente é a otimização da garantia de escoamento na produção, transporte e processamento do óleo. A variedade de compostos químicos presentes no petróleo, desencadeia a deposição de sólidos orgânicos. Nesse trabalho, o objetivo é a análise de sistemas modelo que simulam isoladamente o comportamento dos componentes do petróleo, a fim de avaliar a ação do copolímero de poli(etileno-co-acetato de vinila) (EVA) na presença destes. Através do teste de ponto de fluidez com ensaios auxiliares de microcalorimetria, foi possível a análise dos sistemas modelo de parafina, e os resultados foram eficientes ao revelarem que a presença das parafinas cíclicas não influencia a ação do aditivo sob as condições estudadas.
Palavras chaves
Aditivo polimérico; parafinas; ponto de fluidez
Introdução
O Petróleo é hoje conhecido por ser uma das mais importantes matérias-primas e fontes de energia do mundo, e a sua produção enfrenta, ainda, desafios que envolvem desde a operação, no acesso e desenvolvimento do reservatório, até os fatores físicos e químicos que estão relacionados à variação da composição química do petróleo, o que vai influenciar na demanda de maior ou menor investimento ao longo da sua cadeia produtiva, incluindo o refino e a transformação dos produtos derivados (como gasolina, óleo diesel, querosene, asfaltos, solventes, lubrificantes e plásticos) (ANP, 2018; MANSOORI, 2009). O petróleo bruto é constituído por uma complexa mistura de hidrocarbonetos, e outros elementos presentes em menores quantidades (nitrogênio, oxigênio, compostos de enxofre e íons metálicos) (ANP, 2018). Os compostos de carbono estão geralmente presentes na faixa que engloba entre 1e 60 átomos de carbono, e a parafina faz parte do grupo dos alcanos de alto peso molecular (normalmente acima de 18 átomos de carbono), apresentando-se nas formas cíclica, ramificada (iso-parafina) ou linear (n-parafina). A solubilidade da parafina decresce com a temperatura, e, sobretudo as n-parafinas, sob determinadas condições de temperatura, perdem solubilidade no petróleo cru e mudam o estado físico da solução, se tornando uma suspensão de partículas sólidas no óleo. (YUPA, 2010). A deposição de compostos orgânicos pesados presentes no petróleo, onde estao incluídas as parafinas, especialmente a baixas temperaturas, é um problema sério e antigo da indústria, com implicações operacionais e econômicas, e o tipo e a quantidade dos depósitos dependem da complexa composição do petróleo, que varia expressivamente de um reservatório para outro (HOFFMANN e AMUNSDSEN, 2013; MENDES, 2014). No cenário offshore, a baixa temperatura da água no fundo do mar provoca um resfriamento brusco do óleo à medida que ele sai do reservatório, podendo ocorrer a deposição de parafinas, que envolve um fenômeno de cristalização das mesmas, o qual pode ser dividido em três estágios: o primeiro é a nucleação, em que o primeiro núcleo aparece; o segundo estágio é quando a massa produzida sai de solução, e o último estágio está relacionado ao momento em que ocorre a agregação dos cristais produzidos, promovendo o crescimento dos cristais (GENTILI, KHALIL e LUCAS, 2004). A temperatura em que se pode perceber o aparecimento do primeiro cristal é chamada temperatura inicial de aparecimento de cristais (WAT), acima da qual o petróleo parafínico, apesar de quimicamente muito complexo, é um fluido newtoniano simples. Já em temperaturas abaixo da WAT, a precipitação de parafina aumenta significativamente a viscosidade e altera as propriedades de fluxo para o comportamento não-newtoniano. (VARA, MARTINEZ, GONZALEZ, 2011). O método de calorimetria diferencial de varredura (DSC), com base em curvas exotérmicas, permite calcular e registrar a WAT e avaliar os cristais que precipitam em diferentes temperatura por meio de uma técnica que é baseada na determinação da temperatura em que ocorre o início do calor latente devido à cristalização das parafinas (VIEIRA, BUCHUID e LUCAS, 2013). Além da WAT, outro parâmetro importante, e que foi a base de estudo para esse trabalho, é o denominado ponto de fluidez. Este parâmetro identifica a menor temperatura na qual o petróleo cru ainda pode fluir em condições estáticas e corresponde a uma transição de fase em que o óleo passa de um sistema solúvel de fluido para um gel parafínico até sua solidificação (VARA, MARTINEZ, GONZALEZ, 2011). A precipitação ou deposição de parafinas do petróleo é um fenômeno complexo que gera redução no diâmetro do duto e pode danificar permanentemente as linhas de escoamento, não apenas na produção, mas também durante o transporte e processamento do petróleo (BORDALO, 2007). A utilização de aditivos poliméricos, especialmente os copolímeros, tem se revelado um método interessante para confrontar o problema da deposição de parafinas e otimizar a garantia de escoamento do óleo, uma vez que podem atuar como redutores do ponto de fluidez, inibidores da aglomeração dos cristais formados, ou como modificadores dos cristais (WEI, 2015). No entanto, ainda não se conseguiu obter uma estrutura de aditivo que apresente bom desempenho para todas as composições químicas do petróleo, uma vez que a ação do aditivo depende fortemente das características do petróleo e esta relação ainda não está esclarecida por completo (YANG et al., 2015). E diante desse desafio surge a motivação para maior detalhamento dos compostos presentes no petróleo. Esse trabalho justifica-se pela relevância do estudo mais minucioso, visando, através de sistemas modelos, simular a composição do petróleo e analisar separadamente a influência de cada componente, (n-parafinas, parafinas cíclicas, isoparafinas e as estruturas químicas presentes em menores quantidades no óleo) com o objetivo de compreender a ação do EVA na presença desses componentes.
Material e métodos
Para o preparo dos sistemas modelos parafínicos foram utilizadas, como bases, parafinas com diferentes pontos de fusão (44-46°C, 53-57°C, 56-58°C), as quais foram denominadas P01, P02 e P03. As estruturas químicas usadas para a dopagem dos sistemas estão listadas a seguir: ácido naftênico (Sigma Aldrich), adamantano (Sigma Aldrich), asfaltenos (extraídos com pentano e n- heptano), decaidronaftaleno (Sigma Aldrich), difenilamina (Sigma Aldrich), difenilmetano (Sigma Aldrich), éter difenílico (Sigma Aldrich), fenantreno (Merck Schuchardt OHG), naftaleno (Vetec), nonilfenol (Sigma Aldrich), pirrolidina (Sigma Aldrich), quinolina (Sigma Aldrich), e tetrahidrofurano (Sigma Aldrich). O tolueno (obtido por processo de destilação), o cicloexano (Vetec) e o n-heptano (Isofar) foram, ainda, estruturas utilizadas como solventes dos sistemas. O polímero utilizado para a avaliação foi o copolímero comercial poli(etileno-co-acetato de vinila). Os equipamentos utilizados para os ensaios de ponto de fluidez e microcalorimetria diferencial de varredura foram, respectivamente, 4 banhos termostáticos específicos (HAAKE e JULABO), microDSC VII (SETARAM com célula de hastelloy 276). Para o preparo do sistema-modelo foi adotada a seguinte metodologia: pesagem das parafinas (10% m/v) e solubilização destas no solvente (ou mistura de solventes) sob agitação constante a 45°C, adição das estruturas pretendidas no estudo (1% m/m) e do aditivo EVA10 (500 ppm). O tempo de agitação foi de 1h com aquecimento. O ensaio de ponto de fluidez segue a norma D97 (ASTM D97-2012), em que o sistema-modelo é inserido em um sistema de montagem de cubeta padrão com verificação da sua temperatura real, repouso por no mínimo 24h do sistema, e verificação da temperatura em que o sistema-modelo cessa o escoamento por meio da transição entre banhos termostáticos nas temperaturas de 24°C, 0°C, -18°C e -33°C. O ponto de fluidez foi retratado como o valor da temperatura em que o escoamento cessa, acrescido de 3 unidades. Para os ensaios de microcalorimetria, as amostras de alguns sistemas modelo selecionados foram aquecidas previamente a 45°C por 30 minutos antes de serem pesadas na célula. Para as análises, foram utilizadas aproximadamente 70 mg do sistema modelo, tendo o undecano como referência. Após a pesagem da amostra na célula, estas foram fechadas e inseridas na cavidade do equipamento μDSC e, então, a amostra foi submetida a um aquecimento da temperatura ambiente até 80°C (a uma taxa de aquecimento de 1°C/min). Essa temperatura de 80°C foi mantida por 15 minutos e, em seguida, foi realizado o resfriamento da amostra até -10°C a uma taxa de resfriamento de 0,8°C/min. A temperatura de -10°C foi também mantida por 15 minutos e, por fim, a amostra foi aquecida até a temperatura de 30°C a uma taxa de aquecimento de 1°C/min. Com base na curva de fluxo de calor em função da temperatura, a WAT foi determinada como sendo a temperatura de onset do primeiro pico exotérmico no resfriamento.
Resultado e discussão
A Tabela 1 apresenta os resultados obtidos pelo teste de ponto de fluidez
nos sistemas modelos com a parafina P01 na concentração de 10% m/v, tendo o
tolueno como solvente padrão, e os elementos da primeira coluna como os
compostos que foram dopados na solução, na concentração de 1% m/m. Por
possuírem, entre as três amostras de parafina (P01, P02 e P03) presentes no
estudo, o menor ponto de fusão, são as parafinas com os menores comprimentos
de cadeia. É também o conjunto de parafina que apresenta maior teor de
cadeias lineares em relação às ramificações (OLIVEIRA, 2016). É possível
observar na Tabela 1 que o ponto de fluidez obtido após a dopagem no sistema
modelo pelos compostos estudados isoladamente, não sofreu alteração em
relação ao sistema modelo puro, exceto para os asfaltenos C5 e C7 que
tiveram seu ponto de fluidez reduzido para temperaturas menores que -24°C.
Assim, além dos asfaltenos, a presença dos grupamentos constituintes dos
compostos dopados, os quais envolvem estruturas variadas que simulam a
composição do petróleo (cíclicas, nitrogenadas, oxigenadas, e anéis
aromáticos), na concentração de 1% m/m, também não é um fator limitante para
a ação do aditvo de EVA10 (10% em mol de acetato de vinila) sobre a parafina
P01. Foi observado que para as demais parafinas estudadas, com maiores
pontos de fusão e consequente aumento de tamanho de cadeia, a presença do
aditivo não interferiu no ponto de fluidez do sistema modelo, obtendo-se
resultados de ponto de fluidez de 21 e 27°C, respectivamente para as
parafinas P02 e P03. Uma possível influência dos asfaltenos pode estar
relacionada com a polaridade, uma vez que sua estrutura envolve elementos
altamente eletronegativos, como nitrogênio, enxofre e oxigênio em diversas
proporções.
A fim de avaliar a ação do EVA10 na presença dos componentes cíclicos com
ressonância no anel, foram realizados testes de ponto fluidez com a
concentração da P01 reduzida de 10% m/v para 5% m/v. Assim, foi possível
observar que uma maior quantidade de estruturas aromáticas em relação à esta
parafina no sistema modelo adotado não interferiu na eficiência do aditivo
polimérico.
Por sua vez, ao avaliar a influência das cadeias lineares, a Figura 1 mostra
que nos sistemas modelo com P01 o aumento da porcentagem de n-
heptano:tolueno nas proporções de 100:0, 90:10, 80:20, 70:30 promoveu uma
redução do parâmetro de solubilidade da mistura que, por sua vez, revelou-se
como um fator influenciador da ação do aditivo EVA10 na parafina. É possível
observar que a presença do n-heptano não modificou o ponto de fluidez do
sistema modelo original. Contudo, limitou a ação do aditivo polimérico EVA10
como redutor de ponto de fluidez nos sistemas modelo estudados, elevando o
ponto de fluidez de menor que -24 para -3°C. Esse resultado corrobora com os
obtidos para as parafinas P02 e P03, nos quais o aditivo não apresentou
eficiência devido ao aumento do tamanho da cadeia linear.
Visando observar a influência das cadeias lineares presentes na estrutura no
nonilfenol e cíclicas, utilizando compostos como éter difenílico,
difenilmetano e difenilamina, apenas na relação 3:1 de nonilfenol com o éter
difenílico, foi observada uma diferença no comportamento de escoamento do
sistema modelo, que teve sua fluidez favorecida. O éter difenílico
apresenta o elemento oxigênio em sua estrutura, assim como o nonilfenol, o
que pode ter contribuído para um efeito maior da polaridade no sistema
modelo, como já observado para os asfaltenos. À medida que a concentração de
nonilfenol aumenta em relação ao éter difenílico, aumenta a razão
carbono/oxigênio. Contudo o comportamento do ponto de fluidez do sistema
modelo não é linear nessa relação, o que sugere a necessidade de haver um
balanço ótimo de proporção das estruturas químicas para que elas interfiram
no escoamento do sistema modelo.
Os resultados de microcalorimetria mostraram um aumento da temperatura
inicial de aparecimento de cristais com o aumento do ponto de fusão das
parafinas, apresentando os respectivos resultados para as parafinas puras
P01, P02 e P03: 9,36; 21,59; 26,16. Para as três parafinas estudadas, não
foram observadas alterações na WAT dos sistemas modelo aditivados com o
EVA10. Os sistemas modelo dopados com os demais compostos que apresentarem
redução no ponto de fluidez serão, posteriormente, analisados por essa
técnica.
Conclusões
Com base nos resultados observados, pode-se concluir que com o aumento do tamanho das cadeias de n-parafinas, o ponto de fluidez do sistema modelo é elevado. A presença dessas cadeias lineares se sobrepõe a de todos os demais componentes (cíclicos, nitrogenados, oxigenados e aromáticos) na atuação do aditivo. Foi observado que a fluidez do sistema modelo não depende apenas da estrutura dopada, mas pode ser influenciada pela proporção dos componentes e a polaridade dos mesmos. O parâmetro de solubilidade dos compostos, através da ação do n-heptano: tolueno, mostrou-se um fator que pode atuar limitando a eficiência do poli(etileno-co-acetato de vinila) como redutor de ponto de fluidez.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq, CAPES, FAPERJ e CENPES/PETROBRAS pelo apoio financeiro.
Referências
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