Modelagem computacional de mudança de fase de substâncias puras: quantificação da força intermolecular devido variação volumétrica

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Química Tecnológica

Autores

Duarte, B.A.F. (UFU) ; Silveira-neto, A. (UFU)

Resumo

A modelagem computacional de mudança de fase é uma metodologia que produz importantes progressos científicos e industriais; no entanto, ainda há muitos aspectos a serem investigados dentro desse tema. A literatura apresenta um termo de força de recuo ligado à expansão volumétrica devido à mudança de fase que ainda não foi investigado ou quantificado anteriormente. Portanto, nesse trabalho é quantificado a importância da inclusão de um termo de força na modelagem para expressar o efeito da força intermolecular que emerge da interface relacionada ao equilíbrio de pressão entre as fases de líquido e vapor de uma substância pura em ebulição. Conclui-se a partir dos resultados computacionais que a modelagem da força de recuo sem haver fluxo térmico crítico não foi relevante.

Palavras chaves

bolha de vapor; ebulição; força de recuo

Introdução

Mudança de fase é uma questão relevante em diversas aplicações industriais (HAELSSIG et al., 2010), pois desempenha um papel crítico em uma grande quantidade de processos (WELCH, 2000; JURIC et al., 1998). A ebulição, por exemplo, é uma maneira altamente eficiente de transferir energia térmica, particularmente em trocadores térmicos industriais ( NIKOLAYEV et al., 2016). Além disso, as técnicas de separação química, como a destilação, são caracterizadas pela transferência simultânea de massa e energia (HAELSSIG et al., 2010). A evaporação de gotas é indubitávelmente outro fenômeno relevante que apresenta grande importância para certas aplicações (STROTOS et al., 2011), particularmente a queima de combustíveis líquidos. Os primeiros trabalhos de mudança de fase na literatura apresentaram aspectos importantes da modelagem matemática e numérica que podem ser vistos em (JURIC et al., 1998) e (WELCH, 2000). Atualmente, vários avanços na modelagem matemática e numérica foram alcançados e relatados na literatura com até mesmo simulações complexas voltadas para aplicações industriais (TANGUY et al., 2014). Simulações computacionais de mudança de fase são relevantes para coletar informações sobre características de fluxo, uma vez que experimentos que lidam com a mudança de fase são geralmente difíceis de serem conduzidos corretamente (PAN et al., 2017) devido às pequenas escalas espaciais (WELCH, 2000) e devido à rapidez do processo de mudança de fase (JURIC et al., 1998). Simulações envolvendo mudança de fase apresentam vários obstáculos numéricos (TRYGGVASON et al., 2015) e um dos aspectos mais desafiadores são notavelmente as descontinuidades físicas das propriedades fluidas que ocorrem na interface entre dois fluidos (TSUI et al., 2014) e as condições de salto na interface de importantes variáveis dos fluidos, como a pressão (Tanguy et al., 2014). O modelo de mudança de fase desenvolvido tem o objetivo de modelar escoamentos bifásicos de substâncias puras. A mudança de fase em substâncias puras ocorre a um certo valor de temperatura e pressão quando existe a coexistência de duas fases de uma mesma substância. Essa condição termodinâmica se denomina condição de saturação, onde toda energia inserida no sistema é utilizada no processo de mudança de fase à temperatura constante. A variação volumétrica de um fluido durante o processo de mudança de fase é um fenômeno ainda pouco compreendido e de difícil entendimento devido às microescalas de tempo e espaço que tornam experimentos reais complexos de se quantificar (JURIC et al., 1998). De acordo com Nikolayev et al. (2016), uma mólecula de líquido ao se evaporar produz uma força normal à interface líquido-vapor relacionada à expansão volumétrica e quanto mais intensa for a taxa de evaporação, maior será a magnitude da força intermolecular na interface. De acordo com Tanguy et al. (2014), essa força é modelada de acordo com uma expressão que relaciona o quadrado da densidade de fluxo de massa ocorrendo na interface. Devido à variação de pressão na interface líquido-vapor em função da expansão volumétrica no processo de mudança de fase, faz-se necessário corrigir o salto da pressão na interface com uma força que equilibre essa variação de pressão (JURIC et al., 1998) . Considerando a lei de Young-Laplace, observa-se que nos processos de mudança de fase, o termo da expressão anterior é responsável por adicionar o efeito de expansão volumétrica na modelagem das forças. Apesar de a literatura alertar sobre esse termo na modelagem de mudança de fase, não há estudos que quantifiquem a importância em simulações ou estudos que estabeleçam relação de ordens de grandeza com outros termos relevantes de força na interface, tal como a tensão superficial.

Material e métodos

As simulações computacionais foram conduzidas no cluster do laboratório de Mecânica dos Fluidos da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) utilizando o código MFSim, que tem sido produzido em cooperação com a Petrobras e diversos grupos de pesquisa do país. O código conta com um módulo de mudança de fase de substâncias puras baseado em Pan et al. (2017). O modelo físico utilizado neste estudo consiste em um domínio cúbico tridimensional. O escoamento foi considerado incompressível e fluido monocomponente. A condição de contorno de todas as faces são derivada nula de velocidades, pressão e temperatura uniformemente impostas. Foi simulado ebulição de líquido em um meio superaquecido a partir de uma bolha de vapor com e sem o termo que modela a força interfacial de expansão volumétrica. Foram comparados os saltos de pressão e a predição do raio da bolha de vapor de acordo com a solução analítica disponível em Scriven et al. (1959). O adimensional Jakob foi equivalente a aproximadamente 3. O modelo de mudança de fase emprega uma abordagem semelhante a Pan et al. (2017) para contabilizar o balanço adequado de massa, quantidade de movimento e transporte de energia através da interface. O modelo numérico resolve a equação de energia e, em seguida, executa um balanço energético em cada célula computacional contendo a interface para definir a energia local disponível para permitir a mudança de fase. A energia sensível calculada é convertida em energia térmica latente que é usada para calcular a densidade de fluxo de massa na interface. Finalmente, a condição de saturação é imposta às células da interface e esse procedimento é repetido em cada passo de tempo. As simulações de mudança de fase foram realizadas utilizando uma malha cartesiana tridimensional estruturada com configurações de 32x 32x32, 64x64x64 e 128x128x128 células. Um método de projeção foi utilizado com um tratamento explícito dos termos de advecção e com um tratamento implícito de termos de pressão e difusão. O esquema Barton foi usado para discretização espacial de termos advectivos. Navier-Stokes e a equação da energia foram resolvidas usando o método Multigrid multinível. As equações foram resolvidas de acordo com a metodologia de volume finito. O código MFSim foi utilizado em todas as simulações. Esse código foi desenvolvido nos últimos 10 anos em cooperação com um grande grupo de pesquisa e com o apoio científico da Petrobras. O código MFSim usa malhas compostas estruturadas em bloco, definidas como uma seqüência hierárquica de níveis de malha aninhadas e progressivamente mais finas. Cada nível é formado por um conjunto de blocos de malha não sobrepostas alinhadas com os eixos de coordenadas cartesianas. O critério de convergência das equações de continuidade, quantidade de movimento e energia foi estabelecido para atingir resíduos até 10^-6. Todas as simulações foram realizadas em ambiente paralelo no cluster de Laboratório de Mecânica de Fluidos da UFU.

Resultado e discussão

Simulações do crescimento de uma bolha por mudança de fase que impõe uma densidade de fluxo de massa variável em função do campo térmico foram realizadas para validar o método numérico de acordo com uma solução analítica da previsão do raio da bolha. O adimensional Jakob foi de 3, conforme previamente simulado por Tanguy et al. (2014). Quanto à simulação de mudança de fase com densidade de fluxo de massa variável mostrada na figura 1, a predição do raio da bolha apresentou um bom acordo com a solução analítica disponível para a previsão do raio da bolha. Além disso, a independência de malha foi conduzida e os resultados mostraram convergência para os resultados de validação de referência. Portanto, esses resultados confirmaram a viabilidade de empregar esse método computacional para simulações com mudança de fase. Após a validação, foi simulado a ebulição de líquido também com Jakob=3 com e sem o termo fonte na equação do balanço da quantidade de movimento relacionado à força intermolecular de recuo. De acordo com a figura 2, não foi observada diferença no salto de pressão entre as simulações com ou sem o termo de força interfacial. O erro do raio da bolha entre o previsto pela solução analítica Scriven et al. (1959) e o obtido computacionalmente foi de 3.1% tanto para a simulação com o termo interfacial quanto para a simulação sem o termo. De acordo com Nikolayev et al. (2016), somente na ocorrência de fluxo térmico crítico, esse termo passa a ter a ordem de grandeza semelhante ao termo de tensão superficial. Logo, se espera que a situação em que a força relacionada à expansão volumétrica se torne relevante na modelagem de mudança de fase é na presença de fluxo térmico crítico. Diante dos resultados computacionais obtidos pode-se perceber que a modelagem do termo fonte da força interfacial associado ao recuo não influenciou a previsão do raio da bolha ou o equilíbrio de pressão na evolução temporal do problema. De acordo com a quantificação do termo de recuo, foi observado que ele é 5 ordens de grandeza menor que o valor do termo de força associado à tensão superficial. Logo, a influência do termo da força de recuo quando não for próximo da ordem de grandeza da força de tensão superficial deve afetar pouco ou nada em relação à evolução temporal da interface.

Figura 1

Evolução temporal do raio da bolha de vapor utilizando Jakob de 3 para diferentes malhas

Figura 2

Salto de pressão para simulação com e sem termo de força de recuo

Conclusões

De acordo com os resultados de predição do raio da bolha de vapor e do salto de pressão na interface, a presença do termo de força interfacial não foi relevante nas simulações de ebulição de líquido. Conclui-se que pelo fato de a força que representa expressão da força intermolecular são relevantes apenas quando a ordem de grandeza for semelhante à força de tensão superficial.

Agradecimentos

Agradeço ao laboratório de mecânica dos Fluidos da UFU, ao CNPQ e a Petrobras pelo apoio.

Referências

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