Isolamento e identificação de Biflavonoides das folhas de Piranhea trifoliata (Picrodendraceae)
ISBN 978-85-85905-21-7
Área
Produtos Naturais
Autores
Jeffreys, M.F. (INPA/SEDUC) ; Nunez, C.V. (INPA)
Resumo
A floresta Amazônica é rica em diversas espécies vegetais, dentre elas, destaca-se Piranhea trifoliata, a qual é conhecida popularmente como piranheira, por seus frutos servirem de alimentos para peixes. Suas cascas são utilizadas como curativo para inflamação no útero, em banhos de assento, e para chás no tratamento de malária. O objetivo deste trabalho foi o fracionamento cromatográfico da fase diclorometânica e da fase acetato de etila, ambas obtidas do extrato metanólico das folhas de P. trifoliata. A fase diclorometânica forneceu o biflavonoide 7,4’’’ dimetilamentoflavona conhecido como Podocarpusflavona B e a fase acetato de etila forneceu o biflavonoide 3’-O-metil loniflavona. Para a identificação estrutural foram utilizados os espectros de RMN de 1H e de 13C mono e bidimensionais.
Palavras chaves
Floresta Amazônica; Piranhea trifoliata ; biflavonoides
Introdução
A riqueza da biodiversidade da flora brasileira, associada aos levantamentos etnobotânicos e fitoquímicos, permitiu um grande avanço na pesquisa de substâncias biologicamente ativas a partir de diferentes espécies vegetais que podem ser utilizadas como princípio ativo em fármacos, na aplicação agrícola ou florestal. Dentre as espécies vegetais brasileiras, destaca-se Piranhea trifoliata Baill (Picrodendraceae), a qual é uma árvore de grande porte, com os ramos bem desenvolvidos e parcialmente submersos em água, ocorrem nas margens dos rios da região Amazônica e solos arenosos (REMADE 2017; MOBOT, 2017; SECCO e CORDEIRO, 2017; SUTTER et al., 2006; APG, 2003). Ela pode ser encontrada no Brasil, Bolívia e Venezuela. No Brasil é frequente nos estados do Amazonas, Pará, Tocantins, Rondônia e Mato Grosso (SECCO e CORDEIRO, 2017). É conhecida popularmente como piranheira, pois seus frutos e sementes são usados como alimento por piranhas e outros peixes que vivem nos rios da região e é encontrada nas áreas de várzeas e igapós. Na medicina popular é usada como anti-séptico (CASTAÑEDA et al, 1993), malária, hemorróidas e inflamações. Estudos fitoquímicos realizados pelo nosso grupo de pesquisas mostram o isolamento dos triterpenos: 28-hidroxi- friedelin-3-ona, friedelan-3-ona, 28-hidroxi-friedelan-3-ona, 30-hidroxi- friedelan-3-ona, lupeol, mistura de α- e β -amirina, além da mistura dos esteroides β-sitosterol e estigmasterol, ácido-metoxi-4-hidroxi-benzaldeído, além de seus extratos metanólicos apresentarem atividades antimalárica, antioxidante, antibacteriana e antifúngica (RODRIGUES et al., 2014; PEDROZA, 2014; JEFFREYS, 2011; JEFFREYS e NUNEZ 2016). Dando continuidade ao estudo fitoquímico, o objetivo deste trabalho foi o isolamento de biflavonoides das fases diclorometânica e acetato de etila obtidas do extrato metanólico das folhas de P. trifoliata.
Material e métodos
As folhas de P. trifoliata Baill foram coletadas em Altamira-PA, onde foram secas à temperatura ambiente, moídas em moinho de facas e extraídas com hexano, metanol e água. O extrato metanólico foi submetido a uma partição líquido-líquido, dissolvendo o mesmo em uma mistura de metanol/H2O na proporção 7:3, obtendo as fases diclorometânica (DCM), acetato de etila e hidrometanólica. A fase DCM foi fracionada em colunas abertas de sílica, onde foi obtido o biflavonoide (1). A substância 1 apresentou Rf de 0,57 quando eluída no sistema DCM/Acetona 4:6. O biflavonoide (2) foi isolado a partir do fracionamento da fase AcOEt também obtida do extrato metanólico. Esta molécula apresentou Rf de 0,31 quando eluída no sistema DCM/acetona 1:1. Ambos os biflavonoides apresentaram-se como sólidos amarelos solúveis em DMSO-d6 e apresentaram coloração amarela quando revelados com anisaldeído sulfúrico e verde escuro quando revelados com cloreto férrico. Para a identificação das substâncias, foram realizadas análises de RMN de 1H e de 13C mono e bidimensionais e espectrometria de massas de alta resolução via ionização por ESI.
Resultado e discussão
Ao analisar o biflavonoide (1), observou-se um íon de m/z 567,1209 [M+H]+,
compatível com a fórmula molecular C32H22O10. Os espectros de RMN de 1H mostraram
dois singletos em δH 12,75 e δH 12,65 correspondentes a hidroxilas queladas em OH-5
e OH- 5´´características de biflavonoides. Na região de hidrogênios de anéis
aromáticos, foram observados dois dubletos, um em δH 6,71 (d, J = 2,2 Hz, H– 8), e
outro em δH 6,35 (d, J = 2,2 Hz, H–6) referentes ao anel A-I, além do sinal em δH
3,81 da metoxila ligada em C-7. Observaram-se ainda a presença de um dubleto em δH
8,07 (d, J = 2,4 Hz, H-2’), um duplo dubleto em δH 8,02 (dd, J = 8,7 e 2,5 Hz, H-6’)
e um dubleto em δH 7,12 (d, J = 8,6 Hz, H-5’), referentes ao anel B-I, além de um
singleto em δH 6,89 (s) referente ao hidrogênio H-3 do anel C-I. Ao analisar os
demais sinais, verificou-se a presença de um singleto em δH 6,35 (s) do anel A-II,
um dubleto em δH 7,68 (d, J = 8,9 Hz, H-2’’’ e H-6’’’), outro em δH 6,90 (d, J = 8,7
Hz, H-3’’’ e H-5’’’) e um sigleto em δH 3,73 (s) refermente a metoxila ligada em C-4
do anel B-II e um singleto em δH 6,88 (s) do H-3’’ do anel C-II. O mapa de contorno
2D de 1Hx1H COSY, mostrou os acoplamentos entre hidrogênios H–5’ com H–6’; H–2’ com
H–6’; H–2’’’ com H-3’’’ e H-5’’’ com H-6’’’ respectivamente, ao analisar o mapa de
contorno 2D de HSQC, verificaram-se correlações entre os 12 carbonos metínicos com
seus respectivos hidrogênios. O mapa de contorno 2D HMBC mostrou vários acoplamentos
entre os quais estão as correlações da hidroxila quelada em δH 12,98 (OH-5) com δc
160,8 (C-5) e δH 13,08 (OH-5’’) com δc 160,2 (C-5’’), os acoplamentos a longa
distância (3JCH) foram observados entre os carbonos δc 131,6 (C-2’) com o hidrogênio
δH 8,02 (H-6’), o carbono δc 97,7 (C-6) com a hidroxila em 12,98 (OH– 5), bem como o
carbono δc 98,7 (C-6’’) com a hidroxila em 13,08 (OH–5’’). Outros sinais foram
observados, entretanto os acoplamentos entre δc 164,7 (C-7) com a metoxila em δH
3,80 (MeO-7) e o carbono δc 161,7 (C-4’’’) com a metoxila em δH 3,72 (MeO-4’’’). A
análise destes dados forneceu o biflavonoide 7,4’’’ dimetilamentoflavona conhecido
como Podocarpusflavona B (GARG e MITRA, 1971) (Figura 1). O biflavonoide (2),
apresentou em seu espectro de massas de alta resolução via ionização por ESI, um íon
de m/z 553,1107 [M+H]+, compatível com a fórmula molecular C31H20O10, com Índice de
Deficiência de Hidrogênio (IDH) de 22. Os espectros de RMN de 1H mostraram dois
singletos em δH 12,95 e δH 12,84 correspondentes a hidroxilas queladas em OH-5 e OH-
5´´características de biflavonóides. Na região de hidrogênios de anéis aromáticos,
foram observados dois dubletos em δH 6,38 (d, J = 2,0 Hz, H–6) e em δH 6,65 (d, J =
2,0 Hz, H–8) referentes ao anel A-I, além dos sinais em δH 7,17 (d, J = 8,7 Hz, H–
2’), em δH 8,06 (d, J = 2,0 Hz, H–5’) e um duplo dubleto em δH 7,91 (dd, J = 8,5 e
2,2 Hz, H–6’) referentes ao anel B-I. Para a identificação do anel A-II foram
observados dois dubletos em δH 6,20 (d, J = 2,4 Hz, H–6’’) e em δH 6,38 (d, J = 2,0
Hz, H–8’’), os sinais em δH 6,81 (d, J = 8,9 Hz, H–3’’’ e H-5’’’) e δH 7,66 (d, J =
8,7 Hz, H–6’’’) são referentes ao anel B-II. Os sinais presentes no anel C-II foi
apenas um singleto em δH 6,64 (s, H–3’’). O mapa de contorno 2D de 1H x 1H COSY,
mostrou os acoplamentos entre os hidrogênios H–5’ com H–6’, H–2’ com H–6’, H–2’’’
com H-3’’’ e H-5’’’ com H-6’’’ respectivamente. Ao analisar o mapa de contorno 2D de
HSQC, verificou-se o acoplamento para 12 carbonos metínicos com seus respectivos
hidrogênios. O mapa de contorno 2D HMBC mostrou vários acoplamentos entretanto, tem-
se em destaque as ligações C-4’ e C-4’’’ mostrando que ambos os flavonoides estão
ligados por um oxigênio. Esta confirmação foi estabelecida pelo acoplamento a longa
distância (4JCH) entre δc 156,4 (C-4’) com δH 6,81 (H- 3’’’). Os acoplamentos a
longa distância (3JCH) foram observados entre C-2 com H-6’, C-3 com H-1’, C-10 com
OH-5, H-3, H-6 e H-8, além de C-6’’ com OH-5’’, H-10 respectivamente. Entretanto os
acoplamentos entre δc 165,46 (C-3’) com a metoxila em δH 3,66 (MeO-3’) confirmaram a
proposta da 3’-O-metil loniflavona (KUMAR, et al, 2005) (Figura 2).
Espectro de RMN de 1H do biflavonoide 7,4’’’- dimetilamentoflavona (DMSO-d6, 300 MHz) inédita na família Picrodendraceae.
RMN de 1H do biflavonoide 3’-O-metil loniflavona_DMSO-d6, 300 MHz inédita na família picrodendraceae.
Conclusões
O estudo fitoquímico das fases diclorometânica e acetato de etila do extrato metanólico das folhas de P. trifoliata permitiu o isolamento de dois biflavonoides: 7,4’’’ dimetilamentoflavona e 3’-O-metil loniflavona, que estão sendo descritos pela primeira vez na família.
Agradecimentos
Ao INPA, CNPq, CAPES, FAPEAM, SEDUC/AM, Debora Carla Moura, Hellen Cristina Lima e a Christiane Bertino do GTCN, ao DEPPE e ao professor Dr.Robério Fernandes Alves de
Referências
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