CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA DA PRECIPITAÇÃO BULK NOS TRECHOS SUPERIOR, MÉDIO E INFERIOR DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DOS SINOS

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ambiental

Autores

Alves, D.D. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Riegel, R.P. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Backes, E. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Peteffi, G.P. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Rocha-uriartt, L. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Bianchin, L. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Schmitt, J.L. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Quevedo, D.M. (UNIVERSIDADE FEEVALE) ; Osório, D.M.M. (UNIVERSIDADE FEEVALE)

Resumo

O objetivo deste estudo é avaliar a química da precipitação bulk nos trechos superior, médio e inferior da bacia hidrográfica do Rio dos Sinos (BHRS), em termos concentração de íons e pH. As amostras foram coletadas em um amostrador bulk, entre outubro de 2012 e fevereiro de 2014, nos municípios de Caraá, Taquara e Campo Bom. Os cátions Na+, Ca2+, Mg2+, K+ e NH4+ e ânions F-, Cl-, NO3- e SO42- foram analisados por cromatografia iônica. Campo Bom apresentou o maior percentual de amostras com pH inferior a 5,6, caracterizando chuva ácida. Em Caraá e Taquara, 14% das amostras apresentaram valores de pH inferiores a 5,60, enquanto que em Campo Bom, o percentual chegou a 36% do total de amostras.

Palavras chaves

Precipitação bulk; BHRS; Espécies iônicas

Introdução

A composição química da água da chuva resulta de interações complexas entre a dinâmica das nuvens e os processos microfísicos, bem como de uma série de reações químicas atmosféricas que ocorrem no interior e abaixo das nuvens. A acidez e concentração de espécies químicas na precipitação dependem de uma variedade de fatores, como perfis e distribuições de fontes de emissão de aerossóis atmosféricos, transporte local e de longo alcance de gases, transformações físicas e químicas durante os processos de formação das nuvens (HERRERA et al., 2009; KULSHRESTHA et al., 1999) e de eliminação de espécies químicas pela chuva (CELLE-JEANTON et al., 2009), bem como as condições meteorológicas (SETO e HARA, 2006; STRAYER et al., 2007). A precipitação bulk é definida como a soma de deposição seca e úmida que sedimenta durante o período de amostragem em um coletor localizado em um determinado ambiente. Na prática, essa quantidade pode ser afetada pela precipitação simultânea de partículas finas e gases. A deposição em um amostrador bulk é apenas uma parte da deposição total no ecossistema, pois devido à deposição turbulenta de gases e partículas finas, a deposição total em superfícies vegetativas geralmente excede a deposição na superfície do amostrador bulk (HERRERA et al., 2009). Geralmente, a precipitação bulk contém espécies naturais e antropogênicas (SAKIHAMA et al., 2008), muitas vezes enriquecidas com sal marinho (Na+ e Cl-), poeira do solo (Ca2+, Mg2+ e K+), constituintes ácidos resultantes da queima de combustíveis fósseis (SO42- e NO3-) e amônia (NH4+), resultantes do uso de fertilizantes na agricultura, queima de biomassa, pecuária, resíduos de animais e atividades naturais (LI et al., 2007; MIGLIAVACCA et al., 2005; RAO et al., 2016; XIAO et al., 2013). A emissão de poluentes, especialmente SO2 e NOx, juntamente com uma variedade de aerossóis atmosféricos, tem resultado em danos ambientais, que incluem a acidificação de solos, águas superficiais, águas subterrâneas, agressões à vegetação, corrosão de materiais de construção e diminuição de visibilidade (AYERS et al., 2002; FUJITA et al., 2000; SINGH et al., 2007). Devido aos graves problemas causados ao meio ambiente, a química da precipitação atmosférica tem sido considerada de importância mundial no monitoramento atmosférico (MOULI et al., 2005; VET et al., 2014) e é amplamente investigada em uma variedade de ambientes urbanos e rurais em todo o mundo (BISHT et al., 2016; PU et al., 2017; RAO et al., 2016; ROY et al., 2016; WU et al., 2016; XIAO, 2016). O objetivo deste estudo foi avaliar as características da precipitação bulk, em termos de composição iônica e pH nos trechos superior, médio e inferior da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (BHRS), a fim de obter dados sobre o comportamento químico da água da chuva na área de estudo e identificar diferenças nos perfis químicos de sua composição em três pontos de amostragem.

Material e métodos

As amostras de precipitação bulk foram coletadas em três locais da BHRS: Caraá, Taquara e Campo Bom. As coletas foram realizadas quinzenalmente, de outubro de 2012 a fevereiro de 2014. Durante este período, foram coletadas 90 amostras, das quais 66 (22 para cada ponto de coleta) foram classificadas como válidas pelos critérios de volume suficiente de amostra e coincidência entre períodos de coleta. As coletas foram realizadas utilizando-se um amostrador bulk fixado em um suporte de metal a 2 m acima do nível do solo. Na técnica de amostragem bulk, o coletor permanece aberto ao longo do período de coleta, ou seja, durante períodos chuvosos e secos, amostrando tanto a deposição úmida (precipitação) como a deposição seca (gases dispersos e partículas em suspensão). O amostrador bulk consistiu em um funil de 19 cm, acoplado a um frasco de coleta de 5 L, ambos de polietileno. O funil foi coberto com rede de nylon para evitar a contaminação da amostra por materiais grosseiros (folhas, galhos de árvores, insetos, etc.). Antes do uso, o equipamento foi enxaguado com água deionizada, com condutividade elétrica inferior a 2 μS cm-1 (MIGLIAVACCA et al., 2005). As amostras foram separadas em alíquotas filtradas e não filtradas. O procedimento de filtração foi realizado utilizando-se filtros de éster de celulose de tamanho de poro de 0,22 μm (Merck MilliporeTM), para remover partículas insolúveis. O pH foi determinado nas amostras não filtradas, utilizando-se um medidor de pH Marconi (PA200). As amostras filtradas foram preservadas com clorofórmio PA (Merk) e armazenadas em frascos de polietileno a 4 °C para posterior análise química de íons. Os íons foram determinados utilizando-se um cromatógrafo iônico (Dionex™ ICS-5000+ DC, Thermo Scientific) com detector de condutividade elétrica). Colunas Dionex IonPac™ CS12A e AS9-HC foram utilizadas para analisar os cátions (Na+, Ca2+, Mg2+, K+ e NH4+) e ânions (F-, Cl-, NO3- e SO42-), respectivamente. Os limites de detecção foram: 0,01 mg L-1 para Cl-; 0,05 mg L-1 para NO3-, SO42-, Na+, NH4+, K+ e Ca2+ e Mg2+. Todos os procedimentos analíticos foram realizados na Central Analítica da Universidade Feevale. O conjunto de dados foi submetido à técnica de imputação antes dos tratamentos estatísticos, onde os valores abaixo do limite de detecção do método (MDL) foram substituídos pela metade do MDL específico da variável (MDL/2) e os valores faltantes foram substituídos pelas medianas específicas da variável, ao invés de excluir toda a amostra (REFF et al., 2007). Análises estatísticas descritivas foram aplicadas ao conjunto de dados. A determinação das diferenças estatísticas entre as concentrações das espécies iônicas de cada ponto de amostragem foi obtida através do teste não paramétrico de Kruskal-Wallis, seguido do post hoc de Student-Newman-Keuls.

Resultado e discussão

A Figura 1 apresenta a distribuição de frequência (%) dos valores de pH. O valor de 5,6 foi empregado como valor de demarcação de chuva ácida (MIGLIAVACCA et al., 2012). Em relação ao pH das amostras de precipitação bulk, somente 14% das amostras caracterizaram-se como chuva ácida em Caraá e Taquara, e 36% em Campo Bom. Os valores médios de pH encontrados foram de 6,17 em Caraá, 6,09 em Taquara e 5,93 em Campo Bom, conforme mostra a Tabela 1(a). O menor valor médio de pH em Campo Bom justifica-se em função deste ponto de coleta estar localizado em uma área mais urbanizada, em comparação com Caraá e Taquara. Em Caraá e Taquara os valores de pH podem ser considerados levemente alcalinos se comparados com o valor de referência que caracteriza a chuva ácida (SEINFELD e PANDIS, 2006). Valores de pH alcalinos já foram identificados na Região do Guaíba (MIGLIAVACCA et al., 2005) em 16% das amostras, e na região Metropolitana de Porto Alegre em 22% das amostras (MIGLIAVACCA et al., 2012), localizados próximos à Bacia do Rio dos Sinos. O resumo estatístico das concentrações de íons e pH é apresentado na Tabela 1(a). Conforme observado, somente Cl- e Na+ apresentaram diferenças significativas, demonstrando que em Caraá as concentrações dessas espécies químicas são mais elevadas do que em Taquara e Campo Bom. Esse fato pode estar relacionado com a proximidade de Caraá do oceano, que emite sprays marinhos para a costa terrestre. A Tabela 1(b) apresenta a média dos VMP de Caraá, Taquara e Campo Bom, em comparação com estudos conduzidos em áreas próximas a BHRS e em áreas ao redor do mundo. A BHRS apresentou o menor valor de F-, comparada com as demais áreas. Cl- e Na+ apresentaram valores similares aos identificados em Tóquio, o que pode estar relacionado com a presença de sprays marinhos, dada a proximidade das áreas estudadas com a costa. NO3- e SO42+ apresentaram valores mais elevados na BHRS, quando comparados com os valores encontrados na Bacia do Guaíba e Região Metropolitana de Porto Alegre. Como estas espécies estão relacionadas com a queima de combustíveis fósseis, os dados identificados na BHRS, embora não sejam tão elevados quanto aos observados em centros urbanos (México, Japão) e em áreas rurais da China (exceto por SO42- no México e em Tóquio), merecem atenção, em função da crescente contribuição de NO3- e SO42+ decorrente do aumento da frota veicular brasileira. NH4+ apresentou o menor valor para a BHRS, em comparação com as demais áreas. K+, Mg2+ e Ca2+ normalmente representam emissões provenientes da ressuspensão do solo. Esses íons tendem a apresentar concentrações mais elevadas em áreas rurais, como pode ser observado em Shangdianzi e Linan, na China. Na BHRS, o valor de K+ foi duas vezes maior do que o maior valor identificado em Shangdianzi. O Mg2+ apresentou valor mais elevado somente em relação à Cidade do México e Ca2+ ficou abaixo somente das áreas de estudo localizadas na China.

Figura 1

Distribuição da frequência dos valores de pH

Tabela 1

(a) Concentrações das espécies iônicas (µeq L-1) e pH das amostras e (b) VMP (μeq L-1) da composição química da precipitação em áreas diveras

Conclusões

A composição química da precipitação bulk dos trechos superior, médio e inferior da BHRS foi determinada e comparada com outros estudos realizados próximos da BHRS e também em outras partes do mundo. Foram identificados eventos de chuva ácida em Caraá, Taquara e Campo Bom, no entanto, em média, o VMP da BHRS foi inferior somente ao da Bacia do Guaíba, mas apresentou-se levemente alcalino, comparado com os demais locais, que apresentaram valores de pH oscilando entre 4,25 e 5,08, característicos de chuva ácida. Os íons que apresentaram concentrações mais elevadas foram Cl-, Ca2+, Na+, SO42- e K+, sendo que as concentração medianas de Na+ e Cl- encontrada em Caraá diferem-se das encontradas em Taquara e Campo Bom, o que indica a presença de sprays marinhos, devido à proximidade de Caraá da região costeira. Já para os Ca2+, SO42- e K+, não foram observadas diferenças significativas entre os locais de coleta, indicando a presença de fontes de emissão de origem antrópica e natural, como a ressuspensão do solo para Ca2+ e K+ e emissões proveniente da queima de combustíveis fósseis para o SO42-. A quantificação de espécies iônicas na água de chuva auxilia na compreensão dos processos de remoção de poluentes da atmosfera e na elucidação das “entradas” destas espécies nos processos da química da atmosfera, contribuindo, assim, para a identificação de fontes antrópica e/ou naturais de poluentes atmosféricos.

Agradecimentos

Ao CNPq, pelo auxílio na bolsa de iniciação cientifica PIBIT e à Universidade Feevale, pelos recursos financeiros para a execução do projeto de pesquisa.

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