COMPARAÇÃO DE COAGULANTES NATURAIS EXTRAÍDOS DO QUIABO ROXO E VERDE PARA O TRATAMENTO DE EFLUENTE TÊXTIL

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ambiental

Autores

Freitas, T.K.F.S. (UEM) ; de Souza, M.T.F. (UEM) ; Ambrosio, E. (UEM) ; de Souza, R.P. (UTFPR - DOIS VIZINHOS) ; Geraldino, H.C.L. (UEM) ; Almeida, C.A. (UEM) ; Garcia, J.C. (UEM)

Resumo

A técnica de coagulação/floculação (CF) seguida pela sedimentação é utilizada mundialmente no processo de tratamento de águas residuais. O presente trabalho teve como objetivo investigar o desempenho da atividade coagulante de dois subgrupos (roxo e verde) do quiabo da espécie A.esculentus no processo de CF. A eficiência da CF foi avaliada na remoção de demanda química de oxigênio (DQO), turbidez, cor e absorvância em 254 nm. Através da adição da mucilagem do quiabo verde na CF foi possível reduzir 72,5% da dose de coagulante inorgânico e com a adição da mucilagem do quiabo roxo foi possível reduzir 75,0%. Através da melhoria do processo foi possível aumentar a remoção de DQO sem alterar a máxima eficiência de remoção de turbidez e cor, agregando valores econômicos e s

Palavras chaves

coagulação/floculação; biopolímeros; Abelmoschus esculentus

Introdução

A água é essencial à vida, sua qualidade e quantidade são responsáveis pelo bem estar da espécie humana. Esta é encontrada na forma de água doce (2,6%) e salgada (97,4%). A água doce apresentada nas formas de geleiras e água de subsolo com mais de 800 m de profundidade. A fração disponível ao homem é pequena, cerca de 0,3%, dividida em água de rios e lagos e subterrâneas. Do total de água disponível para o consumo mundial, cerca de 70% são utilizados na agricultura, 22% na indústria, restando 8% para uso doméstico (LENZI et al., 2012). A indústria têxtil destaca-se por ser uma das indústrias que consome elevadas quantidades de água e produtos químicos, tendo como consequência a produção elevada de rejeitos líquidos. O impacto causado pelos efluentes têxteis no meio aquático tem sido uma grande preocupação ambiental, pois eles contêm alta concentração de sais, sólidos suspensos, cor, demanda química de oxigênio e compostos tóxicos ao homem e ao meio ambiente. Sendo que muitos corantes têxteis ou seus subprodutos são carcinogênicos e/ou mutagênicos. Além disso, o descarte de tais efluentes coloridos para o meio ambiente é uma fonte de poluição estética, causando perturbações na vida aquática (BLANCO et al., 2014; GARCIA et al., 2007; PINHEIRO et al., 2004; SENTHILKUMAR et al., 2011). A coagulação/floculação é um dos processos mais utilizados no tratamento de efluentes em escala industrial. Este processo é resultante da neutralização das cargas dos colóides carregados negativamente por produtos de hidrólise catiônicos, que permitem a agregação das partículas coloidais pela atração das forças de Van der Waals produzindo microflocos. A eficiência do processo depende do agente coagulante usado, a dosagem, o pH da solução, a concentração e a natureza do composto orgânico presente no efluente. Os coagulantes adicionados no efluente promovem a aglomeração das partículas pela redução das cargas da superfície de partículas eletrostáticas (SHER et al., 2013). Os sais de alumínio e ferro são os coagulantes mais utilizados no tratamento de águas e efluentes. Os coagulantes mais utilizados são o sulfato de alumínio e o cloreto de polialumínio devido ao seu baixo custo, facilidade de uso, manuseio, armazenamento e misturas (SHER et al., 2013). No entanto, as lamas obtidas a partir do tratamento de sais de alumínio e a sua eliminação, gera o acumulo de alumínio no ambiente causando impactos. Além disso, alguns estudos têm relatado que o sulfato de alumínio residual e policloreto de alumínio podem induzir a doença de Alzheimer (MUTHURAMAN e SASIKALA, 2014). A possível solução para esses problemas pode ser o desenvolvimento de novos coagulantes extraídos a partir de fontes naturais renováveis, tais como os microrganismos, animais ou plantas. Estes coagulantes não apresentam riscos à saúde humana e são biodegradáveis. Os biopolímeros são de grande interesse, uma vez que são produtos naturais de baixo custo, caracterizados por seu comportamento ambientalmente correto e, geralmente, tem grande número de cargas de superfície que aumentam a eficiência do processo de coagulação. Estas vantagens são especialmente aumentadas se a planta da qual é extraído for de origem local, pois, minimizaria os custos do processo de tratamento visto que podem ser colhidos e processados localmente (ABIDIN et al., 2013; ANTOV et al., 2012; SANGHI et al., 2006). Recentemente, tem surgido o interesse por vários pesquisadores em coagulantes/floculantes naturais como, o cactos Opuntia fícus (de SOUZA et al., 2014), Cocos nucifera (FATOMBI et al., 2013), sementes de M.oleifera, S. potatorum, P. vulgaris (MUTHURAMAN e SASIKALA, 2014), Enteromorpha (ZHAO et al., 2014), sementes de Jatropha curcas (ABIDIN et al., 2013), entre outros. Os biopolímeros são uma nova abordagem eficaz e competitiva. Em particular, o quiabo (A. esculentus) é um polímero natural de baixo custo promissor ambientalmente para o tratamento de efluentes têxteis por coagulação/floculação. Dessa forma, este trabalho teve objetivo comparar a eficiência de duas classificações de quiabo (roxo e verde) da espécie A.esculentus no tratamento de efluente têxtil. O quiabo roxo foi utilizado por ser uma espécie exótica e o quiabo verde por ser facilmente cultivado em qualquer região do Brasil.

Material e métodos

Extração da mucilagem do quiabo roxo e verde As vagens do quiabo verde foram obtidas em supermercados do noroeste do Estado do Paraná, Brasil. As vagens do quiabo roxo foram obtidas em uma chácara localizada no oeste do Estado do Paraná, Brasil. Em seguida foram lavadas em água corrente para limpeza. As vagens do quiabo foram cortadas ao meio e removidas as sementes e fibras, o interior da vagem foi raspado manualmente para remoção da mucilagem. O preparo da mucilagem foi realizada com base na metodologia proposta por Okuda et al. (1999) em que 1,0 g de mucilagem foi adicionada a 100 mL de H2O. A suspensão foi mantida sob agitação durante 1,0 h em agitador magnético. Caracterização da mucilagem O espectro de FT-IR foi obtido utilizando um espectrômetro de infravermelho com transformada de Fourier Bruker modelo Vertex 70V, com intervalo variando entre 4000 e 400 cm-1, com 64 scans de acumulação e resolução de 4 cm-1. As amostras foram pulverizadas antes da prensagem em pastilhas de brometo de potássio (KBr, Merck). O espectro de RMN 13C/CPMAS foi obtido utilizando um espectrômetro de RMN Varian modelo Mercury plus 300, com sonda de sólidos CP/MAS 7 mm. A frequência de ressonância do núcleo 1H foi 300,06 MHz e de 13C foi 75,458 MHz. Os principais parâmetros de análise foram: tempo de espera para reciclagem de 1 s, o tempo de contato de 1 ms e 3000 repetições. As amostras secas e trituradas foram empacotadas em rotor de nitreto de silício com tampa kel-F de 7 mm. A velocidade de giro do rotor foi de 4,5 KHz e foi utilizado como referência externa o espectro do hexametilbenzeno (HMB), com sinal metílico em 17,3 ppm. Coleta do Efluente Têxtil (ET) As amostras de ET foram coletadas em uma Lavanderia Industrial de jeans, noroeste do Estado do Paraná, Brasil, onde processos de lavagem e acabamento final são realizados. O efluente foi coletado na lagoa de estabilização após passar por peneira estática para retirada sólidos grosseiros. Caracterização do Efluente Têxtil A caracterização foi realizada para os seguintes parâmetros: cor, demanda bioquímica de oxigenio (DBO5,20), DQO, pH, temperatura e turbidez segundo as metodologias descritas em APHA (1999) e espectrofotometria UV-Vis. Processo de Coagulação/floculação (CF) Os ensaios de CF foram realizados no aparelho de Jar Test microcontrolado modelo Milan - JT 203/6. Em 250,0 mL de ET, era adicionado o coagulante inorgânico e agitado rapidamente (120 rpm) por 30 s. Em seguida, era adicionado o coagulante natural e agitado lentamente (20 rpm) por 15 min. Após 60 min de estabilização o sobrenadante de cada jarro foi coletado.

Resultado e discussão

Caracterização dos coagulantes naturais Os principais grupos funcionais característicos presentes na mucilagem foram identificados utilizando a técnica de FTIR e RMN 13C/CPMAS (Figura 01). O espectro de FTIR da mucilagem do quiabo roxo e verde apresenta bandas de absorção de grupos característicos de polissacarídeos. Tais componentes são compostos principalmente de alcenos e grupos aromáticos e oxigenados contendo vários grupos funcionais (ácido carboxílico e álcool). A banda de absorção larga na região de 3600-3200 cm-1, com um pico centrado em 3400 cm-1 é característica ao estiramento vibracional e ligação hidrogênio do grupo OH. Os picos na região de 2926 e 2916 cm-1 são característicos ao estiramento assimétrico C-H associado com anéis aromáticos (ROSA et al., 2009; SILVERSTEIN et al., 2005). Os picos em 1630 e 1620 cm-1 pertencem ao estiramento vibracional grupo carbonila (C=O) do ácido carboxílico dos polissacarídeos. Os picos de absorção em 1377, 1396 e 1320 cm-1 indicam estiramento vibracional dos grupos CH e CO do anel aromático em polissacarídeos. A banda em 1240 cm-1 ao estiramento C-O. A absorção dos picos em 1160 e 1150 cm-1 é devido a deformação assimétrica da banda C-O-C. O pico de absorção forte em 1050 e 1060 cm-1 é atribuída ao estiramento vibracional do CO e OH secundários que pertence aos polissacarídeos na celulose. Além disso o pico de absorção em 584 e 594 cm-1 corresponde ao estiramento C-OH (ROSA et al., 2009; SILVERSTEIN et al., 2005). O estudo do RMN 13C/CPMAS da mucilagem do quiabo apresentou sinais típicos de mono, di e polissacarídeos. Foram detectados sinais na faixa de 18- 35 ppm correspondentes a RCH3 (18 ppm), RCH2 (22 ppm) e RCH (33 ppm), sinais largos na região de 73 ppm correspondentes a CH-O, na região de 105 ppm correspondentes a C-O-C e na região de 175 ppm de carbonila (possivelmente proveniente do ácido carboxílico), todos estes sinais indicam a presença de polissacarídeos. Esses resultados nos mostram que a identificação dos compostos básicos da mucilagem é muito importante, tendo em vista sua aplicação como polímero natural, que devido as suas características estruturais, promove uma maior adsorção das partículas coloidais (BATHISTA et al., 2001; 2004). Tratamento do ELJ utilizando coagulantes naturais Os resultados das análises físico-químicas realizadas no efluente de lavanderia de jeans (ELJ) antes e após a utilização dos coagulantes naturais extraídos do quiabo roxo e verde na remoção de turbidez, DQO, cor e ABS254nm e os parâmetros da legislação brasileira ambiental para descarte dos mesmos estão apresentados na Figura 02. O ELJ in natura apresentou pH neutro, elevada quantidade de matéria orgânica expressa por altas concentrações de DBO5,20 e DQO, elevada cor, turbidez moderada e oxigênio dissolvido igual a zero. A introdução da matéria orgânica em um corpo hídrico causa o decréscimo de oxigênio dissolvido que é o principal efeito ecológico da poluição orgânica. Os poluentes presentes no efluente são provenientes dos produtos químicos utilizados no processo de acabamento e lavagens do jeans (detergentes, amaciantes, oxidantes, ácidos, corantes, bases entre outros). Considerando as condições e padrões de lançamento de efluentes exigidos pela Resolução CONAMA nº 430/2011 e pela Resolução CEMA nº 70/2009, o efluente LJ não atende aos critérios de cor, , DQO, DBO5,20OD e turbidez sendo necessário o tratamento deste efluente antes de sua emissão no corpo hídrico. Dentre os limites padrões de lançamento de efluentes de LJ em corpos d’água, o pH é de extrema importância, pois a biota aquática é muito sensível a extremos de pH. Os organismos dessa biota são incapazes de sobreviver em pH nos quais não estão adaptados. Desta maneira ELJ tratado com o cloreto férrico não está apto a ser lançado no rio sem a correção do pH. Águas ácidas não são muito comuns, exceto nos casos de poluição grave, neste tratamento, os íons metálicos hidratados, em especial o Fe3+, tendem a perder íons H+ das moléculas de água ligadas a eles em solução, sendo assim atuando como ácidos de Bronsted-Lowry, sendo o causador da acidez deste efluente (MANAHAN, 2013). Sem um nível apreciável de OD, no caso de rios de classe 2 que seria de 5,0 mg L-1, muitos tipos de organismos aquáticos não conseguem existir na água. Muitas ocorrências de mortalidade de peixes se devem não à toxicidade direta dos poluentes, mas à deficiência de oxigênio devido ao seu consumo na biodegradação destes poluentes (MANAHAN, 2013). Pode-se notar que com a melhoria na eficiência de remoção da DBO5,20 e DQO aumentaram-se os níveis de OD nestes efluentes tratados, é válido ressaltar que a concentração de OD no efluente in natura é zero, sendo destacado que a adição de coagulantes naturais aumentaram significativamente os níveis de OD (3,98 e 3,78), porém nenhum destes tratamentos está apto a ser lançado no corpo receptor. Uma possível solução seria a construção de um tanque de aeração ao final do tratamento o que tornaria o custo de operação alto, ou utilizar a calha Parshall, que teria a função de atuar como misturador rápido, facilitando a dispersão dos coagulantes na água durante o processo de coagulação e fornecer OD ao efluente a ser tratado, além da sua principal função que é medir a vazão de entrada e saída de água (FM, 2012). Ou seja, um ressalto hidráulico de grande turbulência, provocado na saída da calha Parshall, promove condições adequadas para a dispersão homogenia e rápida do coagulante e a fornecimento de oxigênio dissolvido. Devido a grande variedade de compostos orgânicos neste efluente é impraticável uma identificação individual de todos eles, portanto é necessário que se caracterize quantitativamente a matéria orgânica (MO). Esta MO pode ser quantificada por métodos indiretos, DBO5,20 e DQO, empregando oxigênio na oxidação desta MO. Segundo os parâmetros DBO5,20 e DQO para o efluente tratado com cloreto férrico, este efluente está inadequado para a sua emissão em um corpo receptor, pois estes valores estão acima do permitido por lei. O que pode inferir é que mesmo com o tratamento com coagulante inorgânico é que estes valores acima de DBO 5,20 e DQO é devido a presença de substâncias resistentes a degradação biológica, principalmente, as moléculas de estruturas químicas complexas e alta massa molecular, como os corantes. Com a adição de coagulantes naturais extraídos a partir do quiabo roxo e verde, com exceção do OD, todos os parâmetros físico-químicos; pH, turbidez, DQO, DBO5,20, cor e temperatura estão dentro dos limites estabelecidos na legislação ambiental brasileira, podendo assim se tornarem uma tecnologia ambientalmente adequada e economicamente viável para o tratamento do ELJ, compatível com as condições estabelecidas na legislação do respectivo corpo receptor.

Figura 01

FTIR-ATR da mucilagem do quiabo (a) roxo e (b) verde. RMN 13C/CPMAS da mucilagem do quiabo (c) roxo e (d) verde.

Figura 02

Parâmetros do ELJ antes e após o uso de coagulante natural extraído do quiabo roxo e verde e limites ambientais determinados na legislação brasileira

Conclusões

A caracterização pelo FT-IR e RMN 13C/CPMAS da mucilagem do quiabo apresentou bandas de absorção e sinais típicos de polissacarídeos, indicando que o mecanismo em “ponte” entre o ELJ e a mucilagem acontece devido à presença de grupos hidroxilas e carbonilas. Com a adição do coagulante natural extraído do quiabo verde foi possível aumentar a remoção de DQO em 22,51% e 17,22% com a adição da mucilagem do quiabo roxo em relação ao coagulante inorgânico (Fe3+, sem alterar a máxima eficiência de remoção de turbidez e cor agregando valores econômicos e sustentáveis. Os biopolímeros extraídos do quiabo roxo e verde mostraram potencial coagulante promissor por ser uma técnica “verde”, com baixo custo e segura. Os polímeros naturais não apresentam riscos à saúde humana, são baratos, de fontes renováveis, não são tóxicos, são altamente biodegradáveis e estão totalmente disponíveis para o tratamento de ELJ de maneira ecológica e eficiente.

Agradecimentos

UEM, GPDMA, CAPES, CNPq, Fundação Araucária

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