Avaliação da presença de microcontaminantes orgânicos de preocupação emergente nas águas superficiais da Bacia do Rio Paraopeba em Minas Gerais utilizando cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (GC-MS)
ISBN 978-85-85905-21-7
Área
Ambiental
Autores
Corrêa, J.M.M. (UFOP) ; Machado, C.F. (UFOP) ; Afonso, R.J.C.F. (UFOP)
Resumo
A significativa diminuição no volume dos recursos hídricos e a constante poluição dos corpos d'águas por poluentes orgânicos têm despertado a atenção para a necessidade de estudos voltados ao conhecimento das substâncias encontradas no meio ambiente e às alternativas de tratamento e recuperação dos sistemas afetados. Desse modo, esta pesquisa tem como objetivo avaliar a presença de ibuprofeno, 4-octilfenol, 4-nonilfenol, genfibrozila, bisfenol A, estradiol e etinilestradiol nas águas superficiais da Bacia do Rio Paraopeba-MG. Para a determinação dos 7 microcontaminantes foi realizado o método extração em fase sólida (SPE) adaptado do Método 1694 US-EPA e os extratos foram analisados por cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (GC-MS).
Palavras chaves
Microcontaminantes ; Bacia do Rio Paraopeba; GC-MS
Introdução
A presença de microcontaminantes nos meios aquáticos têm provocado alterações nesses ecossistemas e em sua biodiversidade. (AMÉRICO et al., 2012; BAQUERO; MARÍNEZ; CANTÓN, 2008; FARRÉ; KANTIANI; BARCELÓ, 2008; BILA; DEZOTTI, 2007). Especialistas de várias áreas do conhecimento científico têm dirigido a atenção para os sérios riscos à saúde humana e ao ciclo de vida dos ecossistemas decorrentes do descarte indevido de poluentes através de efluentes industriais, atividades agropecuárias, unidades hospitalares, esgoto doméstico e, até mesmo, de lançamento direto em redes fluviais, o que acarreta a contaminação de solos, sedimentos, águas subterrâneas e superficiais etc. A Bacia do Rio Paraopeba em Minas Gerais abastece 48 municípios, com uma população de mais de 2,3 milhões de habitantes (IBGE, 2010), e possui ao longo de seu curso quatro estações para abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte, o que corresponde a cerca de 53% dos residentes na RMBH, conforme informações do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba (CBH, 2011). Embora seja uma bacia de fundamental importância social, ambiental e econômica em âmbito regional, não foram identificados no decorrer do levantamento bibliográfico estudos sobre a presença de microcontaminantes orgânicos de preocupação emergente em suas águas superficiais. Um dos procedimentos mais utilizados no preparo de amostras de matrizes complexas para isolar e concentrar o analito de interesse é a extração em fase sólida (SPE). Segundo o Método EPA 1694 USA, indica-se para SPE o cartucho HLB Oasis® para extração e concentração de fármacos e produtos de higiene pessoal, visto que adsorve analitos lipofílicos e hidrofílicos e, na presente pesquisa foi utilizado um cartucho similar, o Strata X® (Phenomenex). Para realizar a extração simultânea das amostras foi utilizado um sistema Manifold desenvolvido por Sanson et al. (2014). A seleção das estações de coleta foi realizada pela análise exploratória por meio da análise estatística multivariada, Análise de Componentes Principais (PCA). Foram selecionadas 15 estações para amostragem, as quais são indicadas pela sigla BP com seu respectivo número de identificação. As amostras foram fornecidas pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM) em quatro períodos: duas coletas em período chuvoso, em novembro de 2015, referente à primeira campanha (C01), e em fevereiro de 2016, referente à segunda campanha (C02), e duas coletas em período de estiagem, em abril de 2016 (C03) e em agosto de 2016 (C04). Sendo assim, este trabalho tem como objetivo avaliar a qualidade das águas através do monitoramento de microcontaminantes orgânicos de preocupação emergente nas águas superficiais da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba-MG. Os 7 compostos monitorados foram: ibuprofeno, 4-octilfenol, 4-nonilfenol, genfibrozila, bisfenol A, estradiol e etinilestradiol.
Material e métodos
As amostras foram coletas em frasco âmbar de 1L com 10 mL de metanol (J. T. Backer®) e acondicionadas à - 4°C até o momento do preparo das amostras. Os procedimentos para a determinação de microcontaminantes envolveram a filtração seguida de concentração e limpeza das amostras por extração em fase sólida (SPE). O método utilizado foi adaptado da metodologia descrita pelo Método 1694 US-EPA. Todos os solventes utilizados na pesquisa foram de grau HPLC. O preparo das amostras envolveu 4 etapas: 1. Filtração sequencial: as amostras foram filtradas em um sistema de filtração a vácuo em filtros de diferentes tamanhos para a abertura dos poros, primeira filtração foi com papel de filtro faixa branca (24 μm), em seguida o de faixa azul (8 μm), ambos da J.Prolab®, e por último foi utilizado o filtro de fibra de vidro (1,2 μm) da Sartorius®. 2. Ajuste de pH: 1L de amostra filtrada teve o pH ajustado para 2 ± 0,2 com solução de HCl (Proquimios®) 50 % v/v utilizando um medidor de pH portátil da digital (Tecnal®). 3. Extração em fase sólida (SPE): foi feita no cartucho Strata X® (Phenomenex) 500 mg/6 mL . Os cartuchos foram condicionados com 5 mL de acetonitrila (J. T. Backer®), 5 mL de metanol e por último 5 mL de água ultrapura Milli-Q® e a eluição com 5 mL de metanol e 5 mL de acetonitrila sob fluxo aproximado de 5 mL/min. 100 µL de cada extrato foram secos. Para extração em série foi utilizado um sistema manifold adaptado. 4. Derivatização: 100 µL de cada extrato das amostras, previamente secos com fluxo de N2, foram ressuspendidos com 75 µL de BSTFA contendo 1% trimetilclorosilano (TCMS) que é um catalisador para reação e 25 µL de solução de 4-nonilfenol deuterado (padrão interno) em piridina a 600ppb. A derivatização ocorre em temperatura controlada de 80°C durante 30 minutos. A análise foi feita por cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massa (GC-MS) em um GCMS-QP2010 Plus, Shimadzu. O método desenvolvido avaliou os seguintes microcontaminantes: ibuprofeno, 4-octilfenol, 4-nonilfenol, genfibrozila, bisfenol A, estradiol, etinilestradiol e o 4-nonilfenol deuterado foi utilizado como padrão interno.
Resultado e discussão
Para seleção dos pontos de amostragem foram utilizados os dados físico-
químicos e biológicos fornecidos nos relatórios anuais do Instituto Mineiro
de Gestão das Águas (IGAM), no período de 2008 a 2014, das 33 estações de
monitoramento distribuídas ao longo da bacia hidrográfica. A análise de PCA
foi realizada no Software Minitab versão 1.7 e os gráficos das distribuições
gerados pelo programa estão representados na Figura 1.
Com os resultados obtidos pela análise exploratória pela PCA foi possível
elaborar um diagnóstico das estações de tratamento e realizar uma amostragem
representativa para a presente pesquisa e, assim, os pontos de coleta foram
reduzidos de 33 para 15, sendo que cada estação é representada pela sigla BP
seguida do seu número de identificação.
Para as análises por GC-MS foram construídas 3 curvas analíticas com
calibração interna utilizando 4-nonilfenol deuterado como padrão interno
(PI). As curvas analíticas foram construídas com 7 níveis de concentração:
5, 10, 15, 20, 50, 75 e 100 ppb. Para todos os compostos estudados as
curvas obtidas foram quadráticas com coeficiente de correlação
(R2) superior a 0,96 e o valor do coeficiente de variação (CV%)
para cada ponto das triplicatas das curvas foram inferiores a 15%. Os
limites de detecção e quantificação do método para os compostos estão
apresentados na Tabela 1.
Dos compostos analisados o bisfenol A foi o único que apareceu em todas as
amostras, a concentração mínima encontrada foi de 28,14 ng/L (BP096/C01) e a
concentração máxima de 6,21 µg/L (BP081/CP01). O ibuprofeno foi detectado em
70% das amostras sendo a menor concentração de 9,31 ng/L (BP036/C04) e a
maior de 1,83 µg/L (BP073/CP01). Em apenas 10% das amostras o 4-octilfenol
foi detectado variando de 7,18 ng/L (BP69/C03) a 170,58 ng/L (BP079/C04). Já
o 4-nonilfenol apareceu em 35% das amostras, sendo 18,96 ng/L (BP98/CP03) a
concentração mínima e 166,96 ng/L (BP075/CP04) a máxima. Outro composto que
apareceu em 70% das amostras foi a genfibrozila e a variação na concentração
foi de 1,30 ng/L (BP022/CP02) a 289,20 ng/L (BP071/CP04). Os hormônios
estradiol e etinilestradiol foram encontrados em 50% e 15% das amostras,
respectivamente. A concentração mínima para estradiol foi de 6,40 ng/L
(BP022/CP03) e para etinilestradiol de 22,56 ng/L (CP081/CP04), enquanto que
as concentrações máximas detectadas foram de 204,18 ng/L (BP073/CP04) para
estradiol e 160,87 ng/L (BP084/CP04) para etinilestradiol.
A quarta campanha do período de coleta de agosto de 2016 foi a que
apresentou, em suas estações de coleta, a maior frequência dos
microcontaminantes orgânicos.
a) Gráfico de dispersão para duas componentes principais. b) Gráfico bidimensional da análise dos dados das 33 estações da Bacia do Rio Paraopeba.
Conclusões
Todos os 7 microcontaminantes orgânicos monitorados foram detectados e em expressivas concentrações. As maiores ocorrências foram para os compostos bisfenol A que apareceu em 100% das amostras analisadas seguido pelo ibuprofeno e pela genfibrozila que apareceram em 70% das amostras distribuídas pelas 4 campanhas. As campanhas 3 e 4, em que amostragem foi realizada em período de estiagem, apresentaram a maior frequência dos compostos nas amostras e as campanhas 1 e 2 exibiram menores frequências. As altas concentrações encontradas se devem aos descartes oriundos de efluentes industriais, de atividades agropecuárias e de esgoto doméstico de ocupações urbanas e rurais ao longo da Bacia do Rio Paraopeba. Dos 7 compostos estudados 5 com os valores mais altos de concentração foram detectados nas amostras da quarta campanha (CP04), desta maneira, foi considerada a campanha com a pior qualidade das águas superficiais da bacia hidrográfica e a campanha 2 com a menor frequência. Tais resultados apontam para os potenciais riscos à saúde humana, às biotas aquáticas e à qualidade dos solos, visto que as águas pesquisadas são amplamente usadas no abastecimento domiciliar, produção industrial, sistema de irrigação, horticultura etc. Portanto, para se assegurar a proteção do meio ambiente e a qualidade das águas, mostram-se indispensáveis métodos mais precisos de tratamento, recuperação e remoção de microcontaminantes orgânicos, assim como novos avanços na legislação ambiental e na gestão dos recursos hídricos em âmbito nacional.
Agradecimentos
FAPEMIG, CAPES, CNPq, FINEP, UFOP e IGAM.
Referências
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