Reator de Leito Móvel MBBR-APG no Tratamento de Efluente de Celulose Kraft

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ambiental

Autores

Peitz, C. (UTFPR) ; Xavier, C. (UTFPR)

Resumo

O efluente gerado na indústria de celulose tem como características altas concentrações de demanda química (DQO) e biológica de oxigênio (DBO5), cor e toxicidade. O presente trabalho visa apresentar o tratamento deste efluente por reator MBBR-APG, assim como avaliar a ecotoxicidade aguda. O efluente foi caracterizado segundo os parâmetros: DBO5, DQO, cor e compostos fenólicos totais (CFT) nas cargas de 0,6 e 9,0g L-1 d-1, a ecotoxicidade aguda foi realizada nas mesmas cargas seguindo a NBR 12713. A remoção de DQO foi superior a 40%, a remoção de DBO5), foi superior a 80%. A remoção de cor e CFT foi próxima a 40%, no caso da cor possivelmente devido a sua adsorção no meio suporte APG. Após o tratamento ecotoxicidade foi reduzida metade.

Palavras chaves

MBBR-APG; Efluente Kraft; Ecotoxicidade

Introdução

O Brasil é o quarto maior produtor de celulose no mundo, atrás de Estados Unidos, China e Canadá. A produção brasileira de celulose alcançou o patamar de 18,77 milhões de toneladas de celulose em 2016, valor este 7,5 % superior ao ano anterior. As exportações de celulose tiveram um incremento de mais de 10% somando cerca de 12,9 milhões de toneladas (IBÁ, 2017). Dentre as características das indústrias de celulose tem-se o alto consumo de água em seus processos, onde são consumidos entre 30 a 60 m3 de água por tonelada de celulose produzida, o que, consequentemente, acaba por gerar grandes volumes de efluentes (BACHMANN, 2009; BUYUKKAMACI e KOKEN, 2010). Em geral, esse efluente é abundante em matéria orgânica oriunda das altas concentrações de demanda química de oxigênio (DQO) e demanda biológica de oxigênio (DBO5), além de apresentar alto teor de sólidos suspensos (SS), ácidos resínicos, lignina, cor e ecotoxicidade (KREETACHAT et al., 2007; ARAÚJO; TAVARES e COSSICH, 2010). Para o tratamento destes efluentes, diversas técnicas têm sido aplicadas com o objetivo de remover matéria orgânica, cor e ecotoxicidade. Dentre estas técnicas, os tratamentos biológicos com sistemas de aeração, como lodos ativados e reatores de leito móvel (MBBR), têm se destacado, sendo eficientes para as remoções de matéria orgânica e ecotoxicidade, mas não para cor aparente (XAVIER et al., 2011; FURLEY; LOMBARDI; GOMES, 2015; KAMALI e KHODAPARAST, 2015). Mesmo após o tratamento do efluente, ainda é necessário o monitoramento deste com relação aos seus efeitos no meio ambiente, para isso tem-se os testes ecotoxicológicos. Estes testes são ferramentas úteis para avaliar a toxicidade dos efluentes, uma vez que somente as análises físico- químicas tradicionalmente realizadas (DQO, DBO5, entre outras) não são capazes de distinguir, entre as substâncias, seus efeitos sobre os ecossistemas dos corpos receptores (RONCO; BÁEZ; GRANADOS, 2004; MENDONÇA et al., 2009). Diante do anteriormente exposto, este trabalho visa apresentar um sistema de tratamento biológico, tratando efluente de celulose Kraft por reator MBBR com meio suporte esponjoso APG (Aquaporousgel®), assim como avaliar os efeitos ecotoxicológicos agudos através do organismo D. magna.

Material e métodos

O tratamento biológico ocorreu em 2 estágios, referentes às COV’s (Carga Orgânica Volumétrica) aplicadas de 0,6 e 9,0 gDQO L-1 d-1, durante 48 dias, em reator MBBR de fluxo contínuo, com 1L de capacidade e meios suportes APG (Aquaporousgel®), com volume de 8 cm3 cada, para crescimento de biomassa microbiana com preenchimento de 10% do volume do reator. O efluente utilizado foi gentilmente cedido por uma indústria de celulose Kraft da região de Curitiba, duas coletas foram realizadas no período de um mês, tendo sido obtidas antes do tratamento biológico. Após a coleta, estas foram transportadas, armazenadas ao abrigo da luz e mantidas a 4°C em galões de 25 L. Os meios suportes APG foram gentilmente fornecidos pela Nisshinbo Chemical Inc.. Tanto o Afluente (efluente bruto) e Efluente (efluente tratado por reator com meio suporte esponjoso MBBR-APG) foram caracterizados em relação aos parâmetros: DQO (Demanda Química de Oxigênio), DBO5 (Demanda Biológica de Oxigênio) (APHA, 2005), compostos fenólicos totais (CFT) (FIELD e LETTINGA, 1987; SIERRA-ALVAREZ et al., 1990), cor aparente (SIERRA-ALVAREZ et al., 1990) e sólidos (APHA, 2005) para avaliação de desempenho e remoções desses parâmetros durante o tratamento. As análises de DQO foram realizadas através do método de refluxo fechado colorimétrico e leitura da absorbância em espectrofotômetro em comprimento de onda de 600 nm, adaptado do método 5220B (APHA, 2005). As análises de DBO5 foram realizadas por método de incubação de 5 (cinco) dias a 20ºC, por diluições das amostras do Afluente e Efluente filtrados em membrana 0,45 µm referente ao método 5210 (APHA, 2005). Os compostos fenólicos totais (CFT) foram determinados espectrofotometricamente, medidos em 215 nm, em cubeta de quartzo de 1x1 cm e quantificados através de curva analítica baseada na concentração de fenol (FIELD e LETTINGA, 1987; SIERRA- ALVAREZ et al., 1990).A cor foi avaliada por método de cor aparente. Sendo determinada espectrofotometricamente, medida a 440 nm, pH 9,0, em cubeta de quartzo de 1x1 cm (SIERRA-ALVAREZ et al., 1990). As análises de sólidos foram analisadas por adequação do método de APHA (2005) no qual amostras do meio suporte APG, que continham os sólidos aderidos, foram submetidos a banho de ultrassom no volume de 100 mL em água deionizada por de 1 (uma) hora para assim remover os sólidos aderidos ao meio suporte, sendo sequencialmente conduzido conforme a seção 2540E. A biomassa em suspensão também foi conduzida conforme a metodologia na seção 2540E descrito pela APHA (2005). Sendo que todas as determinações foram realizadas em triplicata e feitas ao final de cada carga orgânica (COV) aplicada. Para os testes de ecotoxicidade aguda foram utilizados amostras do Afluente e Efluente referentes às cargas avaliadas de acordo com a norma NBR 12713 de Ecotoxicologia Aquática com o organismo D. magna (ABNT, 2009).

Resultado e discussão

Na Figura 1 são apresentadas as remoções médias do tratamento do efluente Kraft em reator MBBR-APG (reator de leito móvel com meio suporte esponjoso APG), conforme as cargas aplicadas. Nela se observa que o sistema MBBR-APG mostrou eficiência média de 43% de remoção de DQO na carga mais baixa, decaindo para pouco mais de 42% na COV 9,0 gDQO L-1 d-1, esses valores são superiores, cerca de 28%, ao medido por Vanzetto (2012) com MBBR-AMB (reator MBBR com meio suporte AMB) para a carga de 9,0 gDQO L-1 d-1. Com relação à remoção de DBO5 foi verificado o decréscimo de quase 10% na remoção média, da carga 0,6 gDQO L-1 d-1 para a COV 9,0 gDQO L-1 d-1, esse decréscimo foi superior ao MBBR-AMB (VANZETTO, 2012). Um indicativo na redução nos valores de DBO5 pode estar relacionado com a razão DBO5/DQO do Afluente, mostrada na Tabela 1, em que para a carga 0,6 gDQO L-1d-1 a razão foi, em média, de 0,34, indicando um Afluente mais propício ao tratamento biológico, já para a carga mais alta a razão foi de 0,20, o que indica maior recalcitrância, ou seja, maior presença de compostos derivados de lignina, compostos aromáticos e fenólicos, todos de difícil biodegradabilidade, com elevada cor (XAVIER, et al., 2009). Para remoção de cor foi verificada uma melhora na eficiência com o aumento da carga, chegando a 39%, em média, o que não era esperado em um tratamento biológico, no qual, em altas cargas normalmente se observa um incremento da cor aparente do efluente (VILLAMAR et al, 2009; XAVIER et al., 2011; KAMALI; KHODAPARAST, 2015). Esse comportamento pode ser explicado devido aos meios suportes esponjosos terem adsorvido a cor do efluente durante o tratamento por MBBR-APG, ou seja, os compostos lignínicos presentes no efluente de indústria Kraft são os principais responsáveis pela cor aparente e estas foram adsorvidas pelo material esponjoso do APG, o qual inicialmente era branco e já nos primeiros dias de tratamento adquiriu uma coloração marrom, que foi gradualmente aumentando para uma coloração mais escura, não sendo removido mesmo após 1 hora de banho de ultrassom realizado nas análises dos sólidos aderidos. Na Figura 1(a), também é mostrada a remoção média para compostos fenólicos totais (CFT), que atingiu 38,1% na carga mais alta comparando-se com os resultados de MBBR-AMB obtidos por Vanzetto (2012). As remoções não seguiram o mesmo perfil com o aumento da carga, pois conforme se aumentou a carga orgânica volumétrica aplicada, a remoção de CFT reduzia para a autora anteriormente citada, chegando a valores negativos. Na Figura 1(b) estão apresentados os resultados obtidos das análises de sólidos aderidos voláteis (SAV) e sólidos suspensos voláteis (SSV). Sobre a biomassa aderida, esta foi de 0,77 g para 3,42 g, um aumento de 4,4 vezes entre as cargas e a biomassa suspensa teve um aumento semelhante de 0,23 g para 1,43 g no período de 14 dias, onde se observou que a biomassa estava 2,4 vezes mais concentrada nos meios suportes APG do que na suspensão líquida do reator. Isto pode ser explicado pela grande quantidade de substâncias poliméricas extracelulares presentes na superfície do meio suporte como também observou Vanzetto (2012) para MBBR-AMB. A relação SSV/SST para os sólidos suspensos foi próxima de 0,64 na COV 9,0 gDQO L-1 d-1, caracterizando um lodo parcialmente estabilizado. Com relação à ecotoxicidade aguda, para a COV 0,6 gDQO L-1 d-1, foi verificado um aumento na ecotoxicidade, na qual o fator de toxicidade (FT) aumentou de 2 para 4 após o tratamento biológico, mesmo assim, na COV 9,0 gDQO L-1 d-1 houve a redução de ecotoxicidade de FT=2 para FT=1, indo de encontro com a legislação estadual, na qual tem-se a resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente (CEMA) nº 081/10 que dispõe sobre critérios e padrões de ecotoxicidade para o controle de efluentes lançados em corpos d’água no estado do Paraná. Para efluentes de celulose e papel, o FT aceitável atualmente é de 2, evidenciando a importância no controle da ecotoxicidade deste efluente por parte das indústrias produtoras (PARANÁ, 2010).

Figura 1 - (a) Remoções de DQO, DBO5, Cor e CFT; (b) Análise de sólido

Esta figura apresenta os valores médios de remoção dos parâmetros físico-químicos e sólidos aderidos e suspensos no reator MBBR-APG

Tabela 1 - Caracterização do Afluente usado no MBBR-APG

Esta tabela apresenta a caracterização físico- química do Afluente utilizado no tratamento por reator MBBR-APG

Conclusões

A eficiência de remoção de matéria orgânica manteve-se estável com relação à DQO, mantendo-se acima de 40%, não apresentando grandes discrepâncias entre as cargas aplicadas, constituindo o MBBR-APG como um sistema estável, considerando a remoção de DBO5 foi verificado uma queda inferior a 10%, sendo justificada pela baixa biodegradabilidade do efluente de celulose Kraft tratado. Os valores alcançados para remoção de cor aparente foram próximos a 40%, em média, para a carga mais alta, o que não era esperado de um tratamento biológico. Este resultado pode ser justificado devido a adsorção de cor pelo meio suporte esponjoso APG, na qual verificou-se que o suporte inicialmente branco, obteve cor marrom escuro ao final do tratamento de 48 dias. A eficiência na remoção para compostos fenólicos totais – CFT, não foi afetada negativamente com o aumento da carga em 15 vezes, podendo ser considerado outro ponto favorável a estabilidade do sistema MBBR-APG. Sobre biomassa, constatou-se a sua afinidade com o meio suporte APG devido a sua concentração ser 2,4 vezes superior a biomassa suspensa no reator. A relação SSV/SST para os sólidos suspensos se verificou um lodo parcialmente estabilizado. Com relação a ecotoxicidade aguda, esta foi reduzida para FT=1 na carga mais alta.

Agradecimentos

As autoras agradecem ao apoio da UTFPR, a indústria de celulose por ceder o efluente para estudos, a Nisshinbo Chemical Inc. pelos meios suportes APG e demais colabor

Referências

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