Caracterização físico-química e lignocelulósica de subprodutos provenientes do processo de vinificação

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Físico-Química

Autores

Costa, G.N.S. (EQ/UFRJ) ; Machado, A.M.R. (IQ/UFRJ) ; Oliveira, R.A. (IQ/COPPE/UFRJ) ; Tonon, R.V. (EMBRAPA) ; Mellinger-silva, C. (EMBRAPA) ; Galdeano, M.C. (EMBRAPA) ; Almeida, E.L. (EQ/UFRJ) ; Freitas, S.P. (EQ/UFRJ)

Resumo

O processamento da uva para a obtenção de suco, vinhos e derivados gera uma série de resíduos, dentre os quais o principal é o bagaço de uva. Sabe-se que um dos principais desafios para o aproveitamento deste subproduto consiste na sua composição variável e altamente fibrosa. Visando melhor direcionar o aproveitamento deste subproduto, este trabalho teve como objetivo realizar a caracterização química e determinar a composição lignocelulósica das duas principais frações (semente e casca) que o compõem. Ambas as frações apresentaram elevados teores de fibra alimentar total, 71,53 e 53,18 g/100 g, semente e casca, respectivamente, com predominância de fibras insolúveis. A farinha proveniente das sementes caracterizou-se por conter um alto teor de lignina (72,52 g/100 g).

Palavras chaves

Bagaço de uva; Fibra alimentar; Lignina

Introdução

O bagaço de uva é o principal resíduo gerado pela indústria vitivinícola. Estima-se que a cada 100 L de vinho são gerados em torno de 17 kg deste resíduo, que é constituído pelas partes sólidas da uva (cascas, sementes e engaços) (De CAMPOS et al., 2008). Quando não é direcionado para a alimentação animal ou utilizado como adubo, é descartado de forma inadequada na natureza (BUSTAMANTE et al., 2008). Dada sua rica composição, apresenta potencial de aproveitamento para aplicações não agronômicas, incluindo o nicho de alimentos. Para a extração de biomoléculas como os compostos fenólicos e fibras do bagaço de uva, pré- tratamentos (químicos, enzimáticos ou físicos) podem ser interessantes, uma vez que ajudam na quebra das interações intermoleculares existentes, facilitando a liberação dos compostos de interesse (KARP et al., 2013). Neste sentido, para a definição da melhor forma de aproveitamento e de processos para tal, é importante o conhecimento da composição físico-química do material. O bagaço de uva é dividido em duas principais frações: as sementes e o que sobra do bagaço quando as sementes são removidas (cascas, engaço e polpa residual) e apresenta composição química variada (BERES et al., 2017). Na literatura, a maioria dos trabalhos avalia o potencial de extração do óleo e de compostos antioxidantes das partes constituintes do resíduo. Entretanto, o grande volume de resíduo fibroso gerado após a recuperação destes compostos continua sendo um problema econômico e ambiental. Desta forma, este trabalho teve como objetivo realizar a caracterização química e lignocelulósica das duas principais frações que compõem o bagaço de uva, visando agregar valor e viabilizar o aproveitamento do mesmo.

Material e métodos

O bagaço de uva (Alicante Bouschet), proveniente do processo de vinificação em tinto, safra 2016, foi cedido pela Vinícola Rio Sol, grupo ViniBrasil (Lagoa Grande, PE). O resíduo foi desidratado em secador de bandejas convectivo a 60 ºC, durante 24 horas. As sementes foram separadas usando uma despolpadeira (Itametal, bobina 0.25 df, Brasil) com peneira com orifícios de 1,5 mm de diâmetro. As impurezas residuais foram removidas manualmente e, em seguida, as duas frações (semente e casca) foram trituradas separadamente em moinho de martelos (Laboratory Mill 3100, Perten Instruments, Suécia), obtendo-se a farinha de sementes (FSU) e de cascas de uva (FCU). Após a moagem, as farinhas obtidas foram armazenadas a -18 ± 2 ºC até a realização das análises. A composição centesimal e os teores de fibra alimentar solúvel e insolúvel foram determinados de acordo com as metodologias da AOAC (2016), a qual inclui a quantificação de celulose e lignina na fração de fibras insolúveis. A composição da biomassa foi determinada de acordo com os procedimentos do NREL (SLUITER et al., 2011; SLUITER et al., 2008a, b, c; HAMES et al., 2008). As análises foram realizadas em triplicata e os resultados foram expressos em base seca.

Resultado e discussão

A Tabela 1 apresenta a composição centesimal das farinhas de sementes (FSU) e cascas (FCU) provenientes do bagaço de uva. A FSU apresentou maior teor de lipídeos, o que é característico deste tipo de matéria-prima. Além disto, apresentou elevado teor de fibra alimentar total (71,53 g/100 g), sendo os valores obtidos neste trabalho superiores aos encontrados para farinhas de sementes de uva das variedades Cabernet Sauvignon (37%) (OLIVEIRA et al., 2014) e Syrah (59-62%) (COSTA et al., 2016). A FCU apresentou teores de proteína, lipídeos e de fibra alimentar total similares aos encontrados por Bender et al. (2016), diferenciando-se apenas em relação ao teor de cinzas (12,00 contra 17,74 g/100 g do presente trabalho). Essa variação pode ser justificada pelas diferentes regiões de cultivo e variedades de uva. Tanto a farinha obtida a partir das sementes quanto a obtida das cascas apresentaram elevado teor de fibra alimentar, o que sugere a possibilidade de utilização como ingrediente fonte de fibras, segundo a legislação nacional vigente da ANVISA (BRASIL, 2012). Os teores de celulose, hemicelulose e lignina encontrados em ambas as frações são mostrados na Tabela 2. Observou-se que a FCU apresentou maior teor de celulose, quando comparado à FSU que apresentou maior teor de hemicelulose e de lignina. Ambos os materiais apresentaram elevados teores de lignina, o que pode sugerir o uso para aplicações não alimentícias, como o desenvolvimento de nanocompósitos, placas para mobiliário e construção civil ou ainda para a geração de bioenergia (MUÑOZ et al., 2014; KUMAR et al., 2008; PRADO et al., 2014). O teor de lignina da FSU do presente estudo foi superior ao obtido por Prado et al. (2014) (46 g/100g), para sementes de uva de uva da região Sul do Brasil.

Tabela 1. Composição centesimal das farinhas (FSU) e (FCU).

Resultados expressos em base seca como a média ± desvio padrão (g/100g).

Tabela 2. Composição lignocelulósica das farinhas (FSU) e (FCU).

Resultados expressos em base seca como a média ± desvio padrão (g/100g).

Conclusões

As farinhas de casca e de semente de uva apresentaram elevados teores de fibra alimentar total com predominância da fração insolúvel. No entanto, o alto teor de lignina presente em ambas às frações pode limitar sua utilização na área de alimentos, abrindo oportunidades de aplicação na engenharia de materiais, construção civil, bioenergia, entre outras aplicações.

Agradecimentos

À Embrapa Agroindústria de Alimentos e ao Laboratório de Bioetanol - COPPE/UFRJ.

Referências

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