Preparo e avaliação cinética de gel de ácido hialurônico-BDDE

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Materiais

Autores

Cerqueira Silva, T. (IBILCE-UNESP) ; Marques dos Santos, C.C. (IBILCE-UNESP/IAL) ; Pastre, I.A. (IBILCE-UNESP) ; Batistuti, J.P. (FCFAR-UNESP) ; Fertonani, F.L. (IQ UNESP - ARARAQUARA) ; Ribeiro, C.A. (IQ UNESP - ARARAQUARA)

Resumo

Neste trabalho buscou-se a preparação de géis de ácido hialurônico-BDDE (AH- BDDE), preparados na presença de diferentes percentagens do agente reticulante. Os géis foram preparados com sucesso no intervalo de 16,5 a 50,% do BDDE frente ao HA. O grau de intumescimento mostrou-se inversamente proporcional ao aumento da % do BDDE. Os parâmetros cinéticos, n, k e D, permitiram avaliar o mecanismo de intumescimento como melhor descrito a partir dos valores de D. Uma relação direta do grau de intumescimento foi obtido para os valores de n e D. Ficou evidente que o aumento na % de BDDE compromete a hidrofilicidade dos géis.

Palavras chaves

géis de ácido hialurônico; intumescimento; BDDE

Introdução

Preenchedores dérmicos faciais são indicações cosméticas e médicas usadas em prática clínica de rotina. Estes enchimentos podem ser classificados como temporário, semi-permanente ou permanente. Essa permanência pode ser classificada de acordo composição do produto. Dentre os diferentes materiais para preenchimento temporário o ácido hialurônico é o mais utilizado, sendo possuidor um vasto campo de aplicação (KOGAN, 2007). O AH pode ser modificado no grupo carboxílico, hidroxílico, acetamida e no terminal reduzido do polímero por reações de esterificação, eterificarão, dentre outras. (SÁNCHEZ-CARPINTERO, 2010). A reticulação pode ser realizada a partir da exposição direta do AH ao agente reticulante, em meio alcalino. A maioria dos métodos apresentados para reticular o AH emprega reagentes polifuncionais (ex.: bis-epoxidos, carbodiimidas e divinilsulfona) (BARBUCCI, R,2002). O processo de reticulação química altera principalmente a solubilidade e as propriedades físicas e reológicas da molécula de AH, gerando géis com alta capacidade de intumescimento (BAND, 1998). O processo de intumescimento é governado por fatores físicos como presença de forças de coesão, grupos hidrofílicos, baixa densidade de reticulação, e flexibilidade da cadeia do polímero favorecendo, sinergicamente, o intumescimento (MASON, 2000; SCHNITZER, 2000). A presença de grupos hidrofóbicos, além da densidade de reticulação, e a presença de íons desfavorecem a absorção de água, assim como o pH e a composição do solvente são fatores externos que interferem no processo de formação do gel. Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi o de preparar o gel de AH utilizando como agente reticulante o BDDE e a avaliação da cinética de intumescimento.

Material e métodos

Adicionou-se hidróxido de sódio variável no intervalo (0,05 ≤CNaOH≤0,2) mol L-1 sobre o ácido hialurônico seguido de homogeneização, mecânica de agitador magnético, por (0,083≤t≤3) h. Em seguida, adicionou-se o 1,4 butanodiol diglicidil éter (BDDE), no intervalo de (100≤v≤500) µL, homogeneização mecânica e banho Maria (30≤T≤65) °C. Formado o gel, este foi fracionado em forma cilíndrica, transferido para um frasco especial de volume adequado para a purificação do gel e para os ensaios de intumescimento feito em solução tamponante PBS pH 7,2. O tempo de agitação mecânica foi ensaiado no intervalo de tempo de (0,5≤t≤8) h. O número de etapas para a melhor condição de purificação e intumescimento foi ensaiada entre (5≤n≤15). Os géis preparados como descrito anteriormente, foram adicionados a sacos de diálise mantidos por 1 h sob agitação em água pura, repetindo-se o processo, porém, sem agitação, por mais 3 vezes, perfazendo um total de 4 h. Posteriormente foram secos e mantidos em sacos plásticos para estocagem e posterior utilização. Assim, géis secos, foram imersos em solução PBS, pH7,2, I= 0,145 mol L-1 NaCl, e a cada 30 min o gel era removido do sistema para a medição de massa e obtenção da curva de intumescimento. Ao final do processo de intumescimento o gel era pesado para a obtenção da massa de gel intumescido (Mt). As propriedades hidrofílicas dos géis foram estudadas por medidas de grau de intumescimento (Q) como função do tempo, e os valores de Q% foram, então, calculados a partir da equação: Q%= [(Mt-Mo)/Mo]x100, para o qual Mt massa do gel intumescido no tempo t; e Mo a massa inicial do gel. Os parâmetros da cinética de intumescimento, n. k e D, foram obtidos a partir das medições de grau de intumescimento como função do tempo, F vs. t. Para as curvas de F vs. t, o expoente difusional, n, e a constante de difusão, k, foram obtidas a partir da equação: F= [Mt/Meq.]= k tn.; sendo Meq. a massa do gel na condição de equilíbrio de intumescimento, t o tempo e k a constante de difusão. A equação está limitada até 60% do primeiro estágio da curva de intumescimento. A determinação dos valores de, n, e de, k, é efetivada a partir da relação log F vs. log t, para a qual a pendente da curva fornece o valor de, n, e o coeficiente linear fornece o valor de, k. A avaliação da incorporação do solvente ao interior da matriz do gel foi efetivada a partir da determinação do coeficiente de difusão do solvente, a partir da equação: D= π r2 (k/4)1/n, para a qual: D é o coeficiente de difusão (cm s-1), r o raio da circunferência do disco de gel seco (cm) (AOUADA, 2009).

Resultado e discussão

As bases teóricas para o intumescimento foram desenvolvidas na década de 40, 1943, pelos cientistas Flory e Rehner. Os autores partiram da premissa de que o fenômeno de intumescimento é controlado por três forças naturais, a variação na: 1- entropia da mistura solvente-polímero; 2- entropia conformacional, causada pela redução no número de conformações das cadeias em consequência de seu estiramento; e 3- entalpia de mistura solvente e polímero. Desta forma, o intumescimento de um determinado polímero é dependente do grau de interação do polímero com as moléculas do solvente. Os valores obtidos para o grau de intumescimento, Q%, para os géis de AH-BDDE e a condição de equilíbrio, estão apresentados na Figura 1; os valores de Qeq.% foram obtidos a partir das curvas Q% vs. t, construídas para cada um dos géis preparados com diferentes teores do agente reticulante BDDE. Na Figura 2 encontram-se inseridos os resultados de Qeq.% e os resultados obtidos para os parâmetros cinéticos do processo de intumescimento, n, k e D (Tabela 1). Retornando-se à Figura 1 pode-se observar as curvas de dependência do grau de intumescimento como função do tempo de contato gel-solução, PBS, pH 7,2, em 25 oC. A partir das curvas fica evidenciado que os géis atingem a estabilidade em aproximadamente 2h ou inferior, para os altos teores de BDDE, e 15 h para os baixos teores, após o tempo o início do processo. As curvas Q% vs. t aprestam duas regiões, denotando comportamentos distintos no processo de intumescimento. Na região inicial, do tempo zero até aproximadamente 6h o intumescimento é consideravelmente rápido, ao passo que para a segunda região o processo desacelera até a formação do patamar, momento em que o gel atinge a condição de equilíbrio com o solvente. Observa-se, também, que para os géis preparados para %BDDE mais elevadas o intumescimento atinge o valor de 1080≤Q%≤1800 e o intumescimento máximo após, aproximadamente, 2h, para valores de 1400≤Q%≤2500. Porém, para o gel preparado com a menor % do agente reticulante o valor de Q%= 5010 é obtido para um tempo da ordem de 15h de intumescimento. Este tempo é superior em no mínimo o quíntuplo do observado para as concentrações mais elevadas do reticulante, porém, o grau de intumescimento aumenta em Q%=3000. Verifica-se, da mesma forma, que as baixas concentrações do agente reticulante favorecem o intumescimento. Tal comportamento deve estar relacionado a um menor grau de reticulação para o gel, o que favorece o aumento da inserção de moléculas de solvente aos retículos. Ao passo que, com o aumento do agente reticulante, e o conseqüente aumento no grau de reticulação, deve favorecer a diminuição do espaço livre, intra-retículo, para a inserção do solvente, tendo como consequência uma menor capacidade de intumescimento. O processo cinético de intumescimento dos géis obtidos a partir da reticulação do AH em presença do BDDE, foi estudado, conforme descrito anteriormente para diferentes percentagens deste agente reticulante (16,5≤BDDE%≤50,4). Na Figura 1 são apresentadas as curvas de: 1- % de intumescimento (%Q) vs. tempo (t) (Fig. 1a); e 2- log F vs. log t (Fig. 1b). A Figura 1b, foi obtida a partir para o gel preparado com 16,5% de BDDE. Fica evidente que a equação utilizada para a determinação dos parâmetros cinéticos, k e n, tem validade até em torno de 60% da escala de tempo utilizada para se obter a curva de intumescimento. Fica evidente a partir das curvas que o processo de intumescimento passa por duas etapas distintas, ocorrendo com maior rapidez no início, passando a ser mais lento para um tempo de imersão próximo da condição de equilíbrio de intumescimento do gel (%Qeq.). Verifica-se a partir da Figura 1a que para altas % de BDDE a condição de %Qeq. foi atingida em 3h (%Qeq.= 1370 %), no entanto, para baixos valores foi atingida próximo a 15 h (%Qeq.= 5405%). Assim, ficou evidenciado que os valores de %Qeq. são consideravelmente influenciadas pela presença do agente reticulador. Este fato permite sugerir- se que há a diminuição da hidrofilicidade dos géis com o aumento da % do agente reticulante, o que deve estar atrelado à baixa quantidade de grupamentos hidroxilas presentes molécula do BDDE (Fig. 2b). Os valores observados para o parâmetro relacionado ao mecanismo de intumescimento, n, foram obtidos a partir da pendente da curva log F vs. log t, ilustrado na Figura 1b, para o pH 7,2 (PBS), BDDE 16,5 %, intumescido em presença de NaCl, I= 0,145 mol L-1. Os valores de n estão apresentados na Figura 2a e na Tabela 1, inserida na Figura 2a, como função da %BDDE; tais valores são inferiores ao esperado para uma difusão controlada pela lei de Fick (4,5≤n≤5,0). No entanto, fica nítido que com o aumento da % de BDDE os valores de n se afastam sistematicamente do intervalo considerado a partir da difusão proposta pela lei de Fick (Fig.2a). Os valores de K, por sua vez, foram obtidos dos coeficientes lineares das curvas Log F vs. log t (Fig. 1b) e estão apresentados na Tabela 1 (Fig.2), juntamente com os valores de %Qeq., n e os valores de D, obtidos para os quatro géis. A partir dos dados apresentados na tabela fica evidente a diminuição dos valores de n e Qeq. com o aumento da % do BDDE. No entanto, os valores de n se apresentam diretamente proporcionais aos valores de %Qeq. Os valores de D, semelhantemente aos de n, são diretamente proporcionais aos valores de %Qeq. Tal comportamento permite sugerir-se que a difusão do solvente para o interior do gel, preparado com a menor % de BDDE, é mais rápida. Este comportamento está relacionado ao fato de que, com o aumento do grau de reticulação, pelo aumento da % de BDDE, há uma diminuição dos grupamentos hidroxilas disponíveis (Figura 2b-molécula do BDDE), diminuindo o grau de hidrofilicidade das cadeias do AH. A avaliação dos valores de k, como função do aumento da % de BDDE, revelou o aumento sistemático nos valores obtido para K, ao passo que os valores obtidos para D mostram um comportamento contrário. Considerando-se o fato de que: 1- D foi obtido a partir de n e k; 2- o valor de k foi obtido independente do mecanismo de difusão (n); é de se esperar que a difusão do solvente, no processo de intumescimento dos géis, é mais bem descrita quando avaliada a partir do parâmetro D. Considerando-se, ainda, a dependência de D dos parâmetros exponencial (1/n) e a dependência direta com k, fica evidente a maior sensibilidade do parâmetro D à variação no mecanismo (parâmetro: n) em comparação ao parâmetro k. Outro aspecto a ser apresentado é a possibilidade de existência de correlação entre os parâmetros n e k, o que juntamente com a destacada sensibilidade ao parâmetro n insere uma maior dificuldade à interpretação dos resultados experimentais.

Figura 1.

a) Curvas de intumescimento %Q vs. t; b) log F vs. log t, para a determinação dos parâmetros cinéticos, n e k, para os diferentes géis

Figura 2.

a) Dependência de n, expoente difusional, como função da % de BDDE; b) molécula de BDDE; Tabela 1., inserida na figura

Conclusões

O gel de do ácido hialurônico-BDDE foi preparado com sucesso para diferentes valores de % do agente reticulante (16,5≤%BDDE≤50,4); ocorrendo a efetiva incorporação das moléculas de BDDE ao AH. Os géis apresentaram diferentes valores de grau de intumescimento, como função do teor de agente reticulante. Estes valores de %Qeq. variaram no intervalo de: (5.405≤%Qeq.≤1.370), em correspondência com os teores de BDDE. Com a efetiva reticulação do AH pelo BDDE ocorreu variação na hidrofilicidade dos géis com o aumento do reticulante. Os resultados provenientes do estudo da cinética de intumescimento dos géis forneceram valores para os parâmetros k, e n; e tais parâmetros permitiram o cálculo do parâmetro D. Os resultados cinéticos permitiram observar que a interpretação do mecanismo de intumescimento é mais bem descrita pela análise dos valores de D. Isto se deve ao fato de ser D muito sensível ao parâmetro cinético, n, e menos sensível ao parâmetro K. Neste sentido, tanto o parâmetro cinético n, quanto D apresentam correlação direta e positiva com o grau de intumescimento, %Qeq. No entanto, os valores observados para %Qeq. e os valores de D diminuem sistematicamente com o aumento no teor de BDDE. Comportamento desta natureza permite sugerir-se que o aumento da % de BDDE aumenta a reticulação do gel, causando a diminuição da hidrofilicidade das cadeias de AH. Tal diminuição se deve a incorporação das cadeias das moléculas de BDDE, as quais, tecnicamente, não apresentam grupos hidroxilas, minimizando a retenção do solvente, refletindo, portanto, na diminuição da hidrofilicidade do gel. Desta forma, pode-se afirmar que o transporte do solvente para o interior do gel é influenciado pelas cadeias do AH, uma vez que tanto n quanto D, são proporcionais ao grau de intumescimento (%Qeq.).

Agradecimentos

Referências

AOUADA, F.A., et al. "Correlação entre parâmetros da cinética de intumescimento com características estruturais e hidrofílicas de hidrogéis de poliacrilamida e metilcelulose." Embrapa Instrumentação-Artigo em anais de congresso (ALICE). Química Nova, São Paulo, v. 32, n. 6, p. 1482-1490, 2009., 2009.

BAND, P. A. Hyaluronanderivatives: chemistryandclinicalapplications. In: LAURENT TC, Editor. The chemistrybiologyand medical applicationsofhyaluronanand its derivatives. London: Portland Press, 1998, p. 33-42.

BARBUCCI, R., et al. Hyaluronicacidhydrogel in thetreatmentofosteoarthritis. Biomaterials, v. 23, p. 4503–4513, 2002.

MASON, M., at al. Attachment of hyaluronic acid to polypropylene, polystyrene, and polytetrafluoroethylene. Biomaterials, v. 21, p.31-36, 2000.

SÁNCHEZ-CARPINTERO, I. at al. DermalFillers: Types, Indictions, andComplicationsActasDermo-Sifiliográficas (EnglishEdition) Volume 101, Issue 5, 2010, pp 381-393.

SCHNITZER, E., at. Al. Interaction of hyaluronic acid-linked phosphatidylethanolamine (HyPE) with LDL and its effect on the susceptibility of LDL
lipids to oxidation. Chemistry and Physics of Lipids, v. 104, p. 149–160, 2000.

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