Produção de biossurfactante fúngico utilizando resíduos como fonte de carbono
ISBN 978-85-85905-21-7
Área
Bioquímica e Biotecnologia
Autores
Duvoisin Junior, S. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS) ; Pereira, D.D.F. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS) ; Albuquerque, P.M. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS)
Resumo
Os biossurfactantes são moléculas anfifílicas e apresentam a capacidade de emulsionar e reduzir a tensão superficial de líquidos, com inúmeras aplicações industriais. Por ainda possuírem um processo produtivo de custo elevado em relação aos surfactantes comerciais, sua produção é limitada. Neste trabalho foi investigada a produção de biossurfactantes pelo fungo Aspergillus sp. cultivado em resíduos da indústria de óleos lubrificantes e em óleo de fritura. Após cultivo do fungo em meio líquido, avaliou-se o índice de emulsificação (E24) na presença de querosene e a tensão superficial (TS) em tensiômetro de anel. O óleo de fritura se mostrou o resíduo mais adequado para a produção de moléculas tensoativas pelo fungo, com 37,5% de redução da TS e E24 de 20,6% após 30 dias de cultivo.
Palavras chaves
Moléculas tensoativas; Bioprocessos; Tensão superficial
Introdução
Biossurfactantes são moléculas anfifílicas, produzidas por bactérias e fungos e têm como característica a capacidade de emulsionar e de diminuir a tensão superficial de líquidos (NITSCHKE; PASTORE, 2002). Os biossurfactantes possuem diversas aplicações, como na área ambiental (biorremediação) na produção de alimentos, cosméticos, indústrias da saúde, de limpeza, de produtos químicos, entre outras (SAHARAN; SAHU; SHARMA, 2011; BEZZA; CHIRWA, 2016). Os fungos podem produzir uma ampla variedade de metabólitos secundários durante a fase estacionária de crescimento, inclusive moléculas tensoativas, que podem apresentar propriedades emulsificantes (RON, ROSSENBERG, 2002; QAZI et al., 2014; GAUTAM et al., 2014; SANCHES, 2016). A produção de biossurfactantes pode ser induzida por diversos substratos, tais como açúcares, óleos, hidrocarbonetos e diferentes resíduos (PIRÔLLO, 2006; SANTOS, 2013; SANCHES, 2016). Os biossurfactantes são incapazes de competir economicamente com os surfactantes sintetizados quimicamente, devido ao seu alto custo de produção (SANTOS, 2013), o que está diretamente relacionado às técnicas ineficientes de recuperação do produto e à utilização de substratos caros para o cultivo do micro-organismo (DECESARO et al., 2013). A escolha de uma matéria-prima de menor custo é importante para a viabilidade econômica do processo porque ela corresponde a até 50% do custo do produto final (LUNA et al., 2015). Considerando a necessidade do uso de fontes de baixo custo como substratos para a produção de biossurfactantes, o objetivo do presente trabalho foi verificar a possibilidade de utilizar resíduos de uma indústria de óleos lubrificantes e óleo de fritura como fontes de carbono para a produção de biossurfactante fúngico.
Material e métodos
O fungo Aspergillus sp., isolado da Região Amazônica foi reativado e cultivado em meio de cultura Sabouraud Dextrose Ágar (SB) a 28°C por cerca de 5 a 7 dias. Após o crescimento do fungo, dois fragmentos (6 x 6 mm) do meio SB contendo micélios fúngicos foram inoculados no meio de cultura líquido. Os resíduos de óleo lubrificante foram doados pela empresa Eternal Indústria, Comércio, Serviços e Tratamento de Resíduos da Amazônia Ltda., localizada no Distrito Industrial de Manaus-AM. Foram testados o óleo lubrificante contaminado (OLUC), o óleo misturado com água (OMA) e a borra de óleo (BOL). O óleo de fritura (OF) foi adquirido em restaurantes da cidade de Manaus. Foi realizado ainda um experimento com óleo de soja (OS) adquirido comercialmente, para fins de comparação. O meio de cultura líquido utilizado para a produção de biossurfactante foi composto por MgSO4 (0,5 g/L), Na2HPO4 (3,0 g/L), KH2PO4 (1,0 g/L), extrato de levedura (1,3 g/L) e fonte de carbono (0,5 g/L), conforme descrito por Jacobucci (2000). O fungo foi cultivado em incubadora tipo shaker a 28°C e 170 rpm, durante 30 dias. Alíquotas foram retiradas periodicamente e filtradas para a determinação do índice de emulsificação e da tensão superficial. Para determinar o índice de emulsificação (E24), uma mistura de 6 mL de querosene e 4 mL do meio líquido filtrado foi agitada em vortex durante 2 min. Após 24 h, o E24 foi calculado, dividindo-se a medida da altura da camada de emulsão pela altura total da mistura, vezes 100 (PORNSUNTHORNTAWEE et al., 2008). Os ensaios foram realizados em triplicata. A tensão superficial (TS) foi medida utilizando-se um tensiômetro de anel (Krüss), através do método de Du Nouy, à temperatura ambiente (22 a 25°C). As medidas foram realizadas em triplicata.
Resultado e discussão
Após o cultivo do fungo nas diferentes fontes de carbono, foi verificado o
E24 de 20,6% para o meio contendo OF (Tabela 1), confirmando a produção de
biossurfactantes pelo fungo quando cultivado nesse resíduo. Para os meios
contendo os resíduos de óleo lubrificante não foi observada a formação de
emulsão. Gautam et al. (2014) utilizaram diferentes resíduos como substrato
na produção de biossurfactante pelo fungo Penicillium chrysogenum. Os
autores verificaram um E24 de 40% quando OF e farelo de trigo foram
utilizados como substrato, o dobro do valor encontrado no presente estudo.
Por outro lado, quando o fungo amazônico foi cultivado em OS, o E24 foi de
62,4%, valor promissor.
A temsão superficial do meio líquido, medida no início do cultivo era 61,60
mN/m. Após 30 dias, verificou-se a queda da TS em todos os meios (Tabela 1).
Quando o fungo foi cultivado em OLUC, observou-se 24,2% de redução na TS.
Quando se utilizou o OMA, a TS reduziu em 26,6%, e na presença de BOL em
19%. Na presença de OS, a TS foi reduzida em 32,6%. A maior redução na TS
(37,5%) foi observada quando o fungo foi cultivado em OF. Segundo Haba et
al. (2000), os micro-organismos ditos bons produtores de biossurfactantes
são capazes de reduzir a TS a 40 mN/m ou menos. Verifica-se que o
Aspergillus sp. utilizado no presente trabalho conseguiu reduzir a TS abaixo
deste valor, indicando o potencial desse isolado em produzir moléculas
tensoativas quando cultivado em resíduo de fritura.
Considerando que a característica de ser um bom emulsificante é atribuída
aos biossurfactantes de alto peso molecular (RON; ROSENBERG, 2002), o fungo
amazônico pode ser considerado produtor de biossurfactantes de baixo peso
molecular quando cultivado em OF, já que apresentou baixo E24 e produziu
significativa redução na TS.
Tensão superficial e índice de emulsificação (E24) do meio após 30 dias de crescimento do fungo Aspergillus sp. em diferentes fontes de carbono.
Conclusões
O Aspergillus sp. isolado da Região Amazônica foi capaz de produzir biossurfactantes na presença de resíduos de óleos lubrificantes e de óleo de fritura, bem como na presença de óleo de soja. Dentre os resíduos avaliados, o óleo de fritura apresentou-se como a fonte de carbono mais adequada para a produção de moléculas tensoativas. A otimização das condições de cultivo fúngico se faz necessária a fim de se obter um aumento das propriedades emulsificantes.
Agradecimentos
À CAPES pelo apoio financeiro (Programa Pró-Amazônia, Projeto N. 052), à FAPEAM pela bolsa de iniciação científica e à Central de Análises Químicas da UEA pela infrae
Referências
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