Biocatálise de caseína de leite bovino por protease tratada em líquido iônico e acetona

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Bioquímica e Biotecnologia

Autores

Blumberg Machado, T. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE) ; Furtado Prestes, C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE) ; de Matos de Borba, T. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE) ; Brandelli, A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL) ; Juliano Kalil, S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE)

Resumo

A caseína pode ser hidrolisada por ação catalítica de proteases, gerando peptídeos bioativos. Este estudo visou empregar uma protease oriunda de Bacillus sp. P45 tratada no líquido iônico (LI) [Emim][Tf2N] e acetona (1:1, v/v) na hidrólise da caseína em meio aquoso. A reação foi monitorada, através do método pH-stat, quantificando o grau de hidrólise (GH) das ligações peptídicas. O GH na reação catalisada pela protease tratada em LI e acetona não foi favorável na hidrólise de caseína, pois apresentou um GH 1,8 vezes menor que a enzima padrão solubilizada em tampão. Em vista dos resultados, futuros estudos devem ser conduzidos, reduzindo a concentração de LI e/ou aplicando a enzima nesta condição para outros tipos de processos biocatalíticos com uso de solventes orgânicos.

Palavras chaves

Hidrólise; Processo enzimático; pH stat

Introdução

Caseínas são frações proteicas do leite (WALSTA; JENNESS, 1984), usadas na indústria de alimentos como agente emulsificante, ligante com água e gelificante (ALVAREZ et al, 2007). Em vista do baixo valor destas proteínas, seu uso para obtenção de peptídeos bioativos é atrativo (CERVATO; CAZZOLA; CESTARO, 1999), sendo que o processo é usualmente por hidrólise enzimática (DAROIT et al, 2012, HIDALGO et al, 2015). As proteases catalisam a clivagem das ligações peptídicas de proteínas e estão disponível na natureza e/ou podem ser obtidas por fonte microbiana. Proteases possuem diversas aplicações na indústria química, farmaceutica e de alimentos (GUPTA; RAMNANI, 2006), adicionalmente estão sendo empregadas na hidrólise de alimentos proteicos para liberar peptídeos bioativos presos na estrutura da proteína (SARMADI; ISMAIL, 2010). Líquidos iônicos (LI) são sais fundidos que vem sendo estudados como estabilizantes de enzimas (DANG et al, 2007) e meios reacionais (HERNÁNDEZ- FERNANDEZ et al, 2009, YANG et al, 2010). Como meio reacionais, geralmente os LIs são empregados como substitutos dos solventes orgânicos (SO), porém recentemente a mistura de LI e SO foi empregada (NASCIMENTO et al, 2015). A protease oriunda do Bacillus sp. P45 foi estabilizada no LI [Emim] [Tf2N], mantendo 80% da atividade após incubada a 55ºC por 144 h. Além disso, a adição de acetona à protease em LI 1:1 (v/v) proporcionou aumento de 91% da atividade enzimática em relação a protease somente no LI (BORBA, 2015). Em vista da capacidade estabilizante dos líquidos iônicos e seu emprego em reações, o objetivo do trabalho foi quantificar a hidrólise de caseína de leite bovino (CLB) através do parâmetro GH em meio aquoso catalisado por protease tratada no LI [Emim][Tf2N] e acetona.

Material e métodos

A protease foi sintetizada pela bactéria Bacillus sp. P45 em cultivo submerso e parcialmente purificada por sistema aquoso bifásico integrado a diafiltração (SALA et al, 2014). A atividade proteolítica foi determinada com o substrato azocaseína a 40ºC conforme Daroit, Côrrea e Brandelli (2009). As hidrólises foram conduzidas em reatores encamisados de 100 mL utilizando a protease P45 (2 mL, 600 U/g de proteína), como biocatalisador, na hidrólise da caseína de leite bovino 3,5% (m/v). O potencial de catálise foi estudado no meio aquoso em duas condições de uso da protease: solubilizada em tampão Tris- HCl 100 mmol/L pH 7,5 (condição 1; padrão) e tratada no líquido iônico [Emim] [Tf2N] e adicionada de acetona 1:1 v/v (condição 2). O tratamento da protease na condição 2 consistiu em uma homogeneização com o LI sob agitação magnética a 4ºC por 30 min. A reação foi monitorada utilizando-se o método pH-stat (ADLER-NISSEN, 1986), titulando-se continuamente com hidróxido de sódio 0,2 mol/L de modo a manter o pH constante. Os parâmetros de reação foram pH 7,5, 40ºC, reator com 73 mL de meio por 8 h (condição 1) e 5,5 h (condição 2). A ruptura das ligações peptídicas foram quantificadas através do percentual do grau de hidrólise, que é dependente do volume de hidróxido de sódio consumido durante a hidrólise, da normalidade da base, do grau de grupamento amino liberados pela hidrólise, da massa de proteína do substrato CLB e do número total de ligações peptídicas por unidade de massa (ADLER-NISSEN, 1986).

Resultado e discussão

A Figura 1 apresenta o grau de hidrólise do substrato caseína ao longo do tempo. No meio aquoso contendo a enzima em LI e acetona o GH foi de 3,89% após 5,5 h de reação. Porém, o ensaio padrão foi superior ao ensaio testado com valor de GH igual 6,93% em 8 h, o maior percentual indicou maior número de ligações peptídicas rompidas, que provavelmente originam peptídeos de menor tamanho. A diferença nos valores de GH foi causado pelo tratamento da protease. O contato do LI pode ter proporcionado a formação de um recobrimento na superfície da protease (LEE; KIM, 2002), tornando-a estável, mas provavelmente gerou uma mudança na estrutura impossibilitando o substrato ter acesso ao sítio ativo da molécula. A atividade catalítica em LIs não segue uma regra (FISCHER; MUTSCHLER; ZUFFERREY, 2011), enquanto algumas enzimas são ativadas (DANG et al, 2007), outras são desestabilizadas (ATTRI; VENKATESU; KUMAR, 2011). Outra causa pode ter sido a troca de íons do LI com a solução alcalina, utilizada para o controle de pH e na manutenção das funções catalíticas da protease (FISCHER; MUTSCHLER; ZUFFERREY, 2011), o que pode ter ocasionado mudanças das propriedades do LI e menor eficiência catalítica. Daroit et al (2012) e Hidalgo et al (2015) hidrolisaram caseinato ovino e caseinato de sódio bovino, respectivamente, catalisados por proteases tamponadas, quantificando o GH pela metodologia do ácido 2,4,6-trinitrobenzeno sulfônico (TNBS). No primeiro estudo foi obtido um GH de 5,5% e no segundo, GH de 8,2% após 7 horas de reação. Assim, foi verificado que o resultado do estudo está na mesma ordem de grandeza, porém novas investigações fazem-se necessárias para avaliar a aplicação da protease tratada em outros processos como para a síntese de peptídeos.

Figura 1

Grau de hidrólise nos ensaios de caseína de leite bovino para as duas condições de uso da protease.

Conclusões

A partir dos resultados apresentados neste estudo pode-se concluir que a protease homogeneizada em líquido iônico e acetona não foi eficaz em catalisar a hidrólise de CLB, pois apresentou o GH de 3,89% após 5,5 horas de reação, enquanto que o ensaio padrão obteve 6,93% em 8 horas. Futuras investigações são necessárias para avaliar o uso da protease nesta condição que possibilitem o desenvolvimento de novos processos biocatalíticos em LI.

Agradecimentos

A Capes, CNPq e FAPERGS-PROBIC.

Referências

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