Impacto da utilização de trigo sarraceno no perfil fermentativo da cerveja

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Alimentos

Autores

Brasil, V.C.B. (UNB) ; Ghesti, G.F. (UNB) ; Avido, F.D. (UNB)

Resumo

Os efeitos da inserção do trigo sarraceno foram medidos, quanto ao percentual de proteínas e açúcar. Os perfis de açúcares durante a fermentação demonstram que o percentual de 20% esperado para a glicose, foi ultrapassado quando ouve inserção do trigo sarraceno na mostura. Demonstrando a eficiência da quebra de açúcares devido à proporção de amilopectinas e amilose encontrada no trigo sarraceno. Conferindo as leveduras cerca de 55 g/L de glicose quando o trigo sarraceno foi adicionado, enquanto que os mostos que utilizaram apenas malte de cevada apresentaram cerca de 10 g/L ao final da mosturação. Por consequência a esses fatores a fermentação ocorre de forma mais rápida, devido ao alto nível de açúcares fermentescíveis no mosto. Diminuindo assim o tempo de produção.

Palavras chaves

tecnologia cervejeira; trigo sarraceno; adjunto

Introdução

No ano de 2016 a indústria cervejeira representou 1,6 % do PIB brasileiro, paralelo à seu desempenho industrial, milhares de microcervejarias foram registradas no Brasil. Os dados mostram que a cada R$ 1 de investimento no processo produtivo cervejeiro tem-se a geração de R$ 2,5 na economia brasileira. Esses valores demonstram a importância de pesquisas e desenvolvimento para o setor, gerando melhoras no produto final e no processo produtivo (CERVBRASIL, 2016). Sabendo que hoje, as grandes indústrias cervejeiras utilizam adjuntos, tais como milho, arroz, açúcar e outras fonte de carboidratos fermentescíveis para as leveduras na etapa de fermentação e também para barateamento dos custos de produção é viável pensar em novos cereais como fontes para esse fim (D’ AVILA.R.F et al, 2012). Para tanto é de suma importância saber o impacto da inserção de um novo cereal nas etapas do processamento. Hoje a etapa de maior impacto para a qualidade do produto final é a fermentação, pois a partir do metabolismo das leveduras que se obtêm o álcool e CO2 como principais produtos do consumo dos açúcares da mostura (OLIVEIRA. N. A, 2011)(KUNZE, 1996). Quantidades inapropriadas de cofatores ou fonte de carboidratos podem causar uma variedade de off-flavours que indicam a morte celular, estresse de leveduras e outros tipos de contaminações no produto final (KUNZE, 1996). Se os grãos selecionados para a confecção do mosto não apresentam quantidades equilibradas de carboidratos e proteínas também é possível, com facilidade, observar a interferência no corpo e espuma do produto final (CHRISTA; SORAL-ŚMIETANA, 2008)(AMERICAN HOMEBREWERS ASSOCIATION). Conhecendo o potencial produtivo de cereais da região Centro-oeste e a lei brasileira que informa e direciona a produção da cerveja (Decreto nº6871, de 4 de junho de 2009) esse trabalho buscou avaliar a utilização exclusiva do trigo sarraceno como adjunto, já que este apresenta baixo valor comercial e diversas propriedades bromatológicas semelhantes ao trigo utilizado em cervejarias na forma de malte (CHRISTA; SORAL-ŚMIETANA, 2008).

Material e métodos

O mosto cervejeiro foi confeccionado mediante adaptação da metodologia padrões (INSTITUTO ADOLF LUTZ, 1985). Utilizando o mosto Pilsen como padrão, os testes foram nomeados da seguinte maneira para facilitar a descrição de seus resultados ao longo do relatório: • 100% malte pilsen________________________ A o 75 g de malte pilsen • 45% malte de trigo________________________B o 41,45 g de malte pilsen o 33,75 g de malte de trigo • 45% trigo sarraceno não peneirado ___________ C o 41,25 g de malte pilsen o 33,75 g de trigo sarraceno moído com casca • 45% trigo sarraceno peneirado __¬¬¬¬¬¬¬¬_____________D o 41,25 g de malte pilsen o 33,75 g de farinha de trigo sarraceno peneirada Foram pesados 75 g de grãos moídos, seguindo a proporção estudada de 45 % (m/m) de adjunto, valor correspondente a 33,45 g e 55 % de malte de cevada; 41,25 g, de acordo com o Decreto no 6871 (BRASIL, 2009). O mosto de malte pilsen (A) não teve qualquer adição de adjunto. A rampa de aquecimento da metodologia de Adolfo Lutz foi seguida, adicionando-se 300 mL de água destilada a 46° C em chapa de aquecimento e agitação magnética, durante 30 minutos com controle de temperatura (INSTITUTO ADOLF LUTZ, 1985). Ao fim dos 30 minutos, 200 mL de água previamente aquecida a 70 °C foram adicionadas para que a temperatura da mistura permanecesse em 70 ° C durante 1 hora, sob agitação constante, posteriormente interrompida, com resfriamento por imersão em banho de água á temperatura ambiente.. Em seguida, o recipiente foi pesado e adicionou-se água deionizada até que o conteúdo da solução contivesse 675 g. O mosto foi filtrado em tecido de mussoline, seguindo o procedimento de fabricação de cerveja denominado “Brew in the bag” (AMERICAN HOMEBREWERS ASSOCIATION). Após filtração, aproximadamente 50 mL foram retirados para analises de extrato por meio de refratômetro (ENSMINGER. P. A, 2015) e quantificação de proteína por método Bradford (BRADFORD, 1976). O restante do conteúdo passou por processo de fervura por 1 hora, com a adição de 0,3 g de lúpulo no início da fervura. Ao final, o líquido foi novamente resfriado, com auxílio de banhos de água a temperatura ambiente. Após a fervura o líquido foi novamente filtrado em filtro de papel analítico pregueado. Cerca de 140 mL do líquido resultante da filtração foi armazenado em biocos esterilizados por meio de autoclave a pressão de 121 atm durante 30 min, para posterior adição de leveduras, iniciando-se assim o processo de fermentação. O processo de fermentação ocorreu pela adição das leveduras previamente preparadas, ocorrendo então a fermentação em frasco de vidro, vedado com rolha de silicone atóxica integrado a um sistema do tipo blow- off, na temperatura de 20 °C por período de 10 dias, sendo recolhidas amostras a cada 2 dias de aproximadamente 1 mL. Sendo quantificadas quanto às quantidades de maltotriose, maltose, glicose, glicerol e etanol em CLAE.

Resultado e discussão

Vê-se na tabela 1 que o comportamento de extração do trigo sarraceno (C e D) é coerente com as analises estatísticas do mosto com malte de trigo(B), fator inicial interessante à industria, já que um cereal não maltado teve potencial de extração semelhante ao cereal que necessita passar por alterações bioquimicas durante o processo de malteação. É importante citar a relevância dessa informações em termos de custos de produção, gasto de água e tempo de processamento. Já que a extração de material solúvel no grão de trigo sarraceno demostra a eficacia da utilização desse material quando comparado com um dos adjuntos mais nobres do mercado cervejeiro. Os erros padrões maiores para a mostura C devem-se a presença das casca no mosto, sendo esse o principal fator de incoerência entre as replicatas, já que a presença de possível cascas pode interferir nas do leituras do refratómetro entre as replicatas. A quantificação de proteínas reforça que o conteúdo proteico do trigo sarraceno é elevado, principalmente se comparado com outras fontes de carboidratos utilizadas na indústria cervejeira, que acabam por diluir a carga de proteínas presente no mosto, como é o caso do milho degerminado (CHRISTA; SORAL-ŚMIETANA, 2008). Foi observado também que para a amostra C o rendimento foi superior, cerca de 21%, maior que para a amostra D. Ou seja, pode-se considerar que o maior conteúdo de proteínas passíveis de solubilização do trigo sarraceno esteja presente na casca. Muitas cervejas hoje possuem pouco corpo e baixa estabilidade de espuma e uma gama variada de off-flavours, porque enfrentam problemas com a baixa quantidade de proteínas que são solubilizadas na mosturação, podendo afetar diretamente no metabolismo da levedura, que depende da quantidade suficiente de aminoácidos disponíveis no mosto cervejeiro para a metabolização do etanol. Se a quantidade não é suficiente as leveduras (OLIVEIRA. N. A, 2011) Fermentação O percentual de açúcar comumente encontrado no mosto cervejeiro esta relacionado à eficiência da atividade enzimática durante a mosturação, sendo que valores de maltotriose e glicose são muito infeiroes aos valores habitual de maltose contida no mosto, seguindo proporções de 46% a 56 % para o último, enquanto que a glicose e maltose representam valores menores de 20 % dos açúcares do contidos no mosto (OLIVEIRA. N. A, 2011). As análises mostraram que esse tipo de comportamento foi seguido para a mostura padrão e a mostura com adição de malte de trigo (B), entretanto o comportamento para as analises C e D, foram totalmente diferentes. Como esperado, a mosturação conferiu as leveduras cerca de 55 g/L de glicose quando o trigo sarraceno foi adicionado, enquanto que os mostos que utilizaram apenas malte de cevada apresentaram apenas cerca de 10 g/L ao final da mosturação. O níveis de glicose alcançaram mais de 50 % de açúcares contidos no mosto para os dois últimos, fator que demonstra uma extrema eficiência enzimática durante a mosturação, sendo que o amido contido no trigo sarraceno foi amplamente sacarificado. A glicose é originalmente o açúcar em menor quantidade presente no mosto cervejeiros, chegando ao máximo entre 8% e 10 % dos açúcares nos mostos padrões (OLIVEIRA. N. A, 2011) . Esse perfil demonstra claramente o a composição do trigo sarraceno, já que ao final da mostura e sem adição das leveduras a quantificação de glicose é cerca de 55 g /L cerca de 5 vezes maior que os cereais malteados. Fato decorrente da composição do grão que confere quantidade equivalente até 79 % do peso do grão em amido, sendo que cerca de 50 % dos grânulos de amido são passíveis de extração e quebra de cadeia, a amilose. Esta macromolécula é hidrossolúvel e pode representar até de 52 % da constituição dos grânulos de amido no grão de trigo sarraceno, enquanto os grãos de malte de cevada possuem até 60 % de carboidrato em seu peso, sendo que a proporção entre amilopectina e amilose é de 3:1 (KUNZE, 1996) ,sendo assim a quantidade de açúcar solúvel no grão de malte é menor que no trigo sarraceno. Isso implica em maior solubilidade dos carboidratos presentes no grão e por isso um maior teor de extrato, e consequentemente maior quebra dos carboidratos em açúcares menores (CHRISTA; SORAL-ŚMIETANA, 2008) (PORTO. P. D, 2011). Os índices de maltoriose são mais elevados para os mostos padrões, como foi dito anteriormente, para as amostras que continham o trigo sarraceno, a principal forma de açúcar disposta no mosto foi a do monossacarídeo, sendo assim o percentual de açúcares mais complexos como a maltotriose foi diminuído e a principal fonte de carboidratos pra as leveduras foi a glicose, fazendo-se desnecessário o alto consumo desse açúcar mais complexo para que se complete a fermentação, sendo assim os indíces de maltotriose a partir do quarto dia, praticamente não foram alterados, se levado em consideração os erros de equipamento de análise. (OLIVEIRA. N. A, 2011). A maltose é o segundo elemento a ser consumido na fermentação, devido a sua simplicidade, inferior apenas à glicose que não possui ligações glicosídecas. Vê-se que a concentração de maltose para os mostos que tiveram o trigo sarraceno como adjunto, são muito inferiores logo após a brasagem, e ao longo do processo de fermentação eles não são consumidos devido à outra fonte de carboidrato ser encontrada no mosto durante os quatro primeiros dias de fermentação, a glicose. O processo de consumo da maltose ocorre entre o quarto e sexto dia. A partir desse momento, não sofre alterações de concentração relevantes, permanecendo no meio. O metabolismo da levedura tem como composto secundário da fermentação o glicerol, sendo que a sua formação esta ligada ao equilíbrio redox da reação. O alto índice de formação de glicerol ao segundo dia de fermentação para os casos C e D (inserção do trigo sarraceno), demonstram que o elevado teor de glicose nos primeiros dias de fermentação aceleraram o metabolismo da levedura (OLIVEIRA. N. A, 2011), acelerando assim a taxa de reações redox no meio. Este índice elevado de monosacarrídeo gera estresse nos organismo unicelulares, terminado assim a fermentação ao segundo dia. Fato comprovado também, pelo consumo dos demais carboidratos (maltose e maltotriose), assim como a geração de álcool durante os períodos posteriores ao quarto dia de fermentação. Vè-se na figura iv que houve a estagnação de produção de etanol a partir do quarto dia, fator coerente com o fim de consumo da glicose presente no mosto e início de consumo da maltose no meio, não sendo nescessaria outra fonte de carboidrato para fermentação no caso da adição de trigo sarraceno. O perfil de transformação de etanol se manteve semelhantes para todas as amostras até o segundo dia de fermentação, sendo que do quarto dia em diante os perfis demonstram discrepância, contando com maior produtividade de etanol para as amostras A e B, entretanto vê-se que a alteração de concentração é mínima entre o sexto dia até o decimo. Fato encontrado em todas as amostras.

Tabela 1

Extrato de mostura e quantificação de proteína

Perfil de açúcares durante a fermentação

i) Glicose(g/L); ii)Maltotriose (g/L); iii)Maltose (g/L); iv)Glicerol (g/L) e v)Etanol(g/L).

Conclusões

A mostura demonstra grande eficiência quanto a quebra dos açúcares quando o trigos sarraceno é utilizado como adjunto, fator desejável para maior produtividade na indústria cervejeira. Logo, não há necessidade do processamento biológico denominado malteação e nem o uso de enzimas comerciais exógenas. O fato da malteação não ser necessária implica no abatimento de custos no processo global. O cereal tratado neste trabalho também não nescessita passar pelo processo de exposição do amido no endosperma por decocção, como ocorre com o milho que é amplamente utilizado na industria cervejeira, e pode ser processado juntamente com o malte durante a mosturação, pois sua temperatura de gelatinização é semelhante ao malte utilizado, eliminado assim uma etapa de processamento durante a brasagem, abatendo ainda mais os custos em relação à utilização dos gritz de milho. O período de fermentação deve ter o tempo reduzido quando a inserção do trigo sarraceno é feita, já que este disponibiliza maior quantidade de açúcares menos complexos, pronto para serem consumidos pelas leveduras. A fermentação deve então terminar até o quarto dia, impedindo o estresse desse organismo unicelular, para que não haja formação exagerada de glicerol e off-flavours.

Agradecimentos

A FAPDF, pela oportunidade, aos colaboradores: Agríciola Sempre Viva, AmbBev, Integra, PIBIT/DPP/UnB e Capes.

Referências

BRADFORD, M.M. “A Rapid and Sensitive Method for the Quantitation of Microgram Quantities of Protein Utilizing the Principle of Dye Binding.” Analytical Biochemistry. 1976, 72, 248–254.
BRASIL. Decreto nº6871, de 4 de junho de 2009. Regulamenta a Lei no 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas. Presidência da República, Casa Civil. Brasília, 4 de junho de 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D6871.htm >.
CERVBRASIL. Anúario 2016. Brasil, 2016.
CHRISTA. K., SORAL-ŚMIETANA. M. Buckwheat grains and buckwheat products – nutritional and prophylactic value of their components – a review. Czech J. Food Sci., Polônia, vol. 26, pg. 153–162.
D’AVILA,R,F.et al. Adjuntos utilizados para produção de cerveja: características e aplicações. Estudos Tecnológicos em Engenharia, Vol. 8, pg .60-68, julho-dezembro, 2012.
ENSMINGER. P. A. Alcohol, Calorie, and Attenuation Levels of Beer. 2015 Disponível em: <http://hbd.org/ensmingr/ >
INSTITUTO ADOLFO LUTZ . Normas Analítica do Instituto Adolfo Lutz: Método químicos e físico para análise de alimentos. São Paulo: IMESP, Ed.3, Vol. 1 pg. 171-172, 1985.
KUNZE, W. Tecnologie Brauer Malzer. 7ed, Ed VLB, Berlin Ale, 1996.
OLIVEIRA. N, A, M. Leveduras utilizadas no processo de fanricação da cerveja. Instituto de Ciências Biológicas. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2011.
PORTO. P. D. Tecnologia de Fabricação de Malte: UMA REVISÃO. Instituto de Ciência e tecnologia de alimentos, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011.

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