Obtenção do óleo essencial de Lippia alba em diferentes horários: caracterização química e atividade biológica sobre Aspergillus carbonarius
ISBN 978-85-85905-21-7
Área
Química Orgânica
Autores
Nogueira, J.O. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS) ; Cardoso, M.G. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS) ; Batista, L.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS) ; Brandão, R.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS) ; Souza, R.V. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS) ; Camargo, K.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS)
Resumo
Os óleos essenciais (OEs) são metabólitos secundários obtidos de plantas. Os objetivos deste trabalho foram extrair, caracterizar, determinar o rendimento e a atividade antifúngica dos OEs de folhas de L. alba coletadas em diferentes horários. Os OEs foram extraídos por hidrodestilação em aparelho de Clevenger modificado e caracterizados por CG/EM e CG/DIC. A atividade antifúngica sobre Aspergillus carbonarius foi analisada pelo teste de difusão em disco. Em todas as amostras foram encontrados como constituintes majoritários o citral e o limoneno, além de α-tujona e ρ- cimeno, presentes apenas nas amostras coletadas às 7 e 17 horas. A CMI dos OEs variou entre 31,25 e 125 µg mL-1. Os resultados obtidos mostram que o OE de L. alba pode ser considerado um antifúngico promissor.
Palavras chaves
Aspergillus carbonarius; Rendimento; Caracterização química
Introdução
Há séculos o homem utiliza as plantas para sua sobrevivência e comodidade, empregando-as como fonte de alimentos e fitoterápicos para prevenção, tratamento e cura de doenças; matéria-prima de cosméticos e fragrâncias, ou até mesmo como condimentos e conservantes alimentícios. A aplicação frequente de plantas medicinais, impulsiona pesquisas que visem o isolamento e a identificação de substâncias bioativas derivadas de vegetais, contribuindo para desenvolvimento de produtos de maior qualidade, que proporcionem melhorias na saúde e bem-estar do homem (SANTOS et al., 2015; REZENDE et al., 2017). As plantas sintetizam compostos que aparentam não estar envolvidos diretamente no seu crescimento, no entanto são importantes para as interações ecológicas. Esses compostos, resultantes do metabolismo da glicose, denominam-se metabólitos secundários e estão presentes em baixas concentrações em várias espécies e partes vegetais, apresentando grande potencial biológico (CROTEAU, KUTCHAN, LEWIS, 2009; PEREIRA, CARDOSO, 2012). Um grupo especial de substâncias oriundas do metabolismo secundário são os óleos essenciais. Segundo a International Standard Organization (ISO), os óleos essenciais são definidos como produtos obtidos de partes de plantas através de destilação por arraste a vapor d’agua ou produtos obtidos por espressão de pericarpos de frutos cítricos. Os óleos essenciais constituem misturas lipofílicas complexas de derivados de terpenoides ou fenilpropanoides. Geralmente são substâncias hidrofóbicas, oleosas e líquidas à temperatura ambiente, odoríferas, incolores ou levemente amareladas (SIMÕES et al., 2007). Os óleos essenciais possuem aplicações em diversas áreas de pesquisa. Na indústria alimentícia, esses metabólitos podem ser empregados para o controle de micro-organismos contaminantes ou agentes deteriorantes dos alimentos, tais como agentes oxidantes que promovem a rancificação de produtos alimentares. Assim, os óleos essenciais representam uma alternativa em potencial para substituição dos conservantes e aditivos sintéticos (MIRANDA et al., 2016). Diversas variáveis podem afetar a qualidade dos alimentos e, dentre elas, a contaminação por toxinas de fungos (micotoxinas) têm se configurado um problema à saúde pública. As micotoxinas de maior importância no que se refere à saúde são aquelas produzidas por fungos do gênero Aspergillus, Penicillium e Fusarium. O micro-organismo Aspergillus carbonarius é um fungo filamentoso produtor de ocratoxina A (OTA), frequentemente encontrada em grãos, cerveja, legumes, café, uva, carne e frutas secas. A ingestão de OTA pode resultar em diferentes implicações negativas à saúde humana e dos animais, dentre os efeitos, citam-se os nefróticos, imunossupressores, carcinogênicos e teratogênicos (FERREIRA, FREITAS, MOREIRA, 2014; OLIVEIRA, OLIVEIRA, MENEGHELLO, 2013; WELKE, HOELTZ, NOLL, 2009). A erva-cidreira (Lippia alba (Mill.) N. E. Brown) é uma planta arbustiva e aromática, pertencente à família Verbenaceae. Esta espécie é muito explorada na medicina popular como chá, tanto pela ação calmante, analgésica e sedativa, quanto pelo sabor e aroma agradáveis. O aroma de erva-cidreira está relacionado aos constituintes do óleo essencial, que podem variar devido à influência de fatores como horário do dia, estações do ano, época de floração, idade da planta, base genética, local de cultivo, quantidade de água disponível, dentre outras mudanças edafoclimáticas. Dentre os compostos presentes no óleo essencial de Lippia alba, citam-se a carvona, limoneno, mirceno, linalol, neral e geranial (AGUIAR et al., 2008; EHLERT et al., 2013; GONÇALVES et al., 2016). Neste trabalho, objetivou-se extrair e caracterizar quimicamente o óleo essencial das folhas de erva-cidreira, coletadas em horários distintos (7, 13 e 17 horas), bem como testar sua atividade antifúngica sobre o micro- organismo Aspergillus carbonarius.
Material e métodos
Extração e Caracterização do Óleo Essencial (OE): A espécie L. alba foi coletada às 7, 13 e 17 horas, em um dia de clima ameno sem precipitação. O OE foi extraído das folhas utilizando-se um aparelho de Clevenger modificado por um período de 2 horas. O hidrolato foi recolhido e centrifugado a 960 G por 10 min. O OE foi separado e armazenado sob refrigeração e proteção de luz (FARMACOPEIA BRASILEIRA, 2010). A análise qualitativa do OE foi realizada por cromatografia em fase gasosa acoplada à espectrometria de massas (Shimadzu, modelo QP 2010 Plus) e os compostos detectados foram identificados comparando-se os índices de retenção da literatura (ADAMS, 2007) com as bibliotecas do equipamento, NIST107 e NIST21. A quantificação dos constituintes foi obtida utilizando-se um cromatógrafo em fase gasosa acoplado à um detector por ionização de chamas (modelo Shimadzu GC 2010); por meio da normalização de áreas (%). O índice de retenção foi calculado pela equação de Van den Dool e Kratz (1963) em relação à série homóloga de n-alcanos (nC8-nC18), fazendo extrapolação para C19 e C20. Teor de Umidade: Em um balão de fundo redondo com capacidade de 250 mL, adicionaram- se 5g de folhas picadas e 80 mL de ciclohexano. O balão foi acoplado à um aparelho de Dean Stark e aquecido por um período de 2 horas. O teor de umidade foi calculado com base no volume de água quantificado no Dean Stark (PIMENTEL et al., 2006). Atividade Antifúngica: A atividade antifúngica do OE de Lippia alba sobre o micro-organismo Aspergillus carbonarius (CCDCA 10507), foi determinada empregando-se o teste de difusão em disco aceito pelo Food and Drug Administration (FDA) e padronizado pelo National Committe for Clinical Laboratory Standards (NCCLS). Uma solução de esporos de concentração 106 esporos por mL preparada com Tween 80 1% foram transferidas para uma placa contendo meio Malt Extract Agar (MEA) sólido. A contagem dos esporos foi realizada utilizando-se uma câmara Neubauer. A solução de esporos foi espalhada sobre o meio utilizando- se a técnica de espalhamento em superfície. Discos de papel de 5 mm de diâmetro foram depositados no centro da placa e embebidos com 10 µL de solução de OE diluído em dimetilsulfóxido (DMSO) nas concentrações de 500; 250; 125; 62,5; 31,25; 15,63; 7,81 e 3,91 µg mL-1. O controle negativo utilizado foi o DMSO. As placas foram envoltas em plástico filme e incubadas em BOD a 25 °C, por um período de 72 horas. A concentração mínima inibitória (CMI) foi definida como a menor concentração de OE capaz de inibir o crescimento do micro-organismo (KARAMAN et al., 2003). Análise Estatística: Para comparar os resultados do rendimento foi realizada a análise estatística com delineamento experimental inteiramente casualizado com duas repetições. Os dados foram submetidos à análise de variância utilizando o programa estatístico SISVAR (FERREIRA, 2011) e as médias comparadas pelo teste Tukey ao nível de 5% de probabilidade.
Resultado e discussão
Os óleos essenciais obtidos de Lippia alba coletados em diferentes
horários, apresentaram rendimentos em base livre de umidade diferentes. O
óleo essencial das folhas coletadas às 7 horas (LA1), apresentou menor
rendimento, enquanto os óleos obtidos das folhas coletadas às 13 horas (LA2)
e 17 horas (LA3), não diferiram estatisticamente entre si, conforme descrito
na Tabela 1.
As diferenças de rendimento observadas entre os óleos essenciais,
podem ser explicadas pelo aumento da temperatura durante o decorrer do dia e
incidência de raios solares sobre a planta nesses horários. A luz e
temperatura interferem no metabolismo das plantas, pois são fundamentais
para o processo de fotossíntese, o que acarreta uma interferência indireta
na produção dos metabólitos secundários. Além disso, enzimas fotossensíveis
presentes na rota do ácido mevalônico podem ser ativadas pela luminosidade,
influenciando a produção de óleo essencial (SANTOS, INNECCO, SOARES, 2004).
Estudos similares de Silva e colaboradores (2016) e Bezerra e
colaboradores (2011), corroboram com dados desta pesquisa. Os autores
observaram que houve diferença significativa na produção de óleo essencial
pela espécie Lippia alba dependendo do horário de coleta do material
vegetal, concluindo que o período do dia influencia no teor desses
metabólitos. Em contrapartida, Ehlert e colaboradores (2013), constataram
que a produção de óleo para a mesma espécie não foi afetada
significativamente pelos horários de coleta.
Os componentes majoritários dos óleos essenciais estudados foram o
citral, mistura dos isômeros geranial (40,16%; 46,09% e 41,51% para a
amostra LA1, LA2 e LA3 respectivamente) e neral (34,12%; 35,65% e 35,54%
para LA1, LA2 e LA3 respectivamente); e o limoneno (12,84%; 7,82% e 12,16%
para LA1, LA2 e LA3, respectivamente); independente do horário de coleta. De
acordo com Linde e colaboradores (2016), a espécie Lippia alba pode ser
classificada em quimiotipos conforme os constituintes presentes no óleo
essencial. Segundo os autores as espécies produtoras de óleo essencial com
elevado teor de citral e limoneno, pertencem ao quimiotipo citral-limoneno.
As amostras LA1 e LA3 apresentaram em sua constituição, dois
compostos que não foram detectados na amostra LA2; a α-tujona e o ρ-cimeno.
A composição química dos óleos essenciais é determinada por fatores
genéticos, todavia, estímulos do meio influenciam nas rotas biossintéticas
de produção de metabólitos secundários e ocasionam biossíntese de diferentes
compostos (SILVA et al., 2016). Na Figura 1 estão representadas as
estruturas para os compostos presentes nos óleos essenciais de Lippia alba.
A partir dos resultados obtidos, observa-se que o horário do dia
pode influenciar na composição do óleo essencial. Diversos autores (Niculau
et al., 2013; Gonçalves et al., 2016; Geromini et al., 2015), estudando o
óleo essencial de Lippia alba observaram a presença do geranial e neral como
constituintes majoritários, corroborando com dados deste trabalho.
O teste para determinar a atividade antifúngica demonstrou que as
amostras LA1 e LA3 foram mais eficazes na inibição do crescimento do micro-
organismo Aspergillus carbonarius, apresentando como concentração mínima
inibitória (CMI) 31,25 µg mL-1. A amostra LA2 exibiu como CMI, 125 µg mL-1,
fato que está relacionado à sua constituição química.
Gonçalves e colaboradores (2016) apontam que a atividade antifúngica
dos óleos essenciais pode estar relacionada à lipofilicidade desses
compostos. Devido à afinidade entre os constituintes dos óleos essências e a
membrana citoplasmática dos micro-organismos, estes metabolitos podem
interagir e desestabilizar a estrutura da membrana, acarretando a ruptura da
estrutura de polissacarídeos, lipídeos e fosfolipídios e prejudicando
organelas citoplasmáticas, como as mitocôndrias. Os constituintes dos óleos
essenciais também podem gerar extravasamento celular, uma vez que alteram a
permeabilidade das membranas.
Pela caracterização química dos óleos essenciais, pode-se presumir
que a baixa atividade antifúngica da amostra LA2 está relacionada à ausência
dos constituintes α-tujona e o ρ-cimeno e/ou ao sinergismo entre estes e
demais compostos presentes no óleo essencial.
Estudos de Yangui e colaboradores (2017) demonstraram que os óleos
essenciais de espécies de Eucalyptus foram capazes de inibir o
desenvolvimento de Biscogniauxia mediterranea. Os autores correlacionaram a
capacidade antifúngica dos óleos essenciais à presença de ρ-cimeno,
constituinte principal do óleo de Eucalyptus camaldulensis utilizado na
pesquisa. Esses dados corroboram com o presente trabalho, no qual foi
observado maior atividade antifúngica nas amostras que continham o composto
ρ-cimeno.
Para Córdova-Guerrero e colaboradores (2016), os terpenoides
apresentam atividade antimicrobiana significativa. O potencial
antimicrobiano da espécie Salvia officinalis, por exemplo, é atribuído à
presença de metabólitos secundários, como a α-tujona ou cineol. Estes
compostos podem apresentar capacidade de causar danos à integridade da
membrana da célula. Segundo os autores, os efeitos antibacterianos e
antifúngicos dos terpenoides provavelmente se devem à mecanismos de atuação
que envolvam a lise celular, o que pode estar relacionado ao potencial
antifúngico das amostras LA1 e LA3.
Fonte: Do autor, 2017.
Legenda: as médias seguidas pela mesma letra não diferem estatisticamente entre si, pelo teste Tukey ao nível de 5% de probabilidade.
Conclusões
Os óleos essenciais de Lippia alba apresentaram diferentes rendimentos, sendo que o menor foi observado nas folhas coletadas às 7 horas. Os constituintes majoritários dos óleos essenciais foram o citral e o limoneno, encontrando também a α-tujona e o ρ-cimeno nas amostras LA1 e LA3. A CMI das amostras LA1 e LA3 foi 31,25 µg mL-1, enquanto a CMI da amostra LA2 foi 125 µg mL-1.
Agradecimentos
Ao CNPq, Capes, FAPEMIG e UFLA.
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